Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0836/14
Data do Acordão:04/22/2015
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO DELGADO
Descritores:INSCRIÇÃO MATRICIAL
ACTO LESIVO
Sumário:A inscrição oficiosa na matriz de uma determinada realidade física, por ter sido qualificada como prédio, reconduz-se a acto imediatamente lesivo dado que provoca uma alteração e significativa na esfera jurídica da recorrente, conferindo-lhe a qualidade sujeito passivo de IMI e nessa qualidade o sujeitando a várias obrigações tributárias, incluindo a obrigação de imposto.
Nº Convencional:JSTA00069163
Nº do Documento:SA2201504220836
Data de Entrada:07/04/2014
Recorrente:A... SA
Recorrido 1:CHEFE DO SERVIÇO DE FINANÇAS DE SÃO PEDRO DO SUL
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF VISEU
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - IMI.
Legislação Nacional:LGT98 ART18 N3 ART31.
CIMI03 ART130 N3.
CPPTRIB99 ART134 N3.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC01725/13 DE 2013/11/27.; AC STA PROC01685/13 DE 2014/01/08.; AC STA PROC0830/12 DE 2012/12/05.
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO 6ED VOLI PAG470.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – Vem a A………………. S.A., melhor identificada nos autos, interpor recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que, nos autos de acção administrativa especial contra o acto administrativo de inscrição oficiosa de parque eólico como prédio urbano, na matriz predial urbana sob o artigo P278 da freguesia ………., promovido pelo Chefe do Serviço de Finanças de S. Pedro do Sul, absolveu a entidade demandada instância.
Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:
«1ª O objecto da acção administrativa principal de que o presente procedimento cautelar depende consiste na apreciação da ilegalidade e inconstitucionalidade da inscrição oficiosa da matriz de um parque eólico que a AT entendeu considerar como prédios tipo “Outros”, efectuada pelo Chefe do Serviço de Finanças competente, consistindo o pedido na declaração de nulidade de tal inscrição oficiosa.
2.ª O que está em causa é desde logo e para o caso que aos presentes autos interessa a qualificação como prédio objecto de inscrição oficiosa na matriz.
3.ª O acto de inscrição oficiosa na matriz de uma dada realidade qualificada como prédio pela Administração Tributária provoca uma alteração significativa na esfera jurídica do particular ao qual o “pretenso prédio” é imputado posto que é esse acto de inscrição que lhe confere a qualidade de sujeito passivo de IMI, sendo que, na ausência da declaração de invalidade do acto de inscrição na matriz a AT procederá à liquidação do referido imposto.
4.ª Não se limitam à liquidação do IMI as consequências fiscais que decorrem para a ora Requerente. Desde logo, na qualidade de sujeito passivo de IMI passa a considerar-se incumbida de um conjunto de obrigações tributárias desde as declarativas e acessórias até à obrigação de imposto (cfr. artigos 18.º, n.º 3 e 31.º, ambos da LGT).
5.ª Por outro lado, o facto de uma dada realidade se encontrar inscrito na matriz predial e ser qualificada pela AT como prédio para efeitos fiscais determina que os negócios relativos à sua transmissão se encontrem sujeitos a IMT/Selo.
6.ª O acto de inscrição oficiosa de uma dada realidade como prédio na matriz, efectuada pela própria AT, é um acto destacável e tem impugnabilidade contenciosa autónoma. Não é mero acto interlocutório inserido num procedimento de liquidação de imposto.
7.ª O acto pelo qual o Chefe do Serviço de Finanças decide inscrever oficiosamente na matriz uma determinada realidade física (que lhe parece) como prédio corresponde ao conceito de decisão, quer dizer, a uma determinação sobre uma certa situação jurídico-administrativa.
8.ª Visa com tal decisão a produção de efeitos jurídicos numa situação individual e concreta.
9.ª Trata-se de um acto unilateral de autoridade, uma figura típica do Direito Administrativo.
10.ª Tal acto assume um carácter regulador na medida em que se dirige à produção ou ao estabelecimento de uma consequência jurídica, ou seja, na determinação da condição jurídica de uma coisa, que não era e que por virtude daquela actuação passa a ser um prédio urbano tributável em IMI.
11.ª Elemento essencial do conceito de acto administrativo é a de que o acto deva produzir efeitos externos para fora da Administração. É de intuitiva percepção que a qualificação e decisão de inscrever oficiosamente uma dada coisa (um Parque Eólico, um aerogerador) como um prédio urbano, produz, imediatamente, efeitos externos desfavoráveis à ora Recorrente que passa a ser sujeito passivo de IMI.
12.ª Perante um acto administrativo da autoria do Chefe de Finanças que não comporta a apreciação da legalidade do acto da liquidação pode o contribuinte como preconiza a alínea p) do n.º 1 e o n.º 2 do artigo 97.º do CPPT contestar a sua legalidade.
Pelo que,
13.º A Sentença ora recorrida ao não admitir a impugnabilidade do acto de inscrição do imóvel na matriz viola, entre outros, o disposto nos preceitos legais citados na conclusão anterior
14.º A decisão recorrida mostra-se contrária à jurisprudência de que se destaca especialmente o Douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido em 27/11/2013 no processo 1725/13 pela 2ª Secção do Contencioso Tributário acessível em para www.dgsi.pt, cuja fundamentação jurídica se remete e aqui se dá por reproduzida e que se juntou como doc.1»

