Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01714/13
Data do Acordão:01/22/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:DERRAMA
TRIBUTAÇÃO PELO LUCRO CONSOLIDADO
TRIBUTAÇÃO AUTONOMA
APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO
Sumário:I - Face à redacção do artº 14º da Lei das Finanças Locais anterior à Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, sendo aplicável o regime especial de tributação do grupos de sociedades, a Derrama deve incidir sobre o lucro tributável do grupo e não sobre o lucro individual de cada uma das sociedades.
II - O art.º 14.º, n.º 8, da Lei das Finanças Locais, na redacção que lhe foi dada pelo artº 57º da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro (Lei do OE para 2012) é uma norma inovadora e não interpretativa.
III - Nas tributações autónomas não se trata de tributar um rendimento no fim do período tributário, mas determinado tipo de despesas, que constituem o facto gerador de imposto, uma vez que cada despesa é um facto tributário autónomo, a que o contribuinte fica sujeito, venha ou não a ter rendimento tributável em IRC, no fim do período, sendo irrelevante que esta parcela de imposto só venha a ser liquidada num momento posterior e conjuntamente com o IRC.
IV - A taxa a aplicar a cada despesa é a que vigorar à data da sua realização, uma vez que o facto tributário se verifica no momento em que se incorre nas despesas sujeitas a tributação autónoma, não se estando perante um facto complexo, de formação sucessiva ao longo do ano, mas perante um facto tributário instantâneo.
V - Não pode a lei agravar o valor da taxa de tributação autónoma, relativamente a despesas já efectuadas aquando da sua entrada em vigor, incorrendo a norma do artigo 5.º, nº 1, da Lei nº 64/2008, de 5 de Dezembro, ao determinar a retroacção de efeitos a 1 de Janeiro de 2008 da alteração do artigo 81.º, nº 3, do CIRC, em inconstitucionalidade por violação da proibição imposta no artigo 103.º, nº 3, da Constituição.
Nº Convencional:JSTA00068551
Nº do Documento:SA22014012201714
Data de Entrada:11/11/2013
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A............, SA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF LISBOA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0234/12 DE 2012/02/05; AC STA PROC0281/11 DE 2011/10/07; AC TC PROC310/2012 DE 2012/06/20; AC STA PROC01302/12 DE 2013/01/09; AC STA PROC01241/12 DE 2013/02/27; AC TC PROC18/11 DE 2011/01/12
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório -
1 – A Fazenda Pública recorreu para o Tribunal Central Administrativo Sul da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, de 31 de Dezembro de 2012, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida por A…………, S.A., com os sinais dos autos, contra a autoliquidação de IRC do exercício de 2008, no montante total de 7.486.220,54€, condenando a Fazenda Pública no pedido de anulação dos actos impugnados, de restituição do imposto indevidamente pago e no pedido de pagamento de juros indemnizatórios, embora, quanto a estes, apenas na parte respeitante à autoliquidação da derrama.
A recorrente termina as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
I – O B………… é formado por um conjunto de sociedades ou pessoas colectivas. Sublinhe-se que ao formarem este agrupamento as pessoas colectivas não perderam a sua identidade ou personalidade jurídica, mantendo para todos os efeitos a sua individualidade e personalidade judiciária (sem prejuízo do disposto quanto à possibilidade de constituição de sociedades por fusão, cisão ou transformação de outras).
II – Na situação sub judice parece-nos que a legitimidade da oponente (?) se encontra mitigada precisamente porque a titularidade dos interesses em jogo se encontra espartilhada num regime especial que apenas tem aplicação para efeitos de tributação.
III – A consolidação fiscal é facultativa, é calculada em conjunto relativamente a todas as sociedades do grupo, mediante soma algébrica dos lucros tributáveis e dos prejuízos fiscais de cada uma das sociedades pertencentes ao grupo, corrigido da parte dos lucros distribuídos entre as sociedades desse grupo que se encontra incluída nas bases tributáveis individuais após comunicação, pela sociedade dominante, à AT dos referidos valores (art. 63.º n.º 7 e art. 64.º do IRC).
IV – O lucro consolidado que resulta do somatório dos lucros individuais apresenta um valor desvirtuado, porque elimina diversas operações das empresas.
