Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0103/10
Data do Acordão:06/16/2010
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:DEFERIMENTO TÁCITO
BENEFÍCIOS FISCAIS
TRANSMISSÃO DE BENEFÍCIOS FISCAIS
IRC
Sumário:Os elementos mencionados no art. 11°-A do EBF destinados a averiguar se deixou de efectuar-se o pagamento de contribuições relativas ao sistema da segurança social, não integram os elementos exigidos no nº 7 do art. 69º do CIRC para efeitos da verificação do deferimento tácito ali também referido.
Nº Convencional:JSTA00066486
Nº do Documento:SA2201006160103
Data de Entrada:02/12/2010
Recorrente:A...
Recorrido 1:MFIN
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:AC TCA SUL.
Decisão:PROVIDO.
Área Temática 1:DIR FISC - IRC.
Legislação Nacional:EBF89 ART2 N2 ART11 A ART13.
CIRC ART69 N2 N7 N8 NAS REDACÇÕES DO DL 221/2001 DE 2001/07/10 E L 32 B/2002 DE 2002/12/30.
CPA91 ART108 ART140 ART141.
Jurisprudência Nacional:AC STA PLENO PROC548/08 DE 2010/01/20.; AC STA PROC1097/09 DE 2010/01/27.
Referência a Doutrina:MANUEL ANSELMO TORRES A RESPONSABILIDADE DOS PREJUÍZOS FISCAIS IN SALDANHA SANCHES E OUTROS REESTRUTURAÇÃO DE EMPRESAS E LIMITES DO PLANEAMENTO FISCAL PAG114 PAG115.
REAVALIAÇÃO DOS BENEFÍCIOS FISCAIS IN CTF N198 PAG95 N118 PAG173 PAG174 N188 PAG196.
NUNO SÁ GOMES MANUAL DE DIREITO FISCAL VI PAG323 E TEORIA GERAL DOS BENEFÍCIOS FISCAIS IN CTF N165.
CASALTA NABAIS DIREITO FISCAL PAG368.
FRANCISCO SOUSA DA CÂMARA AS OPERAÇÕES DE REESTRUTURAÇÃO E A CLAUSULA ANTIABUSO IN SALDANHA SANCHES REESTRUTURAÇÃO DE EMPRESAS E LIMITES DO PLANEAMENTO FISCAL PAG71 PAG110.
BAPTISTA LOBO NEUTRALIDADE FISCAL DAS FUSÕES BENEFÍCIO FISCAL OU DESAGRAVAMENTO ESTRUTURAL? COROLÁRIOS AO NÍVEL DO REGIME DE TRANSMISSIBILIDADE DE PREJUÍZOS IN FISCALIDADE N26/27 PAG29 PAG61.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
RELATÓRIO
1.1. A…, S.A., com os demais sinais dos autos, recorre do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul, que julgou improcedente a acção administrativa especial por si deduzida contra o despacho do SEAF que lhe indeferiu o pedido de transmissibilidade de prejuízos fiscais.
1.2. A recorrente termina as alegações do recurso formulando as Conclusões seguintes:
I. O regime previsto no artigo 69º do Código do IRC sobre a transmissibilidade dos prejuízos não configura um benefício fiscal, mas sim um desagravamento estrutural, nos termos do artigo 4º do EBF.
II. A norma em causa não impede a tributação como é propósito dos benefícios fiscais, mas visa apenas conter a obrigação de imposto na medida do rendimento real da empresa e na sua dimensão inter-temporal e inter-societária.
III. Como refere Carlos Baptista Lobo “somos obrigados a concluir que não existe qualquer fundamento de extra-fiscalidade para a justificação do regime fiscal previsto nos artigos 67º a 72º do Código do IRC. Pelo contrário, o regime previsto traduz-se num desagravamento estrutural.”
IV. Concluindo que “A configuração destes instrumentos fiscais como benefícios fiscais é totalmente desadequada e redutora da realidade”
V. Tal foi também o entendimento do Grupo de Trabalho criado por Despacho de 1 de Maio de 2006, do Ministro de Estado e das Finanças, que procedeu à reavaliação dos benefícios fiscais.
VI. Considerou o Grupo de Trabalho que “Subjacente a tais normas não há pois uma verdadeira extrafiscalidade, isto é, um específico objectivo económico e/ou social a ser prosseguido mas apenas um mero propósito técnico”.
VII. Pelo que concluíram, peremptoriamente “Nesta medida, portanto, não estamos perante benefícios fiscais em sentido próprio.”
VIII. Por todos estes motivos, o art. 11º-A do EBF (actual artigo 13º do EBF) não é aplicável ao regime estatuído no art. 69º do CIRC.
IX. Com este enquadramento legal, devia o Douto Tribunal recorrido, ter apreciado a questão do deferimento tácito do pedido de transmissibilidade dos prejuízos fiscais registados nas sociedades incorporadas.
X. Porquanto, tendo a Recorrente requerido a 30 de Novembro de 2004, autorização para dedução de prejuízos fiscais aos eventuais lucros que viesse a registar nos exercícios pós fusão, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 69º do CIRC, o respectivo deferimento tácito ocorreu em 30 de Maio de 2005.