2 – A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou contra-alegações com as seguintes conclusões:
«A. O preenchimento oficioso de um modelo 1 de IMI decorre do incumprimento por parte da ora recorrente do previsto no artigo 13°, n° 1 CIMI, de onde resulta a obrigação legal do Chefe de Finanças substituir a ora recorrente nesse despoletar (artigo 13°, n° 3, alínea a) do CIMI).
B. Do preenchimento oficioso do modelo 1 de IMI resulta o despoletar do procedimento que visa a inscrição de um prédio na matriz.
C. Nesse momento, o referido prédio é identificado com um número provisório, diferenciado dos restantes por ter aposto a letra P (provisório) no seu início.
D. O procedimento de inscrição de um prédio na matriz visa a recolha de todos os elementos referidos no artigo 91° do CIMI.
E. Um prédio só pode considerar-se inscrito na matriz (deixando de ser diferenciado com a letra P antecedendo o respectivo número), depois concluído o procedimento de avaliação (ou de 2ª avaliação se for caso disso).
F. O próprio procedimento de inscrição de um prédio na matriz insere-se num procedimento que visa a liquidação do imposto, sendo por isso um acto preparatório ou interlocutório, não sendo como tal directamente lesivo dos interesses da recorrente.
G. O legislador nacional estabeleceu o princípio geral da impugnação unitária (Artigo 54° CPPT).
H. Assim, nos termos do artigo 54° do CPPT só são susceptíveis de impugnação contenciosa autónoma os actos expressamente destacados pelo legislador ou os actos imediatamente lesivos.
I. No presente caso, a recorrente ataca um acto que ainda não produziu os seus efeitos, aliás, pretende atacar a inscrição de um prédio na matriz, quando o mesmo (à data) nem sequer se encontrava inscrito.
J. Quanto aos actos destacáveis, o legislador só prevê dois (impugnação do resultado da 2ª avaliação - 134°, n° 1 CPPT - impugnação das incorrecções nas inscrições matriciais dos valores patrimoniais — 134°, n° 2 CPPT), não correspondendo nenhum deles ao acto de inscrição de um prédio na matriz.
K. Assim, será de concluir que o acto de inscrição de um prédio na matriz não é impugnável autonomamente, quer por não se tratar de acto destacável do acto final do procedimento, quer por não se tratar de acto imediatamente lesivo de quaisquer interesses ou direitos legalmente protegidos.
L. Ao ter decidido nestes termos, o tribunal “a quo”, interpretou correctamente a lei processual e,
M. Mostra-se em consonância com a Acórdão do STA, de 05.12.2012, proferido no âmbito do Processo n.º 0830/12.»