V – A derrama municipal não é um imposto estadual mas um imposto municipal cuja taxa é deliberada pelos municípios em função das respectivas necessidades próprias dos mesmos e de diversos factores socio-económicos.
A derrama tem assim como principal objectivo o financiamento de investimentos de carácter municipal com vista ao desenvolvimento específico de áreas territoriais circunscritas que, como tal, diverge de município para município em função da sua necessidade infraestrutural.
VI – Sublinhe-se no entanto que, sempre que os sujeitos passivos tenham estabelecimentos estáveis ou representações locais em mais de um município e matéria colectável superior a € 50.000, o lucro tributável imputável à circunscrição de cada município é determinado pela proporção entre a massa salarial correspondente aos estabelecimentos que o sujeito passivo nele possua e a correspondente à totalidade dos seus estabelecimentos situados em território nacional.
VII – A noção de estabelecimento estável que o CIRC adopta é clarificada na convenção da OCDE em comentário ao art.º 5.º dessa Convenção.
VIII – Assim, em nota número sete pode ler-se “É geralmente aceite que a existência de uma afiliada não constitui, só por si, um elemento que implique ser a afiliada um estabelecimento estável da sociedade-mãe. Isto decorre do princípio de que, do ponto de vista fiscal, esta afiliada constitui uma entidade jurídica independente. O próprio facto da actividade da afiliada ser dirigida pela sociedade-mãe não faz desta um estabelecimento estável desta.”
IX – Nos casos não abrangidos pelo n.º 2 do art. 14.º da Lei das Finanças Locais (os do estabelecimento estável), considera-se que o rendimento é gerado no município em que se situa a sede ou a direcção efectiva do sujeito passivo ou, tratando-se de sujeitos passivos não residentes, no município em que se situa o estabelecimento estável onde, nos termos do artigo 117º do Código do IRC, esteja centralizada a contabilidade (conceito já explanado) (art. 14.º da Lei das Autarquias Locais).
X – Sendo o rendimento gerado no município esse rendimento não pode ser influenciado por factores exógenos.
XI – Como tal impõe-se legalmente aferir o cálculo da derrama tendo por base o lucro tributável de cada uma das sociedades do grupo, ou seja: se a derrama deverá ser calculada e indicada individualmente por cada uma das sociedades na sua declaração, sendo preenchido, também individualmente, o anexo A, se for caso disso.
XII – Sobre a segunda questão já se pronunciou o Tribunal Constitucional, ao não julgar inconstitucional a Lei n.º 64/2008, entendimento que acompanhamos.
XIII – Neste sentido entendeu o Tribunal Constitucional, em plenário e na linha de anterior jurisprudência que, o legislador da revisão constitucional de 1997, ao introduzir a actual redacção do artigo 103.º n.º 3 da CRP, apenas pretendeu consagrar a proibição da retroactividade autêntica, ou própria, da lei fiscal.
O que abrange somente os casos em que o facto tributário que a lei nova pretende regular já tenha produzido todos os seus efeitos ao abrigo da lei antiga e, excluindo do seu âmbito as situações de retrospectividade ou de retroactividade imprópria.
XIV – Desta forma, o do acórdão n.º 18/2011, proferido no processo n.º 204/2010 do Tribunal Constitucional 3.ª Secção, declarou a constitucionalidade da norma em apreço.
XV – Este aresto, referindo-se aos limites do princípio da protecção da confiança na ponderação da eventual inconstitucionalidade de normas dotadas de retroactividade inautêntica e, considerou ser necessário, para que esse princípio seja tutelado, que se reúnam dois pressupostos essenciais:
a) A afectação de expectativas, em sentido desfavorável, será inadmissível, quando constitua uma mutação da ordem jurídica com que, razoavelmente, os destinatários das normas dela constantes não possam contar; e ainda;
b) A ausência da necessidade de salvaguardar direitos ou interesses constitucionalmente protegidos que devam considerar-se prevalecentes (situação em que deve recorrer-se, ao princípio da proporcionalidade, explicitamente consagrado, a propósito dos direitos, liberdades e garantias, no n.º 2 do artigo 18.º da Constituição).
XVI – Acresce ainda que, no caso do IRC, estamos perante um imposto anual, em que se tributam os rendimentos englobados obtidos num determinado ano, considerando que o facto gerador do imposto se tem por verificado no último dia do período de tributação tal como prevê o artigo 8.º, n.º 9, do CIRC, ou seja a 31 de Dezembro de cada ano.
