Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0122/13
Data do Acordão:04/30/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:VALENTE TORRÃO
Descritores:RECURSO HIERÁRQUICO
PRESUNÇÃO
INDEFERIMENTO TÁCITO
PRAZO DE IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
Sumário:I - O prazo legal máximo para a decisão do recurso hierárquico, de acordo com o disposto no artº 66º, nº 5 do CPPT, é de 60 dias.
II - Se o recurso não for decidido nesse prazo, forma-se a presunção de indeferimento findo esse prazo, podendo o interessado impugnar tal indeferimento no prazo referido na alínea d) do nº 1 do artº 102º do CPPT.
III - Deste modo, não é aplicável ao caso o prazo previsto nos nºs 1 e 5 do artº 57º da LGT, o qual é um prazo geral só aplicável quando outro prazo não estiver previsto para a decisão do procedimento.
IV - Interposto recurso hierárquico em 23.03.2010, inexistindo decisão expressa e deduzida impugnação do ato de indeferimento tácito em 22.12.2010, esta é intempestiva porque apresentada para além daqueles prazos cumulados de 60 e 90 dias.
Nº Convencional:JSTA00068234
Nº do Documento:SA2201304300122
Data de Entrada:01/28/2013
Recorrente:A......, SA
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF PORTO
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - IMPUGN JUDICIAL
Legislação Nacional:CPPT99 ART66 N5 ART102 N1 D
LGT ART78 ART56 ART57
CPA ART109 N2
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC01015/06 DE 2007/06/20; AC STA PROC0338/08 DE 2008/09/18
Referência a Doutrina:DIOGO LEITE DE CAMPOS E OUTROS - LGT ANOTADA E COMENTADA 4ED 2012 PAG484.
LIMA GUERREIRO - LGT ANOTADA REI DOS LIVROS PAG264.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

I. “A…….., SA”, com os demais sinais nos autos, veio recorrer da decisão do Mmº Juiz do TAF do Porto que julgou verificada a exceção da caducidade do direito de impugnar, relativamente à impugnação por ela deduzida contra atos de indeferimento tácito de recursos hierárquicos interpostos em 23.02.2010, das decisões de indeferimento expresso das reclamações graciosas de atos de liquidação adicional de imposto de selo relativos aos anos de 2005 e 2006 e juros compensatórios, tudo no valor global de 1.848.227,34 euros, apresentando, para o efeito, alegações nas quais conclui:

a) Acerca do pedido de revisão dos atos tributários

A). Posteriormente à apresentação da presente Impugnação, a A……… deduziu um pedido de revisão dos mesmos atos tributários ora em causa, nos termos do regime do artigo 78° da LGT, cuja junção aos autos a AT requereu, ao abrigo do nº 4 do artigo 111º do CPPT (aplicável por analogia àquele expediente procedimental). Como o pedido de revisão foi apresentado de forma tempestiva, devia este Tribunal ter-se pronunciado sobre o seu mérito: a intempestividade que, a verificar-se, afeta a Impugnação Judicial, não o afeta a ele.

B) Os tribunais devem decidir os pedidos administrativos que estejam nas condições do regime do nº 4 do artigo 111° do CPPT porque o que nele está em causa não é, de todo, a proibição de o pedido de revisão, a reclamação ou o recurso hierárquicos serem apresentados posteriormente a uma impugnação que tenha o mesmo objeto, sendo antes a lógica subjacente a da preferência absoluta do meio judicial de impugnação sobre os meios administrativos.

C) Assim, entende a Recorrente que a Sentença fez uma interpretação errada do n.° 2 do artigo 660° do CPC.

D) Se assim se não entender, então pelo menos se há de considerar que a Sentença deveria ter expressamente disposto a obrigação de a AT decidir, ela própria, o pedido de revisão - o qual, apresentado que foi em tempo, não há de ficar num limbo decisório, sem qualquer pronúncia acerca do seu mérito.

b) Acerca da tempestividade da Impugnação Judicial

E) Apesar de o prazo-regra para decisão do recurso ser de 60 dias (n.° 5 do artigo 66° do CPPT), a única regra expressa na legislação fiscal sobre a impugnação do seu indeferimento tácito é a do nº 5 do artigo 57° da LGT (seis meses, à data dos factos).

