Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01222/12
Data do Acordão:03/06/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:LINO RIBEIRO
Descritores:DÍVIDA À SEGURANÇA SOCIAL
REVERSÃO
PRESCRIÇÃO
Sumário:I - A notificação dos potenciais revertidos para audiência prévia prevista no nº 4 do artigo 23º da LGT configura uma “diligência administrativa” tendente à cobrança das dívidas à segurança social.
II - Nesse caso, o facto interruptivo da prescrição consiste no conhecimento que teve o potencial revertido, através da notificação para audiência prévia, de que o credor tributário pretende exercer o direito à contribuição em dívida através da execução já instaurada contra o devedor originário.
III - Como a notificação é feita no âmbito de um processo de execução destinado à cobrança do crédito, a eficácia da causa interruptiva é permanente, só cessando com a decisão que lhe puser termo.
Nº Convencional:JSTA000P15428
Nº do Documento:SA22013030601222
Data de Entrada:11/09/2012
Recorrente:A...
Recorrido 1:INST DE GESTÃO FINANCEIRA DA SEGURANÇA SOCIAL SECÇÃO PROCESSOS BRAGA
Votação:UNANIMIDADE COM 1 DEC VOT
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1. A……, com os demais sinais nos autos, interpõe recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que julgou parcialmente procedente a oposição à execução instaurada contra a firma B……., Lda, contra si revertida, por contribuições e cotizações em dívida à segurança social relativas ao período de Setembro de 2000 a Junho de 2003.
Nas respectivas alegações, conclui o seguinte:
1ª - O Tribunal “a quo” considerou parcialmente procedente a oposição do Recorrente, considerando prescritas as dívidas tributárias em execução anteriores a Junho de 2001 (exclusive) e improcedente o demais peticionado. É sobre esta improcedência parcial que versa o presente recurso.
2ª - Assim sendo, são três as questões que se levantam:

a) Saber se a citação da reversão efectuada ao Recorrente é nula por conter elementos diferentes do projecto de reversão ou, no limite, se ocorreu preterição de formalidades legais;
b) Saber se o acto que ordenou a reversão contra o Recorrente é nulo nos termos do art. 133º nº 2 d) do Código de Procedimento Administrativo (CPA) ou anulável nos termos do disposto nos art. 125º nº 2 e 135º do mesmo código, por se encontrar inquinado por vício de falta de fundamentação ou insuficiência da fundamentação legalmente exigida;
c) Que sejam consideradas prescritas as dívidas tributárias em execução posteriores a Junho de 2001 (inclusive)
3ª - Antes de mais o Recorrente não coloca em causa a matéria de facto dada como provada em 1ª instância.
4ª - O Tribunal “a quo” considerou que a questão levantada pelo corrente nos artº 10º a 14º da oposição não se pode enquadrar como nulidade da citação mas sim como irregularidade, e que sempre o Recorrente poderia ter requerido a notificação dos elementos em falta.
5ª - Antes de mais entende o Recorrente que a possibilidade de requerer elementos em falta não é uma obrigação dos contribuintes mas sim um direito que pode ou não ser usado, tal como resulta da leitura do art. 37º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT). Estando a Administração Tributária vinculada ao princípio da legalidade compete-lhe dar cumprimento às normas legais e não esperar pela reacção dos contribuintes no sentido de os mesmos corrigirem os erros praticados pela Administração.
6ª - Acresce que, no articulado da oposição, o Recorrente não levanta somente a questão da reversão vir apenas acompanhada de uma certidão quando deveria de vir acompanhada de duas. O Recorrente levanta ainda a questão dos valores constantes da decisão de reversão serem diferentes daqueles que constam no projecto que lhe foi remetido para exercer o direito de audição. (VD. artº 11º da oposição)
7ª - Pelo que o Recorrente mantém que a citação que lhe foi feita é nula.
8ª - Nos art. 15º a 31º da oposição o Recorrente colocou em causa a validade do despacho que ordenou a reversão devido a ausência de fundamentação legalmente exigida. O Tribunal “a quo” não deu razão ao Recorrente alegando que tal despacho contém, ainda que de forma sucinta, os elementos essenciais que permitiram ao Recorrente saber a razão porque lhe era exigido o pagamento das dívidas exequendas.