XVII – Ora, no que respeita às despesas que são tributadas com uma taxa autónoma são-no devido a não estarem devidamente documentadas. Contudo, as taxas autónomas diferenciam-se em função do seu valor e do tipo de despesas que têm a particularidade de não serem documentadas.
Assim pensamos que a tributação com taxas autónomas, em IRC, não se pode confundir com o facto gerador do imposto, não conferindo autonomia à própria despesa, porque se está perante um facto complexo, de formação sucessiva ao longo de um ano.
XVIII –De modo que as características das taxas autónomas não nos pode fazer cair num imbróglio em relação a uma realidade distinta que é a tributação autónoma relativa a qualquer obrigação única.
XIX – Pelo exposto, a sentença recorrida fez uma errada apreciação dos factos ao subsumi-los à previsão legal, estatuindo-os erroneamente.
Pelo que, com o devido respeito, somos de opinião que o douto Tribunal “ad quo”, esteou a sua fundamentação na errónea apreciação das razões de direito, em clara e manifesta violação quer da Lei n.º 64/2008, de 05/12, designadamente no seu artigo 5.º que altera as taxas de tributação autónoma dos art.ºs 81º e 96º do CIRC, quer ainda na interpretação da Lei das Finanças Locais, nomeadamente quanto ao seu art. 14.º.
Porém, V. EXAS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA


2 – Contra-alegou a recorrida, nos termos de fls. 1126 a 1128, suscitando a questão da manifesta incompetência em razão da hierarquia do TCA-Sul para conhecimento do objecto do recurso e levantando a suspeita de que a interposição do recurso para o TCA visou, deliberadamente, apenas atrasar o trânsito em julgado da sentença e a consequente devolução dos montantes de derrama e tributações autónomas ilegalmente liquidados, dado não ser crível que a recorrente desconheça a jurisprudência unânime do STA sobre a matéria controvertida, mais pugnando pelo não conhecimento do recurso no que se refere à questão da derrama, pois que a recorrente se cinge a tecer considerações vagas sobre o regime da derrama, sem, efectivamente, contraditar os fundamentos da decisão do Tribunal “a quo” em violação do disposto no artigo 685.º-A do CPC e vem, a tal propósito, invocar questões novas (legitimidade da Recorrida, definição legal e no âmbito da Convenção Modelo da OCDE de “estabelecimento estável e eliminação da dupla tributação económica e sua relação com o RETGS), insusceptíveis de serem objecto do recurso, mais defendendo que, caso se entenda conhecer do recurso, deve este ser julgado improcedente, mantendo-se integralmente a sentença recorrida.

3 – Por Decisão sumária de 10 de Outubro de 2013 (fls. 1122 a 1133 dos autos) o TCA-Sul declarou-se incompetente em razão da hierarquia para conhecimento do recurso e competente este STA, sendo os autos a este remetidos precedendo requerimento da recorrente nesse sentido.

4 – O Excelentíssimo Procurador-Geral adjunto junto deste Tribunal emitiu o parecer de fls. 1141 a 1143 dos autos concluindo que de acordo com esta jurisprudência (do STA e do Tribunal Constitucional), em que se louva a sentença recorrida e à qual também se adere, deve ser julgado totalmente improcedente o presente recurso, mantendo-se na integra a decisão recorrida.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
- Fundamentação -
5 – Questão a decidir
É a de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao julgar procedente a impugnação judicial deduzida pela ora recorrida, no entendimento, apoiado na jurisprudência deste STA, de que à luz do n.º 1 do art. 14.º da Lei das Finanças Locais de 2007, a derrama municipal autoliquidada por uma sociedade sujeita ao RETGS incide sobre o lucro tributável do grupo e não sobre o lucro tributável de cada uma das sociedades que o integram, bem como no entendimento, apoiado na jurisprudência deste STA e da mais recente jurisprudência do Tribunal Constitucional, de que o n.º 1 do art. 5.º da Lei n.º 64/2008, de 5 de Novembro, no qual a liquidação das taxas de tributação autónoma se baseou, é materialmente inconstitucional, pois contém uma regra relativa às taxas de imposto com efeitos retroactivos, violando assim o n.º 3 do art. 103.º da CRP.