F) Nas regras do procedimento tributário, não subsiste qualquer omissão do tratamento do prazo de impugnação do indeferimento tácito do recurso hierárquico. Pelo contrário, ele está expressa e claramente tratado no n.° 5 do artigo 57° da LGT, do qual resulta, sem mais, que o prazo de impugnação judicial de todos os atos silentes autonomamente impugnáveis se conta do fim do prazo previsto no nº 1.

G) Esta norma abarca o ato de indeferimento tácito do recurso hierárquico e o legislador não sentiu necessidade de prever qualquer exceção para esse caso.

H) O legislador foi, nº 5 do artigo 57° da LGT, suficientemente explícito e completo sobre o regime que pretendeu instituir: o que dele resulta, sem margem para dúvidas, é que é sempre do fim daquele prazo de seis meses que se conta o de impugnação, sem qualquer estatuição expressa ou tácita no sentido de uma exceção para os casos em que existem prazos específicos de decisão.

I) A LGT esgota o tratamento da questão ora em causa: ela contém, no seu artigo 57°, todos os elementos indispensáveis ao tratamento da questão de saber qual o prazo de impugnação judicial do indeferimento tácito de um recurso hierárquico em matéria tributária e a partir de que momento se inicia a contagem do mesmo.

J). No artigo 66° do CPPT não se diz que o fim do prazo de 60 dias implica a formação do indeferimento tácito do pedido, ao contrário do que expressamente acontece, quanto aos recursos hierárquicos em sede de procedimento administrativo, no nº 3 do artigo 175° do CPA.

K). Deste modo, o princípio do nº 1 do artigo 109° do CPA não se aplica por referência a esse prazo de 60 dias.

L). Se o legislador tivesse pretendido estatuir uma exceção ao nº 5 do artigo 57° da LGT, moldando-o consoante o teor do nº 1 do artigo 109° do CPA, teria seguramente esclarecido, no artigo 66° do CPPT, que no fim dos 60 dias se formava uma presunção de indeferimento tácito, ou então, naquele mesmo artigo 57° da LGT, que a regra nele contida (a impugnação do indeferimento tácito conta-se do final do prazo de seis meses que a Administração tem para decidir pedidos configuráveis no âmbito do procedimento tributário) seria adaptável de acordo com eventuais prazos concretos de decisão que existissem na lei procedimental fiscal.

M). No procedimento tributário não é possível vigorar sem exceções o princípio segundo o qual se presume tacitamente indeferida uma pretensão dirigida a um órgão administrativo no fim do prazo fixado para a decisão da mesma. Por isso é que ele não foi transportado para o procedimento tributário nos exatos termos, absolutos e fechados, com que vigora no procedimento administrativo.

N) Seria impossível prever uma regra expressa como a do nº 1 do artigo 109° do CPA, e foi precisamente essa a razão pela qual o legislador a não fez constar da LGT ou de outro diploma.

O). O caso do indeferimento tácito do recurso hierárquico é um caso paradigmático dos motivos dessa impossibilidade: estando estabelecida a regra dos 60 dias para a decisão da Administração, o legislador sabe, porém, que nem sempre esta está sujeita ao dever de decidir nesse prazo (desde logo por causa das regras do princípio da decisão - artigo 56° do CPPT) e foi por isso que, conscientemente, se absteve de estatuir que o incumprimento do mesmo implicava a formação do indeferimento tácito.

P). Ora, se nem sempre a Administração tem o dever de decidir um recurso hierárquico no prazo de 60 dias, nunca o legislador poderia estabelecer uma presunção de indeferimento tácito no momento em que ele é ultrapassado. E foi por força desta volatilidade dos prazos impostos à Administração fiscal - que, por força da especial conformação do princípio da decisão no âmbito tributário, poderão variar de caso para caso, mesmo estando em causa o mesmo procedimento - que o legislador sentiu a necessidade de definir um mesmo momento para a formação da presunção de indeferimento tácito, comum a todo o procedimento tributário.

