Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0734/14
Data do Acordão:11/26/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:IMPOSTO MUNICIPAL SOBRE IMÓVEIS
VALOR PATRIMONIAL
DEVER DE FUNDAMENTAÇÃO
Sumário:I - Padece de erro de julgamento a sentença que ao fiscalizar o cumprimento do dever de fundamentação atende exclusivamente aos elementos constantes da nota de liquidação do tributo impugnado e não aos demais elementos que constam dos autos.
II - Impõe-se a ampliação da base factual para o que se impõe a baixa dos autos à primeira instância.
Nº Convencional:JSTA000P18276
Nº do Documento:SA2201411260734
Data de Entrada:06/20/2014
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A....
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – RELATÓRIO

A………., nif ………, veio deduzir impugnação judicial contra a liquidação de imposto municipal sobre imóveis do ano de 2007 referente ao prédio urbano, inscrito na matriz urbana da freguesia da …….., Concelho do Porto sob o artigo 00313, no valor de € 1 364, 80.

Por sentença de 27 de Dezembro de 2013, o TAF do Porto, julgou procedente a impugnação judicial anulando consequentemente a liquidação impugnada.

Inconformada com o assim decidido, reagiu a Fazenda Publica, interpondo o presente recurso com as seguintes conclusões das alegações:

A) Julgou a douta Sentença, sob recurso, procedente a impugnação deduzida contra a liquidação de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) referente ao ano de 2007 e ao imóvel - prédio urbano - inscrito na matriz predial da freguesia da …….., concelho do Porto, sob o artigo n.º 00313, de que é comproprietária - na proporção de 1/3.
B) Com a ressalva do sempre devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se como assim doutamente decidido, porquanto considera existir erro de julgamento, na senda aliás do propugnado pelo Ex.mo Magistrado do Ministério Público, assim carecendo de sentido a apontada ilegalidade, atentas às razões que passa a expender.
C) Conclui o decidido, “… temos como certo que o acto tributário sindicado está insuficientemente fundamentado, o que consubstancia vício de forma que determina a sua anulação, como bem decidiu a sentença recorrida.”
D) O que vale por dizer, que o Tribunal a quo acolheu o entendimento aduzido pela Impugnante, segundo o qual a liquidação de IMI em causa padece de falta de fundamentação, dado que do teor da nota de liquidação recebida pela Impugnante, onde se fixa o valor patrimonial tributário do imóvel em € 170.600,56, resulta não ter sido dada ao Sujeito Passivo qualquer explicação relativamente à forma como tal valor foi obtido, considerando que naquele documento não consta a razão pela qual o valor patrimonial tributário é o que vem indicado, uma vez que o tributo foi lançado e liquidado com base no n.º 5 do artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro, quando devia tê-lo sido com base no n.º 4 do mesmo diploma.
E) Segundo a Impetrante o prédio não deixou de estar arrendado até 31 de Dezembro de 1988, continuando, aliás, nessa situação, conforme contrato de arrendamento ainda em vigor, pelo que o valor patrimonial a ter em consideração seria o do ano da sua inscrição na matriz, ou seja, o ano de 1984.
F) E discordando da referida fixação do valor patrimonial tributário, vem por via da presente ação, questionar a legalidade da liquidação controvertida por falta de fundamentação, erro nos pressupostos de direito e no lançamento do imposto.
G) Ora, contrariamente ao sentenciado que conclui pela falta de fundamentação e atende exclusivamente aos elementos constantes do Documento de Cobrança /Nota de liquidação do IMI, carece de sentido a referencia expressa de que não se encontra fundamentado o iter cognoscitivo percorrido pela AT para fixar o valor patrimonial encontrado (de €170.000,50) e referido no ato de liquidação.
H) Aquando da entrada em vigor do diploma que procede à reforma da tributação do património - o Decreto-Lei n 287/2003, de 12 de novembro - que aprovou designadamente o novo Código do IMI (CIMI) e procedeu a alterações de diversa legislação tributária conexa com a mesma reforma, tendo em conta a desatualização dos valores patrimoniais dos imóveis em geral, foi estabelecido nos seus artigos 13.º e seguintes, para os prédios já existentes um regime transitório de atualizaçâo dos valores patrimoniais, para vigorar enquanto não se procedesse à avaliação geral prevista no artigo 16º do CIMI.
I) Estatuía este regime transitório, na redacção original do seu artigo 15º, que todos os prédios urbanos inscritos na matriz, transmitidos onerosa ou gratuitamente após a entrada em vigor do CIMI (01.12.2003), seriam alvo de uma primeira avaliação, nos termos desse mesmo código.
J) Previa ainda o n.º 5 do artigo 16.º do mesmo diploma que, no caso de prédios urbanos arrendados, que o deixaram de estar até 31 de dezembro de l988, seria aplicado ao valor patrimonial resultante da renda, o coeficiente correspondente ao ano a que respeita a última atualização daquela, de acordo com a Portaria n.º 1337/2003.
K) De realçar, que o Decreto-Lei nos seus artigos 17º e seguintes, estabelece um resume transitório específico para os prédios arrendados segundo o qual, enquanto não se procedesse à avaliação geral dos prédios urbanos, o valor patrimonial tributário de prédio ou parte de prédio arrendado, por contrato ainda vigente e que tenha dado lugar ao pagamento de rendas até 31 de dezembro de 2001, nunca pode ser superior à capitalização da última renda anual pelo fator 12.
L) Ora, foi tendo por base o regime transitório - não o especifico para os prédios arrendados, mas o dos não arrendados, porquanto a impugnante não apresentou qualquer prova quanto ao facto de o prédio em causa não deixar de estar arrendado até 31 de dezembro de 1988, ou, nesta data, continuar a estar arrendado, em cumprimento do preceituado no artigo 18.º do Decreto-Lei - que a AT procedeu à atualização do valor patrimonial do imóvel ora em crise.
M) Do resultado da atualização do valor patrimonial tributário assim efetuada, podia a ora Recorrida reclamar, em conformidade com o artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro, nos termos dos artigos 16º, 17º, n.º 1, e 19º, designadamente com fundamento em erro de facto ou de direito, no prazo de 90 dias contados do termo do prazo para pagamento voluntário da primeira ou única prestação do IMI, ou solicitar a sua determinação de acordo com as regras do CIMI (n.º 4 daquele preceito legal) e ainda deduzir impugnação judicial (nº5 do mesmo preceito).
