Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0554/02
Data do Acordão:05/07/2003
Tribunal:3 SUBSECÇÃO DO CA
Relator:J SIMÕES DE OLIVEIRA
Descritores:REGULARIZAÇÃO EXCEPCIONAL DE RESIDÊNCIA.
FUNDAMENTAÇÃO DO ACTO ADMINISTRATIVO.
ATESTADO DE RESIDÊNCIA.
JUNTA DE FREGUESIA.
PODER DISCRICIONÁRIO.
PODER VINCULADO.
ACORDO DE SCHENGEN.
PROVA.
DOCUMENTO AUTÊNTICO.
PROVA DOCUMENTAL.
Sumário:I - Está suficientemente fundamentado o indeferimento de um pedido de regularização extraordinária de residência, ao abrigo da Lei 17/96, de 24 de Maio, em que a Administração invoca a falta de prova da data de entrada e do período de permanência no País, bem como a circunstância excludente de o requerente estar "indicado" pelo estado Alemão para efeitos de não admissão no espaço Schengen, mencionando-se também os preceitos dos arts. 3º, al. d) e 8º, nº 2, al. a), da Lei 17/96, de 24.5.
II - Face ao estipulado nos arts. 27º, nº 1, al. f) e 28º do D-L nº 100/84, de 29.3, é a Junta de Freguesia, e não o seu presidente, a entidade competente para emitir o atestado de residência, pelo que um atestado passado sem qualquer menção de prévia deliberação da Junta não pode constituir documento autêntico nem fazer prova plena (arts. 363º, nº 2, e 369º do C. Civil); de igual modo, se for baseado em declarações do interessado, e não em percepções da entidade documentadora, não possui essa força probatória (art. 371º).
III - O art. 3º, al. d), daquela Lei prevê uma causa de exclusão estritamente vinculativa, sem qualquer margem de discricionariedade quanto à sua aplicação e quanto à definição do seu conteúdo, não sendo, por isso, possível afastar o cumprimento de tal norma com o fundamento do requerente ter em Portugal uma vida organizada.
Nº Convencional:JSTA00059332
Nº do Documento:SA1200305070554
Data de Entrada:03/27/2002
Recorrente:A...
Recorrido 1:SEA DO MINAI
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC CONT.
Objecto:DESP SEA DO MINAI DE 2002/02/21.
Decisão:NEGA PROVIMENTO.
Área Temática 1:DIR ADM GER - AUTORIZAÇÃO DE RESIDÊNCIA.
DIR ADM CONT - ACTO.
Legislação Nacional:L 17/96 DE 1996/05/24 ART2 N1 C N3 D ART8 N2 A.
LAL84 ART27 N1 ART28 N1 G.
CPA91 ART4 ART5 ART6 ART125 N1.
CONST97 ART266.
CCIV66 ART363 N2 ART369 ART371.
Referências Internacionais:CONVENÇÃO EUROPEIA DOS DIREITOS DO HOMEM ART8 N2.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC201/02 DE 2002/12/03.; AC STA PROC47574 DE 2002/12/03.; AC STA PROC47978 DE 2003/03/11.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo, 3ª Subsecção:
A..., de nacionalidade indiana, recorre contenciosamente do despacho do SECRETÁRIO DE ESTADO ADJUNTO DO MINISTRO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA, de 21.2.02, que negou provimento ao recurso hierárquico, por si interposto, da deliberação da Comissão Nacional para a Regularização Extraordinária (CNRE) que lhe havia indeferido o pedido de regularização extraordinária da sua situação, efectuado ao abrigo da Lei nº 17/96, de 24.5.
Devidamente citada, a entidade recorrida respondeu, sustentando a legalidade do acto.
Nas suas alegações, o recorrente termina enunciando as seguintes conclusões:
“1. O recorrente entrou em Portugal há cerca de 08 anos.
2. O recorrente, no ano de 1996, formulou o competente pedido de concessão Autorização de Residência, processo que viria posteriormente a ser admitido.
3. Por deliberação da Comissão Nacional para a Regularização Extraordinária de 15 de Março de 2000, foi recusada a admissão do processo de legalização do recorrente, relativamente à qual o recorrente apresentou recurso hierárquico junto de Sua Excelência o Ministro da Administração Interna, sobre o qual recaiu a decisão ora recorrido. (docs. 1).
4. O recorrente não se conforma com esta decisão de indeferimento, em virtude de considerar que reúne todos os requisitos legais para beneficiar da legalização da sua situação de permanência em Portugal ao abrigo da Lei nº. 17/96 de 24 de Maio.
