Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0136/09.2BEPNF
Data do Acordão:10/20/2022
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:ANA PAULA PORTELA
Descritores:DECLARAÇÃO DE NULIDADE
DESPACHO
LICENÇA DE CONSTRUÇÃO
NEXO DE CAUSALIDADE
DANO
Sumário:I - Numa situação de declaração de nulidade de anterior despacho que defere pedido de licença de construção, não interfere com o nexo de causalidade na apreciação dos danos, por ausência ou concorrência de culpa, a existência de um pedido de declaração de suspensão do prazo do alvará, sem que o mesmo tivesse sido deferido.
II - São questões diversas a de saber se a demolição se impunha no caso sub judice, e outra a de saber se a falta de pedido de legalização significa culpa da autora suscetível de intervir no nexo de causalidade ou na concorrência de culpas.
III - Sendo o despacho que aprovou o licenciamento da obra ilegal/nulo, é aplicável à responsabilidade pelas consequências do mesmo a data em que o mesmo foi praticado, ou seja, 26/10/1999, ou seja, o Dec. Lei n.º 48051, de 21/11/1967 e o art. 52.º do Dec. Lei n.º 445/95, de 20/11/1991, e não o RJUE.
IV - A perda de valor de um terreno não é nexo de causalidade da ilicitude de um despacho que foi declarado nulo por violação do PDM e já que a autora mantém a propriedade do terreno que adquiriu e a perda de valor do mesmo não resultou do ato nulo do Município, mas antes do PDM que foi alterado.
Nº Convencional:JSTA00071581
Nº do Documento:SA1202210200136/09
Data de Entrada:05/24/2022
Recorrente:A.............INVESTIMENTOS IMOBILIÁRIOS, S.A. E OUTROS
Recorrido 1:MUNICÍPIO DE SANTO TIRSO
Votação:UNANIMIDADE
Legislação Nacional:ART. 52.º do DL N.º 445/91
ARTS. 334.º e 566.º do CCIV66
ART. 03.º do DL N.º 48051
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

1. A………- INVESTIMENTOS IMOBILIÁRIOS, SA, MUNICÍPIO DE SANTO TIRSO e B……….. vêm, em separado, interpor recurso jurisdicional para este STA, nos termos do art. 150º do CPTA, do acórdão do TCAN que revogou parcialmente a sentença do TAF de Penafiel – que havia julgado improcedente a ação especial instaurada por A………. - Investimentos Imobiliários, SA., contra o Município de Santo Tirso e B…………., em que requeria: “a) Ser declarado nulo o despacho de 25/10/2007 do 2.° Réu - Presidente da Câmara de Santo Tirso que declarou a nulidade do despacho de 26/10/1999 que deferiu o pedido de licença de construção dos autos (alvará n° 309-E); Quando assim se não entenda: h) Ser tal despacho (25/10/2007) anulado; c) bem como o despacho de 26/03/2008 do mesmo 2.° Réu que decretou a demolição do edifício construído ao abrigo daquela licença; d) Serem os Réus condenados ao restabelecimento da situação que existiria se tais atos não tivessem sido praticados, ordenando-se o procedimento administrativo necessário para conformar a obra com as disposições legais e regulamentos aplicáveis, designadamente com o PDM em vigor; c) Após a prática das inerentes formalidades, ser o Réu - Município condenado a emitir, no final desse procedimento, a correspondente licença, em substituição, total ou parcial, do referido despacho de 25/10/2007; o) Serem ambos os Réus condenados, solidariamente, a pagar à A. o montante de 1.488.189,03 € pelos danos causados com a sua atuação, descriminados no art. 138 da p.i., com juros à taxa máxima legal, desde a citação até afectivo reembolso; g) Para a hipótese de ser emitida licença com menor área edificável que a constante da licença declarada nula, ser o montante indemnizatório referido na alínea anterior reduzido na proporção da capacidade edificativa que for autorizada, também com juros à taxa máxima legal, desde a citação até efetivo reembolso; h) Condenados os Réus a pagar à A. a quantia que se liquidar em execução de sentença, respeitante aos juros e demais custos de financiamento que se vencerem desde a data da propositura desta ação até efetivo reembolso, bem como os danos da imagem pública da A., causados pela prática dos impugnados atos, i) Condenados os Réus a pagarem as custas.” – determinando a baixa dos autos para ser “completada a decisão dos pedidos indemnizatórios formulados pela A., segundo os critérios definidos neste acórdão”.

2. Para tanto, alegaram, concluindo:

2.1 - No recurso interposto pelo Município de Santo Tirso:

«Da admissibilidade do recurso (artigo 150º, nº 1 do CPTA): (...)

Das alegações de recurso:

ix. O Recorrente não se conforma com a douta decisão do TCAN que, concedendo parcial provimento ao recurso, decidiu revogar parcialmente a sentença e ordenar a baixa dos autos para que seja completada a decisão dos pedidos indemnizatórios formulados, segundo os critérios definidos nesse acórdão.

x. E, segundo os critérios definidos, a baixa do processo destina-se a verificar quais os custos da obra realizada até 24/05/2007 e que foram suportados pela Autora na convicção de que a obra era legal, com sustento na conduta ilícita do Réu, Município de Santo Tirso, que licenciou uma construção incompatível com o PDM vigente à época.

xi. Entendeu o TCAN que o encadeamento/nexo causal entre o licenciamento e os custos da obra licenciada foi quebrado pela realização do embargo em 24/05/2007, porém, o Recorrente entende, salvo melhor opinião, que esse encadeamento causal já havia sido quebrado antes e com manifesta culpa da autora, constituindo o pedido indemnizatório um manifesto abuso de direito.

xii. O entendimento do Recorrente assenta, essencialmente, nos seguintes factos:

1) início das obras sem ter sido feito o alinhamento prévio no local;

2) início das obras quando os efeitos da licença de construção se encontravam suspensos;

3) ocultação das notificações e falta (recusa) de legalização das obras executadas.

Quanto ao ponto 1:

xiii. Foi dado como provada, com referência às letras constantes quer da sentença da primeira instância, quer no douto acórdão da segunda, a seguinte matéria de facto:

O. O despacho do ponto N do probatório foi subscrito pelo R. Presidente, na altura Vereador com competências subdelegadas em 20-10-1998, estando o deferimento condicionado a alinhamento e a nivelamento fornecido no local (fls. 97 do PA 1304/97).

WW. Em 10.5.2007 foi emitida informação pela fiscalização dando conta que “visitado novamente o local, confirma-se que já foi dado início às obras de construção do edifício, com abertura e carregamentos dos caboucos na parte posterior, demolição numa extensão de 10 m do muro de vedação ao passeio público e ainda com demolições e rasgos no muro de suporte do passeio para cravar pilares *…+”. – fls. 516 do pa. 1304/97 – provado por sentença de 31-01-2020;

XX. Em 10-05-2007 a A. já tinha dado início às obras de construção do edifício, com abertura e carregamentos dos caboucos na parte posterior, demolição numa extensão de 10 m do muro de vedação ao passeio público e ainda com demolições e rasgos no muro de suporte do passeio para cravar pilares (fls.516 do PA 1304/97);

KKKKKK. Nunca chegou a ser realizado qualquer alinhamento no local pelos fiscais do Município (depoimento de C………);

Ora:

xiv. Da matéria dada como provada em O) resulta claramente que o deferimento ficou condicionado ao alinhamento e nivelamento fornecido no local.

xv. Tal ficou a constar expressamente do alvará de licença de construção nº309-E, fls 472 do PA 1304/97

[IMAGEM]

Sucede que,

xvi. Tal como resulta do facto provado em KKKKKKK a Recorrida iniciou as obras sem ter sido feito tal alinhamento e nivelamento no local, incumprindo uma condição do licenciamento. Trata-se de uma condição suspensiva dos efeitos do licenciamento, pelo que, sem o seu cumprimento a Recorrida não poderia iniciar as obras.

Quanto ao ponto 2):

xvii. Foi dada como provada a seguinte matéria:

TT. Em 21.3.2007 a A………– Investimentos Imobiliários, SA apresentou requerimento nos processos 1304/97 e 644/02, nos seguintes termos,

1) A aqui requerente deu entrada de um pedido de licenciamento de obras particulares e que deu origem ao processo n.º 1304/97,

2) Tal pedido de licenciamento deu origem ao alvará de construção n.º 309-E pelo prazo de 6 anos.

3) Posteriormente a Requerente deu entrada de um pedido de alteração à licença supra referida e que deu origem ao processo n.º 644/202.

4) Em consequência deste pedido de alteração foi proferida informação do serviço no processo 1304/97 no sentido da suspensão do prazo de vigência do alvará n.º 309-E - vide fls 488.

5) Pelo que, foi com muita surpresa que, após consulta do processo - 1304/97 - tomamos conhecimento que existe informação no sentido de declaração de caducidade da licença concedida pelo facto de não ter sido iniciada a obra dentro dos prazos legais.

6) Salvo melhor opinião, não é possível declarar a caducidade de um prazo suspenso.

7) Assim sendo, não pode ser declarada a caducidade do alvará.

Além disso:

8) Deve ser proferida decisão de deferimento no processo 644/202,

9) Já que entre a entrada do pedido de alterações à licença concedida no processo n.º 1304/97 e a data de hoje já decorreram mais de 45 dias.

10) Pelo que, solicitamos a V.a Exa. que se digne no prazo de 15 dias proferir decisão final no processo 644/202.

Termos em que o expõe a V.a Ex.a e requer que se digne declarar que o prazo de vigência do alvará de licença emitido no processo 1304/97 se encontra suspenso.