N) Optou a Impugnante/Recorrida por reclamar e impugnar as liquidações de IMI relativas aos anos de 2003 e 2005, invocando os mesmos fundamentos objeto da presente ação, porquanto da mesma não constava a razão pela qual havia sido atribuído aquele valor patrimonial, vindo a ação de impugnação a ser decidida pelo STA no Recurso n.º 0277/12, de 10.10.2012;
O) Face ao que vem exposto supra, tal ato de fixação do valor patrimonial consubstancia um ato destacável, autonomamente impugnável, conforme jurisprudência assente dos Tribunais superiores (Por todos os Acórdãos do TCASul de 25.04.2010 no processo nº 03586/09 e de 12.02.008 no processo 02125/07).
P) Destarte, uma vez consolidada a fixação do valor patrimonial tributário, nos termos supra expostos, por não ter a Impetrante utilizado qualquer dos meios de defesa ao seu dispor, nos termos do supra citado artigo 20.º do Decreto Lei n.º 287/2003, foi, em conformidade, emitida a competente liquidação de IMI relativa ao ano de 2007, aqui controvertida,
Q) E, no atinente a esta liquidação, veio a ser deduzida a presente ação, concluindo o Tribunal a quo pela falta de fundamentação da fixação do valor patrimonial tributário que cremos, ante as razões expostas, não está em causa nos presentes autos.
R) Na verdade, apenas podemos concluir que da liquidação relativa ao ano de 2007, consta a fundamentação necessária e que legalmente se impunha.
S) Conforme determina o n.º 2 do artigo 77.º da LGT, a fundamentação dos atos tributários deve conter sempre as disposições legais aplicáveis, a qualificação, a quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo.
T) Em rigor, respeitando a notificação da liquidação de IMI do ano de 2007, os elementos necessários para que se considere devidamente fundamentada dirão respeito ao cálculo do imposto em causa, que no caso se considera serem, (i) Imposto a que respeita o ato tributário e respetivo ano de imposto - “Imposto Municipal sobre Imóveis” e “Ano de imposto”; (ii) Indicação da data da liquidação notificada - “Data da Liquidação” (iii)Identificação e localização dos imóveis em causa - “Descrição dos prédios/Município/Freguesia/Artigo”; (iv) Indicação do valor patrimonial dos imóveis - “Valor Patrimonial Tributário’; (v) Existência ou não de isenção - “Valor Isento”; (vi) Identificação da taxa aplicável aos imóveis - “Taxa %”; (vii) Operação de apuramento da matéria tributável - “ Valor Patrimonial Tributário” x “Taxa %”; (viii) Montante de coleta correspondente a cada prédio - “Coleta”.
U) Neste sentido vejam-se os Acórdãos do STA de 20.02.2008, Processo n” 0765/07 e de 11.02.2009, Processo nº 0767/07, dos quais resulta que para efeitos de liquidação de Contribuição Autárquica - regime que se manteve no essencial com o IMI - se encontra devidamente fundamentado o ato de liquidação que indica a localização, o artigo matricial, o valor matricial, o valor patrimonial, a data de liquidação, o ano a que respeita, a taxa aplicável, a inexistência de isenção e a coleta correspondente a cada um dos prédios urbanos.
V) A fundamentação é ainda, no dizer do Acórdão daquela suprema instância datado de 02.04.2008, proferido no Processo nº 0882/07, “um conceito relativo, que varia conforme o tipo de ato em causa e as circunstâncias do caso concreto.”
W) Conforme salienta A. José de Sousa e J. Silva Paixão, in CPT Comentado e Anotado, em anotação ao artigo 82º, “Tendo em conta que, hoje, a grande massa dos atos de liquidação é feita através do Serviço de Informática Tributária (…) importa entender esta exigência de fundamentação em termos hábeis”.
X) Para aqueles autores, contrariamente às situações de não entrega das declarações, ou de liquidações adicionais, em que se impõe fundamentação mais rigorosa, assentando a liquidação, nas declarações do contribuinte, a respetiva fundamentação, basta-se com a nota de apuramento do rendimento coletável e cálculo do imposto, ao mencionar entre outros elementos, o ano a que respeita o imposto, os rendimentos, taxa, etc.
Y) Hoje, face ao disposto no citado artigo 77º da LGT, tal linha argumentativa, mantém plena atualidade, apontando no mesmo sentido a jurisprudência (cf. Acórdão do STA de 02.04.2008 no recurso nº 0882/07), ao aludir a um mínimo de densidade do conteúdo fundamentador.
Z) Assim, caia discordância com o sentenciado, considera a Fazenda Pública que o ato controvertido se encontra fundamentado - e não apenas no que tange à fundamentação do tributo a pagar, como erroneamente ali é referido - pois o valor encontrado surge justificado em concretização dos critérios enunciados.
AA) Aqui chegados, apenas podemos concluir que à notificação do ato tributário ora em crise não falta qualquer elemento legalmente exigido, porquanto, tendo em conta os campos correspondentes, indicados a “itálico”” no ponto supra, conclui-se que todos aqueles elementos se encontram devidamente identificados, não restando qualquer dúvida em relação ao montante do tributo e aos cálculos em causa.
BB) Até porque, a Impugnante sem mostrar qualquer reserva ou dúvida, não deixou de se pronunciar expressamente sobre a fundamentação do ato em crise, onde demonstra compreender perfeitamente as razões que subjazem à liquidação e essenciais à sua defesa, se assim não fosse certamente não teria deixado de da faculdade que o artigo 37º do CPPT lhe concede.
CC) Por essa razão mostra-se que a sentença recorrida caiem erro quando conclui pela falta de fundamentação e atende exclusivamente aos elementos constantes do Documento De Cobrança / Nota de Liquidação do IMI.
DD) Como bem decidiu o STA no acórdão citado em N, numa situação em tudo idêntica à dos presentes autos, secundado pelo Acórdão do STA de 07.11.2012, Processo n.º 01126/11 que mantém na mesma linha argumentativa.
EE) Em suma, entende a fazenda Pública, com a ressalva do devido respeito, que a douta Sentença sob recurso enferma de erro de julgamento porquanto fez errónea interpretação e aplicação das disposições legais que regem o regime transitório - da reforma da tributação do património - e mais precisamente o que resulta do disposto no artigo 20º. do Decreto-Lei n.º 287/2003 de 12 de novembro.
FF) E, não se verificando o vicio apontado, ao ato tributário, este deve permanecer na sua estabilidade e vigência no ordenamento jurídico, uma vez que a AT agiu em cumprimento do preceituado pelo legislador, em ordem ao principio da legalidade que impera na sua atuação.
GG) O Tribunal a quo decidiu com violação das disposições legais supra citadas.
Termos em que, e nos melhores de direito aplicáveis, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta Sentença recorrida, como que se fará inteira justiça.