Q). Esse prazo, de seis meses (atualmente, de quatro), é um prazo ponderado, uma espécie de "meio-termo" que assegura um módico suficiente de defesa dos direitos de todos os intervenientes no procedimento tributário: os contribuintes ficam com a possibilidade de sujeitar a apreciação judicial uma sua situação tributária sem terem de esperar durante dois anos de silêncio administrativo; e a Administração, para a qual pode nascer um dever de decidir uma determinada pretensão apenas depois de ultrapassados dois anos de uma sua anterior pronúncia sobre a mesma questão, fica assim defendida contra a possibilidade de ver esse seu direito restringido desproporcionalmente (por exemplo, se numa situação desse tipo se estabelecesse a consequência da presunção do indeferimento tácito logo que passados 60 dias da apresentação de uma pretensão).

Termos em que se requer a V. Exas. que julguem o presente Recurso como procedente, com todas as devidas consequências legais resultantes do vício de anulabilidade invocado.

II. O MºPº emitiu o parecer que consta de fls. 724/727 no qual defende a improcedência do recurso.

III. Com interesse para a decisão foram dados como provados em 1ª instância os seguintes factos:

a) Notificada a Impugnante das liquidações adicionais de Imposto de Selo e juros compensatórios n°s 2009 00000023185 e 2009 00000023186 relativas aos anos de 2006 e 2005 no valor global de € 1.848.227,34 (€ 628.617,18 € 1.219.610,16) (cfr. processos de Reclamação Graciosa apensos);

b) A impugnante reclamou graciosamente das liquidações supra referidas em 17.06.2009, as quais vieram a ser indeferidas, por decisão datada de 05.02.2010 e que lhe foi notificada em 26.02.2010 (fls. 378 e 328 dos processos de Reclamação Graciosa apensos).

c) Em 23.03.2010, a Impugnante não se conformando com as decisões de indeferimento das Reclamações Graciosas deduzidas e a que se reporta a alínea anterior interpôs Recurso Hierárquico das mesmas (cfr. fls. 1 dos Recursos Hierárquicos apensos);

d) Os Recursos Hierárquicos a que se reporta a alínea anterior não foram objeto de decisão expressa (cfr. Recursos Hierárquicos apensos);

e) As presentes impugnações foram apresentadas, via fax, em 22.12.2010 (cfr. relatório de comunicação aposto no rosto das petições iniciais juntas aos presentes autos).

IV. Colhidos os vistos legais cumpre agora decidir.

A única questão a conhecer no presente recurso é a de saber se caducou ou não o direito de a recorrente impugnar os atos de indeferimento tácito dos recursos hierárquicos.

IV.1. A decisão recorrida entendeu que o direito de impugnar havia caducado invocando a seguinte argumentação:
A norma que fixa o prazo de impugnação do indeferimento tácito é a alínea d) do nº 1 do artº 102º do CPPT que estabelece que a impugnação será apresentada no prazo de 90 dias contados a partir da formação da presunção do indeferimento tácito.
Tendo os recursos sido apresentados em 23.03.2010 e considerando o prazo para a decisão - 60 dias artº 66º, nº 5 do CPPT -, a formação do indeferimento tácito ocorreu em 23.05.2010. Contados 90 dias sobre essa data, o prazo para impugnar terminava em 21.08.2010, pelo que a apresentação da impugnação em 22.12.2010 é extemporânea.

Neste mesmo sentido se pronunciou o MºPº no seu citado parecer de fls. 724/725)

IV.2. Diferente entendimento manifesta a recorrente, louvando-se nos seguintes argumentos:
Posteriormente à apresentação da presente impugnação deduziu um pedido de revisão dos mesmos atos tributários ora em causa, nos termos do regime do artigo 78° da LGT, cuja junção aos autos a AT requereu, ao abrigo do nº 4 do artigo 111º do CPPT (aplicável por analogia àquele expediente procedimental).
Como o pedido de revisão foi apresentado de forma tempestiva, devia este Tribunal ter-se pronunciado sobre o seu mérito: a intempestividade que, a verificar-se, afeta a impugnação Judicial, não o afeta a ele.
Os tribunais devem decidir os pedidos administrativos que estejam nas condições do regime do nº 4 do artigo 111° do CPPT porque o que nele está em causa não é, de todo, a proibição de o pedido de revisão, a reclamação ou o recurso hierárquicos serem apresentados posteriormente a uma impugnação que tenha o mesmo objeto, sendo antes a lógica subjacente a da preferência absoluta do meio judicial de impugnação sobre os meios administrativos.
Se assim se não entender, então pelo menos se há de considerar que a sentença deveria ter expressamente disposto a obrigação de a AT decidir, ela própria, o pedido de revisão - o qual, apresentado que foi em tempo, não há de ficar num limbo decisório, sem qualquer pronúncia acerca do seu mérito.
Por outro lado, apesar de o prazo-regra para decisão do recurso ser de 60 dias (n.° 5 do artigo 66° do CPPT), a única regra expressa na legislação fiscal sobre a impugnação do seu indeferimento tácito é a do nº 5 do artigo 57° da LGT a qual abarca o ato de indeferimento tácito do recurso hierárquico pelo que o legislador não sentiu necessidade de prever qualquer exceção para esse caso.