XI. Atente-se que o requerimento foi apresentado cumprindo todos os requisitos formais e substanciais em vigor à época, constantes do artigo 69º, nº 2, do CIRC e da Circular 6/2002, de 2 de Abril, da DSIRC.
XII. E tal como o Acórdão do STA decidiu no processo 0548/08, de 22.04.2009, não pode a Administração Fiscal, mediante a Circular nº 7/2005, de 16-05-2005, exigir a comprovação de inexistência de dívidas à Segurança Social, porquanto a sua emissão “é posterior à data de apresentação dos pedidos de transmissibilidade de prejuízos fiscais”.
XIII. Acrescentando que “é apenas do acompanhamento do requerimento por estes elementos referidos no nº 2 (do artigo 69º do CIRC) e não quaisquer outros eventualmente necessários ou convenientes para apreciação do pedido que o artigo 69º, nº 7 do CIRC fazia depender a formação do deferimento tácito”.
XIV. Não pode assim ser aceite vir agora a Administração Fiscal exigir por outra via, qualificando algo como sendo benefício fiscal, outros documentos para além dos referidos no artigo 69º, nº 2, do CIRC e da Circular 6/2002, de 2 de Abril, da DSIRC.
XV. Constata-se que o facto da Administração Fiscal ter sentido necessidade de expressamente abarcar esta exigência numa nova Circular relativa ao artigo 69º do CIRC (a Circular 7/2005, de 16 de Maio) demonstra o quão forçado é a fundamentação de ser um benefício fiscal.
XVI. Por outro lado, só em 29 de Junho de 2006, ou seja, mais de um ano e meio após a data em que a Recorrente apresentou o referido requerimento, a DSIRC solicitou à Recorrente o envio de comprovativos da inexistência de dívidas à Segurança Social.
XVII. Pelo que esta solicitação da DSIRC não é susceptível de suspender a contagem do prazo de deferimento tácito, dado o facto principal de este já ter decorrido totalmente.
XVIII. Por esse motivo, da matéria de facto constante dos autos e da Legislação aplicável, verificou-se um deferimento tácito à utilização dos prejuízos das sociedades incorporadas.
XIX. Este deferimento tácito consubstanciou um acto constitutivo de direitos para a Recorrente.
XX. Pelo que não poderia ser revogado, atendendo às limitações dos artigos 140º e 141º do Código do Procedimento Administrativo.
XXI. Por esse facto, o Despacho do SEAF enferma de vício de violação de lei, não só por erro sobre os pressupostos de facto, mas também por violação dos artigos 140º e 141º do Código do Procedimento Administrativo.
XXII. Nessa medida, deve ser declarada a possibilidade da Recorrente, com base no deferimento tácito em deduzir os prejuízos reconhecidos nas sociedades incorporadas.
XXIII. Concomitantemente deve-se anular o Despacho do Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais nº 131/2007, de 6 de Fevereiro de 2007.
XXIV. Conclui-se, deste modo, que o Acórdão recorrido incorre em erro de julgamento, pelo que não se poderá manter, devendo ser revogado de imediato, julgando-se procedente a acção, o que desde já se requer para todos os efeitos legais.
Termina pedindo o provimento do recurso e a revogação da decisão recorrida.
1.3. Contra-alegou o recorrido, rematando com a formulação das Conclusões seguintes:
I. A transmissibilidade dos prejuízos fiscais, prevista no artigo 69º do CIRC, configura um benefício fiscal que carece de reconhecimento, estando como tal sujeita ao disposto no artigo 11º-A, nº 1 do EBF.
II. Consistindo a transmissão de prejuízos fiscais numa consequente dedução na matéria colectável apurada, à luz dos artigos 2º e 3º do EBF, a mesma não pode deixar de ser considerada como um benefício fiscal, ainda que ao Requerente a pretenda designar por outra forma, mesmo que com idêntico sentido.
III. A formação do acto tácito está sempre dependente do preenchimento - no caso, por parte do requerente - dos requisitos de deferimento tácito da pretensão, e se estes não estiverem reunidos, não pode haver formação do acto tácito.
IV. Estando a Administração Tributária adstrita ao estrito cumprimento da legalidade, nunca poderia vir a proferir uma decisão de mérito que se traduzisse no reconhecimento, ou não, de um verdadeiro benefício fiscal, sem que se mostrassem reunidos todos os requisitos formais e substanciais para que tal fosse possível.
V. Não é por dar cumprimento ao mencionado na Circular nº 6/2002 - de 02.04.2002 - que a Recorrente fica desobrigada do cumprimento do disposto no artigo 11º-A do EBF.
VI. Não foi a Circular nº 7/2005 que veio determinar a obrigação legal de comprovação da regularidade da situação da Autora perante a Segurança Social - o que determina tal obrigação é próprio texto legal ínsito no artigo 11º-A do EBF (em vigor desde Novembro de 2002).
VII. Tendo a omissão do preenchimento dos requisitos formais origem numa lacuna da Autora, e não da Administração Tributária, não pode admitir-se que tenha ocorrido deferimento tácito (nem em 30 de Maio de 2005, nem em qualquer outro momento, uma vez que não foram juntas certidões relativas as todas as sociedades envolvidas no processo de fusão).