Mais requer:

Que V.a Ex.a se digne a proferir decisão final no processo n.º 644/202. - fls. 67 e ss. do p.a. 644/02 e 515 do pa 1304/97 – provado por sentença de 31-01-2020;

LLL. Em 5.6.2007 a A. apresentou requerimento dando conta que face ao pedido de alteração da licença os prazos de caducidade se encontram suspensos, que em 28.5.2007 desistiu do pedido de alteração e que o prazo da licença deve ser prorrogado pelo período em que se encontrou suspensa. – fls. 546 do p.a. 1304/97 – provado por sentença de 31-012020;

xviii. Daqui resulta claramente que, em 21/03/2007, foi a própria Autora (recorrida) que invocou a suspensão da licença, a fim de evitar a declaração da sua caducidade e em 05/06/2007, pediu a prorrogação do prazo pelo período em que se encontrou suspensa.

xix. De acordo com a conclusão XXXVI do douto recurso da autora para o TCAN, confessa que deu início às obras em 10/05/2007, a fim de evitar a referida caducidade.

xx. Pelo que, resulta claramente que a autora deu início às obras na pendência da suspensão, por si invocada, da licença, o que revela claramente má-fé, pois que, por um lado, pugna pela suspensão da licença, para evitar a declaração de caducidade do ato de licenciamento, por outro lado, dá início às obras, sem o alinhamento e nivelamento no local, o que é uma conduta manifestamente reprovável e censurável.

Assim sendo:

xxi. Da matéria acima transcrita, resulta claro que a autora recorrida iniciou as obras, sem cumprir a condição imposta no alvará e que consistia no alinhamento e nivelamento fornecido no local, pelo que iniciou a construção ilicitamente, sem estar cumprida uma condição suspensiva dos efeitos do deferimento do licenciamento.

xxii. A recorrida sabia dessa condição e deliberadamente decidiu não a cumprir, pelo que, a sua conduta ilícita esteve na origem do dano, havendo claramente uma relação causal entre a conduta da autora e o dano,

xxiii. De igual modo, a recorrida iniciou a construção na pendência da suspensão da eficácia da licença, por si invocada para evitar a declaração da caducidade do ato de licenciamento.

xxiv. Não podia a autora junto da Recorrente invocar a suspensão da licença, para evitar a declaração da caducidade e, de seguida, iniciar as obras, ou seja, de duas uma, ou os efeitos estavam suspensos ou o prazo para dar início às obras tinha expirado, o que levaria à caducidade do ato de deferimento do licenciamento e sem este não haveria dano.

xxv. Pelo que, é evidente que a recorrida agiu com manifesta má fé, quando deu início às obras, numa altura em que os efeitos da licença estavam suspensos.

Assim sendo,

xxvi. A culpa da Recorrida é manifesta pois que sabia que, sem o alinhamento e nivelamento no local, não poderia dar início às obras e sabia da suspensão dos efeitos da licença e, mesmo assim, sem qualquer justificação iniciou as obras, bem sabendo que não o podia fazer.

xxvii. Sendo certo que, era exigível outro comportamento à autora, concretamente, era exigível à Recorrida que cumprisse as condições impostas pelo alvará e respeitasse a suspensão dos efeitos da licença.

Quanto ao ponto 3:

xxviii. Deu-se como provado o seguinte:

OOOO. D……….. procurou ilidir a realização de embargos e notificações na sua pessoa (depoimento de D……… e E………);

IIIIII. A. A. ocultou ao empreiteiro e à empresa de engenharia contratados a ocorrência de embargos (depoimento das testemunhas ………., ……….. e C………..);

HHHHHH. A A. nunca fez qualquer diligência no sentido de legalizar a construção (depoimento/declarações de parte da A. e PA junto aos autos);

xxix. Tal como resulta da douta fundamentação da primeira instância, confirmada pelo TCAN que se transcreve,

“No caso citado foram dadas possibilidades aos Recorrentes no sentido da legalização, que estes ignoraram.

Em 16-07-2007 a A. foi notificada da intenção do R. Município declarar a nulidade do licenciamento e proceder à demolição das obras efectuadas; em 07-09-2007 foi notificada da intenção do Município declarar a nulidade da licença e proceder à demolição do edificado se a A. não legalizasse a obra; em 25-10-2007 foi notificada para legalizar a construção sob pena de se proceder à sua demolição.

Chegados a 26-03-2008 verifica-se que a A. não apresentou nenhum pedido de legalização da obra.

O Município fez tudo o que era exigível a uma entidade pública actuando de boa fé (art. 6.º-A do CPA, na redacção então em vigor).

xxx. E, citando a douta fundamentação da TCAN:

“Ora, os factos provados, tal como referido na sentença, demonstram amplamente que a Administração tentou por diversas vezes solicitar do interessado uma reacção no sentido de explicitar se pretendia ou não a legalização da obra, sem encontrar da parte deste um mínimo de receptividade. Sobre este último aspecto, o facto HHHHHH – não impugnado - é elucidativo.

E assim, entende-se ser fora de dúvida que, no processo administrativo em causa se chegou a um ponto em que por inamovível inércia da Recorrente a demolição se impunha como “ultima ratio” para garantir a prevalência da disciplina urbanística no caso concreto.

Posto isto:

xxxi. Além da inamovível inércia, a autora procurou ilidir e ocultou do empreiteiro e dos engenheiros da obra as notificações e os embargos, o que ultrapassa todos os padrões de normalidade e de boa-fé.

xxxii. Com o devido respeito, além de ilegal, a conduta da autora é irresponsável, arrogante e prepotente, consubstanciando a prática de abuso de direito na modalidade da proibição do tu quoque, uma vez que o direito invocado à indemnização tem como causa uma posição jurídica indevidamente conseguida, ou seja, quem atua ilicitamente, em desconformidade com o direito, não pode prevalecer-se das consequências jurídicas de uma atuação ilícita ou lícita da contraparte.

xxxiii. O que é manifesto nos presentes autos, pois que se não fosse a conduta ilícita da recorrida (incumprimento das condições do alvará e início da construção na pendência de uma suspensão da eficácia da licença por si requerida) não existiriam danos.

xxxiv. Por outro lado, teve a possibilidade de legalizar a construção e não quis, o que poderia ter evitado os danos reclamados, ou seja, se requerida e legalizada a construção, ter-se-ia evitado a demolição e os danos daí decorrentes.

Assim sendo,

xxxv. Deve ser considerado que o comportamento da autora (recorrida) consubstancia a prática de abuso de direito, nos termos do disposto no artigo 334º do CC.

Posto isto:

xxxvi. A matéria dada como provada e acima transcrita impunha que o Tribunal a quo tivesse considerado que a autora agiu com culpa (artigo 70º do RJUE e 570º do CC) e ou que o pedido indemnizatório constitui manifesto abuso de direito na modalidade tu quoque (artigo 334º do CC.,.

xxxvii. Fez, pois, o Tribunal errada aplicação do direito aos factos provados, pelo que, deve a douta decisão do TCAN ser revogada e substituída por outra que considere que a Autora agiu com culpa e ou que o pedido indemnizatório constitui manifesto abuso de direito.

Termos em que o presente recurso deve ser julgado por procedente e, em consequência, a douta decisão do TCAN ser revogada e substituída por outra que julgue por não provado e totalmente improcedente o pedido indemnizatório formulado pela autora. JUSTIÇA!»

Recurso interposto por B………:

«Pressupostos da admissibilidade do recurso: (...)

F) Sempre, o presente recurso deve ser admitido, atenta a existência de contradição no julgamento da matéria de facto dada como provada10 [10 Cfr. artigos 682 nº3, 683º, nº1 e 684, nº2 do C.P.C. subsidiariamente aplicáveis.], mais concretamente quanto ao facto que o recorrente pretendeu aditar ao elenco dos factos dados como provado no pedido de ampliação do objeto de recurso e que o Tribunal a quo julgou improcedente com o fundamento que o facto é “…impertinente no caso dos autos”.11 [11 Páginas 109 e 110 do Douto Acórdão.]

G) Sendo certo também que o Douto Acórdão viola regras de Direito Probatório Material ao dar como provado um facto impugnado pelos réus na contestação cuja prova foi ilidida tal como resulta da fundamentação da decisão sobre a matéria de facto constante na sentença da primeira instância.

Na verdade:

H) O Tribunal a quo mantém a fundamentação da Decisão sobre a matéria de facto do TAF que conclui como não provado o ponto 3., mas ao mesmo tempo transfere-o para o elenco dos factos dados como provados. I) O referido ponto 3 tem a seguinte redação; “3. Em 23/11/2005, a autora adquiriu o prédio a que se refere o ponto Z do probatório pelo valor de € 185.000,00 euros”

J) Os réus impugnaram o pagamento do preço do terreno na contestação.

K) A declaração de pagamento do preço introduzida em documento autêntico, não obstante o previsto no artigo 394º do C.C., pode ser contrariada desde que haja um princípio de prova escrito.

L) A jurisprudência dos tribunais superiores, com base no defendido pelo Prof. Vaz Serra12 [12 Revista de Legislação e Jurisprudência (RLJ) 101º, pág. 270 e ss, RLJ 107.º/311 e ss., 103/13 e ss. “Provas: direito probatório material”, separata do Boletim do Ministério da Justiça, Lisboa, 1962.] tem entendido, maioritariamente, que quando houver determinado circunstancialismo, por exemplo um princípio de prova por escrito, que tornem verosímil o facto a provar, contrário à declaração confessória, ficará aberta a possibilidade de complementar esse circunstancialismo, mediante testemunhas, de modo a fazer a prova do facto contrário ao constante dessa declaração, ou seja, no caso, a prova de onde resulte não corresponder à realidade.