O legislador foi, nº 5 do artigo 57° da LGT, suficientemente explícito e completo sobre o regime que pretendeu instituir: o que dele resulta, sem margem para dúvidas, é que é sempre do fim daquele prazo de seis meses que se conta o de impugnação, sem qualquer estatuição expressa ou tácita no sentido de uma exceção para os casos em que existem prazos específicos de decisão.

A LGT esgota o tratamento da questão ora em causa no seu artigo 57°.
No artigo 66° do CPPT não se diz que o fim do prazo de 60 dias implica a formação do indeferimento tácito do pedido, ao contrário do que expressamente acontece, quanto aos recursos hierárquicos em sede de procedimento administrativo, no nº 3 do artigo 175° do CPA.

Deste modo, o princípio do nº 1 do artigo 109° do CPA não se aplica por referência a esse prazo de 60 dias.

Se o legislador tivesse pretendido estatuir uma exceção ao nº 5 do artigo 57° da LGT, moldando-o consoante o teor do nº 1 do artigo 109° do CPA, teria seguramente esclarecido, no artigo 66° do CPPT, que no fim dos 60 dias se formava uma presunção de indeferimento tácito, ou então, naquele mesmo artigo 57° da LGT, que a regra nele contida (a impugnação do indeferimento tácito conta-se do final do prazo de seis meses que a Administração tem para decidir pedidos configuráveis no âmbito do procedimento tributário) seria adaptável de acordo com eventuais prazos concretos de decisão que existissem na lei procedimental fiscal.

O caso do indeferimento tácito do recurso hierárquico é um caso paradigmático dos motivos dessa impossibilidade: estando estabelecida a regra dos 60 dias para a decisão da Administração, o legislador sabe, porém, que nem sempre esta está sujeita ao dever de decidir nesse prazo (desde logo por causa das regras do princípio da decisão - artigo 56° do CPPT) e foi por isso que, conscientemente, se absteve de estatuir que o incumprimento do mesmo implicava a formação do indeferimento tácito.

Ora, se nem sempre a Administração tem o dever de decidir um recurso hierárquico no prazo de 60 dias, nunca o legislador poderia estabelecer uma presunção de indeferimento tácito no momento em que ele é ultrapassado. E foi por força desta volatilidade dos prazos impostos à Administração fiscal - que, por força da especial conformação do princípio da decisão no âmbito tributário, poderão variar de caso para caso, mesmo estando em causa o mesmo procedimento - que o legislador sentiu a necessidade de definir um mesmo momento para a formação da presunção de indeferimento tácito, comum a todo o procedimento tributário.

Vejamos então se este entendimento colhe o apoio legal.

V. Em primeiro lugar cabe apreciar o alegado nas conclusões A) a D).

V.1. Refere a recorrente que tendo deduzido pedido de revisão oficiosa, posteriormente à apresentação da presente impugnação, o tribunal deveria dele ter conhecido, independentemente da intempestividade da impugnação, uma vez que aquele pedido era tempestivo.
Ou, pelo menos, deveria a sentença ter expressamente disposto a obrigação de a AT decidir ela própria, o pedido de revisão.

Ora, desde logo se vê que esta argumentação não tem o mínimo fundamento legal.
Com efeito, o pedido de revisão oficiosa é da competência da entidade referida no artº 78º, nº 1 da LGT, pelo que a ela deveria ter sido apresentado o respetivo pedido.