Contra alegou a entidade recorrida concluindo da seguinte forma:
1.ª - Vem este recurso interposto, pela Fazenda Pública, da douta sentença de fls. 85/93 que julgou a presente impugnação procedente, anulando a liquidação impugnada, em IMI, ano de 2007.
2.ª - Dos fundamentos invocados pela ora Recorrida para obter a procedência do seu pedido de anulação da liquidação impugnada, a douta sentença sob recurso pronunciou-se apenas sobre o primeiro dos fundamentos invocados — VÍCIO DE FORMA, falta de fundamentação legalmente exigida (fls. 92 v.º).
3.ª - A questão a dever ser decidida no presente recurso pode resumir-se assim:
Os actos tributários de lançamento e liquidação que foram praticados em imposto municipal sobre imóveis (IMI), ano de 2004, reproduzidos nos documentos através dos quais é feita a sua notificação aos respectivos sujeitos passivos, podem considerar-se devidamente fundamentados, nos termos exigidos, entre outros, pelos artigos 268.º/3 da Constituição da República Portuguesa (CRP). 77.º da Lei Geral Tributário (LGT), especialmente nos seus nºs 1 e 2. e 125.º do Código de Procedimento Administrativo (CPA), especialmente nos seus n.º 1 e 2?
4.ª - O âmbito do presente recurso é, assim, a decisão proferida em 1ª instância, que julgou procedente o invocado vício de forma, consistente na falta da devida fundamentação do acto impugnado, o que determinou a anulação deste.
5.ª - Só que a Recorrente, nas suas alegações discorreu, também sobre o outro fundamento invocado pela Impugnante/Recorrida - Erro no lançamento e liquidação do imposto (VIOLAÇÃO DE LEI) - e, especialmente a fls. 119, ponto 14., e a fls. 124, conclusão L., alega que a Impugnante/Recorrida não apresentou qualquer prova quanto ao facto de o prédio em causa não deixar de estar arrendado até 31 de Dezembro de 1988.
6.ª - O que, de resto, não é verdade, porquanto a Impugnante/Recorrida apresentou prova desse facto através dos documentos juntos com a sua petição inicial, como docts n.ºs 7 e 8.
7.ª - Nas suas alegações a Recorrente tenta o impossível - demonstrar que o documento de fls. 12 regista fundamentação suficiente do lançamento e liquidação impugnados.
8.ª - A verdade é que não regista: refere, apenas o artigo matricial de inscrição do prédio; o ano a que respeita o imposto; o valor patrimonial tributário a taxa tributária aplicada; e a colecta apurada. Mais nada com interesse para a exigida fundamentação do acto.
9.ª - Nem no documento de fls. 12, nem no processo administrativo interno dá o autor do lançamento e da liquidação (acto impugnado) a menor explicação sobre o valor patrimonial tributário que considerou, designadamente como chegou a ele;
10.ª - como não dá a menor explicação sobre a escolha (entre as várias legalmente previstas) da taxa tributária aplicada (0,80 %).
11.ª - E essa explicação teria sempre de, no mínimo, ser expressa e acessível, clara e suficiente.
12.ª - E proceder do autor do lançamento e da liquidação em causa,
13.ª - Não foi tido em consideração que se tratava, no caso, de um imposto novo, que viera substituir a contribuição autárquica e que, em relação a esta, apresentava diferenças muito profundas, mormente no tocante à matéria de avaliação e fixação da realidade tributável.
14.ª - Como não foi tido em consideração que as regras utilizadas até então, durante quarenta anos, foram as do Código da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Indústria Agrícola (de 1963), que nada tinham a ver com o regime instituído pelo Código do IMI - inovador, complexo e muito diversificado, o qual, ao longo de quase dez anos, continua a suscitar justificadas controvérsias.
15.ª - Não foi tido em consideração na liquidação ora impugnada, como não foi tido em consideração em nenhum dos anos anteriores de aplicação deste imposto.
16.ª - Daí as impugnações anteriormente apresentadas de liquidações em IMI efectuadas à ora Recorrente.
17.ª Do que se observa do documento de, fls. 12 e do processo administrativo interno retira-se, inequívoca., a conclusão de que o acto tributário impugnado não foi objecto de fundamentação expressa, acessível, clara e suficiente.
18.ª - Daí que, contrariamente ao que afirma a Recorrente, a douta sentença recorrida não enferma de erro de julgamento, designadamente de deficiente interpretação e aplicação do art. 20º Decreto-Lei n. 0287/2003.
19.ª - A Recorrida utilizou as normas daquele citado art. 20.º relativamente à notificação que lhe foi feita pelo documento de cobrança emitido para o IMI de 2003.
20.ª - E claro ficou, como não podia deixar de ficar, que o documento de cobrança referido na conclusão 16.ª não lhe deu a conhecer por que era aquele (e não outro) o valor da matéria tributável, o valor da taxa tributária e o valor do imposto a pagar (colecta).
21.ª - O que vale por dizer que o acto tributário dado a conhecer pelo predito documento de cobrança não estava devidamente fundamentado,
22.ª - como não está fundamentado o acto de lançamento e liquidação do IMI de 2007, conforme muito bem julgou a douta sentença recorrida.
23.º - Isto porque quer agora (IMI de 2007) quer antes (em 2003, 2004, 2005 e 2006) o documento de cobrança mantém, no essencial, a mesma forma e os mesmo dizeres,
24.ª - omitindo qualquer tipo de fundamentação, mínima que seja, do acto tributário.
25.ª - Basta estabelecer o confronto entre o documento de fls. 12 e a notificação do resultado da avaliação de prédio urbano, para efeitos de IMI, para se perceber que no primeiro caso não há fundamentação alguma e no segundo, embora de forma sumária, a fundamentação existe.
26.ª - De resto, a fundamentação que deve obrigatoriamente constar do documento de cobrança tem de ser contemporânea da prática do acto (lançamento e liquidação)
27.ª - e não posterior a ela, nomeadamente elaborada aquando da apreciação, pela A T, de reclamação que, com esse fundamento lhe seja dirigida.
28.ª - Julgando como julgou, a douta sentença de fls. 85/93 fez, na linha de orientação dos Acs. deste Supremo Tribunal, dados nos processos nºs 36/12, 659/12, e 822/12, respectivamente de 19-04-2012, 19-09-2012 e 17-10-2012, e no processo n. º
1714/05.4 do TCANORTE, de 08-11-2012, correcta interpretação e aplicação da lei e do Direito, não merecendo qualquer censura.»