M) A declaração de recebimento do preço constante da escritura pública de compra e venda foi elidida pela prova documental e testemunhal tal como resulta da fundamentação da decisão sobre a matéria de facto que julga tal facto como não provado.

N) A interpretação do Tribunal a quo viola assim direito provatório material, devendo o referido ponto 3 manter-se no elenco dos factos dados como não provados.

O) Aliás a consideração daquele facto como provado, originará com contradição entre o facto provado e a própria fundamentação, uma vez que o Tribunal a quo a mantém, não fazendo qualquer juízo crítico.

P) O réu recorrente através do pedido de ampliação do objeto do recurso requereu que fosse introduzido no elenco dos factos dados como provados o seguinte facto: “O pagamento das faturas dos trabalhos realizados pela sociedade empreiteira Construções F………., Lda foi efetuado pela Empresa G………., Lda.” (também conhecido por SC……..)

Q) Este facto resulta da própria fundamentação da decisão da matéria de facto realizada pelo TAF quando na pág.67 diz claramente: “(…) Era a SC……..que efectuava o pagamento das facturas e das letras à Construções F……….. (…)”

R) O Tribunal a quo julgou improcedente a ampliação do recurso com o seguinte fundamento: “(…) O que releva é saber a quem contabilisticamente é imputado o pagamento dessas facturas, em harmonia com a relação negocial que esta em causa, entre a Autora e a sociedade empreiteira, desinteressando a relação entre a Autora e G…………., Lda. (…)”

S) A introdução do facto referido na alínea “P” destas conclusões no elenco dos factos provados confere coerência à Decisão da matéria de facto dada como provado, pois, representa a verdadeira convicção do Exmo. Senhor Juiz da Primeira Instância constante na fundamentação.

T) Sem a introdução deste facto a Decisão sobre a matéria de facto não se fica coerente e tem consequências na presente ação, pois, o contabilístico não corresponde à verdade.

U) Introduzindo este facto, a sentença da Primeira Instância terá de ser manter na integra, atenta a inexistência de qualquer prejuízo por parte da sociedade autora A………...

Sem prescindir:

V) Atento o enquadramento legal efetuado pelo Tribunal Central Administrativo Norte no Douto Acórdão que aplicou ao caso sub judicie o artigo 70º do Regime Jurídico de Urbanização e Edificação (RJUE) deverá o pedido indemnizatório formulado contra o réu B………, demandado na qualidade de titular do órgão que pratica o ato administrativo, ser julgado improcedente.

W) Não resultou provado qualquer facto que demonstrasse uma conduta dolosa por parte do titular do órgão que emana o despacho de 25.10.1999.

X) É seguro que da prova documental junta aos autos e constantes dos PA o Réu, na qualidade de Presidente de Câmara Municipal de Santo Tirso, desempenhou as suas funções com um zelo e diligência até superior ao que era exigível, sempre cuidou de saber da legalidade dos seus despachos, solicitando e respeitando as informações técnicas e jurídicas

Y) Não existe qualquer facto provado nos autos que suporte a procedência do pedido de indemnização da autora contra o réu com base no artigo 70º do RJUE.

Z) Mesmo ordenando a remessa dos presentes autos para a primeira instância, nunca a réu B……… na qualidade de titular do órgão que pratica o ato poderá ser condenado no pagamento de eventual indemnização por não se verificar um dos pressupostos: a culpa.

AA) Estava, assim, com o devido respeito, o Tribunal a quo obrigado a manter a improcedência do pedido da autora deduzido contra o réu, julgando o recurso improcedente quanto ao réu B……...

Ainda sem prescindir:

BB) O Douto Acórdão erra na norma que aplica.

CC) De acordo com o princípio geral da aplicação da lei no tempo, segundo o qual a lei só dispõe para o futuro (art.º 2º da Constituição da República Portuguesa e art.º 12º do Código Civil), a lei reguladora do regime da responsabilidade civil por atos de gestão pública no domínio do urbanismo é a que vigorar à data em que tiver ocorrido o facto gerador de responsabilidade.

DD) O RJUE – Regime Jurídico da Urbanização e Edificação - foi a provado pelo Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de dezembro, que entrou em vigor 120 dias após a sua publicação e revogou o Decreto-Lei n.º 445/91, de 20 de novembro.

EE) A Despacho Administrativo em discussão é de 26.10.1999, portanto emitido antes da publicação do DL 555/99 de 16 de dezembro que aprova o RJUE.

FF) O regime jurídico da responsabilidade civil extracontratual do Estado em vigor na data em que é praticado o ato administrativo que defere o licenciamento depois declarado nulo (este ato é lícito) é o Decreto-Lei nº 48051, de 21.11.1967 e o artigo 52º do Decreto Lei nº 445/91, de 20.11.1991.

GG) Este artigo 52º do Decreto Lei nº 445/91, de 20.11.1991 nada refere quanto á responsabilidade pessoal do titular do órgão, pelo que quanto ao réu B……….. não existe obrigação de indemnizar.

HH) Aliás, qualquer que seja o regime jurídico aplicável, para que o titular do órgão que praticou o ato seja responsabilizado terá de atuar com dolo ou culpa grave, com “diligência e zelo manifestamente inferiores àqueles a que se encontravam obrigados em razão do cargo” (artigo 8º nº1 do RRCEE e artigo 70 do RJUE), ou seja, a responsabilização pessoal e direta do titular do órgão depende da prova do dolo ou culpa grave, uma vez que não existe presunção.

II) Não resultou provado qualquer facto que permita concluir que o réu na qualidade de titular do órgão que pratica o ato atuou sem a diligência que lhe era devida, antes provou-se o contrário.

JJ) Deve, assim, ser admitido o presente Recurso, o mesmo julgado procedente e em consequência mantida da Decisão da Primeira Instância que absolveu o réu recorrente do pedido, fazendo-se assim, JUSTIÇA!»

2.3 - No recurso interposto por A……… – INVESTIMENTOS IMOBILIÁRIOS, S.A.:

«A – DA ADMISSÃO PRELIMINAR SUMÁRIA (...)

B – ALEGAÇÕES

Décima terceira: O douto acórdão recorrido decidiu que a “indemnização pela aquisição do terreno (com licença de construção) não era um dano indemnizável, à luz do art.º 70º do RJUE”, porquanto “o terreno não foi objeto de demolição ou de qualquer outra intervenção suscetível de prejudicar a sua capacidade construtiva dentro das normais restrições de legislação urbanística”.

Décima quarta: Porém, nos termos desse art.º 70º, o Município responde pelas ações e omissões cometidas em violação do RJUE (como é o caso da al. a) do art.º 68º - violação do PDM), sempre que a causa da declaração de nulidade resulte de uma conduta ilícita dos seus órgãos ou dos seus funcionários ou agentes.

Décima quinta: O acto ilícito praticado pelo Sr. Presidente da Câmara Municipal de Santo Tirso com o despacho de 26/10/1999, foi declarado nulo em 25/10/2007 pela mesma entidade, por violação do PDM.

Décima sexta: Assim, o prejuízo causado à Autora, com a impossibilidade de construção, no terreno que adquiriu por 185.000,00€, é um dano indemnizável, segundo um juízo equitativo nos termos do art.º 566º, n.º 3 do Código Civil.

Décima sétima: Tendo a Autora adquirido esse terreno para aí construir de acordo com o projeto aprovado, a indemnização devida deve ser fixada com base na equidade, por não ser possível quantificar o valor exato do dano e também assenta na “perda de chance”, que não corresponde a um dano eventual e futuro mas um dano certo e atual, visto que se trata da probabilidade concreta – e já existente no património do interessado – de obter um resultado favorável, que não se confunde neste plano, com o lucro cessante.

Décima oitava: Assim, com a compra de terreno a Autora tinha uma probabilidade, certa e séria, de obter uma vantagem,

Décima nona: sendo o prejuízo praticamente total, em virtude de, com a revisão do PDM de Santo Tirso em 2011 o terreno ter sido classificado como solo rural e qualificado como espaço agrícola, em Estrutura Ecológica (provado por sentença de 31/01/2020 – facto 75).

Vigésima: Assim, o acórdão recorrido ao julgar não ser indemnizável o prejuízo resultante de o terreno em apreço ter deixado de ter capacidade construtiva, errou quer por violação do art.º 70º do RJUE quer com base na “perda de chance”.

Vigésima primeira: Por outro lado, o acórdão recorrido eliminou como “destituídos de nexo de causalidade, os pretendidos lucros cessantes e os danos emergentes constituídos pelos custos inerentes à construção efectuada de 24/05/2007 em diante”, querendo com isto dizer que não são indemnizáveis os danos ocorridos depois do “embargo” de 24/05/2007 (cfr. probatório da sentença de 31/01/2021).

Vigésima segunda: Porém, para esse denominado “embargo” ser eficaz, deveria ter como pressuposto ser exarado em auto, obrigatória e expressamente as determinações do art.º 102-B do RJUE, em confronto com os art.s 66º a 73º do CPA, sendo essas formalidades essenciais para a produção de efeitos que este propende: a suspensão dos trabalhos.

Vigésima terceira: Assim, o denominado “embargo” de 24/05/2007, não constitui, por falta desse elementos e determinações, uma medida de tutela de legalidade urbanística, que obrigasse à imediata suspensão dos trabalhos de construção por parte da Autora.

Vigésima quarta: Aliás, o Réu Município não considerou esse embargo como tal porquanto só em 16/12/2008 é que a Autora foi notificada do despacho de 25/10/2007, numa altura em que já tinham terminado as obras da estrutura do edifício, tendo o Réu Município procedido à sua demolição (ponto QQQQQ do probatório).

Vigésima quinta: O acórdão recorrido, ao não entender como indemnizáveis os trabalhos realizados depois de 24/05/2007, violou por erro de interpretação e aplicação o disposto nos art.s 102-B e 103º, ambos do RJUE.