Por outro lado, ao tribunal tributário não cabe dar ordens ou instruções à Administração Tributária, pelo que não se compreende a conclusão da alínea D) no sentido de que “a sentença deveria ter expressamente disposto a obrigação de a AT decidir, ela própria o pedido de revisão…”

Acresce, por outro lado, que também não tem o mínimo apoio legal a pretensão de aplicação do disposto no artº 111º, nº 4 do CPPT.

Na verdade, tal norma estabelece o seguinte:

“Caso, posteriormente à receção da petição de impugnação, seja apresentada reclamação graciosa relativamente ao mesmo ato e com diverso fundamento, deve esta ser apensa à impugnação judicial, sendo igualmente considerada, para todos os efeitos, no âmbito do processo de impugnação”.

Ora, esta norma, conforme resulta claro da letra do preceito, não se aplica ao pedido de revisão oficiosa, mas apenas à reclamação graciosa e ao recurso hierárquico (v. nº 5 do mesmo artigo).

De qualquer forma, tendo o tribunal tributário concluído pela intempestividade da impugnação, ainda que, por hipótese de raciocínio, a tese da recorrente tivesse algum fundamento legal, o tribunal tinha esgotado o poder jurisdicional de mais nada podendo conhecer.

No entanto, sempre a recorrente pode pedir a remessa do pedido de revisão à entidade competente, pelo que este não fica sem decisão, como alegou na conclusão da alínea D).

Finalmente, diremos ainda que esta matéria, não tendo constituído objeto da decisão recorrida, parece nem sequer poder agora objeto de recurso.

Pelo que ficou dito, improcedem as citadas conclusões.

VI.2. Relativamente à outra questão - intempestividade da impugnação - diremos o seguinte:

VI.2.1. Conforme resulta do probatório supra, as reclamações graciosas foram indeferidas por decisão datada de 05.02.2010 (alínea b) do probatório).
Dessas reclamações a recorrente interpôs recursos hierárquicos em 23.03.2010, os quais não foram objeto de decisão expressa (alíneas c) e d) do probatório).
A recorrente deduziu impugnação do indeferimento tácito de tais recursos em 22.12.2010 (alínea e) do probatório).

VI.2.2. O artº 66º, nº 5 do CPPT determina que os recursos hierárquicos serão decididos no prazo máximo de 60 dias.
Por sua vez, o artº 102º, nº 1, alínea d) do mesmo diploma, estabelece que a impugnação será apresentada no prazo de 90 dias contados a partir dos factos seguintes:
d) Formação da presunção de indeferimento tácito.

Finalmente, os nºs 1 e 5 do artº 57º da LGT, em vigor à data dos factos, determinavam que o procedimento tributário devia ser concluído no prazo de seis meses, devendo a administração tributária e os contribuintes abster-se da prática de atos inúteis ou dilatórios, sem prejuízo de o incumprimento desse prazo, contado a partir da entrada da petição do contribuinte no serviço competente da administração tributária, fazer presumir o seu indeferimento para efeitos de recurso hierárquico, recurso contencioso ou impugnação judicial.

Estamos aqui então perante um prazo geral de indeferimento tácito que, como é sabido, consiste numa ficção jurídica destinada a permitir aos interessados reagir contenciosamente conta atos da administração quando não haja decisão no prazo legal.

O indeferimento tácito pressupõe, no entanto, um dever de decisão da sobre a pretensão do contribuinte, consagrando o artº 56º, nº 1 da LGT um dever geral de pronúncia da administração tributária sobre todos os assuntos da sua competência que lhe sejam apresentados pelos sujeitos passivos e outros interessados.
Este dever de pronúncia consubstanciar-se-á num dever de decisão, nos casos em que a peça apresentada vise uma tomada de posição da administração tributária sobre pretensões dos interessados, embora esse dever de decisão possa ser dispensado se esta se tiver pronunciado há menos de dois anos sobre pedido do mesmo autor com idêntico objeto e fundamentos ou tiver sido ultrapassado o prazo legal de revisão do ato tributário (artº 56º, nº 2 citado).
Por outro lado, como resulta do disposto no artº. 47º do CPPT, não existirá dever de decisão quando a mesma pretensão do interessado já tenha sido apreciada por dois órgãos integrantes da mesma administração tributária.