VIII. Não ocorrendo o deferimento tácito, e tendo sido proferido decisão expressa de indeferimento por parte do Recorrido, que reconhecidamente resulta de um juízo discricionário do seu autor (apenas sindicável pelos Tribunais em caso de erro grosseiro ou manifesta desadequação ao fim legal, cf. Acórdãos do STA proferidos nos processos nº 142/06 e 1003/05, entre outros), deverá o mesmo ser mantido, pois que não merece qualquer censura.
Termina com o pedido de confirmação do julgado.
1.4. O MP emite Parecer no sentido do provimento do recurso, fundamentando-se no seguinte:
«A questão suscitada no presente recurso consiste em saber se se formou deferimento tácito sobre o pedido de transmissibilidade dos prejuízos fiscais formulado pela autora.
Alega a recorrente, que o regime previsto no artigo 69° do Código do IRC sobre a transmissibilidade dos prejuízos não configura um benefício fiscal, mas sim um desagravamento estrutural, nos termos do artigo 4° do EBF.
E que assim o art. 11°-A do EBF (actual artigo 13º do EBF) não é aplicável ao regime estatuído no art. 69º do CIRC.
Sendo que, com este enquadramento legal, devia o Tribunal recorrido, ter apreciado a questão do deferimento tácito do pedido de transmissibilidade dos prejuízos fiscais registados nas sociedades incorporadas.
Pois que, tendo a recorrente requerido a 30 de Novembro de 2004, autorização para dedução de prejuízos fiscais aos eventuais lucros que viesse a registar nos exercícios pós fusão, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 69º do CIRC, o respectivo deferimento tácito ocorreu em 30 de Maio de 2005.
Em abono desta sua tese sustenta que o requerimento foi apresentado cumprindo todos os requisitos formais e substanciais em vigor à época, constantes do artigo 69º, nº 2, do CIRC e da Circular 6/2002, de 2 de Abril, da DSIRC.
E que não pode aceitar que venha agora a Administração Fiscal exigir por outra via, qualificando algo como sendo benefício fiscal, outros documentos para além dos referidos no artigo 69°, nº 2, do CIRC e da Circular 6/2002, de 2 de Abril, da DSIRC.
Fundamentação:
Afigura-se-nos que o recurso merece provimento já que no caso se verificou efectivamente o deferimento tácito.
Com efeito, independentemente da questão de saber se o regime especial de transmissibilidade dos prejuízos fiscais previsto no art. 69º do CIRC tem a natureza de «benefício fiscal», questão que aliás não é pacífica na doutrina e na jurisprudência (Vide Acórdão do Pleno da 2ª secção do Supremo Tribunal Administrativo de 20.01.2010, recurso 548/08 e referencias doutrinárias ali feitas), sempre se dirá que a verificação dos requisitos do art. 11°-A do EBF - inexistência de dívidas de imposto sobre o rendimento, a despesa ou o património e das contribuições relativas ao sistema da segurança social - não fazia parte dos pressupostos legais exigidos no art. 69º, nº 7 do CIRC para verificação do deferimento tácito.
Na verdade, nos termos do referido normativo o pedido de transmissibilidade dos prejuízos fiscais, considera-se tacitamente deferido se a decisão não for proferida no prazo de seis meses, desde que acompanhado dos elementos referidos no seu nº 2.
E esses elementos são os necessários ou convenientes para a demonstração de que a fusão é realizada por razões económicas válidas, tais como a reestruturação ou racionalização das actividades das sociedades intervenientes, e se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva, nos quais não se incluem os necessários para se averiguar se existem ou não dívidas à segurança social.
Como se sublinha no recente Acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 27.01.2010, recurso 1097/09, in www.dgsi.pt, que tratou de caso em tudo idêntico ao dos presentes autos, «é apenas do acompanhamento do requerimento por estes elementos referidos no nº 2 e não quaisquer outros eventualmente necessários ou convenientes para apreciação do pedido que o nº 7 do art. 69º fazia depender a formação de deferimento tácito».
No caso, e como resulta do probatório, pese embora o requerimento tenha dado entrada no dia 30.11.2004 nos SF de Oeiras, só em 23.06.2006, mais de um ano e meio depois, é que a Administração Fiscal solicitou à autora o envio dos documentos comprovativos da inexistência de dívidas à Segurança Social das sociedades incorporada e incorporante.
Sendo certo que a recorrente com o requerimento que apresentou em 30.11.2004 entregou todos os elementos que a própria Administração Fiscal entendia como necessários ou convenientes para o perfeito conhecimento da operação visada (e que elencou na circular 6/2002 de 2 de Abril).
Daí que se conclua que à data em que a Administração Fiscal solicitou os elementos adicionais referentes à inexistência de dívidas à Segurança Social, já de há muito se encontrava formado o acto de deferimento tácito (30.06.2005).»