9ª - Em coerência com o alegado na Oposição o Recorrente mantém que a citação que recebeu não se encontrava acompanhada de qualquer fundamentação apta a justificar a legalidade da reversão efectuada uma vez que tal citação não contém qualquer espécie de fundamentação, quer quanto aos seus pressupostos quer quanto à sua extensão.
10ª - Na verdade, as menções constantes do campo designado “Dos fundamentos” consistem unicamente na reprodução truncada do n.º 2 do art.ºs 23º e da alínea b) do n.º 1 do art. 24, ambos da Lei Geral Tributária (LGT) e em considerações meramente conclusivas.
11ª - Nem é, aliás, referido se o ora Recorrente foi gerente nominal, ou de direito, da devedora originária, nem apresentados quaisquer factos ou indícios que legitimem a conclusão de que exerceu a gerência de facto da sociedade devedora originária.
12ª - E, finalmente, não é devidamente fundamentada a consideração da inexistência ou insuficiência de bens na esfera da sociedade devedora originária para garantir o pagamento da dívida exequenda.
13ª - Como tal, o acto que determinou a reversão da execução em crise contra o ora Recorrente encontra-se inquinado pelo vício de ausência da fundamentação legalmente exigida ou por insuficiência da fundamentação, pelo que está ferido da nulidade prevista no art.º 133º, n.º 2, alínea d) do Código do Procedimento Administrativo (CPA). Ou é, no limite, anulável, por força do disposto nos art.ºs 135º e 125º, n.º 2 do citado CPA.
14ª - Caso seja outro o douto entendimento deste Tribunal Superior entende o Recorrente que se encontram prescritas as dívidas tributárias em execução posteriores a Junho de 2001 (inclusive). Vejamos,
15ª - Tal como consta na douta sentença ora em recurso é inequívoco que o prazo de prescrição das dívidas em causa é de cinco anos. Apesar disso o Tribunal “a quo” considerou tais dívidas não prescritas com os seguintes fundamentos que se transcrevem:
Regressando ao caso sub judice, verifica-se que as causas interruptivas de que há conhecimento ocorreram em 18 de Fevereiro de 2005 e 15 de Setembro de 2005 com a citação do devedor originário, e 15 de Julho de 2006 com a notificação do Oponente de despacho prévio à reversão (qualquer diligência administrativa, realizada com conhecimento do responsável pelo pagamento, conducente à liquidação ou à cobrança). Face ao que supra se referiu impõe-se concluir que relativamente às contribuições e cotizações em dívida, anteriores a Junho de 2001 (exclusive) a notificação do revertido ocorreu depois de decorridos 5 anos pelo que se encontram prescritas. No que concerne às restantes elas não se encontram prescritas
16ª - É óbvio que o Recorrente não se conforma com tal fundamentação uma vez que entende que se encontram prescritas todas as quantias em execução.
17ª - Desde logo, e quanto à citação da devedora originária, a mesma não produz qualquer efeito interruptivo relativamente ao Recorrente uma vez que a citação deste, em processo de execução fiscal foi efectuada após o 5º ano posterior ao da liquidação (6 de Julho de 2010) – Artº 48º nº 3 da Lei Geral Tributária (LGT).
18ª - Relativamente à notificação do Recorrente para exercer o direito de audição tal acto não tem efeito interruptivo da prescrição uma vez que, nessa data, o Recorrente ainda não era executado nem responsável pelo pagamento. Só o passou a ser após a decisão final da reversão, ou seja, com a citação ocorrida em 6 de Julho de 2010.
19ª - Pelo que entende o Recorrente que o primeiro e único facto interruptivo relativamente a si ocorreu em 6 de Julho de 2010.
20ª - Assim sendo, nessa data já tinham decorrido mais de 5 anos relativamente a todas as dívidas exequendas.
21ª - Caso seja outro o douto entendimento deste Tribunal Superior, considerando que a notificação para o exercício do direito de audição constituiu facto interruptivo, mesmo assim as dívidas encontram-se todas prescritas.
22ª - Nos termos do artº 49º nº 3 da LGT a interrupção tem lugar uma única vez, com o facto que se verificar em primeiro lugar.