Não se tomará conhecimento da questão da legitimidade da impugnante, porquanto se trata de questão inteiramente nova e extemporaneamente suscitada pela recorrente, como esta, aliás, reconhece nas suas alegações (cfr. o artigo 17.º das suas alegações, a fls. 1109 dos autos). No demais, em causa estarão novos argumentos, que não novas questões, e não obstante não ser fácil apreender o alcance de alguns desses novos argumentos para a primeira vertente da questão decidenda, entende-se ser de conhecer do objecto do recurso na sua totalidade atento a que é pelo menos possível depreender que a recorrente alega que da letra do artigo 14.º da Lei das Finanças locais decorre necessariamente interpretação diversa da adoptada na sentença recorrida quanto à questão da derrama dos grupos de sociedades tributados segundo o Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades (RETGS).

6 – Matéria de facto
A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos:
A) A Impugnante tem por objecto social a promoção, dinamização e gestão, por forma directa ou indirecta, de empreendimentos e actividades na área do sector eléctrico, tanto a nível nacional como internacional, com vista ao incremento e aperfeiçoamento do desempenho do conjunto das sociedades do seu grupo (cfr. documentos junto ao Processo administrativo).
B) A Impugnante encontra-se sujeita ao RETGS, desde o exercício de 2001, sendo que no exercício de 2008 era a sociedade dominante do grupo denominado de “B…………”, o qual incluía, naquele exercício, para além da Impugnante, as seguintes sociedades (cfr. documentos junto ao Processo Administrativo):
…… Gás – SGPS, S.A (“…… Gás”);
…… Investimentos, SGPS, S.A. (“... Investimentos”);
…... Gestão de Produção de Energia, S.A. (“…... Produção”);
…... Serviner – Serviços de Energia, S.A. (“…... Serviner);
…... Distribuição – Energia, S.A. (“…... Distribuição”);
…... Serviço Universal, S.A. (“…..., SU”);
...... Comercial – Comercialização de Energia, S.A. (“...... Comercial”);
…… Multimédia – serviços Interactivos, S.A. (“…… Multimédia”);
…… – Consultoria Económica e Participações – Sociedade Unipessoal, Lda. (“……”);
...... Imobiliária e Participações, S.A. (“...... Imobiliária”);
…… Imobiliária, Lda. (“……”);
…… – Estudos, Desenvolvimento e Actividades Laboratoriais, S.A. (“……”);
…… - Medicina Apoiada, S.A. (“……”);
…… – Mudança e Recursos Humanos, S.A. (“……”);
...... Internacional, S.A. (“...... Internacional”);
…… – Serviços Complementares de Saúde, S.A. (“……”);
...... Valor – Gestão Integrada de Serviços, S.A. (“...... Valor”);
...... Powerline – Infraestruturas de Comunicação, S.A. (...... Powerline”);
...... Gás III, SGPS, S.A. (“...... Gás III”);
…… Gás – SGPS, S.A. (“…… Gás”);
...... Soluções Comerciais, S.A. (“...... SC”);
...... Estudos e Consultadoria, S.A. (“...... EC”);
...... Inovação, S.A. (“...... Inovação”);
...... Gás.Com – Comércio de Gás Natural, S.A. (“...... Gás.Com”).
C) A Impugnante submeteu a Declaração de Rendimentos Modelo 22 de IRC de 2008 do grupo fiscal que lidera, a 29 de Maio de 2009, que não foi validada centralmente pela, então, Direcção Geral dos Impostos (“DGCI”), em virtude de, no entender daquela entidade, terem sido detectados erros centrais de preenchimento, em concreto no campo 364 “derrama” da referida declaração (cfr. documento a fls. 173 a 175 dos autos).
D) A Impugnante corrigiu a declaração inicial, em conformidade com as orientações da administração Tributária inscrevendo no campo 364 da declaração em referência a importância de €6.896.437,21, i.e. o valor da derrama devida segundo a interpretação que a Autoridade Tributária faz da lei aplicável (cfr. documentos de fls. 174 e ss e 176 e ss dos autos).