5. O facto é que o requerente já fez prova bastante da sua entrada e permanência continuada, em território nacional.
6. É destituído de qualquer fundamento a presente decisão de indeferimento que viola o artigo 4º do C.P.A., pois não pode a Administração negar ao recorrente, que está radicado em Portugal há cerca de 08 anos, a trabalhar, tendo toda a sua vida aqui organizada e estabilizada, o direito de permanecer em território nacional.
7. Nos termos da al. a) do n.º 2 do artigo 8º da Lei nº 17/96, de 24 de Maio, o recorrente apresentou atestado de residência emitido pela Junta de Freguesia, prova idónea e suficiente da sua permanência continuada em Portugal desde data anterior a 25 de Março de 1995.
8. A decisão de não admissão do pedido formulado pelo recorrente viola o preceituado nos artigos 5º e 6º do C.P.A., e ainda o disposto no n.º 2 do artigo 266º da C.R.P., porquanto pedidos formulados por cidadãos do Bangladesh, instruídos com os mesmos documentos foram já há muito concluídos favoravelmente, tendo sido emitidos os respectivos títulos de residência.
9. Mais acresce que a decisão de indeferimento bule com os princípios previstos na Convenção Europeia dos Direitos do Homem, nomeadamente com o artigo 8º que apela ao respeito por “ um justo equilíbrio entre os interesses em confronto, a saber o direito do recorrente ao respeito da sua vida familiar e privada e a protecção da ordem pública e a prevenção de infracções penais “.
10. Com efeito, a presente decisão recorrida é claramente violadora dos direitos reais e profissionais que cabem ao recorrente.
11. Na realidade, a proposta de indeferimento apenas tem razão de ser se for necessária para acautelar a segurança nacional ou pública, o bem estar económico do País, a defesa da ordem e prevenção de infracções penais, a protecção da saúde e da moral ou a defesa dos direitos e liberdades de terceiros, cfr. o n.º 2 do artigo 8.º da CEDH.
12. Mais se diga que a Administração, no exercício do poder discricionário, não se encontra à margem dos princípios gerais de Direito Administrativo, nomeadamente, do princípio da legalidade, o que proíbe a motivação do acto fundada em critérios subjectivos e casuísticos expressamente invocados em sede de fundamentação.
13. Na decisão de indeferimento não existiu, uma adequada ponderação dos vários interesses em questão, pelo que, se revela inconveniente e inoportuna a conservação da decisão ora recorrida, em homenagem ao dever de boa administração.
14. Por outro lado, a fundamentação do indeferimento do pedido de concessão de autorização de residência constante do despacho recorrido não pode deixar de se equiparar a falta de fundamentação, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 125.º do C.P.A., uma vez que os fundamentos adoptados são obscuros, pois não esclarecem concretamente a motivação do acto, violando o preceituado no n.º 1 do artigo 125.º do C.P.A., no n.º 1 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 256-A/77 e n.º 3 do artigo 267.º da C.R.P.”.
Tendo começado por responder ao recurso, a entidade recorrida contra-alegou, extraindo as seguintes conclusões:
A) A força probatória do atestado de residência deve ser analisada de acordo com o que estipula o artigo 371º do Código Civil;
B) Analisada a prova produzida no processo administrativo, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras concluiu que o ora recorrente não fez prova da data da entrada nem do período de permanência continuada em território nacional;
C) O recorrente encontra-se nas condições negativas previstas na alínea d) do artigo 3º da Lei n.º 17/96;
D) Não foi violado o princípio da prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses dos cidadãos, consagrado no artigo 4º do CPA;
E) O não reconhecimento da situação de interesse nacional não pode ser entendido como violadora do princípio da prossecução do interesse público e da protecção dos direitos e interesses dos cidadãos, consagrado no artigo 4º do CPA”;
O Ministério Público emitiu o parecer de fls. 53, em que se pronuncia pelo não provimento do recurso.
O processo correu os vistos legais.
Posteriormente aos vistos, veio o recorrente juntar aos autos o documento de fls. 64 e 65, que é um ofício da Presidência do Governo de Karlsruhe, Alemanha, no qual se comunica que foi deferido o pedido de cancelamento do nome do recorrente do Sistema de Informação do Espaço Schengen.
Cumpre decidir.