3 – O Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu fundamentado parecer (fls. 233/234), que na parte mais relevante se transcreve:
«(…) A nosso ver o recurso merece provimento.
A questão controvertida traduz-se em saber se o acto de inscrição oficiosa de uma dada realidade (aerogerador) como prédio urbano, categoria “Outros”, na matriz é um acto imediatamente lesivo para efeitos de impugnação contencioso.
Nos termos do disposto no artigo 54.º do CPPT, os actos interlocutórios do procedimento não são susceptíveis de impugnação contenciosa, sem prejuízo de poder ser invocada na impugnação da decisão final qualquer ilegalidade anteriormente cometida, salvo quando forem imediatamente lesivos dos direitos dos contribuintes ou disposição expressa em sentido diferente.
Ao contrário do princípio geral estatuído no artigo 51.º/1 do CPTA, em que se estabelece que são impugnáveis os actos administrativos com eficácia externa, especialmente, aqueles cujo conteúdo seja susceptível de lesar direitos ou interesses legalmente protegidos, no contencioso tributário vigora o principio unitário, nos termos do qual, em regra só há impugnação contenciosa do acto final do procedimento, que afecta imediatamente a esfera patrimonial do contribuinte fixando a posição final da AT perante este, definindo os seus direitos e deveres, salvo quando forem os actos forem imediatamente lesivos dos direitos do contribuinte ou disposição expressa em sentido diferente (Código de procedimento e de processo Tributário, anotado e comentado, 6ª edição 2011, I volume, página 467, Jorge de Sousa).
Parece que inexiste disposição expressa que permita a impugnação contenciosa directa de acto de inscrição oficiosa de dada realidade como prédio urbano na matriz.
De facto, o artigo 130.º/3 do CPPT só se aplica a incorrecções materiais nas matrizes, sendo certo que no caso em análise estamos perante um eventual erro de qualificação de determinada realidade (aerogerador - Acórdão do STA, de 2012.12.05-P.0830/12, disponível no sitio da Internet www.dgsi.pt).
A nosso ver o acto em causa é imediatamente lesivo, e, como tal, pode a recorrente, querendo, sindicá-lo autonomamente, se o não quiser sindicar em sede de impugnação da liquidação do tributo (sobre esta faculdade alternativa, obra citada, página 470).
De facto, o acto suspendendo não pode deixar de provocar uma alteração significativa na esfera jurídica da recorrente, pois que lhe confere a qualidade de sujeito passivo de IMI.
Na qualidade de sujeito passivo de IMI passa a recorrente a estar sujeita a várias obrigações tributárias, desde as declarativas e acessórias até à obrigação de imposto, nos termos do estatuído nos artigos 18.°/3 e 31.º da LGT.
A partir do momento em que a realidade em causa está inscrita como prédio na matriz para efeitos fiscais determina que os negócios relativos à sua transmissão se encontrem sujeitos a IMT/Imposto Selo.
Portanto, como se vê, a inscrição da realidade em causa na matriz como prédio urbano determina lesividade efectiva e actual e não simplesmente hipotética.
Aliás, dificilmente se compreenderia que o legislador permitisse a sindicância directa e imediata (por via graciosa/contenciosa) de meras irregularidades materiais das matrizes e não de erros de qualificação das realidades inscritas, oficiosamente, nas mesmas matrizes, com imediata repercussão na esfera jurídica dos contribuintes.
O acto suspendendo é, pois, sindicável, directa e autonomamente (Neste sentido acórdão do STA, de 27/11/2013, proferido no recurso nº 01725/13, disponível no sitio da Internet www.dgsi.pt).
A sentença recorrida, a nosso ver, merece, assim, censura. (…)»

4 - Colhidos os vistos legais, cabe decidir.

5 – O Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu fixou a seguinte matéria de facto:
1. No âmbito de ação de recolha de elementos a Autora foi notificada pela Direção de Finanças de Viseu pelo ofício 2717 de 16.03.2011 enviado por carta registada com aviso de receção assinado no dia 21.03.2011, para apresentar a declaração Modelo 1 de IMI relativamente à inscrição do Parque Eólico de ……../………. do concelho de S. Pedro do Sul. - fls. 27 e sgs. do PA 2640.
2. Por despacho proferido em 08.04.2011 pela Diretora-Adjunta da Direção de Finanças de Viseu foi determinada a inscrição oficiosa do prédio referido em 1. na matriz em face da Autora não ter procedido voluntariamente à entrega do Modelo 1 do IMI. - fls. 29 e sgs. do PA 2640.
3. O prédio inscrito na matriz foi objeto de 1.ª avaliação, daí resultando a fixação de um valor patrimonial tributário (VPT) de € 122.000,00 euros, o qual foi notificado à Autora através do ofício 7543529. — fls. 25.
4. A Autora apresentou reclamação da matriz pedindo a segunda avaliação do prédio P278 — ……….. - fls. 27 e sgs..
5. No dia 27.07.2011 procedeu-se à comissão para a segunda avaliação constituída por dois peritos regionais e pelo perito da parte. - fls. 15 e sgs. do PA - IMI, Processo de 2ª Avaliação.
6. O VPT que resultou da 2ª avaliação relativamente ao prédio P278 — ………. foi de € 2.440.000,00 euros. — fls. 19 e sgs. do PA - IMI, Processo de 2ª Avaliação.
7. A presente ação foi apresentada neste Tribunal no dia 23.08.2011. - fls. 2 e sgs..
6. Do objecto do recurso