E) Posteriormente, pela necessidade de efectuar alguns ajustamentos, entre os quais os valores das contribuições para o Fundo de Pensões de algumas das sociedades, a Impugnante veio a entregar, em 26 de Maio de 2010, ao abrigo do disposto no n.º 2 do actual artigo 122.º do CIRC, uma declaração de rendimentos Modelo 22 de IRC de substituição, referente ao exercício de 2008, nos termos da qual apurou um prejuízo fiscal de €544.757.480,58 e um total de imposto a recuperar de 24.366.805,87, inscrevendo no campo 364 da declaração (derrama) em referência a importância de €6.918.507,36, a qual foi igualmente validada pela Administração Tributária (cfr. documentos de fls. 181 e ss dos autos).
F) Entre 1 de Janeiro de 2008 a 31 de Dezembro de 2008, a Impugnante, bem como as demais empresas que integram o denominado “B…………” suportaram encargos referentes a despesas de representação e despesas com viaturas, que revelaram contabilisticamente e a que se aplicaram as taxas de tributação autónoma previstas nos n.º 3 e 4 do art. 81.º do CIRC, com a redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 64/2008, de 5 de Dezembro (cfr. documentos juntos com a reclamação graciosa junto ao Processo Administrativo, contestação e projecto de indeferimento da reclamação graciosa).
G) Em 21/12/2010 a Impugnante apresentou reclamação graciosa da autoliquidação de IRC referente ao exercício de 2008 (cfr. requerimento a fls. 3 do Processo Administrativo).
H) Em 25/08/2011 foi proferido despacho de concordância com a proposta de indeferimento da reclamação graciosa e que ordena a notificação da Impugnante para efeitos do exercício de audição prévia (cfr. decisão de fls. 693 e ss do Processo Administrativo).
I) Não foi proferida decisão definitiva sobre a reclamação graciosa da Impugnante face à apresentação da Impugnação Judicial com base no indeferimento tácito da reclamação graciosa (cfr. 704 e ss do Processo administrativo).
J) A Impugnação foi apresentada junto do Tribunal Tributário de Lisboa em 13/07/2011 (cfr. fls. 2 dos autos).

6 – Apreciando
6.1 Do alegado erro de julgamento da sentença recorrida
A sentença recorrida, a fls. 1032 a 1060 dos autos, julgou procedente a impugnação judicial oportunamente deduzida pela ora recorrida, salvo no respeitante ao pagamento de juros indemnizatórios relativos à tributação autónoma (onde julgou não haver erro imputável aos serviços porquanto estes limitaram-se a cumprir a lei - cfr. sentença recorrida, a fls. 1059 dos autos), no entendimento de que derrama municipal autoliquidada por uma sociedade sujeita ao RETGS incide sobre o lucro tributável do grupo e não sobre o lucro tributável de cada uma das sociedades que o integram, sendo, pois, ilegal a autoliquidação da derrama efectuada individualmente para cada uma das sociedades abrangidas pelo RETGS como propugnado pela Administração Fiscal, e que o art. 14.º, n.º 8, da Lei das Finanças Locais, na redacção que lhe foi dada pelo art. 57.º da Lei do Orçamento do Estado para 2012 (Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro é uma norma inovadora e não interpretativa, e nessa medida, não se aplica ao caso dos autos, em que está em causa derrama do exercício de 2008, e bem assim de que as novas taxas de tributação autónoma previstas no artigo 81.º, n.º 3 e 4 do CIRC, na redacção que lhes foi dada pela Lei n.º 64/2008, de 5 de Dezembro, são inaplicáveis às despesas a elas sujeitas realizadas antes de 6 de dezembro de 2008, por inconstitucionalidade material - violação do artigo 103.º n.º 3 da Constituição da República (proibição de leis fiscais retroactivas) - do artigo 5.º daquela lei (que determinou a aplicação de tais novas taxas desde o dia 1 de Janeiro de 2008).
Fundamentou-se o decidido, quanto à base de cálculo da “derrama de grupo”, no Acórdão deste STA de 2 de Maio de 2012, rec. n.º 0234/12, transcrito na sentença nos trechos tidos por relevantes (cfr. sentença recorrida, a fls. 1041 a 1043 dos autos) e quanto à (in)aplicação ao período temporal em causa das novas taxas de tributação autónoma, para além do mais, no juízo de inconstitucionalidade material a que o artigo 5.º da Lei n.º 64/2008, de 5 de Dezembro foi sujeito, primeiro pelo STA (Acórdão de 6/07/2011, Rec. n.º 0281/11), e depois pelo Tribunal Constitucional (Acórdão n.º 310/2012, de 20 de Junho de 2012).