Termos em que, com o douto suprimento, deve o presente recurso ser admitido e julgado procedente, em ordem à revogação do determinado no douto acórdão recorrido em relação às duas questões em apreço (prejuízo pela aquisição do terreno e natureza do “embargo” de 24/05/2007), após o que devem os autos baixar à 1ª Instância para a instrução determinada no referido acórdão.»

3. Foram apresentadas contra-alegações, com as seguintes conclusões:

3.1. – MUNICÍPIO DE SANTO TIRSO (no Recurso interposto por A ………- Investimentos Imobiliários, S.A.)

“ (...) B) - Quanto às doutas alegações:

XI. Tal como resulta quer da douta sentença da primeira instância, quer do douto acórdão do TCAN, a Recorrente construiu em desobediência a dois embargos, revelando uma conduta manifestamente censurável e que é qualificada como crime de desobediência.

XII. Os factos provados demonstram amplamente que o Recorrido tentou por diversas vezes solicitar da Recorrida uma reação no sentido de explicitar se pretendia ou não a legalização da obra, sem encontrar da parte deste um mínimo de recetividade. Sobre este último aspeto, o facto HHHHHH – não impugnado - é elucidativo. E assim, entende-se ser fora de dúvida que, no processo administrativo em causa se chegou a um ponto em que por inamovível inércia da Recorrente a demolição se impunha como “ultima ratio” para garantir a prevalência da disciplina urbanística no caso concreto.

XIII. A Recorrente não legalizou, porque não quis, sendo certo que, os danos alegados devem-se à sua inamovível inércia, porque se a Recorrente tivesse pautada a sua conduta pela legalidade, os mesmos não existiriam, pelo que, se mais não fosse, a conduta da Recorrente consubstanciaria um claro abuso de direito.

XIV. Qualquer cidadão normal, colocado na posição da Recorrente, respeitaria os embargos, suspendendo as obras e, bem como, tentaria a legalização, o que não fez, porque não quis, remetendo-se a uma inamovível inércia.

XV. Além disso, a Recorrente deu início às obras:

1) sem ter sido feito o alinhamento prévio no local (condição suspensiva dos efeitos do licenciamento);

2) quando os efeitos da licença de construção se encontravam suspensos, a seu pedido, para evitar a caducidade do ato de licenciamento,

3) e, ocultou as notificações e a falta (recusa) de legalização das obras executadas.

Face ao exposto:

XVI. O encadeamento/nexo causal entre o licenciamento e os danos peticionados, foi quebrado com manifesta culpa da aqui Recorrente, constituindo o pedido indemnizatório um manifesto abuso de direito.

XVII. Com base nessa matéria, a ora recorrida, também, interpôs recurso de revista, que aqui se dá por inteiramente reproduzido,

XVIII. Devem, pois, improceder todas as conclusões da Recorrente.

Termos em que o Recurso não deve ser admitido.

Sempre,

Deve ser julgado por não provado e improcedente, fazendo-se assim inteira e acostumada JUSTIÇA!”

3.2. – B…………. (no Recurso interposto por A………..- Investimentos Imobiliários, S.A.)

“ (...) Sem prescindir:

E) O custo da aquisição do terreno nunca poderá ser imputável a qualquer atuação do Município ou do réu, sendo obvio que não representa dano indemnizável na medida em que a autora mantém a propriedade do mesmo.

F) Pelo que, no que respeita a este segmento decisório deverá ser mantido ao Douto Acórdão do TCAN.

G) A alegação de que os embargos de 24.05.2007 não constituem um verdadeiro embargo, mas uma “suspensão” nunca foi abordada pela autora.

H) Nem a autora impugnou o julgamento da matéria de facto dada como provada em AAA, BBB, CCC, DDD, EEE, FFF, GGG, III, NNN, LLLL E MMMM, onde resultam provados precisamente os embargos.

I) Mantendo-se como provada esta matéria de facto resulta a certeza: foram realizados dois embargos á obra que foram desrespeitados.

J) Não pode a autora, com o devido respeito, em sede de recurso invocar que um embargo não é embargo para justificar a sua conduta dolosa assente nos presentes autos e que não foi colocada em causa.

K) Antes, foi a passividade e total desobediência e desrespeito dos embargos e a recusa em legalizar obra a causa dos alegados danos sofridos pela autora, que só à mesma poderão ser imputados.

L) Devem assim serem mantidos os segmentos decisórios do Douto Acórdão impugnados pela autora, fazendo-se assim JUSTIÇA!”

3.3. A………… – INVESTIMENTOS IMOBILIÁRIOS, S.A. (nos recursos interpostos pelo Presidente da Câmara Municipal de Santo Tirso, B………, e pelo Município de Santo Tirso)

“A : Violação das regras de direito probatório material

I – Não há qualquer violação das regras de direito probatório quando o douto acórdão recorrido considerou provado o facto NNNNNN, relativo à compra pela Autora e pelo preço de 185.000,00 euros, do prédio a que se refere o ponto NN do probatório;

II – Tal facto consta da escritura pública junta com a petição inicial, e

III – nos termos do art. 393.º e 394.º do Código Civil não é admitida prova testemunhal em contrário da declaração que consta dessa escritura, salvo convenções contra o seu conteúdo ou além dele, que, no caso, não existem.

IV – Ora, nos termos do n.º 3, do art. 674.º do C.P.C (ex vi do art.º 1.º do C.P.T.A), o recurso de revista – como é o presente caso – por “erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser deduzido, salvo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova.”

V – Não existindo, nem tendo sido invocadas, tais disposições legais, não pode, assim, a matéria factual ser fixada ou alterada neste recurso (cf. entre outros, o Acórdão do STA de 01/07/98, Ap. D.R. de 28/12/01).

VI – Aliás, o STA só pode conhecer dos recursos de revista sobre a matéria de direito, (n.º 4, do art. 12.º do ETAF, republicado pelo Dec. Lei n.º 214-G/2015, de 2/10), o que não é o caso em apreço.

Contradição na decisão sobre a matéria de facto

VII – Alega a recorrente (conclusão “O” e seguintes) que, tendo sido considerado provado o referido facto (NNNNNN) há contradição com a sua fundamentação.

VIII – Porém, constando da fundamentação que o que releva é saber a quem contabilisticamente é imputado o pagamento das faturas (de construção do edifício), desinteressando a relação entre a Autora G……….., Lda., “Não há qualquer contradição, revelando essa decisão numa coerência lógica com as premissas de que parte”.

Responsabilidade do Réu na qualidade de titular do cargo

IX – Alega, ainda, o recorrente (conclusão “V” e seguintes) que, tendo o acórdão recorrido aplicado o art. 70.º do RJUE, deveria o pedido indemnizatório deduzido contra o Réu ser julgado improcedente por não se ter provado qualquer facto que demonstrasse uma conduta dolosa.

X – Porém, a responsabilidade civil da Administração resulta de uma conduta ilícita (que preenche também a culpa) dos titulares dos órgãos, devendo ter-se também em atenção o disposto no art. 8.º, em correspondência com o art. 1.º, n.º3 da Lei n.º67/2007, em relação às “ações ou omissões ilícitas cometidas com dolo ou com diligência e zelo manifestamente inferiores àqueles a que se encontravam obrigados em razão do seu cargo”, assegurando (n.º2) um regime de solidariedade passiva com a pessoa coletiva, “no exercício das suas funções e por causa desse exercício”, sendo obrigatório o exercício do direito de regresso.

XI – Assim, para haver responsabilidade do titular não é necessário haver uma conduta dolosa, mas tão somente o “dolo eventual” ou uma “negligência grave”, designadamente nos seus poderes de direção e supervisão, sendo certo que se presume, a existência de culpa leve na prática de atos jurídicos ilícitos (art. 10.º, n.º 2 da Lei n.º 67/2007).

XII – Ora, o Réu teve uma conduta ilícita, com culpa grave, ao ter aprovado o licenciamento de uma obra que violava o PDM, mantendo-a durante um longo período de tempo após sucessivas transmissões da licença de construção, com aceitação do seu “averbamento”, pelos sucessivos adquirentes, sem nunca questionar a sua validade, salvo quando soube que o Senhor D……… (seu adversário político) era sócio-gerente da Autora, pelo que se viu na necessidade de solicitar um parecer jurídico ao Professor Mário Aroso de Almeida.

XIII – Como se extrai do P.A. (cfr. pontos 24 a 27 destas alegações que aqui se dão por reproduzidos), o Réu não exerceu, com a diligência devida, em razão do cargo, quando aprovou um projeto de obra que, sendo nulo, por violação do PDM, só veio a ser como tal declarado muito mais tarde.

XIV – O Réu é, pois, responsável, em forma solidária com o Réu-Município de Santo Tirso, pelos prejuízos causados à Autora, que, de boa-fé, confiou na validade dos atos por ele praticados, designadamente com a emissão de alvará de licença de construção.

XV – Por outro lado, a invocação do “termo de responsabilidade” do projeto de arquitetura não isenta o Réu da sua responsabilidade de proceder ao controlo preventivo da sua legalidade e/ou conveniência (cf. Fernanda Paula Oliveira, em «A Responsabilidade da Administração perante o promotor de “operação inválida”», em Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 96, pág. 8/9).

Erro na aplicação do direito aplicável

XVI – Alega, finalmente, o recorrente que sendo o despacho (que aprovou o licenciamento da obra) datado de 26/10/1999, era aplicável o Dec. Lei n.º 48051, de 21/11/1967 e o art. 52.º do Dec. Lei n.º 445/95, de 20/11/1991, e não o art. 10.º do RJUE (CC das conclusões).