- II -
É a seguinte a matéria de facto com interesse para a decisão, que pode dar-se como provada:
1. Em 5.12.96, o recorrente requereu a regularização extraordinária da sua situação, ao abrigo da Lei nº 17/96, de 24.5.
2. Por deliberação da CNRE de 15.3.00, foi resolvido indeferir tal pedido, com fundamento no seguinte: “Uma vez que se verifica a causa de exclusão prevista no art. 3º, alínea d), da Lei 17/96, de 24/05” (processo instrutor, fls. 104).
3. Notificado, o recorrente interpôs recurso hierárquico para o Ministro da Administração Interna, através de requerimento apresentado em 14.4.00 (processo instrutor, fls. 116.
4. Em 10.12.01 a Auditoria Jurídica do Ministério da Administração Interna elaborou o parecer nº 0/1685, cujo conteúdo se transcreve:
“1. A..., cidadão de nacionalidade Indiana, com os demais sinais constantes dos autos, não se resignando com a deliberação de 15-03-00, da Comissão Nacional para a Regularização Extraordinária (fls. 108), através da qual foi indeferido o pedido de regularização extraordinária por si formulado, dela vem interpor recurso hierárquico, que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos e legais efeitos.
2. Notificada a CNRE, nos termos e para os efeitos do artigo 172º do CPA, esta manteve a sua deliberação de indeferimento, informando que a mesma foi proferida de acordo com a lei e não ocorrem motivos que sustentem a sua eventual alteração (fls. 135).
Determinou Vossa Excelência que esta Auditoria Jurídica emitisse parecer, pelo que cumpre emiti-lo.
3. O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras depois de analisado o pedido de Regularização Extraordinária apresentado pelo ora recorrente, procedeu à notificação do interessado e do seu Ilustre Mandatário, informando que o pedido não reunia os requisitos legais, em virtude de não se encontrar provada a data de entrada nem o período de permanência em território nacional, convidando-o à apresentação de alegações nos termos dos artigos 100º e 101º do CPA.
4. O recorrente alegou no sentido de que a prova da permanência estava feita pelo atestado de residência e que, admitido o processo, não é lícito à Administração vir ao fim de dois anos dizer que vai indeferir o pedido.
De seguida, o processo foi enviado à CNRE, para decisão, a qual deliberou no sentido do indeferimento por se verificar a causa de exclusão prevista no artigo 3º, alínea d), da Lei n.º 17/96, de 24 de Maio.
5. Da análise do processo verifica-se que o interessado não fez prova da data da entrada nem do período de permanência continuada em território nacional, como exige a alínea a,), do n.º 2, do artigo 8º, da Lei n.º 17/96, de 24 de Maio, e que se encontra nas condições negativas previstas na alínea d), do artigo 3º, da mesma lei.
Com efeito, o recorrente é objecto de indicação, no Sistema de Informação Schengen, para efeitos de não admissão, não podendo beneficiar da regularização extraordinária, nos termos da alínea d), do artigo 3º, da Lei n.º 17/96, de 24 de Maio, sendo ainda de referir que subsiste a ausência de prova da data da entrada em território nacional, como exige a alínea a), do n.º 2, 1 do artigo 8º, da Lei n.º 17/96, de 24 de Maio, embora isso não tenha relevado na deliberação impugnada.
Termos em que
Concordando Vossa Excelência com o que antecede, poderá, ao abrigo do despacho de delegação de competências n.º 52/2001, de 18 de Dezembro de 2000, publicado no Diário da República, II Série, n.º 2, de 3 de Janeiro, negar provimento ao recurso, mantendo assim a deliberação recorrida” – doc. de fls. 14.
5. Sobre este parecer a entidade recorrida lançou em 26.2.02 o seguinte despacho: “Concordo. Nos termos e com os fundamentos do presente parecer nego provimento ao recurso de A..., id. nos autos e confirmo a deliberação da CNRE que indeferiu o pedido. Comunique-se ao SEF, devolvendo-se o processo, para notificação do recorrente e da sua advogada. Comunique-se também à CNRE” – mesmo doc. de fls. 14.
6. Em documento emitido com o timbre da Junta de Freguesia do Feijó, e assinado pelo respectivo presidente, atesta-se que o recorrente reside na freguesia há mais de um ano, acrescentando-se que o mesmo “declarou residir nesta freguesia, na morada acima indicada, desde 20-12-94 (fls. 6 do instrutor).
7. À data do acto recorrido, o recorrente era objecto de indicação pelas autoridades da Alemanha, para efeitos de não admissão, no âmbito do Sistema de Informações Schengen (fls. 76 a 79 do instrutor).