Discorda do decidido a Fazenda pública, imputando à sentença recorrida erro de julgamento, porquanto entende, em síntese, que o douto Tribunal “ad quo” esteou a sua fundamentação na errónea apreciação das razões de direito, em clara e manifesta violação quer da Lei n.º 64/2008, de 05/12, designadamente no seu artigo 5.º que altera as taxas de tributação autónoma dos art.ºs 81º e 96º do CIRC, quer ainda na interpretação da Lei das Finanças Locais, nomeadamente quanto ao seu art. 14.º.
O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Supremo Tribunal no seu parecer junto aos autos sustenta fundamentadamente o não provimento do recurso, pois que a sentença recorrida é plenamente conforme à jurisprudência deste STA, quanto à “derrama de grupo” – cfr., para além dos citados na sentença recorrida, os Acórdãos de 5 de Julho de 2012 (recs. n.ºs 206/12 e 265/12), de 9 de Janeiro de 2013 (rec. n.º 1302/12) e de 27 de Fevereiro de 2013 (rec. n.º 1241/12), e também do Tribunal Constitucional, quanto às taxas de tributação autónoma (Acs. do STA de 14 de Junho de 2012, rec. n.º 757/11, de 14 de Fevereiro de 2013, rec. n.º 1375/12, e de 17 de Abril de 2013, rec. n.º 166/13; Acs. do Tribunal Constitucional n.º 382/2012, de 12 de Julho de 2012, n.º 617/2012 de 19 de Dezembro de 2012 e n.º 85/2013, de 5 de Fevereiro de 2013.
E assim é, efectivamente, nada dizendo a recorrente que abale a nossa convicção do que o que se vem decidindo – de forma unânime, reiterada e pacífica em numerosos Acórdãos proferidos por este STA –, quer quanto ao cálculo da derrama no caso de grupos de sociedades sujeitos ao RETGS antes da entrada do n.º 8 do artigo 14.º da Lei das Finanças Locais na redacção que lhe foi dada pelo art. 57.º da Lei do Orçamento do Estado para 2012 (Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro), quer quanto à inaplicabilidade das (novas) taxas de tributação autónoma previstas no artigo 81.º, n.º 3 e 4 do CIRC, na redacção que lhes foi dada pela Lei n.º 64/2008 de 5 de Dezembro, às despesas a elas sujeitas realizadas antes de 6 de Dezembro de 2008, por inconstitucionalidade material - violação do artigo 103.º n.º 3 da Constituição da República (proibição de leis fiscais retroactivas) - do artigo 5.º daquela lei (que determinou a aplicação de tais novas taxas desde o dia 1 de Janeiro de 2008), não mereça também aqui ser reafirmado.
É que, embora a recorrente invoque em abono da sua tese quanto à constitucionalidade do artigo 5.º da Lei n.º 64/2008, de 5 de Dezembro o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 18/2011, de 12 de Janeiro de 2011, o que é certo é que o Tribunal Constitucional reviu posteriormente a sua posição, vindo a declarar a inconstitucionalidade daquela norma, tendo esta nova orientação sido inclusive sufragada por Acórdãos do Tribunal Constitucional proferidos em Plenário (cfr. os Acórdãos do TC n.º 617/2012, de 19 de Dezembro de 2012 e n.º 85/2013, de 5 de Fevereiro de 2013).

Assim, pelos fundamentos constantes dos Acórdãos deste STA de 27 de Fevereiro de 2013, rec. n.º 1241/12 e de 17 de Abril de 2013, rec. n.º 166/13, para cuja fundamentação se remete e que também aqui se acolhe, haverá, sem mais, que negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida, que nenhuma censura merece.
- Decisão -
7 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.

Junte-se cópia dos acórdãos deste STA de 27 de Fevereiro de 2013, rec. n.º 1241/12 e de 17 de Abril de 2013, rec. n.º 166/13.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 22 de Janeiro de 2014. - Isabel Marques da Silva (relatora) - Pedro Delgado - Casimiro Gonçalves.

Nota: Os acórdãos supra identificados encontram-se tratados e divulgados informaticamente nesta base de dados.