O EMMP pronunciou-se emitindo o seguinte parecer:
«Questiona-se no presente recurso o acerto da sentença do TAF do Porto de 27.12.203 que, julgando procedente a impugnação deduzida por A…….., anulou a liquidação do lMl impugnada, relativa ao ano de 2007, com base no invocado vício da falta de fundamentação.
Nas Conclusões da sua Alegação sustenta a recorrente, além do mais, que “(…) a sentença recorrida cai em erro quando conclui pela falta de fundamentação e atende exclusivamente aos elementos constantes do Documento de Cobrança/Nota de Liquidação do IMI”.
Entende-se que lhe não assiste razão.
Por imperativo constitucional e legal, todos os actos da Administração, susceptíveis de afectarem os direitos e interesses legítimos dos administrados, devem ser devidamente fundamentados.
A fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito, equivalendo à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclarecem concretamente a motivação do acto (cfr., nomeadamente, o art. 268º, nº 3 da CRP, arts. 124º e 125º, ambos do CPA e art. 77º, nº 2 da LGT).
As explicações produzidas à “posterior” pela entidade administrativa que praticou o acto não se integram na respectiva fundamentação (cfr., nomeadamente, J. M. Botelho, A. Pires Esteves e J. Cândido de Pinho, “CPA anotado”, 1992, fls. 360, J.M, Sérvulo Correia, Noções de Direito Administrativo”, pgs. 405/406”).
Ora, no caso vertente, é manifesto que a nota de liquidação a que alude o ponto 1 do probatório não permite saber como foi alcançado o valor patrimonial tributário em que assenta o acto de liquidação impugnado e não encontra expressão na factualidade levada probatório que “em qualquer liquidação respeitante a período anterior, ou através de qualquer outra comunicação, a Administração Tributária tenha alguma vez dado a conhecer ao Contribuinte ao motivos porque o valor patrimonial tributário foi fixado no valor constante do documento de fls, 12”.
Assim, na linha do acórdão deste Supremo Tribunal em que se louva a sentença recorrida, não se vê como não sufragar o entendimento de que o acto impugnado padece do vício de falta de fundamentação, determinante da sua anulabilidade.
Apenas se acrescentará que, como claramente deles resulta, são distintos os contornos que conduziram às decisões que a ora recorrente invoca em abono da sua argumentação recursiva (Conclusões N. e DD), sendo essa circunstância o factor determinante da verificada inexistência de oposição relevante entre esses arestos e o acórdão em que se que se louva a sentença ora recorrida (cfr. os Acórdãos proferidos nos Recs n-ºs 0277/12 e 01126/11 de 10.04.2013 e 16.102013, respectivamente).
Pronuncio-me, pois, sem mais delongas, pela improcedência do presente recurso e, consequentemente, pela manutenção do julgado.
É o meu parecer.»

2 – FUNDAMENTAÇÃO

O Tribunal de primeira instância deu como provada a seguintes factualidade:

1. A Impugnante foi notificada da liquidação 2007 159333103 de 19.02.2008, referente a Imposto Municipal sobre Imóveis do ano de 2007, com o valor total de €1 364, 80, e ao imóvel ali identificado, da freguesia da ……., concelho do Porto, a que corresponde o artigo U -00313 e cujo valor patrimonial tributário é de €170 600, 56 - cfr. documento de liquidação constante de fls. 12 dos autos para cujo teor se remete e o qual se dá por inteiramente reproduzido para os efeitos legais;
2. A Impugnante é titular de 1/3 do prédio identificado em 1., sendo também titular da parte correspondente quanto aos rendimentos inscritos - cf. docs. de fls. 16 e 17 e informação de fls. 13, todos do Processo Administrativo apenso aos autos.
3. Por escritura pública celebrada em 9.12.1986, a impugnante, A…….., por si e em representação de B……. e esposa e C……… e esposa, declararam dar de arrendamento à sociedade D………., Lda., ali representada por E……… e F………., o rés-do-chão, com entrada pelos números …… a ……. do prédio urbano sito na Rua ……, freguesia da …….., Porto, inscrito na respectiva matriz sob o artigo 313 - cfr. contrato de arrendamento constante de fls. 18 a 24 dos autos, para o qual se remete e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para os efeitos legais.
4, Da escritura referida no ponto anterior consta, entre o mais, que “o prazo de duração é de um ano, considerando-se prorrogado por iguais e sucessivos períodos, e teve o seu início em 1 de Maio do corrente ano”, - cfr. contrato de arrendamento constante de fls. 18 a 24 dos autos, para o qual se remete e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para os efeitos legais;.
5. A renda mensal, imóvel identificado em 1 era, em Janeiro de 1989 de 133 455$00 (€665, 67) - cfr. recibo de renda 5/1989, constante de fls. 26 dos autos para o qual se remete e cujo teor se dá por inteiramente reproduzido.