1.5. Colhidos os vistos legais, cabe decidir
FUNDAMENTOS
2. No acórdão recorrido julgaram-se provados os factos seguintes:
a) Por requerimento entrado em 30.11.2004 no Serviço de Finanças de Oeiras 3 e dirigido ao Exmo. Ministro das Finanças a ora autora veio peticionar que lhe fosse concedida autorização para dedução aos eventuais lucros tributáveis que venha a registar nos exercícios após a fusão, dos prejuízos fiscais dedutíveis apurados nas esferas da B… e da C… (sociedades incorporadas) - cfr. processo instrutor, cujas folhas não se mostram numeradas;
b) No âmbito deste procedimento, a AT solicitou à ora autora, em 23.6.2006, o envio dos documentos comprovativos da inexistência de dividas à Segurança Social das sociedades incorporada e das incorporantes, que esta remeteu, mas apenas em parte, em 21.7.2006, não tendo remetido a relativa à sociedade D…, por a mesma não ter ainda sido disponibilizada - cfr. mesmo processo instrutor;
c) Uma inspectora tributária principal emitiu parecer sobre tal pedido em 3.11.2006, tendo proposto o indeferimento do pedido de autorização de transmissibilidade dos prejuízos fiscais, da B… e D… para a A…, nos termos do nº 2 do artigo 69º do CIRC, uma vez que não se encontram cumpridos os requisitos exigidos para a sua concessão, concretamente o da realização da fusão por razões económicas válidas com reflexos positivos na estrutura produtiva, ...o facto de as empresas apresentarem no seu balanço um capital próprio negativo, indicia que, não possuem património seu. O passivo excede o activo, o seu valor é menor que zero. Isto quer dizer que o contributo patrimonial das incorporadas para a sociedade incorporante é negativo, a incorporação destas sociedades só vai prejudicar a sociedade incorporante, aqueles patrimónios em nada contribuem para os resultados futuros da sociedade.
Por estes motivos, entendemos que a sociedade incorporante em nada beneficia com a integração daquelas sociedades. Assim, no presente caso, o pressuposto legal do interesse económico da fusão, fixado no nº 2 do art. 69° do CIRC não se verifica, e, por conseguinte, não será de autorizar a dedução dos seus prejuízos fiscais..., o que a chefe de divisão após o seu despacho de confirmo, em 9.11.2006, bem como o Exmo. Subdirector-Geral, por subdelegação, após o seu despacho de concordo, em 13.11.2006 - cfr. mesmo processo;
d) Após o exercício do direito de audição foi junto ao procedimento uma “adenda à informação nº 1441/2006”, onde foram apreciados os fundamentos invocados pela ora autora em sede deste direito, e se propõe a convolação em definitivo do projecto de decisão no sentido de indeferir a requerida transmissão dos prejuízos fiscais, onde o substituto legal do Director-Geral, em 5.1.2007, apôs o seu despacho de concordo com o indeferimento, após o que foi lavrada a nota informativa onde se propõe o consequente indeferimento, que o Exmo. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, em 6.2.2007, apôs o seu despacho de Concordo - cfr. mesmo processo;
e) O despacho supra foi notificado à ora autora pelo ofício 4589, datado de 26.2.2007 - cfr. mesmo processo;
f) A petição inicial da presente acção administrativa especial deu entrada neste TCAS em 29.5.2007 - cfr. carimbo aposto a fls. 3 dos presentes autos;
g) Por escritura pública de 22.10.2004, celebrada no Cartório Notarial de Competência Especializada do Porto, a ora autora representada por procuradora, bem como as outras duas igualmente representadas, a B…, SA, e a D…, Lda., foi efectuada a fusão por incorporação, nos termos da qual estas duas últimas sociedades são incorporadas naquela primeira, em que os bens activos e passivos que integram os patrimónios daquelas são transmitidos para esta primeira, pelo seu respectivo valor líquido contabilístico, constantes das respectivas contabilidades - cfr. doc. de fls. 92 e segs destes autos (doc. nº 2).
3.1. Com base nesta factualidade, o acórdão recorrido decidiu pela improcedência da presente acção administrativa especial, com fundamentação que, em síntese, é a de que, por um lado, não se formou o invocado acto de deferimento tácito e, por outro lado, uma vez que o despacho de indeferimento, por parte do SEAF, se fundamentou na inexistência dos requisitos exigidos pela lei para a concessão da autorização para deduzir os prejuízos fiscais acumulados pelas sociedades fundidas, este seu juízo não pode ser fiscalizado pelos tribunais, a menos que ocorresse erro grosseiro ou manifesta desadequação ao fim legal, o que não sucede no caso, sendo que também se não divisa que tal acto possa padecer do invocado vício formal da sua insuficiente fundamentação, antes apresentando uma fundamentação clara, congruente e suficiente, atentas a sua exteriorização e a sua apreensão manifestada pela autora na presente acção administrativa especial.