XVII – Porém, embora o processo administrativo tivesse sido iniciado no âmbito do Dec. Lei n.º 445/91, de 20/11/1991, o mesmo continuou no âmbito do Dec. Lei n.º 555/99, de 16/12, pelo que se configura aplicável o art. 70.º do RJUE em correspondência com o art. 1.º, n.º 3 e 8.º da Lei n.º 67/2007, de 31/12, à declaração de nulidade do referido ato de licenciamento.

XVIII – Por outro lado, o art. 52.º do Dec. Lei n.º 445/91 prevê a responsabilidade pessoal do respetivo titular, ao preceituar que nas situações previstas na al. b) do seu n.º 2 (violação do PDM), constituem ilegalidade grave, que até implicava perda de mandato, devendo ser equacionado com o disposto no n.º 1, do art. 3.º do Dec, Lei n.º 48051, quando dispõe que os titulares dos órgãos responde pela prática dos atos ilícitos “se tivessem excedido os limites das suas funções”, o que consubstancia aquilo que a doutrina e a jurisprudência francesas designam por “voie de fait” e próximo da ideia que inspira a figura do “ultra vires” do Direito Administrativo britânico (cf. Sérvulo Correia, em Noções de Direito Administrativo 1982, p. 352/365), pelo que a prática do ato nulo assenta no pressuposto de que quem o pratica, ou o executa, excede os limites das suas funções (artigo 3.º do Dec. Lei n.º 48051).

XIX – Não é, assim, exato o alegado pelo Réu de que o regime da responsabilidade extracontratual por factos ilícitos, previsto no Dec. Lei n.º 48051, apenas consagra a obrigação de indemnizar por parte do município, sendo que a atuação do titular (prevista na parte final do n.º 1 e n.º 2 do art. 3.º do referido diploma) compreende, além da culpa grave, por ter excedido os limites das suas funções, o dolo eventual.

XX – Acresce que a ilicitude prevista no art. 6.º do Dec. Lei n.º 48051 é uma “ilicitude” de conduta e não de resultado, ou seja, um desvalor de comportamentos,

XXI – compreendendo, simultaneamente, os requisitos da ilicitude e da culpa que, assim, se confundem (cf. Acórdãos do STA de 12/11/2002 – proc. n.º 0122/02 e 27/09/2005, Proc. n.º 0353/03).

XXII – Assim, mesmo que fosse aplicável à situação dos autos - o que só por mera hipótese se admite – o art. 52.º do Dec. Lei n.º 445/91, de 20/11/1991, em conjugação com o Dec. Lei 48051, de 21 /11/1967, o Réu é pessoalmente responsável pelos prejuízos causados à Autora pela sua conduta ilícita, nos termos dos art. 3.º e 6.º deste último diploma.

B – Quanto ao recurso interposto pelo Município de Santo Tirso, no caso de também ser admitido preliminarmente, nos termos do art. 150.º do C.P.T.A:

I – Alega a recorrente que a Autora atuou com culpa na produção ou agravamento dos danos, bem como atuou com abuso de direito, o que afasta a responsabilidade do ora Réu/Município.

II – Para o efeito, invoca o disposto no art. 570.º do Código Civil, bem como o comentário da Prof. Fernanda Paula Oliveira, «A responsabilidade da Administração perante o promotor da “operação inválida”», em CJA n.º 96.

III – Pergunta-se, assim, se a responsabilidade do Município pela indemnização devida em relação aos danos causados por conduta ilícita pode ser afastada ou diminuída quando o lesado pelo ato nulo é o requerente da pretensão.

IV – Antes de mais, deve salientar-se que, como consta da “nota 4”, do referido “comentário”, não é a declaração de nulidade, mas sim o próprio ato declarado nulo a causa adequada dos prejuízos (cf. Acórdão do STA de 05/06/2001, p. 47/54), o que resulta diretamente do art. 70.º, n.º 1 do RJUE: “... em caso de (...) declaração de nulidade ...” (e não por causa dela), o município responde quando “... a causa da (...) declaração de nulidade resulte de uma conduta ilícita dos titulares dos seus órgãos ou dos seus funcionários e agentes”.

V – Ora, a Autora não apresentou qualquer projeto de construção nem requereu o seu licenciamento, limitando-se a adquirir o terreno por escritura pública de 23/11/2005 e requerer o averbamento, em seu nome, do respetivo alvará n.º 309-E, de 06/06/2001” que foi autorizada pelo município (cf. pontos Y, MM, NN e OO do probatório), após o que adjudicou, em 02/02/ 2007, a “Construções F………, Lda” o contrato para a construção do prédio em causa nos presentes autos pelo valor de 1.273.445,72 euros.

VI – Na verificação da responsabilidade direta e solidária do município causada pela conduta ilícita do titular, Presidente da Câmara Municipal, não tem assento na verificação da culpa do lesado na produção ou agravamento dos danos, mas antes o nexo de causalidade que, no entender do douto acórdão recorrido, terá sido quebrado pela conduta da Autora quando prosseguiu a realização da obra após o embargo de 24/05/2007, referido em DDD.

VII – Aliás, os factos invocados pelo município/recorrente: a questão do alinhamento (que foi, em devido tempo, 14/02/2007) requerido, da suspensão para aguardar o entendimento da DGAL (que foi declarada pelo próprio município como impossibilidade ou inutilidade superveniente), ocultação das notificações e falta de legalização das obras executadas (quando era detentor de um alvará de licença de construção), em nada contribuíram para a produção ou agravamento de danos.

IX – Com efeito:

a) a alegação de que nunca chegou a ser realizado qualquer alinhamento no local pelos fiscais do Município, apenas releva para a omissão deste, uma vez que tal alinhamento foi requerido pela Autora em 14/02/2007, tendo aos 26/02/2007, os Serviços de Fiscalização informado que as obras ainda não tinham sido iniciadas, mas o terreno estava vedado e encontrava-se montada no local uma grua e o terreno tinha sido limpo, sem que tivesse sido questionado o alinhamento com início das obras em 10/05/2007 (pontos 4 e 9 das “informações” do ponto BBB do probatório);

e a declaração de que a Autora invadiu “espaço público”, não resulta dos factos dados como provados em XX e ZZ do probatório.

b) O recorrente alega ainda que tendo a Autora requerido em 21/03/2007 a suspensão da licença, deu início às obras na pendência dessa “suspensão”.

Porém, a Autora, tendo conhecimento da existência de “informação” no sentido da declaração de caducidade da licença concedida pelo facto de não ter sido iniciada a obra dentro dos prazos legais, requereu que fosse declarada a suspensão no processo 1304/97 e proferida decisão final no processo 644/202, no prazo de 15 dias (cf. ponto TT do probatório). Ora, a referida “informação” é a que consta da informação de 26/02/2007, constante do “ponto OO do probatório”, na qual se diz que “independentemente de o processo ter licença de construção, não cumpre o Dec.-Lei 555/99, alterado pelo Dec. Lei n.º 177/2001 – art. 71.º, n.º 3, al. a)”.

Não tendo sido proferida decisão final do aludido prazo de 15 dias, no processo 644/202, a Autora desistiu desse pedido de alteração e requereu que o prazo da licença do processo 1304/97 fosse prorrogado pelo período em que se encontrava suspenso.

Assim, a Autora não invocou a suspensão da licença, a fim de evitar a declaração da sua caducidade, mas que tal suspensão fosse declarada a fim de, entretanto, ser proferida decisão final no processo 644/202, requerendo a prorrogação do prazo do proc. n.º 1304/97 pelo período em que essa licença se encontrava suspensa.

Não é, pois, exata a afirmação do Réu de que a Autora atuou com manifestada má-fé quando deu início às obras “numa altura em que os efeitos da licença estavam suspensos”.

Má-fé usou o Réu ao dizer que a licença tinha caducado de forma automática, por não ter iniciado as obras, devendo proceder à devolução do alvará da construção (ponto RR do probatório) e de que a Autora só teve conhecimento, com surpresa, quando consultou o processo (ponto TT do probatório), apresentando, nessa data (21/02/2007), o requerimento atrás referido (ponto TT do probatório).

O recorrente também alega que D…….. procurou ilidir a realização de embargos e não procurou “legalizar” a construção.

Sendo a Autora uma sociedade comercial é fácil a sua notificação (cf. art. 112.º do CPA), pelo que não se percebe o que essa falta possa contribuir para qualquer infração.

Quanto à falta de diligência para legalizar a construção, a Autora era detentora de uma licença de construção que no seu entender era válida - e não havia nada que se pudesse prever o contrário dadas as sucessivas transmissões da licença - e, por outro lado, não sendo o projeto de construção da sua autoria, implicaria a sua total remodelação, com os consequentes custos.

Essa falta de diligência, a ocorrer, não implica uma conduta ilícita na execução da obra que prevalece sobre a ilicitude do Município de Santo Tirso pela aprovação de um projeto de construção que não verificou a conformidade do pedido de licenciamento com o PDM (ponto V do probatório).

IX – Finalmente, a alegação de que a Autora abusou do direito que a licença lhe conferia não tem a mínima sustentação, pelo que o pedido indemnizatório não constitui qualquer abuso de direito, nos termos do art. 334.º do Código Civil.

X – A Autora atuou sempre com boa-fé, ao exercitar o direito que lhe conferia a licença em causa tendo em conta, essencialmente, a atuação do Senhor Presidente da Câmara Municipal que, durante cerca de 10 anos, nunca considerou que a licença por ele concedida fosse considerada nula.

Termos em que, com o douto suprimento, devem ser julgados improcedentes os recursos de B……….. e o Município de Santo Tirso, do douto acórdão do TCAN.”