3-Do Direito:

A sentença recorrida julgou procedente a impugnação com a seguinte fundamentação de direito (destacam-se apenas os trechos mais relevantes com interesse para o presente recurso):

A………., NIF ………, com residência e domicilio fiscal na Rua ………, nº ……., Habitação …….., cidade do Porto vem, nos termos e com os fundamentos previstos no art. 99º a) e 102º nº1 d) do Código de Procedimento e Processo Tributário, deduzir Impugnação Judicial contra a liquidação de Imposto Municipal sobre Imóveis do ano de 2007, relativamente ao prédio urbano, inscrito na matriz urbana da freguesia da ………, sob o artigo 00313, no valor de €1 364, 80, o que faz com os seguintes argumentos:
Falta de fundamentação legalmente exigida - a notificação que lhe foi feita não observa os requisitos imperativamente estabelecidos no art. 77º nº2 da Lei Geral Tributária, relativamente ao dever de fundamentação do acto tributários imposto pelo art. 268º nº3 da Constituição da República Portuguesa, o que seria dispensável, para o ano de 2007, se tal fundamentação houvesse sido feita no lançamento e liquidação do ano de 2003 o que não aconteceu. Não foi feita qualquer referência à razão por que o valor patrimonial tributário é o que vem indicado no documento de cobrança, desconhecendo o Impugnante quais as operações efectuadas para o apuramento da matéria colectável.
Erro no lançamento e liquidação de imposto - o imposto foi liquidado nos termos do art. 16º nº5 do DL 287/2003 quando devia tê-lo sido com base no art. 16º n.º 4 desse mesmo diploma.
Em suma, o acto tributário aqui Impugnado - Imposto Municipal sobre Imóveis de 2007 - praticado pela Administração Fiscal na base de uma interpretação errada da ei e desprovida de fundamentação legalmente exigida, não pode subsistir, porque:
Não se encontra minimamente fundamentado, sem qualquer explicação relativa às operações efectuadas para o apuramento da matéria tributável, tanto mais indispensável quanto se tratava de um imposto novo, estrutural e profundamente diferente do que veio substituir, permanecendo, até à presente data, sem qualquer explicação (fundamentação) ao Sujeito Passivo;
• O lançamento e a liquidação do imposto foram feitos com base numa norma jurídica - art. 16º n.º 5 do DL 287/2003 - que era inaplicável ao caso;
• O lançamento e a liquidação do imposto deviam ter sido feitos com base no disposto nos n.º 1, 2, 3 e 4 do art. 16 do DL 287/2003;
• Verificam-se, desde modo, os fundamentos de impugnação judicial previstos no art. 99º e Código de Procedimento e Processo Tributário, aplicável por remissão do art. 129º do Código do Imposto Municipal sobre imóveis, com a consequente anulação da liquidação impugnada - art. 124º nº1 do Código de Procedimento e Processo Tributário.
Conclui pedindo que a presente Impugnação Judicial seja recebida e, a final, julgada procedente, por provada, com todas as consequências da lei, nomeadamente a anulação da liquidação de Imposto Municipal sobre Imóveis do ano de 2007, aqui objecto de impugnação.
Com a Petição Inicial juntou documentos e arrolou testemunhas.
Recebida a Impugnação foi o Ilustre Representante da Fazenda Pública notificado para contestar o que fez - cfr. fls. 38 e seguintes dos autos.
Na contestação apresentada o Ilustre Representante da Fazenda Pública pugna pela improcedência da Impugnação por remessa para os argumentos expendidos em sede de reclamação graciosa.
Por despacho judicial datado de 25.07.2012 foi dispensada a produção de prova testemunhal - cfr. despacho de fls. 60 dos autos.
Foram os autos com vista ao Ministério Público que emitiu fundamentado parecer onde conclui:
“cremos que assiste razão à impugnante quando alega que desconhece em absoluto quais as operações efectuadas para o apuramento da matéria tributável (valor patrimonial tributário) tanto que essa falta já tinha ocorrido no lançamento e liquidação referentes a 2003.
Com efeito, da liquidação consta apenas o valor patrimonial tributário, a taxa aplicada e a colecta, desconhecendo-se os critérios usados pela Administração Tributária na determinação do valor patrimonial do prédio urbano em causa e que constam do Capítulo VII do CIMI.
Daí que ocorra, a nosso ver, o apontado vício de forma, por falta de fundamentação da liquidação. Fica assim prejudicada a apreciação dos restantes vícios invocados.
Pelo exposto, somos de parecer que a impugnação deve ser julgada improcedente».
Saneamento
(…)
FUNDAMENTAÇÃO
(…)
Questão a decidir:
Saber se deve ser anulada a liquidação de Imposto Municipal sobre Imóveis de 2007 por falta de fundamentação. Isto porque os fundamentos do acto que lhe foram comunicados através do documento de cobrança não permitem saber «a razão por que o valor patrimonial tributário é o que vem indicado naquele documento», o que se exigia tanto mais quanto o Imposto Municipal sobre Imóveis era, à data, «um imposto novo, com regras novas, assente em valores tributáveis novos». A falta de fundamentação quanto ao modo como foi fixado o valor patrimonial tributário viola o disposto no art. 77.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária, e no art. 268º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa (CRP).
Quanto à decisão a proferir no caso concerto, faremos apelo ao Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 10.04.2012, proferido no âmbito do processo 036/12 e relatado por Francisco Rothes, disponível em www.dgsi.pt, que decidiu questão em tudo semelhante à dos autos, apenas diferindo relativamente ao período tributário, referindo ali ao ano de 2004 e aqui ao ano de 2007.
Assim, passaremos a transcrever:
Acórdão sumariado nos seguintes termos:
I - Os actos tributários estão sujeitos a fundamentação (art. 268º, n.º 3, art., 77.º da Lei Gerar Tributária e art., 25.º do Código de Procedimento Administrativo).