23ª - Ora, seguindo a orientação da douta sentença, as causas de interrupção ocorreram em 18/02/2005 e 15/09/2005, com a citação da executada, e 15/07/2006 com a notificação do ora Recorrente para o exercício do direito de audição.
24ª - Uma vez que a citação da devedora originária não produz efeito interruptivo relativamente ao Recorrente, resta-nos, de acordo com os fundamentos da douta sentença, a data da notificação para o exercício do direito de audição.
25ª - Acontece que o Tribunal “a quo” contou mal o prazo de cinco anos. Com efeito o Tribunal “a quo” deveria ter contado o prazo desde 15/07/2006 até à data da prolação da sentença e não até à data da entrada da oposição.
26ª - E isto porque, sendo a prescrição de conhecimento oficioso e invocável a todo o tempo, deveria o Tribunal “a quo” ter contado o prazo até à data da prolação da sentença (26 de Junho de 2012) prazo esse que é de cinco anos e onze meses.
27ª - Assim sendo, e em resumo, ainda que se entenda que a notificação para o exercício do direito de audição interrompeu o prazo prescricional, à data da prolação da sentença já tinham decorridos mais de cinco anos, pelo que todas as dívidas se encontram prescritas.
28ª - Pelo que a douta sentença violou o disposto nos artº 23º nº2 e 4, 24º nº 1, 48º nº 3 e 49º nº 3 todos da LGT, 37º nº1 e 204º nº1 do CPPT, 125º nº2, 133º nº2 d) e 135º do CPA, 63º nº2 da Lei 17/2000 de 8/8 e 49º nº 1 da Lei 32/2002 de 20/12.

1.2. Não foram apresentadas contra-alegações.

1.3. O Ministério Público junto do STA emitiu parecer no sentido do recurso não merecer provimento.

2. A sentença recorrida seu por assente os seguintes factos:

1. As dívidas exequendas revertidas contra o oponente referem-se a contribuições e cotizações para a Segurança Social relativas aos períodos de Setembro de 2000 a Maio de 2003;
2. No dia 14/2/2005, para cobrança de cotizações relativas ao período de Setembro de 2000 a Junho de 2003, com base na certidão de dívida n.º 1739/2003, emitida a 17/11/2003, foi instaurado o processo de execução fiscal n.º 0301200501002465;
3. No dia 17/8/2005, para cobrança de contribuições relativas ao mesmo período (Setembro/2000 a Junho/2003), com base na certidão de dívida n.º 1738/2003, emitida a 30.10.2003, foi instaurada a execução fiscal n.º 0301200501011049;
4. A sociedade devedora foi citada para a execução na execução nº 0301200501002465, em 18 de Fevereiro de 2005 e foi a sociedade citada para a execução nº 0301200501011049, a 15 de Setembro de 2005;
5. Foi o oponente revertido notificado para, querendo, exercer o direito de audição prévia, a 15 de Julho de 2006 (3º dia após a notificação), sendo-lhe entregue cópia do projecto de decisão/reversão - cfr. fls. 28, 29 e 31, do apenso, que aqui se dá por integralmente reproduzido;
6. Os processos executivos estiveram parados desde então até 25/6/2010, data em que se procedeu à apensação na mesma data, 25/06/06 foi proferido despacho de reversão contra o Oponente.
7. O oponente foi citado da reversão a 6/7/2010.

3.1. O recorrente invocou como causa da oposição à execução fiscal contra si revertida três fundamentos: (i) violação do direito de audição, relativamente a parte da dívida exequenda ou nulidade de citação, por ter sido surpreendido com elementos novos sobre os quais não foi ouvido; (ii) falta de fundamentação do acto de reversão; (iii) prescrição da dívida exequenda.
A sentença recorrida julgou improcedentes os dois primeiros fundamentos, considerando que o despacho de reversão contém os elementos suficientes e que o projecto de decisão da reversão é bem explícito quanto à identificação das certidões em dívida, não sendo a oposição o meio adequado para se invocar a nulidade da citação, e julgou prescritas as dívidas anteriores a Junho de 2001, uma vez que a notificação do recorrente para o exercício da audiência prévia à reversão ocorreu cinco anos após a data em que essas contribuições deveriam ser pagas.
