Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:061/11
Data do Acordão:03/17/2011
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:GRADUAÇÃO DE CRÉDITOS
IVA
PRIVILÉGIO CREDITÓRIO
PRIVILÉGIO MOBILIÁRIO
Sumário:Sendo o único bem penhorado na execução um bem imóvel e não gozando o IVA exequendo senão de privilégio mobiliário geral (cfr. a primeira parte do n.º 1 do artigo 736.º do Código Civil), terá de ser graduado a par dos demais créditos exequendos que apenas gozam da garantia que lhes é conferida pela penhora (cfr. o n.º 1 do artigo 822.º do Código Civil), sobre eles não prevalecendo.
Nº Convencional:JSTA000P12715
Nº do Documento:SA220110317061
Recorrente:MP
Recorrido 1:A... , FAZENDA PÚBLICA E OUTROS
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório -
1 – O Ministério Público recorre para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, de 18 de Outubro de 2010, tal como rectificada por despacho de 21 de Outubro de 2010 (a fls. 63 e 64 dos autos), na parte em que graduou em 3.º lugar, precedendo os demais montantes do crédito exequendo IRS de 2004 e coimas, garantidos pela penhora, incluindo os juros, o crédito exequendo de IVA de 2005 e 2006, por gozar de privilégio mobiliário geral, sem qualquer limite temporal e juros.
O Ministério Público recorrente termina as suas alegações de recurso apresentando as seguintes conclusões:
a) A sentença recorrida, proferida a 18.10.2010, graduou correctamente os créditos exequendos e reclamados antes de ser determinada a sua correcção, ao abrigo dos art.ºs 666º, nº2 e 667º, nº1, ambos do C.P.C., por despacho de 21.10.2010, apesar de nela se ter consignado que o IVA beneficiava de privilégio imobiliário, por manifesto lapso;
b) Designadamente, no que se refere ao crédito exequendo de IRS de 2004, IVA de 2005 e 2006 e coimas, que colocou, a par, em 3.º lugar, tendo em conta que o IRS não se inscreve no limite temporal a que alude o art. 111.º do CIRS, as coimas não têm qualquer privilégio e o IVA, como se diz na sentença após correcção, goza apenas de privilégio imobiliário;
c) Rectificada a sentença, por forma a constar que o IVA goza de privilégio mobiliário, nos termos do art.º 736.º do C. Civil, o despacho de 21.10.2010 procedeu ainda à alteração da graduação, colocando a quantia exequenda de IVA de 2005 e 2006 em 3.º lugar e o demais crédito exequendo de IRS de 2004 e coimas em 4.º lugar,
d) Assim errando na aplicação do direito, por violação do disposto nas disposições conjugadas dos arts. 736º, nº1 e 822º, ambos do C. Civil
e) A sentença devia, pois, ter graduado, a par, os créditos de IRS, IVA e coimas, que constituem parte da quantia exequenda, depois dos créditos, exequendo e reclamados de IMI e do crédito hipotecário;
f) Pelo que deve ser revogada e substituída por outra que reconheça e gradue os créditos pela seguinte ordem:
1º - os créditos exequendo e reclamado de IMI dos anos de 2006, 2007 e 2008, incluindo os juros;
2º - o crédito hipotecário reclamado pelo Banco de Investimento Imobiliário, SA e respectivos acrescidos e juros, até ao limite de três anos e
3º - o restante crédito exequendo de IRS de 2004, IVA de 2005 e 2006 e coimas garantidos pela penhora.

2 - Não foram apresentadas contra-alegações.
3 – Por despacho de fls. 91 dos autos, a Meritíssima juíza “a quo” admitiu o erro de julgamento na graduação do crédito de IVA, atento o privilégio de que o mesmo goza.
- Fundamentação -
4 – Questão a decidir
É a de saber se a sentença recorrida, tal como rectificada, ao ter graduado o crédito exequendo relativo a IVA de 2005 e 2006 em 3.º lugar, precedendo os montantes do crédito exequendo relativos a IRS de 2004, coimas e juros respectivos, estes graduados em 4.º lugar, cometeu erro de julgamento.