E, ainda de acordo com a fundamentação do acórdão recorrido, o acto de deferimento tácito não chegou, no caso, a formar-se, dado que, estando em causa um benefício fiscal (transmissão de prejuízos fiscais com a consequente dedução na matéria colectável apurada) no conceito do nº 2 do art. 2º do EBF e sendo-lhe, portanto, aplicável também o disposto no seu art. 11º-A, então, uma vez que o procedimento foi iniciado já depois da entrada em vigor do art. 11º-A do EBF (introduzido pelo art. 4º do DL nº 229/2002, de 31/10), o pedido formulado para a transmissão de prejuízos fiscais, estava sujeito também à comprovação de não haver contribuições em dívida à segurança social, sendo que a AT, quando notificou a autora para juntar os documentos que considera em falta para instruir o pedido de autorização para dedução dos prejuízos fiscais das sociedades incorporadas, fez juntar a Circular nº 7/2005, de 16/5, em que são enumerados os requisitos a que devem obedecer os pedidos de transmissibilidade de prejuízos fiscais em casos de fusão, cisão e entrada de activos, em cuja alínea h) consta, “Documento comprovativo da inexistência de dívidas à Segurança Social das sociedades fundidas e da incorporante”. Ou seja, competindo à autora a prova dos pressupostos para obter tal benefício, designadamente, entregando certidão comprovativa daquele requisito contido no citado art. 11º-A do EBF (de nada dever à segurança social), não pode ocorrer o invocado deferimento tácito quando o procedimento não se encontre instruído com todos esses elementos previstos nesta norma e na do art. 69º, nº 7 do CIRC.
3.2. Discorda a recorrente, sustentando, como se viu, que o art. 11º-A do EBF (actual artigo 13º do EBF) não é aplicável ao regime estatuído no art. 69º do CIRC e que, por isso, o acórdão recorrido devia ter apreciado a questão do deferimento tácito do pedido de transmissibilidade dos prejuízos fiscais registados nas sociedades incorporadas, já que sendo o requerimento datado de 30/11/2004, o respectivo deferimento tácito ocorreu em 30/5/2005, sendo que o pedido foi apresentado cumprindo todos os requisitos formais e substanciais em vigor ao tempo, constantes do artigo 69º, nº 2, do CIRC e da Circular 6/2002, de 2/4/, da DSIRC, sendo que só em 29/6/2006, ou seja, mais de um ano e meio depois é que a DSIRC solicitou o envio de comprovativos da inexistência de dívidas à Segurança Social e sendo que tal deferimento tácito consubstanciou um acto constitutivo de direitos, pelo que não poderia ser revogado, atendendo às limitações dos arts. 140º e 141º do CPA. Ou seja, o despacho do SEAF enferma de vício de violação de lei, não só por erro sobre os pressupostos de facto, mas também por violação das ditas normas do CPA.
3.3. As questões a decidir são, assim, as de saber se, no caso, se formou o invocado acto de deferimento tácito quanto ao pedido de transmissibilidade de prejuízos fiscais feito pela recorrente e se o despacho nº 131/2007, de 6/2/2007, do SEAF, enferma, ou não, das aludidas ilegalidades.
Vejamos.
4.1. O nº 1 do art. 11º-A do EBF, sob a epígrafe «Impedimento de reconhecimento do direito a Benefícios Fiscais», dispunha, ao tempo (na redacção do DL 229/2002, de 31/10):
«1 – Os Benefícios Fiscais dependentes de reconhecimento não poderão ser concedidos quando o sujeito passivo tenha deixado de efectuar o pagamento de qualquer imposto sobre o rendimento, a despesa ou o património e das contribuições relativas ao sistema da segurança social.
2 - Para efeitos do disposto no número anterior, tal situação só será impeditiva do reconhecimento dos Benefícios Fiscais enquanto o interessado se mantiver em incumprimento …».
4.2. Por sua vez, o art. 69º do CIRC dispunha (na redacção introduzida pelo DL nº 221/2001, de 10/7 e pela Lei nº 32-B/2002, de 30/12 (que vigorou até à alteração introduzida pela Lei nº 50/2005, de 30/8) o seguinte, no que aqui interessa:
«1 – Os prejuízos fiscais das sociedades fundidas podem ser deduzidos dos lucros tributáveis da nova sociedade ou da sociedade incorporante até ao fim do período referido no nº 1 do artigo 47º, contado do exercício a que os mesmos se reportam, desde que seja concedida autorização pelo Ministro das Finanças, mediante requerimento dos interessados entregue na Direcção-Geral dos Impostos até ao fim do mês seguinte ao do registo da fusão na conservatória do registo comercial.
2 – A concessão da autorização está subordinada à demonstração de que a fusão é realizada por razões económicas válidas, tais como a reestruturação ou racionalização das actividades das sociedades intervenientes, e se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva, devendo ser fornecidos, para esse efeito, todos os elementos necessários ou convenientes para o perfeito conhecimento da operação visada, tanto dos seus aspectos jurídicos como económicos.
(...)
7 – O requerimento referido no nº 1, quando acompanhado dos elementos previstos no nº 2, considera-se tacitamente deferido se a decisão não for proferida no prazo de seis meses a contar da sua apresentação, sem prejuízo das disposições legais antiabuso eventualmente aplicáveis. (Redacção da Lei 32-B/02, de 30/12).
8 – Para efeitos do cômputo do prazo referido no número anterior, considera-se que o mesmo se suspende sempre que o procedimento estiver parado por motivo imputável ao requerente.