O recorrente manifesta desacordo com a sentença relativamente aos três fundamentos, alegando que: (i) a citação é nula, porque a decisão da reversão foi acompanhado apenas de uma certidão de dívida e porque os valores constantes da reversão são diferentes do projecto que lhe foi remetido para exercer o direito de audição; (ii) o acto de reversão é inválido, por falta de fundamentação, dado não indicar se o recorrente é gerente de direito ou de facto, nem se fundamenta a inexistência ou insuficiência de bens; (iii) também as dívidas posteriores a Junho de 2001 estão prescritas, porque a notificação para exercer o direito de audiência não é um facto interruptivo da prescrição, e mesmo que o fosse, na data em que foi emitida a sentença já tais dívidas estavam prescritas.
Mas em nenhum destes argumentos, que nada de novo trazem relativamente ao que foi apreciado na decisão recorrida, se pode dizer que o recorrente tem razão.
Começando pela questão da prescrição, aquela cuja procedência inutilizaria o conhecimento das demais, perante o disposto no nº 3 do artigo 63º da Lei nº 17/2000, de 8/8, tem que se considerar que a notificação do potencial revertido para exercer o direito de audição no incidente de reversão é um facto interruptivo da prescrição.
As contribuições em causa são apenas as devidas desde Julho de 2001 a Junho de 2003. Nessas datas, o regime de prescrição desse tipo de dívidas constava do artigo 63º da Lei nº 17/2000, de 8/8, o qual foi posteriormente reproduzido na Lei nº 32/2002 de 20/12 (que revogou aquela) e no artigo 60º da Lei nº 4/2007, de 16/1 (que revogou esta). Quer nessas normas, quer no actual regime (cfr. art. 187º do Código dos Regimes Contributivos da Sistema Providencial da Segurança Social – Lei nº 110/09 de 16/9), a obrigação do pagamento das contribuições à segurança social prescrevem no prazo de cinco anos a contar da data em que deveriam ter sido cumpridas e «o prazo de prescrição interrompe-se por qualquer diligência administrativa, realizada com conhecimento do responsável pelo pagamento, conducente à liquidação ou à cobrança».
A notificação dos potenciais revertidos para audiência prévia prevista no nº 4 do artigo 23º da LGT configura uma “diligência administrativa” tendente à cobrança da divida exequenda. Na verdade, a reversão é um instituto da execução fiscal através do qual se efectiva a responsabilidade subsidiária por dívidas de outrem, no âmbito do processo de execução instaurado contra o dever originário. Como refere Paulo Marques, «a reversão traduz-se numa manifestação do princípio da economia processual, possibilitando a penhora e a venda coerciva subsequente de todos os bens necessários à satisfação do crédito no âmbito do mesmo processo de execução, não existindo consequentemente a necessidade da instauração de outro, embora este passa a ser dirigido contra pessoas que não estão indicadas na certidão de dívida» (cfr. Responsabilidade Tributária dos Gestores e dos oficiais de Contas, Coimbra Editora, pág. 55).
Apesar de se tratar de uma formalidade prévia à tomada da reversão da execução, a notificação para o exercício do direito de audição não deixa de confrontar o responsável subsidiário com a possibilidade de cobrança coerciva de uma dívida, com o seu «chamamento à execução», em virtude da inexistência ou insuficiência de bens penhoráveis do devedor originário. Trata-se, assim, de uma “diligência administrativa” que, além de concretizar o princípio da participação dos contribuintes nas decisões que os afectem, co-responsabilizando-os pela decisão de reversão, também dá conhecimento da pretensão de se executar a contribuição em dívida no âmbito do mesmo processo executivo que foi instaurado contra o devedor originário. Se a notificação para audiência prévia à reversão cumpre a função de dar a conhecer a intenção de se exercer a pretensão executiva, então também se lhe deve atribuir eficácia interruptiva do prazo legal para o exercício do direito à contribuição. O facto interruptivo da prescrição consiste no conhecimento que teve o potencial revertido, através da notificação para audiência prévia, de que o credor tributário pretende exercer o direito à contribuição em dívida através da execução já instaurada contra o devedor originário.