A questão objecto do presente consiste em saber, se a inscrição oficiosa na matriz do parque eólico como prédio urbano na espécie de “outros”, é um acto lesivo que provoca uma alteração significativa na esfera jurídica da recorrente e como tal, pode ou não ser, sindicado autonomamente como acto contenciosamente recorrível.

A sentença recorrida absolveu a entidade requerida da instância, no entendimento de que o acto suspendendo — inscrição oficiosa na matriz de dada realidade como prédio urbano “Outros” — é um mero acto interlocutório do procedimento de liquidação, não imediatamente lesivo, e como tal, não directamente impugnável contenciosamente.
Não conformada a A……………. S.A. vem interpor o presente recurso.
A base jurídica da sua argumentação assenta nas seguintes proposições:
- O acto de inscrição oficiosa de uma dada realidade como prédio na matriz, efectuada pela própria AT, é um acto destacável e tem impugnabilidade contenciosa autónoma. Não é mero acto interlocutório inserido num procedimento de liquidação de imposto;
- Visa tal acto a produção de efeitos jurídicos numa situação individual e concreta, nomeadamente em sede de IMI, IMT e Imposto de Selo;
- Na qualidade de sujeito passivo de IMI passa a recorrente a considerar-se incumbida de um conjunto de obrigações tributárias desde as declarativas e acessórias até à obrigação de imposto (cfr. artigos 18.º, n.º 3 e 31.º, ambos da LGT);
- O facto de uma dada realidade se encontrar inscrito na matriz predial e ser qualificada pela AT como prédio para efeitos fiscais determina que os negócios relativos à sua transmissão se encontrem sujeitos a IMT/Selo.