4. O recurso de revista foi admitido pela formação deste STA por acórdão de 5.5.2022.

5. O Ministério Público foi notificado, em 25.05.22022, nos termos e ao abrigo do art. 146º CPTA.

6. Após os vistos legais, cumpre decidir.

*

Fundamentação

Dá-se aqui por reproduzida a Matéria de facto fixada pelas instâncias com relevância para a decisão da causa:

*

O DIREITO

1.Recurso do Município

Pretende o recorrente que a autora atuou com culpa na produção ou agravamento dos danos, o que afasta a sua responsabilidade nos termos do art. 570.º do Código Civil.

Para tanto refere que resulta da matéria dada como provada que se impunha que o Tribunal a quo tivesse considerado que a A. agiu com culpa (art. 70º do RJUE e 570º do CC) e ou que o pedido indemnizatório constitui manifesto abuso de direito (art. 334º do CC), tendo o acórdão incorrido em erro na aplicação do direito aos factos provados, devendo ser revogado.

Na verdade, a seu ver, o início das obras foi feito sem o alinhamento prévio no local, quando os efeitos da licença de construção se encontravam suspensos, havendo ocultação das notificações e falta (recusa) de legalização das obras executadas.

Pelo que é um erro ordenar a baixa dos autos para que seja completada a decisão dos pedidos indemnizatórios formulados, segundo os critérios aí definidos, ou seja, verificar quais os custos da obra realizada até 24/05/2007 e que foram suportados pela Autora na convicção de que a obra era legal, com sustento na conduta ilícita do Réu, Município de Santo Tirso, que licenciou uma construção incompatível com o PDM vigente à época.

1.1.Relativamente à culpa da autora pretende o recorrente que a mesma resultaria desde logo do facto provado em KKKKKKK que refere que aquela iniciou as obras sem ter sido feito o alinhamento e nivelamento no local, o que era condição do início das obras, incumprindo, assim, uma condição suspensiva do licenciamento.

Ou seja, contrariamente ao entendido pelo TCAN o encadeamento/nexo causal entre o licenciamento e os custos da obra licenciada foi quebrado muito antes do embargo em 24/05/2007, ou seja, com o início das obras sem ter sido feito o alinhamento prévio no local e quando os efeitos da licença de construção se encontravam suspensos, e com ocultação das notificações e falta (recusa) de legalização das obras executadas.

Então vejamos o que concluir quanto à alegada falta de nexo de causalidade a alegação por nunca ter chegado a ser realizado qualquer alinhamento no local pelos fiscais do Município.

É certo que, e conforme resulta de O do probatório o despacho do ponto N do probatório foi subscrito pelo R. Presidente, na altura Vereador com competências subdelegadas em 20-10-1998, estando o deferimento condicionado a alinhamento e a nivelamento fornecido no local (fls. 97 do PA 1304/97), o que ficou a constar do alvará de licença de construção nº309-E.

Contudo, e conforme resulta da matéria de facto:

“T. Em 26.10.1999 foi proferido despacho de deferimento do pedido de licenciamento no processo 1304/97. – fls. 430 do p.a. 1304/97 – provado por sentença de 31-01-2020;

U. O referido despacho foi subscrito pelo R. Presidente (fls. 430 do PA 1304/97)”

E, foi este despacho de 26/10/1999 que deferiu o pedido de licença de construção dos autos (alvará n° 309-E), que não faz qualquer alusão a condicionamento de alinhamentos, (e não aquele de 20/10/1998, esse sim condicionado a alinhamento), que foi declarado nulo pelo despacho aqui em causa de 25/10/2007 do 2.° Réu - Presidente da Câmara de Santo Tirso.

De qualquer forma o alinhamento foi requerido pela autora em 14/02/2007, tendo os Serviços de Fiscalização informado em 26/02/2007 que as obras ainda não tinham sido iniciadas, mas o terreno estava vedado e se encontrava montada no local uma grua e o terreno tinha sido limpo, sem que tivesse sido questionado o alinhamento com início das obras em 10/05/2007 (pontos 4 e 9 das informações do ponto BBB do probatório).

Pelo que carece de razão o recorrente neste argumento para afastar o nexo de causalidade por culpa do lesado.

1.2. Alega o recorrente que o encadeamento/nexo causal entre o licenciamento e os custos da obra licenciada não foi apenas quebrado pela realização do embargo em 24/05/2007 já que esse encadeamento causal havia também sido quebrado com o início das obras quando o licenciamento das mesmas se encontrava suspenso o que leva a que o pedido indemnizatório se traduza num manifesto abuso de direito.

Então vejamos.

Desde logo estão aqui apenas em causa os custos desde o início da obra, segundo os critérios definidos pelo TCAN por se ter entendido que a autora os fez na convicção de que eram legais até 24/05/2007, data do embargo.

Como resulta de BBB da matéria de facto, em 21/5/2007 foi emitida informação técnica de onde resulta que:

6- Aos 01/03/2007, foi prestada informação de serviço no sentido de declaração de caducidade do alvará de licenciamento, em virtude de as obras não terem sido iniciadas dentro do prazo previsto na al. a) do n.º 2 do art. 71 º do DL 555/999, de 16/12 - fls 514.

7- Sobre esta informação foi proferido o despacho de concordo aos 01/03/2007. 8- Aos 21/03/2007, veio o Requerente pedir a declaração de suspensão do prazo do alvará.

9- Aos 10/05/2007, os serviços de fiscalização informaram que a requerente já tinha dado inicio às obras, com a abertura e carregamento de caboucos, demolição do muro de vedação ao passeio público e demolição e rasgos no muro de suporte do passeio para cravar pilares; foi colocado um contentor em cima do passeio público e vedação de rede, ocupando uma área pública sem a respetiva autorização; a licença foi passada com a condicionante do alinhamento e nivelamento a fazer no local e que ainda não foi feito.”

Ou seja, em 21.03.2007, a autora requereu pedido de declaração de suspensão do prazo do alvará e, entretanto, em 10.05.2007, os serviços de fiscalização detetaram que as obras já tinham sido iniciadas.

Ora, desde logo, fazer um pedido de suspensão não é o mesmo que ver o mesmo deferido.

E, em momento algum, e antes da data do embargo em 24.05.2007, resulta ter existido um despacho a deferir o pedido de suspensão.

E, enquanto tal não acontecesse não podemos dizer que houve qualquer culpa no início das referidas obras.

Pelo que, não podemos concluir que a autora não tinha a convicção de que a obra era legal pelo facto de, em 21/03/2007, ter pedido a suspensão da licença, a fim de evitar a declaração da sua caducidade e de entretanto ter dado início às obras a fim de evitar a referida caducidade e já que não resulta da matéria de facto a existência de um deferimento expresso daquele pedido de suspensão.

E, ainda que, em 05/06/2007, tenha pedido a prorrogação do prazo pelo período em que se encontrou suspensa.

Não se pode, também, dizer que o início das obras na pendência de um pedido de suspensão da licença revele má-fé.

1.3. Pretende o recorrente que D…….. procurou ilidir a realização de embargos e não procurou “legalizar” a construção.

E, com esse facto, pretende que a autora contribuiu para a causa dos danos existentes mesmo antes do embargo de 24/05/2007.

Seja de que forma for, e mesmo que tenha ocorrido falta de diligência no processo de legalização de parte da obra construída, eventualmente legalizável, tal nem implica uma conduta ilícita na execução da obra nem interfere na nulidade da aprovação de um pedido de licenciamento de um projeto de construção que não está em conformidade com o PDM.

Pelo que este argumento não implica qualquer culpa sua.

A este propósito diz-se na decisão recorrida:

“Por outro lado, ao contrário do que a Recorrente sustenta, a realização de operações urbanísticas por particulares depende de prévia licença atribuída num procedimento iniciado a requerimento dos interessados, nos termos dos Artigos 4º/1 e Artigo 9º/1 do RJUE. Sem surpresa, pois o particular poderia não ter interesse na realização da obra amputada de um andar e, mantendo esse interesse, teria que apresentar novo projeto e novo pedido de licenciamento em conformidade o novo PDM.

Portanto, ao contrário do alegado pela Recorrente, o artigo 106º/2 do RJUE impõe aos particulares, de forma implícita, mas inequívoca, o ónus de formalizarem o pedido de licenciamento, a par de onerar o presidente da câmara demolição.

Esse hipotético novo requerimento inauguraria um novo procedimento e não a continuação do procedimento originário a fortiore ratione entendimento expresso no Ac. do STA de 24-01-2008, Proc. 0457/07, relativamente a mera alteração do projeto: «O licenciamento municipal a que estão sujeitas as obras ou alterações ao projeto, referido no nº 2 do art. 29º do DL nº 445/91, de 20 de Novembro, na redação do DL nº 250/94, de 15 de Outubro, constitui um novo e autónomo processo de licenciamento, e não um subprocedimento enxertado no processo de licenciamento originário, ou, muito menos, um procedimento condicionado, amputado ou a termo». A jurisprudência invocada pelo TAF era perfeitamente extensível ao caso destes autos, incluindo o Ac. do TCAN de 05-06-2015, proc. 63/12.6BEBRG, dotado com o seguinte sumário: = Se é certo que nos termos do art.º 106°, n° 2 do RJUE «a demolição não pode ser ordenada se a obra for suscetível de ser licenciada ou autorizada ou se for possível assegurar a sua conformidade com as disposições legais e regulamentares que lhe são aplicáveis mediante a realização de trabalhos de correção ou de alteração», mostrando-se ser a demolição a ultima ratio que apenas deve ser utilizada quando se revele o único meio possível de repor a legalidade urbanística, atento o princípio da proporcionalidade, em qualquer caso, a situação de ilicitude não se poderá eternizar, devendo os interessados, promover a legalização da operação em prazo razoável, tanto mais que a legalização de obras corresponde a um ónus dos interessados.