II - A liquidação de Imposto Municipal sobre imóveis que não dá conta alguma da forma como foi determinado o valor patrimonial tributário não pode ter-se por suficientemente fundamentada, a menos que se demonstrasse que a Administração Tributária anteriormente tinha procedido à pertinente comunicação dos motivos por que esse valor foi fixado no montante considerado naquele acto.
É inquestionável e não vem questionada a exigência de fundamentação do acto impugnado.
É também inequívoco, e nisso todos os intervenientes processuais estão de acordo, que o documento de cobrança remetido ao Contribuinte - do qual constam os únicos elementos que podem considerar-se integrantes da declaração fundamentadora da liquidação ora impugnada que foram externados pela Administração Tributária - refere a localização do prédio, o artigo matricial, o valor patrimonial tributário, a data da liquidação, o ano a que respeita, a taxa aplicada e a colecta apurada.
A questão suscitada nos autos resume-se a saber se os elementos constantes daquela nota são ou não suficientes para dar cumprimento às exigências legais de fundamentação no que se refere à determinação do valor patrimonial tributário.
A nosso ver, a Recorrente não logrou de modo algum pôr em causa o que foi decidido a esse propósito. Senão vejamos:
A Recorrente limita-se a afirmar, conclusivamente, que os elementos constantes do referido documento de cobrança são bastantes para que o Contribuinte «conheça a razão da liquidação impugnada», mas nada refere quanto à questão que foi a que determinou a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto a anular a liquidação, qual seja a que a fundamentação externada não permite ao Contribuinte saber como foi alcançado o valor patrimonial tributário do prédio a que se refere a liquidação. A esse propósito, como abundantemente ficou referido na sentença, a fundamentação é totalmente omissa.
Como bem ficou dito pela Juíza do Tribunal a quo, a fundamentação externada não permite saber se o valor patrimonial tributário indicado «decorre da aplicação dos coeficientes constantes da Portaria n.º 1337/2003 de 05/12, porque a Administração Tributária considerou tratar-se de um prédio urbano não arrendado (art. 16º, nºs 1 a 4) ou apenas arrendado até Dezembro de 1988 (art. 16º, n.º 5), ou se foi determinado de acordo com os arts, 37.º a 46.º do Código de Imposto Municipal sobre Imóveis», sendo que «[n]em sequer é uma conclusão imediata que à situação dos autos fosse aplicável (apenas) uma daquelas normas […] pois nada é dito na liquidação quanto ao facto de o prédio estar ou não arrendado, ou até quando o esteve ou quanto a não ter sido feita a sua avaliação».
Por outro lado, relativamente à referência feita na referida nota de cobrança ao art. 25.º do Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro, a que a Recorrente insiste em conceder relevância ao nível da fundamentação do valor patrimonial tributário (cfr. conclusão IX), já a sentença deixou dito que a mesma nada «elucida quanto á matéria de avaliação patrimonial do artigo matricial, pois esta norma prevê apenas um regime de salvaguarda, estabelecendo limites ao aumento do Imposto Municipal sobre Imóveis.».
Concluindo, temos como cedo que a Administração Tributária não deu a conhecer o que a levou a apurar o valor patrimonial de € 166.129,00 e não outro qualquer, sendo que o documento de fls. 12 não permite saber se aquele valor tem fundamento no estatuído no art. 16.º, nºs 1 a 4, n.º 5 ou no art. 17.º do Decreto-Lei n.º 287/2003 ou se foi determinado nos arts. 36.º a 47.º do Código de Imposto Municipal sobre Imóveis ou até com base em quaisquer outras disposições legais, tudo como bem ficou dito na sentença recorrida.
Nem se diga que essa fundamentação já anteriormente tinha sido comunicada ao Contribuinte, pois não ficou demonstrado que em qualquer liquidação respeitante a período anterior, ou através de qualquer outra comunicação, a Administração Tributária tenha alguma vez dado a conhecer ao Contribuinte os motivos por que o valor patrimonial tributário foi fixado no valor constante do documento de fls. 12.
Em conclusão, temos como cedo que o acto tributário sindicado está insuficientemente fundamentado, o que consubstancia vício de forma que determina a sua anulação, como bem decidiu a sentença recorrida.

2.2.4 CONCLUSÕES
Preparando a decisão, formulamos seguintes conclusões:
- Os actos tributários estão sujeitos a fundamentação (art. 268º, n.º 3, art. 77.º da Lei Geral Tributária e art. 125.º do Código de Procedimento Administrativo).
II - A liquidação de Imposto Municipal sobre Imóveis que não dá conta alguma da forma como foi determinado o valor patrimonial tributário não pode ter-se por suficientemente fundamentada, a menos que se demonstrasse que a Administração Tributária anteriormente tinha procedido à pertinente comunicação dos motivos por que esse valor foi fixado no montante considerado naquele acto,”
Ora, considerando toda a argumentação exposta, bem como o teor da nota de liquidação recebida pela Impugnante - ver facto provado nº1 - onde se fixa o valor patrimonial tributário do imóvel em €170 600, 56, sem que ao Sujeito Passivo seja dada qualquer explicação relativamente à forma como tal valor foi obtido, semelhante conclusão havemos de tirar julgando, consequentemente, a presente Impugnação improcedente, pelo vício de falta de fundamentação, anulando a liquidação correspondente,
Considerando a procedência do vício de falta de fundamentação, fica prejudicado o conhecimento das restantes questões colocadas a este Tribunal Administrativo e Fiscal,
Julga-se assim a Impugnação inteiramente procedente.
Decisão
Pelo exposto e nos termos das disposições legais citadas, considero procedente a presente impugnação decidindo, consequentemente anular a liquidação impugnada, relativa a Imposto Municipal sobre Imóveis no valor de €1 364, 80.
Custas pela Fazenda Pública, sem prejuízo de isenção em vigor.