9 – No caso de ocorrer o deferimento tácito, a dedução dos prejuízos fiscais considera-se automaticamente escalonada por um período mínimo de três anos, não podendo em cada um dos dois primeiros praticar-se dedução superior a um terço do total dos prejuízos.»
4.3. É da conjugação do disposto nestes normativos legais que o acórdão recorrido conclui que não ocorreu, no caso, o deferimento tácito do pedido formulado pela recorrente, em 30/11/2004, ao Sr. Ministro das Finanças, no sentido de que lhe fosse concedida autorização para dedução aos eventuais lucros tributáveis que venha a registar nos exercícios após a fusão, dos prejuízos fiscais dedutíveis apurados nas esferas da B… e da C… (sociedades incorporadas).
Não é esta, porém, a interpretação decorrente da lei.
Com efeito, como claramente se diz no recente acórdão do Pleno (secção do contencioso tributário) deste STA, de 20/1/2010, no processo nº 0548/08, «nos termos do nº 7 do artigo 69º do Código do IRC, o início do prazo de deferimento tácito do pedido estava apenas dependente da entrega dos elementos referidos no seu nº 2, entre os quais não se incluíam os necessários para averiguar da existência de dívidas à segurança social, mas apenas os “necessários ou convenientes para o perfeito conhecimento da operação visada”, entendendo-se como tal os que se relacionam com a “demonstração de que a fusão é relacionada por razões económicas válidas, tais como a reestruturação ou racionalização das actividades das sociedades intervenientes, e se insere numa estratégia da redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva”, entre os quais não se vê que caiba, por indicação expressa ou implícita, a declaração de inexistência de dívidas à segurança social.
Tal exigência, a decorrer da lei, decorreria não do artigo 69º do Código do IRC, que a tal declaração de inexistência de dívidas se não refere, mas do artigo 11º-A do Estatuto dos Benefícios Fiscais, ao tempo vigente, que a ela aludia expressamente. Isso mesmo foi, aliás, assumido no Acórdão fundamento, que expressamente qualificou o regime especial de transmissibilidade dos prejuízos fiscais previsto no artigo 69º do Código do IRC como tendo natureza de “benefício fiscal”, por isso sujeito aos requisitos gerais daqueles, posição que é agora reiterada pelo recorrente, não obstante as consistentes dúvidas sobre a adequação daquela qualificação ao regime em causa expressas não apenas pela doutrina (Cfr. MANUEL ANSELMO TORRES, «A Portabilidade dos Prejuízos Fiscais», in J.L. Saldanha Sanches e Outros, Reestruturação de Empresas e Limites do Planeamento Fiscal, Coimbra, Coimbra Editora, 2009, pp. 114/115) mas inclusive no Relatório do Grupo de Trabalho criado por Despacho de 1 de Maio de 2005 do Ministro do Estado e das Finanças para a Reavaliação dos Benefícios Fiscais (cfr., Reavaliação dos Benefícios Fiscais: Relatório do Grupo de Trabalho criado por Despacho de 1 de Maio de 2005 do Ministro do Estado e das Finanças, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, nº 198, Lisboa, 2005, pp. 95, 118, 173/174 e 188/196).»
No caso que nos ocupa, o acórdão recorrido convocou expressamente o art. 11º-A do EBF para concluir pela impossibilidade de ocorrer o deferimento tácito.
Mas, salvo o devido respeito, não pode fazer-se tal convocação: é que, como igualmente se salienta no citado acórdão do Pleno, «… nos termos do nº 7 do artigo 69º do Código do IRC apenas os requisitos do nº 2 do mesmo artigo, e não outros, tinham de ser entregues com o requerimento referido no nº 1, para que começasse a correr o prazo de deferimento tácito.
Observe-se, aliás, que a norma do nº 7 do artigo 69º do Código do IRC era já mais exigente quanto aos requisitos do deferimento tácito do que o regime geral estabelecido no artigo 108º do Código de Procedimento Administrativo, que faz depender o início da contagem do prazo de deferimento tácito tão só da “formulação do pedido ou da apresentação do processo” (cfr. o seu nº 2), independentemente deste estar devidamente instruído, relevando a deficiente instrução, quando verificada, apenas para efeitos de suspensão do decurso do prazo, se o requerente for notificado para suprir as deficiências e enquanto o não fizer, pois que aí o procedimento fica parado “por motivo imputável ao particular “(cfr. o nº 4 do artigo 108º do Código de Procedimento Administrativo).»
E este é o entendimento que igualmente perfilhamos (cfr. neste sentido, também os acórdãos desta secção do STA, de 22/4/09, processo nº 0548/08 e de 27/1/10, processo nº 01097/09).
4.4. Retornando ao caso dos autos, vemos que o acórdão recorrido concluiu que, competindo à autora a prova dos pressupostos para a obtenção do benefício em causa (designadamente, entregando certidão comprovativa de nada dever à segurança social - requisito contido no art. 11º-A do EBF), o invocado deferimento tácito não poderá ocorrer quando o procedimento não se encontre instruído com todos esses elementos previstos quer nesta norma, quer na do art. 69º, nº 7 do CIRC [sendo que a AT, quando notificou a autora para juntar os documentos que considerou em falta para instruir o pedido, fez juntar a Circular nº 7/2005, de 16/5, em que são enumerados os requisitos a que devem obedecer os pedidos de transmissibilidade de prejuízos fiscais em casos de fusão, cisão e entrada de activos, em cuja alínea h) consta, “Documento comprovativo da inexistência de dívidas à Segurança Social das sociedades fundidas e da incorporante”].