A jurisprudência deste Tribunal tem integrado no conceito de “diligências administrativas” a notificação para audição do revertido, atribuindo-lhe eficácia interruptiva. Diz-se que, para efeito da norma acima transcrita, diligências administrativas «serão todas as que ocorram nos processos administrativos de liquidação e nos processos de execução fiscal, conducentes à liquidação e cobrança da dívida, de que venha a ser dado conhecimento ao devedor (como a citação, a penhora, a notificação do responsável subsidiário para se pronunciar sobre a possibilidade de reversão e a notificação do acto quer a decide)» (cfr. acs. de 1/10/2008, rec. nº 0661/08, de 6/11/2008, rec. nº 0828/08, de 12/11/2008, rec. nº 0588/08, de 7/1/2009, rec. nº 0835/08, de 25/2/2009, rec. nº 047/09, de 11/3/2009, rec. nº 050/09, de 11/3/2009, rec. nº 0219/08).
Assente que a notificação para audiência prévia à reversão constitui uma causa de interrupção da prescrição, impõe-se determinar os efeitos dessa interrupção, até porque ocorreram outros actos interruptivos com potencialidade para influenciar a contagem do prazo de prescrição.
Um dos factos susceptíveis de interromper o prazo de prescrição foi a citação do devedor originário, que ocorreu em 18 de Fevereiro e 15 de Setembro de 2005 em cada uma das execuções. Como o nº 2 do artigo 48º da LGT, supletivamente aplicável às dívidas à segurança social, estabelece que as causas de suspensão ou interrupção aproveitam igualmente ao devedor principal e aos responsáveis solidários ou subsidiários, poderia dizer-se que naquelas datas também se interrompeu o prazo de prescrição relativamente ao recorrente. E se assim fosse, então as posteriores interrupções seriam irrelevantes, porque o novo prazo de prescrição só se iniciaria com o termo do processo executivo, tal como se dispõe no nº 1 do artigo 327º do Código Civil.
Simplesmente, essas citações não produziram efeito relativamente ao recorrente, porque ele não foi citado até ao termo do 5º ano posterior ao da liquidação, condição necessária para que o efeito interruptivo se produzisse. O nº 3 do art. 48º da LGT impõe, como condição da produção do efeito interruptivo da citação do devedor originário relativamente ao devedor subsidiário, que este seja citado no prazo de cinco anos após a liquidação. Se esta citação não se verificar, nenhum dos efeitos próprios do acto interruptivo se produzem, seja o de eliminar o tempo decorrido, seja o de transformar o efeito interruptivo em suspensivo em consequência da paragem do processo por prazo superior a um ano, seja ainda o de só se reiniciar o novo prazo no termo do processo.
Como o recorrente foi citado apenas em 6/7/2010, muito para além dos cinco anos posteriores à liquidação da quantia exequenda, não se produziu o efeito interruptivo da citação do devedor originário e por conseguinte reassume eficácia interruptiva a notificação para audiência prévia à reversão.
Outra circunstância que eventualmente poderia alterar a contagem do prazo de prescrição foi a paragem do processo de execução desde 15/7/2006 até 25/6/2010 (nº 6 do probatório). Mas o nº 2 do artigo 49º da LGT, em que se previa a cessação do efeito interruptivo por efeito de paragem do processo por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte, foi revogado pela Lei nº 53-A/2006 de 29/12, ressalvando-se apenas os casos em que à data da sua entrada em vigor – 1-1-2007 – se havia completado um ano de paragem (arts. 90º e 91º). Ora, como a paragem do processo se iniciou em 15/7/2006, na data da entrada em vigor daquela lei ainda não tinha decorrido um ano de paragem do processo, pelo que o efeito interruptivo não chegou sequer a transformar-se em efeito suspensivo.
O novo efeito interruptivo apenas ocorreu em 6/7/2010 com a citação do recorrente para a execução. Como no regime instituído pela Lei nº 53-A/2006, os factos com potencial efeito interruptivo que ocorram após a primeira interrupção deixam de ter efeito, a recorrente considera que na data da sentença já havia decorrido mais de cinco anos sobre o início do novo prazo prescricional.