DECIDINDO NESTE STA

A questão a apreciar e decidir é a de saber se (a sentença fez correcto julgamento quando decidiu que) a liquidação impugnada não está suficientemente fundamentada no que concerne ao valor patrimonial tributário utilizado na liquidação do IMI ora impugnada (2007).


DA FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DA LIQUIDAÇÃO IMPUGNADA
É inquestionável a exigência legal de fundamentação do acto impugnado.
Do documento de cobrança remetido ao Contribuinte constam os únicos elementos que podem considerar-se integrantes da declaração fundamentadora da liquidação ora impugnada que foram externados pela AT – refere a localização do prédio, o artigo matricial, o valor patrimonial tributário, a data da liquidação, o ano a que respeita, a taxa aplicada e a colecta apurada.
A questão suscitada nos autos resume-se a saber se os elementos constantes daquela nota são ou não suficientes para dar cumprimento às exigências legais de fundamentação no que se refere à determinação do valor patrimonial tributário.
A Recorrente afirma, que carece de sentido a referência expressa na sentença de que não se encontra fundamentado o iter cognoscitivo percorrido pela AT para fixar o valor patrimonial encontrado de Eur 170.600,56 referido no acto de liquidação, e destaca que não é de atender exclusivamente aos elementos constantes do Documento de Cobrança/ Nota de liquidação do IMI pelas razões aduzidas nas conclusões de recurso, designadamente H) a M).
A recorrente considera que houve erro de julgamento, porque a notificação do acto tributário não só contém todos nos elementos legalmente necessários, como o seu destinatário não deixou de se pronunciar expressamente na petição inicial sobre a fundamentação do acto, onde demonstra compreender perfeitamente as razões que subjazem à liquidação e que eram essenciais à sua defesa,
Vejamos:
A ora recorrente impugnou o IMI de 2007 considerando que a liquidação não se encontra fundamentada, sem qualquer explicação relativamente às operações efectuadas para apuramento da matéria tributável e que o lançamento e liquidação do imposto foram feitos com base no artº 16º nº 5 do DL 287/2003 quando devia ter sido efectuada com base nos nºs 1, 2, 3 e 4 do mesmo preceito legal (o que terá a seu ver gerado erro no lançamento e liquidação do imposto, dizendo que a aplicação ao valor da matriz (€ 729,54) dos coeficientes de actualização previstos na Portaria nº 1337/2003, nos termos do nº 4 do artigo 16º do DL nº 287/2003, dá um valor patrimonial de €2.582.58 e não de €170.600.56, como está referido no documento de cobrança pelo que no caso em apreço não tem aplicação a norma do nº 5 do artº 16 do D. L. nº 287/2003).

A decisão recorrida, e também a contribuinte recorrida nas contra-alegações, focalizam a fundamentação do acto impugnado apenas no documento, de fls.12 através do qual se notificou a recorrida para proceder ao pagamento da 1ª prestação do IMI do ano de 2007.
No processo administrativo apenso nº 22/2009 o Sr. Chefe do Serviço de Finanças do Porto 5, foi informado designadamente que:
“(…)
2. A última actualização da matriz foi efectuada em 1989 em resultado do tratamento da declaração de rendas do prédio urbano total ou parcialmente arrendado, entregue em 1989-02-21, referente às rendas recebidas durante o ano de 1988, conforme fotocópia a fls. 17 dos autos.
3. O valor total das rendas convencionadas foi de 19.802,62 €, que depois de deduzido 15% de despesas de conservação deu origem a um rendimento colectável de 16.832,23 €, conforme consta da fotocópia da matriz a fls. 15 e 16 dos autos.
4. Com a entrada em vigor do Código da Contribuição Autárquica, o referido rendimento colectável foi convertido em valor patrimonial (16.832,23€ x 15), que passou a ser de 252.483, 37€.
5. Com a publicação e entrada em vigor do Código do IMI, foi criado um regime de transição, que prevê no nº 5 do art. 16º do D.L. nº 287/2003 de 12/11, que a actualização do valor tributário, no caso de prédios urbanos arrendados que o deixaram de estar até 31 de Dezembro de 1988, é aplicado ao valor patrimonial resultante da renda o coeficiente correspondente ao ano a que respeita a última actualização da renda.
(...)
9. Assim e conforme se encontra determinado, o valor patrimonial para efeitos de IMI, foi calculado partindo do valor patrimonial inicial, apurado com base na última declaração de rendas entregue no ano de 1989 referente ao ano de 1988, actualizado com base nos coeficientes de desvalorização da moeda previstos na Portaria nº 1337/2003 de 05/12, (252.483,37€ x 1.97) de onde resultou o valor patrimonial actualizado é de 497.392,24€ conforme print a fls. 18 dos autos.
10. No ano de 2007 e conforme o previsto no artº 138º do CIMI, o referido valor patrimonial foi actualizado e passou para Eur 512.314,00 (Eur 497.392,23 x 1.03), conforme print a fls. 19 dos autos.
11. De onde resulta que contrariamente ao pretendido, o imposto devido para o ano de 2007 é de Eur 1.364,80 (Eur 512.314,00 : 3x0,80)”