E na verdade, de acordo com a factualidade que vem provada (cfr. al. b) do Probatório), em 23/6/2006 a AT solicitou à ora autora o envio dos documentos comprovativos da inexistência de dívidas à Segurança Social das sociedades incorporada e das incorporantes, elementos que esta remeteu, mas apenas em parte, em 21/7/2006, não tendo remetido a relativa à sociedade D…, por a mesma não ter ainda sido disponibilizada.
Ora, independentemente da questão, também versada no acórdão recorrido, de saber se este regime especial de transmissibilidade dos prejuízos fiscais previsto no art. 69º do CIRC tem, ou não, a natureza de «benefício fiscal» (questão que tem sido objecto de controvérsia na doutrina e na jurisprudência, como bem se colhe da própria fundamentação do citado acórdão do Pleno), o que é certo é que, contrariamente ao que, como se viu, também se exara no mesmo acórdão recorrido, a verificação daqueles requisitos mencionados no art. 11°-A do EBF não fazia parte dos pressupostos legais exigidos no nº 7 do art. 69º do CIRC para a ocorrência do deferimento tácito: o pedido de transmissibilidade dos prejuízos fiscais, considera-se tacitamente deferido se a decisão não for proferida no prazo de seis meses, desde que acompanhado dos elementos referidos no seu nº 2, isto é, como se realça no douto Parecer do MP, dos elementos necessários ou convenientes para a demonstração de que a fusão é realizada por razões económicas válidas, tais como a reestruturação ou racionalização das actividades das sociedades intervenientes e se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva. Não estão, portanto, aqui incluídos quaisquer elementos necessários para a averiguação da existência ou não de dívidas à segurança social.
4.5. De todo o modo, como se disse, também é duvidosa a conclusão de estarmos perante um verdadeiro benefício fiscal, considerando que a própria natureza do regime em questão (o regime especial de tributação dos grupos de sociedades, ou seja, o regime especial aplicável às fusões, cisões, entradas de activos e permutas de acções) tem em vista o princípio da neutralidade fiscal (de acordo, aliás, com o regime de neutralidade previsto na Directiva 90/434/CEE).
Desde logo, porque o conceito de benefício fiscal, de acordo com o nº 1 do art. 2º do EBF, se traduz em medida de carácter excepcional instituída para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes que sejam superiores aos da própria tributação que impedem, constituindo, pois, um facto impeditivo do nascimento da obrigação tributária com o seu conteúdo normal (tributação-regra). Ou seja, trata-se de situações que, estando sujeitas aos pressupostos objectivos e subjectivos da incidência do imposto, o legislador entende desagravar, excepcionalmente, em razão de interesses públicos (extrafiscais) especialmente relevantes (sobre a diferenciação entre os conceitos de benefício fiscal e desagravamento estrutural, cfr. Nuno Sá Gomes - Manual de Direito Fiscal, Vol. I, 323 e sgts., e Teoria Geral dos Benefícios Fiscais, in Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, nº 165).
Ora, aquele regime de neutralidade, que opera desde que sejam observadas determinadas condições (Casalta Nabais, Direito Fiscal, Almedina, pag. 368), pretende, precisamente, assegurar uma tributação do lucro real das empresas, assentando numa perspectiva de implícita continuidade da actividade das mesmas, decorrente dos seus direitos e obrigações, sendo, por isso, um regime estrutural ao sistema fiscal. Não se vislumbra aqui, portanto, qualquer fundamento extra-fiscal para justificar tal regime, de modo a integrá-lo no conceito de benefício fiscal resultante do art. 2º do EBF.
Como refere Francisco Sousa da Câmara (As operações de reestruturação e a cláusula anti-abuso prevista no art. 67º/10 do CIRC, in J.L. Saldanha Sanches e Outros, Reestruturação de Empresas e Limites do Planeamento Fiscal, Coimbra, Coimbra Editora, 2009, pp. 71/110) aquele regime especial visa permitir que as respectivas «operações se possam realizar sob o signo da neutralidade fiscal (…) Ou seja, trata-se de um regime que visa eliminar ou, pelo menos, reduzir substancialmente, os obstáculos fiscais à concretização e execução daquelas operações, mas que não tem por propósito conceder isenções e/ou benefícios fiscais aos sujeitos passivos de imposto intervenientes nas operações ((Sem prejuízo, claro está, de se poder entender que o diferimento da tributação e a eventual transmissão dos prejuízos fiscais constituem desagravamentos fiscais).
Razão que «associada à necessidade de assegurar maior eficácia e celeridade às operações, terão mesmo levado o legislador a alterar o regime da transmissão dos prejuízos no âmbito destas operações e a criar uma norma de deferimento tácito, nas situações em que em que não fosse proferida decisão no prazo de três meses contados a partir da data da apresentação do pedido, tal como consta do preâmbulo do DL nº 221/2001, de 7 de Agosto» (Ibidem, Anotação 7).