Efectivamente assim seria, se o primeiro facto interruptivo tivesse por único efeito inutilizar o tempo prescricional anteriormente decorrido. Mas, como o acto foi praticado no âmbito de um processo executivo, visando a modificação subjectiva da instância, por aplicação da regra do nº 1 do artigo 327º do Código Civil, a causa interruptiva dura até ao termo desse processo. Assim, o novo prazo prescricional só começa a correr após o termo do processo, uma vez que tem que se admitir que o titular do direito não está inactivo enquanto o processo está pendente. Havendo processo destinado à cobrança do crédito, a eficácia da causa interruptiva é permanente, só cessando com a decisão que lhe puser termo. Por isso, quanto ocorreu o segundo acto interruptivo ainda não se havia iniciado o novo período prescricional.
Dada a eficácia permanente da primeira causa interruptiva, as dívidas posteriores a Julho de 2001 ainda não prescreveram.

3.2. A recorrente discorda na decisão tomada quanto à invocada “nulidade de citação”, por continuar a entender que a decisão da reversão foi acompanhada apenas de uma certidão de dívida e que os valores dela constantes são diferentes do projecto que lhe foi remetido para exercer o direito de audição.
A haver irregularidade qualificada como nulidade da citação, a mesma teria que ser suscitada em sede de execução e não como fundamento de oposição. Mas o que se depreende da alegação do recorrente é que o “acto de reversão” é inválido pelo facto de não vir acompanhado de uma das certidões de dívida e conter valores diferentes dos constantes do projecto de decisão. Nesse sentido, a oposição é o meio processual adequado a fazer valer o erro nos pressupostos de facto ou o vício de procedimento, como inicialmente alegou.
Mas nem se verifica uma coisa nem outra: o projecto da decisão de reversão constante de fls. 28 a 29, refere de forma clara e distinta as duas certidões de dívida, as quais foram notificadas ao recorrente através das cartas registadas constantes de fls. 30 e 31; e o despacho de reversão refere-se aos dois processos executivos, ordenando mesmo a sua apensação, e a citação/notificação da reversão foi acompanhadas das duas certidões, onde se discriminam os períodos das contribuições em divida e o respectivo valor, conforme de vê de fls. 38 a 40 do p.a. apenso. É verdade que o documento que materializa a citação contém um valor em dívida diferente do indicado pelas certidões, mas apenas porque se refere à soma do valor de cada uma das certidões que a acompanham e não porque haja qualquer erro de cálculo das liquidações a que se referem.
Perante os factos atestados por esses documentos, não se pode concluir que foi preterido o direito de audição ou que a reversão é inválida por erro nos pressupostos de facto.

3.3. De igual modo, se pode considerar que o despacho de reversão não dá a compreender a um destinatário razoável as razões de facto e de direito que estão na sua base.
O recorrente queixa-se que o despacho não indica se é gerente de direito ou de facto, nem se fundamenta a inexistência ou insuficiência de bens. Mas lendo esse despacho, constante de fls. 34 do p.a apenso, embora de forma sucinta, nele se refere que foi possível apurar que o recorrente é o responsável subsidiário da executada “tendo desenvolvida actividade de gerente no período a que respeita a dívida exequenda” e que, «ordenadas que foram as buscas», os bens registados em nome da executada “são manifestamente insuficientes face ao valor da dívida exequenda”.
Ora, estes factos, em conjunto com a invocação das normas legais que fundamento a reversão (24º e 23º da LGT, 153º do CPPT), permitem ao responsável pela gestão de uma empresa conhecer a razão pela qual é chamado a responder pelas dívidas geradas no tempo em que desenvolveu tal actividade. A expressão «actividade de gerente» só pode ser entendida no sentido de gerente que desenvolve acções de gerência e não no sentido de mero gerente de direito. De igual modo, sabido que foram ordenadas buscas e que os bens encontrados são insuficientes, está-se em condições de saber que a execução só se direcciona contra o gerente dada a escassez de bens no património da devedora originária.
Não há, pois, qualquer violação da regra do artigo 77º da LGT sobre a fundamentação dos actos em matéria tributária e da norma do nº 4 do artigo 23º sobre a declaração fundamentadora da reversão.
4. Pelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.
Custas pelo recorrente.