Assim, caso os interessados não realizem os trabalhos de correção ou alteração devidos, nos termos do artº 105° do RJUE, ou não promovam a legalização da operação em prazo razoável concedido para o efeito, é legítima a emanação da ordem de demolição, de modo a fazer cessar a situação de ilegalidade verificada, sob pena de se eternizar uma situação de impunidade permissiva. = Esta jurisprudência demonstra sem margem para dúvidas que na matéria se traduz em impender sobre a Administração o dever de contactar e ouvir previamente o interessado, dando-lhe oportunidade de apresentar o projeto de legalização para o efeito, mas também em impender sobre o interessado o ónus de formular um pedido de legalização das obras. E não obstante a demolição constituir a ultima ratio da disciplina urbanística, seria insustentável pretender que o travão à demolição se mantivesse acionado enquanto subsistisse alguma réstia de possibilidade impugnatória, pois isso corresponderia virtualmente à eternização da obra ileg nulla ratio considerando que o interessado sempre poderia aferrar-se ao argumento de não sujeição a prazo de uma eventual impugnação baseada na nulidade ou inexistência do ato que ordena a demolição, nos termos do artigo 58º/1 CPTA. Ora, os factos provados, tal como referido na sentença, demonstram amplamente que a Administração tentou por diversas vezes solicitar do interessado uma reação no sentido de explicitar se pretendia ou não a legalização da obra, sem encontrar da parte deste um mínimo de recetividade. Sobre este último aspeto, o facto HHHHHH não impugnado - é elucidativo.

E assim, entende-se ser fora de dúvida que, no processo administrativo em causa se chegou a um ponto em que por inamovível inércia da Recorrente a demolição se impunha como última ratio para garantir a prevalência da disciplina urbanística no caso concreto.”

Ora, são questões diferentes a de saber se a demolição se impunha no caso sub judice, e outra a de saber se a falta de pedido de legalização significa culpa da autora suscetível de intervir no nexo de causalidade ou na concorrência de culpas.

Ora, a falta do pedido de legalização correspondente a uma inércia não interfere com a conclusão da necessidade de demolição assim como não implica culpa do lesado só por si e enquanto não houver qualquer embargo.

Resulta da matéria de facto que, conforme informação da fiscalização de 2005/05/06, ainda não tinham sido iniciadas as obras cujo prazo de execução decorria até 2007/06/06.

Resulta ainda da matéria de facto que:

Em 26-04-2007, o Banco ………. aprovou a concessão de um empréstimo no valor de 1.200.000 € para construção de um imóvel sito no Lugar ………., S. Martinho do Campo, Santo Tirso, pelo prazo de 4 anos, e com uma taxa de juro baseada na taxa Euribor a três meses acrescida de um spread de 1,5 % (fls. 69-70 da providência cautelar 779/08.1BEPNF);

VV. Em 02-05-2007, a Construções F………., Lda. emitiu a factura n.º 451 pela prestação de serviços de construção civil efectuados na obra aqui em causa, no valor de 35616,35 €, o qual foi pago em 02-05-2007 - fls. 59-61 dos autos;

WW. Em 10.5.2007 foi emitida informação pela fiscalização dando conta que “visitado novamente o local, confirma-se que já foi dado inicio às obras de construção do edifício, com abertura e carregamentos dos caboucos na parte posterior, demolição numa extensão de 10 m do muro de vedação ao passeio público e ainda com demolições e rasgos no muro de suporte do passeio para cravar pilares […]”. – fls. 516 do pa. 1304/97 – provado por sentença de 31-01-2020”.

E que, por despacho de 25/10/2007, do 2.° Réu - Presidente da Câmara de Santo Tirso foi declarada a nulidade do despacho de 26/10/1999 que deferiu o pedido de licença de construção dos autos.

Ou seja, não há como assacar responsabilidade à autora em ter executado obras ao abrigo de uma licença que exista pelo menos até ao momento em que a obra foi embargada.

Pelo que, este argumento não implica qualquer culpa da autora.

2. Abuso de direito

O recorrente invoca, pelos mesmos fundamentos que alega a existência de culpa da autora, que existe abuso de direito por parte da mesma, nos termos do art. 334º do CPC.

Isto é, refere que, tendo a autora dado início às obras na pendência da suspensão da licença, por si invocada, fá-lo sem o alinhamento e nivelamento no local, bem sabendo da existência dessa condição e ainda que para evitar a declaração da caducidade do ato de licenciamento.

O que significa que agiu com má-fé já que não podia invocar a suspensão da licença, para evitar a declaração da caducidade e, de seguida, iniciar as obras, ou seja, de duas uma, ou os efeitos estavam suspensos ou o prazo para dar início às obras tinha expirado, o que levaria à caducidade do ato de deferimento do licenciamento e sem este não haveria dano.

Sendo que lhe foi dada possibilidade no sentido da legalização, o que ignorou.

Mas, como vimos, nem estes fundamentos são causa de concorrência de culpas ou exclusão de culpa do aqui recorrente nem implicam qualquer má-fé ou abuso de direito por manifesta excedência dos limites impostos pela boa-fé, pelos costumes ou pelo fim social ou económico do direito, nos termos do artigo 334.º do CC.

RECURSO INTERPOSTO POR B……

1.Começa, o recorrente por invocar que sendo o despacho (que aprovou o licenciamento da obra) datado de 26/10/1999, era aplicável o Dec. Lei n.º 48051, de 21/11/1967 e o art. 52.º do Dec. Lei n.º 445/95, de 20/11/1991, e não o RJUE.

E que, o regime da responsabilidade extracontratual por factos ilícitos, previsto no Dec. Lei n.º 48051, apenas consagra a obrigação de indemnizar por parte do município.

Então vejamos.

Segundo o princípio tempus regit actum, princípio geral do direito que, no direito administrativo, significa que os atos administrativos se regem pelas normas em vigor no momento em que são praticados, também a responsabilidade pelas consequências de um ato ilegal/nulo devem reportar-se à data em que o mesmo foi praticado.

E não se diga que embora o processo administrativo tivesse sido iniciado no âmbito do Dec. Lei n.º 445/91, de 20/11/1991, o mesmo continuou no âmbito do Dec. Lei n.º 555/99, de 16/12, pelo que é aplicável à declaração de nulidade do referido ato de licenciamento o art. 70.º do RJUE em correspondência com o art. 1.º, n.º 3 e 8.º da Lei n.º 67/2007, de 31/12.

Na verdade e conforme resulta de T da matéria de facto “ Em 26.10.1999 foi proferido despacho de deferimento do pedido de licenciamento no processo 1304/97. – fls. 430 do p.a. 1304/97 – provado por sentença de 31-01-2020.”

Que significa que é aqui aplicável o Dec. Lei n.º 445/91, de 20/11/1991 e o Dec. Lei n.º 48051, de 21/11/1967.

Nos termos do nº3 deste último:

“ 1. Os titulares do órgão e os agentes administrativos do Estado e demais pessoas coletivas públicas respondem civilmente perante terceiros pela prática de atos ilícitos que ofendam os direitos destes ou as disposições legais destinadas a proteger os seus interesses, se tiverem excedido os limites das suas funções ou se, no desempenho destas e por sua causa, tiverem procedido dolosamente.

2. Em caso de procedimento doloso, a pessoa coletiva é sempre solidariamente responsável com os titulares do órgão ou os agentes.”

Por sua vez nos termos do artigo 52.º do DL 445/91

“Nulidade do licenciamento

1 - São anuláveis os atos administrativos que decidam pedidos de licenciamento, no âmbito do presente diploma, e não tenham sido precedidos de consulta das entidades cujos pareceres, autorizações ou aprovações sejam legalmente exigíveis.

2 - São nulos os atos administrativos que decidam pedidos de licenciamento, no âmbito do presente diploma, e que:

a) Não estejam em conformidade com os pareceres vinculativos, autorizações ou aprovações legalmente exigíveis;

b) Violem o disposto em plano regional de ordenamento do território, plano municipal de ordenamento do território, normas provisórias, área de desenvolvimento urbano prioritário, área de construção prioritária ou alvará de loteamento em vigor.

c) Violem o disposto no n.º 2 do artigo 48.º

3 - Constitui negligência grave deixar de promover as consultas referidas no n.º 1 nos prazos fixados no presente diploma, bem como omitir a indicação dessas entidades na notificação da deliberação sobre o pedido de informação prévia.

4 - As situações previstas na alínea b) do n.º 2 constituem ilegalidade grave, para os efeitos do disposto na alínea c) do n.º 1 e no n.º 3 do artigo 9.º e na alínea g) do n.º 1 do artigo 13.º da Lei n.º 87/89, de 9 de Setembro.

5 - Nas situações previstas nos n.ºs 1, 2 e 3, o município constitui-se na obrigação de indemnizar os prejuízos causados aos interessados.”

In Caderno de Justiça Administrativa nº96 Fernanda Paula Oliveira a pág. 3 e seguintes refere:

” De entre as inovações introduzidas pelo Regime da Responsabilidade Civil destaca-se, desde logo, o princípio da responsabilidade direta e exclusiva do Estado e demais pessoas coletivas públicas pelos danos que resultem de ações ou omissões ilícitas cometidas com culpa leve pelos titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, no exercício da função administrativa e por causa desse exercício (nº1 do art. 7°). Por outro lado, o legislador estabelece uma presunção de culpa leve quer na prática de atos jurídicos ilícitos, como tal definidos no art. 9°, quer, por aplicação dos princípios gerais da responsabilidade civil, quando tenha havido incumprimento de deveres de vigilância (cfr. o n.° 3 do art. 10°). O que significa que, a partir desta Lei, e de acordo com as mencionadas presunções, para acionar o mecanismo da responsabilidade civil bastará ao lesado provar a existência de um ato ilícito, ainda que não consiga demonstrar que existiu uma forma de culpa mais grave, ou seja, o dolo ou a negligência grosseira (culpa grave).