E no mesmo sentido vai o entendimento, acima já assinalado, de Anselmo Torres, ao referir que, relativamente à transmissibilidade dos prejuízos fiscais, no caso do regime dos arts. 67º e sgts. do CIRC, nenhum desses mecanismos constitui um benefício fiscal, pois «Não impedem a tributação, mas visam apenas conter a obrigação de imposto na medida do rendimento real da empresa na sua dimensão inter-temporal e inter-societária» (loc. cit. pag. 114/115), transmissibilidade esta que «obedece ao princípio da continuidade da actividade empresarial, o qual se destina a assegurar a tributação do rendimento real da actividade empresarial sempre que os respectivos prejuízos fiscais e lucros tributários sejam realizados não apenas em diferentes períodos de tributação mas também na esfera de diferentes sujeitos passivos» (pag. 131).
Acresce que, relativamente àquele regime (dos arts. 67º e sgts. do CIRC) outros há que referem não se poder, sequer, afirmar que exista uma norma prévia de incidência a este título já que a situação de dissolução sem liquidação (conjugada com o princípio de sucessão universal) obstarão à existência do próprio facto tributário, até porque em lado algum se vislumbra uma demonstração de capacidade contributiva, pelo que também o princípio da igualdade tributária seria violado [cfr. Carlos Baptista Lobo, Neutralidade fiscal das fusões: benefício fiscal ou desagravamento estrutural? Corolários ao nível do regime de transmissibilidade de prejuízos, in Fiscalidade, 26/27 (Abril-Junho / Julho-Setembro de 2006), pags. 29 a 61].
4.6. Todavia, esta é questão que, no caso, se mostra irrelevante, dado que, como também acima se referiu, independentemente da natureza que se atribua ao regime especial de transmissibilidade dos prejuízos fiscais previsto no artigo 69º do CIRC (benefício fiscal ou desagravamento estrutural) e da consequente aplicabilidade, ou não, do disposto no art. 11º-A do EBF, o que é certo é que, de acordo com o então disposto no nº 7 do mesmo art. 69º (nº 7 que foi eliminado pela Lei nº 50/2005, de 30/8), o deferimento tácito operava desde que o requerimento fosse acompanhado dos elementos referidos no seu nº 2, ou seja, todos os elementos necessários ou convenientes para o perfeito conhecimento da operação visada, tanto nos seus aspectos jurídicos como económicos, no sentido da demonstração de que a fusão é realizada por razões económicas válidas, tais como a reestruturação ou racionalização das actividades das sociedades intervenientes, e se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva.
E, por isso, ao contrário do que igualmente parece decorrer das Conclusões III, VII e VIII das contra-alegações do recorrido, no caso também não releva o disposto no nº 8 do art. 69º do CIRC, segundo o qual, para efeitos do cômputo do prazo de deferimento tácito, tal prazo se suspende sempre que o procedimento esteja parado por motivo imputável ao requerente: é que, conforme vem provado, o pedido foi apresentado em 30/11/2004 e só em 23/6/2006 a AT solicitou a apresentação dos ditos elementos relativos à segurança social, não se provando qualquer outro facto que permita concluir que a recorrente contribuiu de alguma forma para que o procedimento iniciado com o seu pedido estivesse parado ou que não tivesse sido acompanhado dos elementos referidos no nº 2 do artigo 69º do CIRC.
Assim, quer nesta data em que foram solicitados os novos elementos, quer, por maioria de razão, na data (6/2/2007) em que veio a ser proferido o despacho nº 131/07, do SEAF, indeferindo expressamente o pedido, já de há muito se encontrava decorrido o prazo de 6 meses previsto no nº 7 daquele art. 69º do CIRC para a formação de deferimento tácito (30/5/2005), deferimento este que, consubstanciando um acto constitutivo de direitos para a recorrente, só poderia ser revogado com fundamento em invalidade e no prazo de um ano após a verificação do deferimento tácito (arts. 108º, 140º e 141º do CPA, subsidiariamente aplicáveis, ex vi do disposto na al. c) do art. 2º da LGT e na al. d) do art. 2º do CPPT), o que não foi o caso.
O despacho de indeferimento (proferido em 6/2/2007) é, portanto, ilegal e, consequentemente, o acórdão recorrido que assim não entendeu não pode manter-se na ordem jurídica.
DECISÃO
Nestes termos acorda-se em, dando provimento ao presente recurso jurisdicional:
a) revogar o acórdão recorrido;
b) julgar procedente a presente acção administrativa especial;
c) declarar que se formou deferimento tácito sobre o pedido de transmissibilidade de prejuízos fiscais referido na al. a) da matéria de facto provada e anular, consequentemente, o despacho nº 131/07, do Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, de 6/2/2007.
Custas pelo Ministério das Finanças, na instância e neste STA, fixando-se a taxa de justiça devida em cada um dos tribunais em 5 UCs e a procuradoria em 1/8.
Lisboa, 16 de Junho de 2010. - Casimiro Gonçalves (relator) - Dulce Neto - Alfredo Madureira.