Lisboa, 6 de Março de 2013. – Lino Ribeiro (relator) - Dulce Neto (voto a decisão, com distinta fundamentação quanto à questão da prescrição, conforme declaração anexa) – Isabel Marques da Silva.

Declaração de voto
A questão da prescrição das contribuições em causa neste recurso - Julho de 2001 a Junho de 2003 - tem de ser vista, como o foi e bem neste acórdão, à luz do regime de prescrição constante do art.º 63º da Lei 17/2000, de 8 de Agosto, análogo ao que veio posteriormente a ser consagrado na Lei n.º 32/2002 de 20.12, na Lei n.º 4/2007, de 16.01, bem como na actual Lei n.º 110/09, de 16.09, segundo o qual «o prazo de prescrição interrompe-se por qualquer diligência administrativa, realizada com conhecimento do responsável pelo pagamento, conducente à liquidação ou à cobrança».
Deste modo, e sabido que só o que não está especificamente regulado neste regime especial de prescrição das dívidas à segurança social será regulado pelas regras constantes da Lei Geral Tributária e pelas regras gerais da prescrição das obrigações constantes do Código Civil, é evidente que não constituirão actos interruptivos do prazo de prescrição destas dívidas os actos que, de forma divergente, encontrem previsão no Código Civil e na Lei Geral Tributária (como a instauração de impugnação, reclamação, recurso hierárquico e revisão), mas, tão só, as “diligências administrativas”, realizadas com conhecimento do responsável pelo pagamento, conducentes à liquidação ou à cobrança da dívida.
E como tem sido repetidamente afirmado pela jurisprudência, “diligências administrativas” serão todas as diligências que ocorram tanto no processo conducente à liquidação como no processo conducente à cobrança (voluntária ou coerciva) da dívida, de que venha a ser dado conhecimento ao titular - como seja, por exemplo, a notificação do responsável subsidiário para se pronunciar sobre a possibilidade de reversão, a notificação do acto de reversão, a citação, a notificação da penhora de bens.
Quanto aos efeitos destes actos interruptivos, eles terão de ser os previstos no Código Civil, uma vez que nem o regime especial das contribuições à segurança social nem a actual Lei Geral Tributária dispõe sobre a matéria.
Com efeito, ao contrário do que constava do CPT e da própria LGT até à revogação do n.º 2 do seu art.º 49º pela Lei n.º 53-A/2006, a Lei Geral Tributária nada dispõe actualmente sobre os efeitos da interrupção da prescrição das dívidas tributárias, isto é, se os actos interruptivos têm efeito instantâneo ou duradouro, havendo, portanto, que aplicar o regime que, para a generalidade das obrigações, o legislador consagrou no Código Civil nos artigos 326º e 327º.
Ora, não há qualquer suporte para afirmar que as diligências administrativas constituam factos interruptivos duradouros, isto é, cujos efeitos se prolongam no tempo e que só cessam quando findar o processo em que foram praticados - sejam os processos conducente à liquidação sejam os processos conducentes à cobrança da dívida.
Trata-se, a meu ver, de actos de interrupção instantâneos, que determinam o imediato início de um novo prazo prescricional, por aplicação da regra geral contida no art.º 326º do C.Civil, segundo o qual «a interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do acto interruptivo, sem prejuízo do disposto nos n.º s 1 e 3 do artigo seguinte».
Esta é a regra geral, do efeito instantâneo da interrupção, que só admite como excepção (efeito duradouro) a situação prevista no art. 327º do C.Civil.
Com efeito, por força da parte final do art.º 326º do C.Civil, o acto interruptivo só tem efeito duradouro quando se trata de um acto de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, pois o n.º 1 do art.º 327º dispõe que «Se a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo», com o que se pretendeu instituir um prolongamento dos efeitos da interrupção até ao julgamento da causa, só aí começando a contar-se o novo prazo.
Trata-se, porém, exclusivamente, de casos de citação ou notificação em acção judicial, face ao exercício já judicial do direito pelo credor. São actos interruptivos judiciais, praticados num processo judicial, sendo certo que este art.º 327º está necessária e exclusivamente relacionado com o art. 323º do C.Civil onde se prevê como acto interruptivo a «citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, se seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente» (n.º 1 do art.º 323º) e com o art.º 324º (compromisso arbitral).