- III -
Com o presente recurso contencioso, o recorrente reage contra a decisão administrativa que lhe recusou o pedido de regularização extraordinária da sua situação, ao abrigo da Lei nº 17/96, de 24.5.
Quer na petição de recurso, quer, por remissão expressa, nas alegações, o recorrente formula o pedido de que o tribunal “revogue” o acto impugnado, admitindo-se o seu pedido de legalização.
Sendo o contencioso administrativo de mera anulação de actos com fundamento na sua ilegalidade (cf. o art. 6º do ETAF), torna-se claro que este Supremo Tribunal não poderá ir além de proferir uma declaração de anulação ou de nulidade de determinada decisão administrativa, pelo que não é admissível qualquer pedido cujo objecto extravase desse âmbito. Deste modo, o pedido do recorrente tem de ser interpretado no sentido de visar a anulação, pura e simples, do acto recorrido, e não a sua revogação, modificação ou substituição.
A segunda precisão que cabe fazer desde já é a de que a legalidade dos pressupostos dos actos administrativos é, em princípio, aferida com referência à situação factual e jurídica existente à data da sua prática, de acordo com o princípio tempus regit actum. Por isso, não podem relevar os documentos juntos pelo recorrente a fls. 62 e segs., pois a alegada eliminação do nome do recorrente do Sistema de Informação do Espaço Schengen é posterior à prática do acto recorrido. Isto, para além de do facto de que, do ponto de vista adjectivo, essa junção foi efectuada extemporaneamente (cf. o art. 706º, nº 2, do C.P.C.).
Vejamos em primeiro lugar se procede a arguição do vício de falta de fundamentação, pois pode dar-se o caso de essa insuficiência existir e ser de molde a perturbar a apreensão do conteúdo do acto, comprometendo depois a apreciação dos vícios que o afectariam. Segundo o recorrente, os fundamentos do acto seriam obscuros e não esclareceriam completamente a motivação do acto.
A simples observação do teor do parecer em que assentou o despacho recorrido, e que integra, por remissão concordante, a sua própria fundamentação (art. 125º, nº 1, do CPA), é suficiente para infirmar qualquer insuficiência de fundamentação. É perfeitamente claro, na óptica do destinatário do acto, o caminho cognoscitivo e valorativo que conduziu ao indeferimento do recurso hierárquico e à manutenção da decisão de indeferimento do pedido.
Esse iter reconduz-se a dois motivos inviabilizadores da pretensão do recorrente, a saber:
a) Não ter sido feita prova da data de entrada nem do período de permanência continuada em território nacional, como exige a al. a) do nº 2 do art. 8º da Lei 17/96;
b) Encontrar-se o recorrente nas condições negativas previstas na al. d) do art. 3º da mesma lei, em virtude de o seu nome ter sido indicado para efeitos de não admissão, no âmbito do Sistema de Informações Schengen.
Assim, quer no que respeita à fundamentação de facto, quer à de direito, a entidade recorrida deu cumprimento ao dever de fundamentar o acto em termos totalmente satisfatórios.
Passemos agora à análise dos restantes vícios.
Como se viu, um dos pressupostos em que a decisão recorrida assentou foi o de não se encontrar provada, nem a data de entrada, nem o período de permanência do recorrente em território nacional.
O recorrente procura contrariar essa conclusão, argumentando que essa prova decorre do atestado de residência da Junta de freguesia de Feijó, junto a fls. 6 do processo instrutor.
Nesse documento, subscrito pelo presidente da Junta, atesta-se para “fins de cartão de residência” que o recorrente “reside na freguesia há mais de um ano”, e bem assim que o mesmo declarou nela residir desde 20-12-94”.
Ora, como bem nota o Ministério Público no seu parecer, um documento passado nestas condições não é susceptível de comprovar a data de entrada no País ou o tempo de residência do recorrente em Portugal, pois não se mostra elaborado com base em nenhuma deliberação da Junta de Freguesia que tenha precedido a certificação nele contida, e assinada pelo Presidente. Nos termos do art. 27º, nº 1, al. f), e 28º, nº 1, al. g), do Dec-Lei 100/84, de 29.3, competia à Junta atestar a residência, vida e situação económica dos cidadãos, e ao Presidente assinar os atestados.
Só os documentos emitidos pela entidade pública competente podem constituir documentos autênticos, e valer-se da força probatória plena que a lei lhes empresta (art. 363º, nº 2, e 369º do Código Civil). Quando o art. 8º, nº 2, al. a) da Lei 17/96 manda instruir o pedido de regularização extraordinária com o “atestado de residência”, em alternativa com outra prova da entrada e permanência no país, quer seguramente referir-se a um atestado emitido em conformidade com a lei.