Ora, sendo certo que, no caso concreto, existia o dever de decisão e a Administração Tributária não se pronunciou no prazo de 60 dias, será que presunção de indeferimento tácito ocorreu no termo desse prazo, ou, como defende a recorrente, só se formou passados os seis meses previstos no nº 1 do artº 57º da LGT na redação então em vigor?

Acompanhando Diogo Leite de Campos e outros - LGT Anotada e Comentada, 4ª edição, 2012, pág. 484 diremos que tal presunção se forma decorridos os 60 dias referidos.

Com efeito, como escrevem aqueles autores: ”Se em lei especial for previsto prazo diferente do indicado no nº 1 deste artº. 57º para a conclusão do procedimento tributário, deverá ser esse o prazo a considerar para formação da presunção de indeferimento tácito, como se estabelece, com caráter genérico, no nº 1 do artº. 109º do CPA.
Um afloramento desta regra encontra-se no artº. 106º do CPPT, relativamente ao indeferimento tácito de reclamação graciosa.
Uma situação em que se prevê um prazo especial para decisão é a do artº. 66.°, nº 5, do CPPT, relativo aos recursos hierárquicos, que devem ser decididos no prazo de 60 dias. Por isso, decorridos esses 60 dias, o recurso presume-se tacitamente indeferido (artº. 175º, nºs 1 e 3, do CPA)”.

Também Lima Guerreiro - LGT Anotada, Rei dos Livros, pág. 264, embora sem apreciar expressamente esta questão e referindo-se ao artº 106º do CPPT, diz que a formação da presunção do indeferimento tácito deve coincidir com o termo do prazo do exercício do dever legal de decisão.

E bem se compreende que assim seja pois que, se o que se pretende é permitir ao interessado reagir contra a inércia da Administração, não faria sentido que, terminando o prazo para decidir em 60 dias, tivesse de se aguardar seis meses pela formação da presunção de indeferimento.

Sobre esta questão, a nível da doutrina, v. ainda Lopes de Sousa –CPPT Anotado e Comentado, 6ª edição, Vol. I, pág. 605 que refere que decorrido o prazo de 60 dias sem que haja sido tomada uma decisão, considera-se o recurso tacitamente indeferido (n.° 3 do mesmo artº. 175.° e n.° 5 do artº. 57.° da LGT, adaptado ao prazo aqui indicado). E acrescenta ainda este autor (pág. 606) que do texto do artº. 57.°da LGT ressalta que o prazo geral de seis meses que nele se estabelece não abrange os subprocedimentos de recurso hierárquico, pois prevê-se a presunção de indeferimento, inclusivamente, para efeitos de recurso hierárquico.
Assim, é de concluir que o prazo de formação da presunção de indeferimento previsto naquele artº. 57.°, n.° 5, da LGT se aplica apenas aos procedimentos tributários de 1º grau (incluindo nestes os de reclamação graciosa), pois é desses que é possível interpor “recurso hierárquico, recurso contencioso ou impugnação judicial”.

Neste mesmo sentido se pronunciou também o Acórdão deste STA, de 20.06.2007 – Processo nº 01015/06 (seguido depois pelo acórdão de 18.09.08 – Processo nº 0338/08), com a seguinte argumentação:

“Dispõe o artº 66º, nº 5 do CPPT que “os recursos hierárquicos serão decididos no prazo máximo de 60 dias”, findos os quais se considera o recurso tacitamente indeferido.
Por sua vez, estabelece o artº 57º, nº 1 da LGT que “o procedimento tributário deve estar concluído no prazo de seis meses, devendo a administração tributária e os contribuintes abster-se da prática de atos inúteis ou dilatórios”.
E no seu nº 5 determina que “sem prejuízo do princípio da celeridade e diligência, o incumprimento do prazo referido no n.º 1, contado a partir da entrada da petição do contribuinte no serviço competente da administração tributária, faz presumir o seu indeferimento para efeitos de recurso hierárquico, recurso contencioso (leia-se ação administrativa especial) ou impugnação judicial”.
Da análise deste último preceito legal ressalta, assim, à evidência que o prazo, geral, de seis meses que o mesmo estabelece não abrange os procedimentos (ou subprocedimentos) de recurso hierárquico, pois prevê-se a presunção de indeferimento, inclusivamente, para efeitos de recurso hierárquico.
Por isso, é forçoso concluir que a presunção de indeferimento aí prevista se aplica apenas aos procedimentos tributários de 1º grau, para além dos de reclamação graciosa, pois é desses que é possível interpor “recurso hierárquico, recurso contencioso ou impugnação judicial”.
Além de que e embora a liquidação seja um procedimento de primeiro grau, ele mostra-se excluído do predito normativo, que se refere expressamente à “entrada da petição do contribuinte…”, que não tem lugar na liquidação.
Ora, no caso em apreço, o que está em causa não é o prazo para formação de indeferimento tácito em procedimentos de cuja decisão cabe recurso hierárquico, mas sim de formação de indeferimento tácito do próprio recurso hierárquico, situação que não é abrangida pelo referido artº 57º, nº 5, da LGT.
Sendo assim e ao contrário daquilo que alega a recorrente, não há que falar aqui de primazia das normas da LGT sobre as normas do CPPT, uma vez que a formação de indeferimento tácito de recurso hierárquico não é regulada na LGT.
Assim, se conclui pela inexistência da invocada inconstitucionalidade orgânica, uma vez que não se verifica, pelas razões supra apontadas, qualquer incompatibilidade entre as normas do CPPT e da LGT.
O referido regime de formação de indeferimento tácito findo o prazo para decisão é também o regime geral previsto no CPA, como se conclui do seu artº 109º, n.º 1, em que se estabelece que “a falta, no prazo fixado para a sua emissão, de decisão final sobre pretensão dirigida a órgão administrativo competente confere ao interessado, salvo disposição em contrário, a faculdade de presumir indeferida essa pretensão, para poder exercer o respetivo meio legal de impugnação”.
O n.º 2 desse artº 109º, ao estabelecer que “o prazo a que se refere o número anterior é, salvo o disposto em lei especial, de 90 dias” reporta-se, como é óbvio, ao único prazo que aí se refere, que é o “prazo fixado para a...emissão” da decisão.
Este regime de coincidência do prazo para decisão com o prazo para a formação de indeferimento tácito é reafirmado pelo CPA a propósito do recurso hierárquico, como se constata pelo seu artº 175º, n.ºs 1, 2 e 3.
Não há, assim, no CPA um prazo para formação de indeferimento tácito diferente do prazo para decisão. O prazo para formação de indeferimento tácito, nos casos em que não se prevê o deferimento tácito, é sempre o prazo para decisão. Aliás, nem se compreenderia outra solução, pois, visando o indeferimento tácito permitir ao interessado reagir contra a inércia indevida da Administração, a solução lógica é que a possibilidade de impugnação surja no preciso momento em que essa inércia se torna indevida, isto é, no momento em que se constata que decorreu o prazo para decisão sem que ela tenha sido proferida.
Deste modo, afastada a aplicação do prazo de 6 meses previsto no artº 57º, nº 1 da LGT, deve entender-se que ocorreu o indeferimento tácito findo o prazo de 60 dias previsto no artº 66º, nº 5, do CPPT, que é o prazo legal de decisão do recurso hierárquico. “

Em face de todos os ensinamentos doutrinais e jurisprudenciais referidos podemos então concluir que o artº 57º, nºs 1 e 5 da LGT consagram um prazo geral de formação de indeferimento tácito, mas, nos casos em que a lei impõe prazos especiais para a decisão, como é o caso dos autos, aquela presunção se forma decorrido o prazo legal para a decisão.

Pelo que ficou dito, improcedem as conclusões das alíneas E) a Q) das alegações e, em consequência, o recurso, uma vez que na data da apresentação da impugnação estava ultrapassado o prazo constante do citado artº 102º do CPPT.

De todo o modo, dado que existe o dever de decisão por parte da Administração Tributária (artº 56º, nº 1 da LGT), sempre a recorrente poderá, eventualmente, impugnar a decisão expressa que vier a ser proferida, se esta lhe for desfavorável.

VII. Nestes e pelo exposto, nega-se provimento ao recurso, confirmando-se a decisão recorrida.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 30 de abril de 2013. - Valente Torrão (relator) – Ascensão Lopes – Pedro Delgado.