5 – Na sentença objecto do presente recurso encontram-se fixados os seguintes factos (que numeramos):
1) – O Serviço de Finanças de Oliveira do Hospital remeteu, em 18.12.2009, ao Tribunal Tributário de Coimbra o incidente de verificação e graduação de créditos devidamente acompanhado da cópia do original da execução fiscal nº 080920050101983.0 e apensos que instaurou à executada A…, contribuinte …, residente na Rua …, em …, para cobrança do crédito exequendo, no valor total de € 1 341,27 e respectivos acréscimos legais, por dívidas provenientes de IRS do ano de 2004, IVA de 2005 e 2006, IMI de 2006, 2007 e 2008 e coimas fiscais de 2007 e 2008 e respectivos juros;
2) – Para garantia da referida dívida foram penhorados os seguintes bens:
I) Bens Imóveis:
- Em 30 de Janeiro de 2008 foi penhorada a metade indivisa (1/2) do prédio urbano inscrito no artigo matricial 1 813º, correspondente à fracção “D”, conforme auto de penhora de 15.05.2008 de fls. 31 conjugado com o print do auto de penhora electrónico junto a fls. 14 do apenso conjugado com a certidão predial e o auto de penhora lavrado em 15.05.2008 e junto a fls. 31 cujo teor dos mesmos se dão aqui por integralmente reproduzidos.
3) – A supracitada penhora foi registada, a título provisório por dúvidas, respectivamente, na Ap. 27 de 2008.01.30, conforme resulta das certidões prediais juntas aos autos a fls. 21 a 22.
4) – Posteriormente, foi convertida em definitiva, em 28.04.2008, conforme se comprova das respectivas inscrições matriciais de acordo com o averbamento Ap. 1, conforme fotocópia da certidão da Conservatória do Registo Predial de Oliveira do Hospital junta a fls. 21 a 22 do apenso.
5) Em 4 de Junho de 2008 foi exarado o termo de apensação, tendo a dívida em execução ascendido ao valor de € 4 901,47, conforme consta de fls. 52 e que aqui se dá por integralmente reproduzido.
6) Por despacho de 10 de Novembro de 2008 foi designada data para a realização da venda.
7) Em 4 de Dezembro de 2008 procedeu-se à abertura e aceitação das propostas apresentadas, tendo a mesma ficado deserta, conforme teor dos autos de abertura de propostas junto a fls. 118 dos autos e que aqui se dão por reproduzidos.
8) Nos presentes autos foram ainda reclamados os seguintes créditos:
A). Instituições Bancárias:
O “Banco de Investimento Imobiliário, S.A.”, com sede na Rua do Ouro, n.º 130, em Lisboa, NIPC n.º 502924 047, reclama um crédito no montante total de € 46 024,28, decorrente de um contrato de mútuo celebrado por escritura pública de 15.09.1998 e garantido por hipoteca voluntária que incidiu sobre o imóvel penhorado e devidamente registada.
B). Representante da Fazenda Pública
- Imposto Municipal sobre Imóveis – IMI:
A) - Processo de execução fiscal n.º 080920080100920.6/ Ano 2007 / Valor - €121,18, acrescem juros de mora;
B) - Processo de execução fiscal n.º 080920090100696.7/ Ano 2008 / Valor - €78,89, acrescem juros de mora.
6. Apreciando.
6.1 Da graduação do crédito exequendo relativo a IVA de 2005 e 2006 precedendo os créditos exequendos relativos a IRS de 2004 e coimas
Como a própria juíza “a quo” reconhece, tem razão o Ministério Público quanto à verificação do alegado erro de julgamento da sentença recorrida tal como rectificada pelo despacho de fls. 63 e 64 dos autos, na parte em que refez a graduação dos créditos exequendos de IVA, IRS e coimas.
De facto, reconhecendo-se, como se reconheceu na sentença rectificada – em conformidade com o disposto no n.º 1 do artigo 736.º do Código Civil -, que o IVA exequendo apenas gozava de “privilégio mobiliário geral” (e não de privilégio imobiliário geral, como por lapso se fez constar da sentença), e sendo o único bem penhorado um bem imóvel (cfr. o n.º 2 do probatório fixado), nenhuma razão havia para graduar os créditos exequendos relativos a IVA antes dos créditos exequendos de IRS (este não beneficiando do privilégio imobiliário estabelecido no artigo 111.º do Código do IRS atento a que o imposto respeita a 2004 e a penhora teve lugar em 2008 – cfr. os números 1, 3 e 4 do probatório) e coimas, pois que todos eles se encontram apenas garantidos pela penhora, ex vi do n.º 1 do artigo 822.º do Código Civil.

Há, pois, que conceder provimento ao recurso, revogando a sentença recorrida na parte em que graduou os créditos exequendos de IVA de 2005 e 2006 em 3.º lugar, precedendo os créditos exequendos relativos a IRS de 2004 e coimas (graduados, após rectificação, em 4.º lugar – fls. 63 dos autos), mantendo-a no demais, indo todos eles graduados a par, em 3.º lugar, após os créditos exequendo e reclamado de IMI e juros (graduados em 1.º lugar) e o crédito hipotecário reclamado, respectivos acrescidos e juros até ao limite de três anos (graduado em 2.º lugar).
- Decisão -
7 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso, revogando a sentença recorrida no segmento impugnado, que no demais se mantém, e, em consequência, graduar os crédito exequendos relativos a IVA a par dos créditos exequendos relativos a IRS e coimas, indo todos eles graduados em 3.º lugar.

Sem custas.
Lisboa, 17 de Março 2011. Isabel Marques da Silva (Relatora) - António Calhau - Dulce Neto.