6.1 Este Supremo Tribunal Administrativo já se pronunciou por duas vezes sobre questão similar à ora suscitada.
Assim no Acórdão 1725/13 de 27.11.2013, que tratou de caso em tudo idêntico ao dos presentes autos, quer nos pressupostos de facto quer no teor das alegações de recurso, ficou dito que «a inscrição oficiosa na matriz de uma determinada realidade física, por ter sido qualificada como prédio, reconduz-se a acto imediatamente lesivo dado que provoca uma alteração e significativa na esfera jurídica da recorrente, conferindo-lhe a qualidade sujeito passivo de IMI e nessa qualidade o sujeitando a várias obrigações tributárias, incluindo a obrigação de imposto».
Também no Acórdão 1685/13, de 08.01.2014, este Supremo Tribunal Administrativo afirmou que as eventuais ilegalidades decorrentes do acto prévio de inscrição oficiosa de prédio na matriz como prédio urbano da espécie “outros”, podem ser objecto de impugnação autónoma, através de acção administrativa especial.
Trata-se de jurisprudência que também aqui se acolhe, por com a respectiva fundamentação concordarmos integralmente, pelo que, pelo que nos limitaremos a reproduzir a argumentação expendida no supracitado Acórdão 1725/13.
Como se sublinha naquele aresto «No caso, não se vê que haja disposição expressa que permita a impugnação contenciosa directa de acto de inscrição oficiosa de dada realidade como prédio urbano na matriz.
De facto, o nº 3 do art. 134º do CPPT só se aplica a incorrecções materiais nas matrizes (asserção com a qual a Fazenda Pública também concorda – cfr. as Conclusões II e III das contra-alegações), sendo certo que no caso em análise estamos perante um eventual erro de qualificação de determinada realidade (aerogerador). E da interpretação conjugada do nº 3 do art. 134º do CPPT e do nº 3 do art. 130º do CIMI, resulta um alargamento quanto aos fundamentos do pedido de correcção nas inscrições matriciais que podem ter por base quaisquer erros materiais que afectam a veracidade de características previamente definidas e demais dados respeitantes aos imóveis a inscrever nas respectivas matrizes.
Assim, considerando o caso dos autos, logo se conclui que não estamos perante uma situação de mero erro material com repercussão na veracidade da inscrições matricial, como é exigido pela análise conjugada dos preceitos constantes daqueles referidos normativos, mas estamos, antes, perante uma questão jurídica que é prévia e respeita à qualificação jurídica dos factos tributários (cfr. o acórdão do STA, de 5/12/2012, proc. nº 0830/12). Isto é, no caso, a inscrição matricial pressupõe a resolução da questão prévia da qualificação da natureza jurídica do prédio em causa, rectius, da realidade física em causa, nomeadamente quanto a saber se essa realidade (aerogerador) deve ser qualificada como prédio (urbano na espécie “outros”) em conformidade com a lei aplicável.
A recorrente não alega a existência de um mero erro material, mas sim um vício substancial, quanto à própria qualificação jurídica da realidade levada à matriz. Ora, como aponta o MP, afigura-se-nos que o acto em causa (o acto cuja suspensão de eficácia se pretende) é imediatamente lesivo, e que, como tal, pode a recorrente, querendo, sindicá-lo autonomamente, se o não quiser sindicar em sede de impugnação da liquidação do tributo. (Sobre esta faculdade alternativa, cfr. Jorge Lopes de Sousa, loc. cit., p. 470.)
Na verdade, aquele acto suspendendo não pode deixar de provocar uma alteração significativa na esfera jurídica da recorrente, pois que lhe confere a qualidade de sujeito passivo de IMI e nessa qualidade passa a estar sujeita a várias obrigações tributárias, desde as declarativas e acessórias, até à obrigação de imposto, nos termos do disposto nos arts. 18º nº 3 e 31º da LGT. Acrescendo que, a partir do momento em que a realidade física (aerogerador) aqui em causa está inscrita como prédio na matriz para efeitos fiscais, até os negócios relativos à sua transmissão se encontrem sujeitos a IMT/Imposto Selo.
A questionada inscrição da dita realidade física constituída pelo aerogerador, na matriz como prédio urbano, determina, portanto, lesividade efectiva e actual e não simplesmente hipotética, sendo que, como salienta o MP, dificilmente se compreenderia, também, que o legislador permitisse a sindicância directa e imediata (por via graciosa/contenciosa) de meras irregularidades materiais das matrizes e não de erros de qualificação das realidades inscritas, oficiosamente, nas mesmas matrizes, com imediata repercussão na esfera jurídica dos contribuintes.
E nem se diga (…..) que seguindo o entendimento da recorrente se estará a permitir a abertura de várias vias processuais, sob a mesma causa de pedir, implicando a possibilidade de existirem várias decisões contraditórias, sob o mesmo procedimento, violando entre outros, os princípios da certeza e segurança jurídica: na verdade, os pressupostos para a qualificação de determinada realidade como prédio e para a consequente inscrição deste na matriz ainda se diferenciam dos pressupostos atinentes aos (vários) factos tributários que dessa inscrição podem resultar, e daí que, apesar de não ter ainda ocorrido a liquidação do imposto, se projectem desde logo os apontados efeitos externos e lesivos, determinantes da impugnabilidade do acto» (fim de citação).

É esta a jurisprudência que também aqui se acolhe e se reitera, já que se entende que a respectiva fundamentação é inteiramente transponível para o caso dos autos, pelo que, com base nessa mesma fundamentação jurídica, se conclui que o recurso merece provimento.
7. Decisão
Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao presente recurso e revogar da sentença recorrida, ordenando a baixa dos autos à 1ª instância, para, fixada a pertinente factualidade, se conhecer do mérito da causa, se a tal nada mais obstar.

Custas pela entidade demandada, que contra-alegou.

Lisboa, 22 de Abril de 2015. – Pedro Delgado (relator) – Fonseca Carvalho – Isabel Marques da Silva.