Quanto à responsabilidade pessoal dos titulares de órgãos, funcionários e agentes do Estado e demais pessoas coletivas, o art. 8.º, n.° 1, alarga a sua responsabilidade pessoal e direta aos casos de “diligência e zelo manifestamente inferiores àqueles a que se encontravam obrigados em razão do cargo”. Ou seja, o legislador tem em vista quer a atuação intencional, quer a atuação com culpa grave ou negligência grosseira.

É de realçar que não obstante o n.° 1 do art. 8º estabeleça uma responsabilidade pessoal dos titulares de órgãos, funcionários e agentes, o n.° 2 do mesmo preceito assegura um regime de solidariedade passiva, impondo que o Estado e as demais entidades públicas respondam em forma solidária com aqueles.

Por outro lado, é tornado obrigatório o exercício do direito de regresso sobre os titulares dos órgãos: em conformidade com o disposto no art. 8°, n.° 3, “sempre que satisfaçam qualquer indemnização nos termos do disposto no número anterior, o Estado e as demais pessoas coletivas de direito público gozam de direito de regresso contra os titulares de órgãos, funcionários ou gentes responsáveis”. E, segundo o art. 6°, n.° 1, “[o] exercício do direito de regresso, nos casos em que este se encontra previsto na presente lei, é obrigatório”. A significar que o “direito de regresso” passa a ser um “dever de regresso”.

Assim, no âmbito da legislação aplicável era exigível que o aqui recorrente tivesse agido com dolo, o que não resulta dos autos.

E não se diga que o facto de o art. 52.º do Dec. Lei n.º 445/91 , que prevê a responsabilidade pessoal do respetivo titular, preceituar que as situações previstas na al. b) do seu n.º 2 (violação do PDM), constituem ilegalidade grave, que até implicava perda de mandato, tal deve ser interpretado em sintonia o com o disposto no n.º 1, do art. 3.º do Dec, Lei n.º 48051, quando dispõe que o titular dos órgãos responde pela prática dos atos ilícitos “se tivessem excedido os limites das suas funções”.

Na verdade, a atuação do titular prevista na parte final do n.º 1 e n.º 2 do art. 3.º do Dec. Lei n.º 48051 compreende apenas o dolo ainda que também o dolo eventual, mas não as situações de culpa grave, nem esta se confunde com qualquer situação de excesso nos limites das suas funções.

Pelo que, o recurso procede nesta parte, improcedendo a ação contra o aqui recorrente.

Sendo assim fica prejudicado o conhecimento da restante argumentação invocada pelo aqui recorrente.

***

3. Recurso interposto por A……….– INVESTIMENTOS IMOBILIÁRIOS, S.A.

Como se diz no recurso que admitiu a revista:

“Nesta sede de revista a A./Recorrente pretende discutir a questão de saber se à luz do art. 70º do RJUE o custo do terreno [no montante de €185.000,00] é, ou não, um dano indemnizável (art. 566º, nº 3 do CC), sendo que o acórdão entendeu que não, uma vez que “as faculdades construtivas do terreno não foram afetadas pelos atos camarários”.

3.1. A recorrente alega que o acórdão recorrido erra ao decidir que a “indemnização pela aquisição do terreno (com licença de construção) não era um dano indemnizável, à luz do art.º 70º do RJUE” já que “o terreno não foi objeto de demolição ou de qualquer outra intervenção suscetível de prejudicar a sua capacidade construtiva dentro das normais restrições de legislação urbanística”.

E que, nos termos do art.º 70º o Município responde pelas ações e omissões cometidas em violação do RJUE (como é o caso da al. a) do art.º 68º - violação do PDM), sempre que a causa da declaração de nulidade resulte de uma conduta ilícita dos seus órgãos ou dos seus funcionários ou agentes.

Ora, o ato praticado pelo Sr. Presidente da Câmara Municipal de Santo Tirso com o despacho de 26/10/1999 é ilícito e por isso foi declarado nulo em 25/10/2007 pela mesma entidade, por violação do PDM.

Pelo que, conclui que o prejuízo causado à Autora, com a impossibilidade de construção, no terreno que adquiriu por 185.000,00€, é um dano indemnizável, segundo um juízo equitativo nos termos do art.º 566º, n.º 3 do Código Civil.

E que a equidade, por não ser possível quantificar o valor exato do dano, também assenta na “perda de chance”, que não corresponde a um dano eventual e futuro, mas um dano certo e atual, visto que se trata da probabilidade concreta – e já existente no património do interessado – de obter um resultado favorável, que não se confunde neste plano, com o lucro cessante.

Pelo que, o acórdão recorrido ao julgar não ser indemnizável o prejuízo resultante de o terreno em apreço ter deixado de ter capacidade construtiva, errou quer por violação do art.º 70º do RJUE quer com base na “perda de chance”.

Então vejamos.

É certo que a autora adquiriu o terreno aqui em causa para aí construir de acordo com o projeto aprovado.

E que, com a revisão do PDM de Santo Tirso em 2011 o terreno foi classificado como solo rural e qualificado como espaço agrícola, em Estrutura Ecológica (provado por sentença de 31/01/2020 – facto 75).

Mas esta perda de valor do terreno, que é inequívoca, não resulta como nexo de causalidade da atuação do réu Município.

A autora mantém a propriedade do terreno que adquiriu e a perda de valor do mesmo não resultou do ato nulo do Município, mas antes do PDM que foi alterado.

E quiçá, do facto de não ter requerido a legalização da obra na parte em que a mesma era legalizável.

Não está, assim, aqui em causa qualquer tipo de indemnização pela perda de oportunidade de ganho, segundo um juízo equitativo, nos termos do art.º 566º, n.º 3 do Código Civil.

Pelo que não é indemnizável o valor do terreno como pretende a recorrente.

3.2. Como também se refere no acórdão que admitiu a revista:

Alega ainda, no que se refere ao embargo, que o acórdão recorrido, ao não entender como indemnizáveis os trabalhos realizados depois de 24.05.2007, violou por erro de interpretação e aplicação o disposto no art. 102º-B e 103º, ambos do RJUE.”

Ou seja, a recorrente pretende que o acórdão recorrido eliminou como “destituídos de nexo de causalidade, os pretendidos lucros cessantes e os danos emergentes constituídos pelos custos inerentes à construção efetuada de 24/05/2007 em diante”, querendo com isto dizer que não são indemnizáveis os danos ocorridos depois do “embargo” de 24/05/2007.

E que, para esse denominado “embargo” ser eficaz, deveria ter como pressuposto ser exarado em auto, obrigatória e expressamente as determinações do art.º 102-B do RJUE, em confronto com os art.s 66º a 73º do CPA, sendo essas formalidades essenciais para a produção de efeitos que este propende: a suspensão dos trabalhos.

Conclui que o “embargo” de 24/05/2007, não constitui, por falta desse elementos e determinações, uma medida de tutela de legalidade urbanística, que obrigasse à imediata suspensão dos trabalhos de construção por parte da Autora.

Tanto que o Município não considerou esse embargo como tal porquanto só em 16/12/2008 é que a Autora foi notificada do despacho de 25/10/2007, numa altura em que já tinham terminado as obras da estrutura do edifício, tendo o Réu Município procedido à sua demolição (ponto QQQQQ do probatório).

Conclui que acórdão recorrido, ao não entender como indemnizáveis os trabalhos realizados depois de 24/05/2007, violou por erro de interpretação e aplicação o disposto nos art.s 102-B e 103º, ambos do RJUE.

Então vejamos.

Desde logo resulta da matéria de facto e nomeadamente de AAA, BBB, CCC, DDD, EEE, FFF, GGG, III, NNN, LLLL E MMMM a existência dos referidos embargos não sendo este o momento para os colocar em causa.

É, pois, intempestiva a alegação de que os embargos de 24.05.2007 não constituem um verdadeiro embargo, mas antes uma mera “suspensão”.

Ou de que só em 16/12/2008 é que a Autora foi notificada do despacho de 25/10/2007 a ordenar o embargo da obra, numa altura em que já tinham terminado as obras da estrutura do edifício, seguido da sua demolição pelo Município Réu.

Na verdade, e como resulta da matéria de facto, fixada:

“MMMM. O embargo a que se refere o ponto LLLL do probatório foi realizado no dia 25-10-2007 na pessoa do irmão de D…….., também administrador da A. (depoimento das testemunhas …………, ……….. e E……….)

NNNN. D………. teve conhecimento do embargo a que se refere o ponto LLLL do probatório (depoimento de D……..);

OOOO. D……… procurou ilidir a realização de embargos e notificações na sua pessoa (depoimento de D…………. e E…….)”

Improcede, assim, a questão suscitada.

*

Em face de todo o exposto acordam os juízes deste STA em:

_Negar provimento aos recursos de revista interpostos pelo MUNICÍPIO DE SANTO TIRSO e pela A………. - INVESTIMENTOS IMOBILIÁRIOS, SA;

_Conceder provimento ao recurso de revista interposto por B……….., e, em conformidade, revogar o acórdão recorrido e julgar improcedente a ação naquilo a que a ele respeita.

Custas pelo Município de Santo Tirso e A………. na proporção do respetivo decaimento.

Lisboa, 20 de outubro de 2022. - Ana Paula Soares Leite Martins Portela (relatora) - Adriano Fraxenet de Chuquere Gonçalves da Cunha - José Augusto Araújo Veloso.