Como refere Ana Filipa Morais Antunes, in “Prescrição e Caducidade”, Coimbra Editora, pág. 161, «Estão em causa hipóteses de interrupção fundadas no exercício judicial do direito pelo respectivo titular e que justificam, por isso, um regime especial. Uma vez que os actos interruptivos judiciais desencadeiam um processo durante o qual se pode admitir que o titular não está inactivo, deverá manter-se a eficácia da interrupção, só começando o prazo a correr a partir do momento em que transitar em julgado a sentença que puser termo ao processo.»
Ou como esclarecia Vaz Serra (in “Prescrição Extintiva e Caducidade”, BMJ, nº 106, p. 248), em termos de saber em que momento começa a correr o novo prazo prescricional:
«Há, por conseguinte, que apurar quando cessa a eficácia da causa interruptiva, ou, o que é o mesmo, qual a duração dessa eficácia.
A este respeito, pode a eficácia da causa interruptiva ser instantânea ou permanente, conforme essa eficácia se produz em dado momento, cessando logo e começando, portanto, logo também o novo período prescricional, ou dura por um lapso de tempo mais ou menos longo, findo o qual se inicia o novo período da prescrição.
Eficácia instantânea tem o reconhecimento, ou o acto da constituição em mora do devedor; deriva daí que do mesmo momento começa a correr um novo período prescricional.
Eficácia permanente têm os actos interruptivos judiciais, dado que dão início a um processo, durante o qual pode admitir-se que o titular não está inactivo e deve, assim,
manter-se a eficácia da interrupção. A prescrição só recomeçará a correr do momento em que transita em julgado a sentença que põe termo ao processo».
Por conseguinte, só no caso de a prescrição ter sido interrompida pelo acto de citação para acção judicial (ainda que de natureza executiva) ou de notificação para pagamento de dívida em cobrança executiva, se poderia defender que a cessação da eficácia do acto interruptivo era diferida para a data do trânsito em julgado da sentença que pusesse termo a esse processo judicial executivo em curso corra contra este devedor.
Ora, não é esse, seguramente, o caso da diligência de carácter administrativo aqui em causa, de notificação de um possível responsável subsidiário para que ele possa exercer, querendo, o direito de audição prévia com vista a colaborar na elaboração da decisão da eventual reversão da execução contra si. Reversão que poderá nem sequer suceder, bem podendo acontecer que o processo judicial executivo nunca chegue a reverter contra ele, em virtude o órgão da execução, após aquela audição, concluir que não o pode responsabilizar pela dívida e que, por isso, não pode dar início a qualquer processo judicial contra ele.
Aliás, a notificação para exercer o direito de audição prévia ao acto de reversão não constitui, ainda, uma notificação para intervir no processo de execução (ao contrário do que sucede com o acto de citação), mas uma mera notificação num procedimento administrativo de natureza tributária que corre no processo executivo e que precede o acto administrativo de reversão. Pelo não creio que se possa defender a aplicação do artigo 327º do C.Civil, que, como resulta do seu teor e tem sido interpretado pela doutrina, se destina apenas aos casos de chamamento para uma acção judicial, face ao exercício já judicial do direito pelo credor.
Neste contexto, tendo a notificação para exercer o direito de audição sido efectuada em 15/07/2006, e dado o efeito instantâneo deste acto interruptivo, começou de imediato a correr novo prazo prescricional de 5 anos, que terminava, em princípio, na ausência de causas suspensivas, no dia 15/07/2011.
Porém, tendo em conta que ele foi citado para a execução no dia 6/07/2010, antes do decurso do novo prazo de 5 anos, conclui-se que a prescrição ainda não ocorreu - ainda que se considere aplicável a estas dívidas a norma contida no nº 3 do art. 49º da LGT (que diz que a interrupção tem lugar uma única vez), pois esta norma só foi introduzida pela Lei nº 53-A/2006, de 29.12, que entrou em vigor em 1/01/2007, pelo que não se encontrava impedida a relevância deste acto interruptivo que constitui o 1º acto na vigência da nova redacção da norma.
Dulce Manuel Neto.