Explicam-se pois, “à posteriori”, as razões em que assentou a liquidação do IMI impugnado mas a verdade é que tais elementos não podem ser considerados agora à mingua de no probatório nada se ter referido quanto à existência de reclamações seja contra o acto de fixação do valor patrimonial tributário do prédio em causa nos autos seja contra actos de liquidação do IMI respectivo, de anos anteriores. Também o mesmo probatório é omisso quanto a eventuais comunicações em anos anteriores por parte da AT à contribuinte das razões pelas quais o valor patrimonial tributário foi fixado no valor considerado no acto de liquidação ora impugnado (o que é pertinente saber pois que os actos de liquidação de IMI não necessitam de dar conta anualmente da forma como foi fixado o valor patrimonial do respectivo prédio) e se houve ou não reclamação, não obstante a própria impugnante ter apresentado com a petição inicial os docs. de fls. 13 a 17.

Assim considerando que a impugnante se insurgiu contra o facto do IMI ter sido actualizado com base na norma do nº 5 do artigo 16º do DL nº 287/2003 e não com base na norma do nº 4 do mesmo artigo (No seu entender, claramente expresso, o prédio continuou arrendado após 31 de Dezembro de 1988 e por isso a norma do nº 5 daquele artigo não pode ser aplicada). E, que diferente entendimento tem a administração tributária, para quem a actualização deve ser feita nos termos do nº 5, porque nos prédios não arrendados devem incluir-se aqueles que o deixaram de estar após 31/12/1988, caso não se verifiquem os requisitos do artigo 17º) e sendo a fundamentação um requisito formal da decisão, que não se confunde com o seu conteúdo, não poder deixar de se entender que a impugnante teve de alguma forma conhecimento, do juízo que a administração tributária efectuou para decidir no sentido em que decidiu. Como já se disse o autor do acto impugnado considera que a actualização do valor patrimonial tributável do prédio deve ser feita nos termos do nº 5 e não do nº 4 do artigo 16º do referido Decreto-Lei, mas não temos de facto elementos nos autos que nos permitam afirmar com segurança que houve comunicação de tais razões ou motivos à contribuinte recorrida.

Assim o juízo de falta de fundamentação do acto de liquidação parece precipitado sendo essencial levar ao probatório os factos/elementos supra mencionados a título meramente exemplificativo sendo essencial que fique claro se anteriormente à liquidação do IMI de 2007 já tinha sido comunicada à contribuinte a forma como foi determinado o valor tributável do prédio que o gerou, designadamente se em liquidações de IMI anteriores e referentes ao mesmo prédio, ou através de qualquer outra comunicação a AT alguma vez deu a conhecer à contribuinte os motivos pelos quais a o valor patrimonial foi fixado no concreto valor considerado na liquidação impugnada.

Verificamos ainda que, a recorrente considera que a falta de razão da impugnante e que justifica que se tenha tido por base o regime transitório - não o especifico para os prédios arrendados, mas o dos não arrendados, reside em a impugnante não ter apresentado qualquer prova quanto ao facto de o prédio em causa não deixar de estar arrendado até 31 de Dezembro de 1988, ou, nesta data, continuar a estar arrendado, em cumprimento do preceituado no artigo 18.º do Decreto-Lei - que a AT procedeu à actualização do valor patrimonial do imóvel ora em crise (conclusão L)
E na verdade, para se aplicar o regime transitório da actualização dos valores patrimoniais dos prédios constante dos artigos 176 e 17º do DL nº 287/2003, é preciso conhecer se o prédio continuou arrendado após 31/12/1988, se deu lugar ao pagamento de rendas até 31/12/2001, se houve declaração de rendas para efeitos de IRS até 31/12/2002 e se houve participação da última renda mensal recebida até 12/12/2003. A impugnante alegou que o contrato se manteve em vigor, juntando até um recibo de renda, mas não consta dos factos provados de que estava em vigor naquelas datas ou se houve declaração e participação daquelas rendas.
Ora a recorrente considera que a falta de razão da impugnante e que justifica que se tenha tido por base o regime transitório - não o especifico para os prédios arrendados, mas o dos não arrendados, reside em a impugnante não ter apresentado qualquer prova quanto ao facto de o prédio em causa não deixar de estar arrendado até 31 de dezembro de 1988, ou, nesta data, continuar a estar arrendado, em cumprimento do preceituado no artigo 18.º do Decreto-Lei - que a AT procedeu à atualização do valor patrimonial do imóvel ora em crise (conclusão L)
E na verdade, para se aplicar o regime transitório da actualização dos valores patrimoniais dos prédios constante dos artigos 176 e 17º do DL nº 287/2003, é preciso conhecer se o prédio continuou arrendado após 31/12/1988, se deu lugar ao pagamento de rendas até 31/12/2001, se houve declaração de rendas para efeitos de IRS até 31/12/2002 e se houve participação da última renda mensal recebida até 12/12/2003. A impugnante alegou que o contrato se manteve em vigor, juntando até um recibo de renda, mas não consta dos factos provados de que estava em vigor naquelas datas ou se houve declaração e participação daquelas rendas.
Considerando a factualidade que importa apurar e atendendo a que a sentença recorrida cai em erro de julgamento quando atende exclusivamente aos elementos constantes do documento de cobrança do IMI, impõe-se por isso a anulação da mesma e a baixa do processo à primeira instância para averiguação da factualidade referida, e outra que se entenda conveniente, essencial para a apreciação e decisão da questão da fundamentação e legalidade do acto de liquidação de IMI referente ao ano de 2007.

4- DECISÃO:
Pelo exposto, acordam em conceder provimento ao recurso, anular a sentença recorrida e ordenar a baixa do processo para ampliação da matéria de facto e aplicação do direito correspondente.

Sem custas.
Lisboa 26 de Novembro de 2014. – Ascensão Lopes (relator) - Ana Paula Lobo – Dulce Neto.