Por outro lado, resulta que o atestado em questão foi passado com base em declarações do próprio interessado, e não com base na percepção da entidade documentadora, e nessa medida é insusceptível de fazer prova plena – art. 371º do Código Civil. Sobre esta matéria, v. os recentes Acs. deste S.T.A de 17.11.02 e 3.12.02, resp. proc.ºs nºs 201/02 e 47.574.
Dependendo o benefício da regularização extraordinária da prova de que o cidadão não comunitário entrou no País até 25.3.95 e bem assim de que nele tenha residido continuadamente (art. 2º, nº 1, al. c), da referida Lei), não é passível de censura, no plano da legalidade, a decisão administrativa que não considerou satisfatória a prova feita por intermédio do documento em causa.
Acresce ainda que, à data da decisão sub judice, o recorrente era objecto de indicação por uma parte contratante no âmbito do Sistema de Informações Schengen. Ora, de harmonia com a al. d) do art. 3º da Lei 17/96, essa é uma “causa de exclusão” que impede em absoluto a regularização extraordinária.
Resta conhecer da alegada violação dos arts. 4º, 5º e 6º do CPA, 266º da CRP e princípios da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
Nada há, porém, de antitético entre a decisão impugnada e o conjunto de normas e princípios invocados.
Acerca de idêntica arguição o recente Acórdão de 11.3.03, proc.º nº 47.978, pronunciou-se nos seguintes termos:
“Para a construção deste vício entende o recorrente que pelo facto de ter a sua vida estabilizada em Portugal desde 1995 não lhe pode ser negado a autorização de residência, com o fundamento de ter sido indicado para efeitos de não admissão por qualquer das Partes Contratantes do Acordo de Schengen. Em seu entender esta indicação não vale "ad eternum". O recorrente, sem por em causa a existência da referida indicação, alega que, apesar disso, o indeferimento do seu pedido viola o art. 8º, n.º 2 da CEDH que impõe o respeito por "um justo equilíbrio entre os interesses em confronto, a saber ao respeito pela sua vida familiar e provada e protecção da ordem pública e a prevenção de infracções penais". Só se justifica o indeferimento por razões de ordem e prevenção penais, protecção da saúde e da moral, ou defesa de direitos, liberdades de terceiros. Daí que, conclua, a Administração terá violado o art. 4º do CPA e o art. 8º, n.º 2 da Convenção Europeia Dos Direitos do Homem. Também é evidente que não tem razão. O art. 3º, al. c) da Lei 17/96, de 24 de Maio considera excluídas do benefício de regularização extraordinária de residência em Portugal, as "pessoas que no âmbito do Sistema de Informação Schengen, tenham sido indicadas por qualquer das partes contratantes para efeitos de não admissão". Esta norma é, como se vê dos termos em que está redigida, estritamente vinculativa. Não cabe à Administração adequar a aplicação desta norma aos motivos que levaram à indicação (criminais, morais ou outros), como não cabe à Administração o poder de afastar tal regra por motivos de oportunidade ou conveniência. A estrita vinculação da Administração no que respeita à aplicação da referida causa de exclusão (nem sequer contem conceitos indeterminados), afasta a hipótese de violação do art. 4º do CPA. Este artigo impõe à Administração a prossecução do interesse público, no respeito pelos interesses e direitos dos cidadãos. Se a lei define o interesse público impondo à Administração uma actividade estritamente vinculada, parece evidente que é dessa forma, e apenas dessa forma, que se prossegue o interesse público. Não era, assim, possível à Administração recusar o cumprimento ao disposto no art. 3º, al. d) da Lei 17/97, de 24 de Maio, com base no facto do recorrente ter em Portugal a sua vida regularizada, nem limitar a aplicação do artigo aos casos em que resulte perigo para a segurança nacional ou pública, ou para o bem estar económico do País. Não existe deste modo também qualquer violação do art. 8º, n.º 2 da CEDH”.
Esta doutrina merece a nossa inteira concordância, pelo que aqui se reitera.
O acto recorrido mostra-se, assim, isento dos vícios que o recorrente lhe imputa.
Nestes termos, acordam em negar provimento ao recurso.
Custas pelo recorrente.
Taxa de justiça: 200,00 Euros
Procuradoria: 100,00 Euros
Lisboa, 7 de Maio de 2003
J Simões de Oliveira – relator – Madeira dos Santos – Abel Atanásio