Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0840/16.9BEAVR
Data do Acordão:10/12/2022
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:IMPOSTO MUNICIPAL SOBRE TRANSMISSÃO ONEROSA DE IMOVEIS
ARRENDAMENTO
Sumário:I - O artº.1025, do C. Civil, estabelece a duração máxima de trinta anos para o contrato de locação, o qual, quando tenha por objecto coisa imóvel, se designa por arrendamento (cfr.artº.1023, do C.Civil).
II - Nos termos do artº.2, nº.2, al.c), do C.I.M.T., tal como já acontecia em sede de regime da antiga Sisa (cfr.artº.2, §1, 4º., do C.Sisa), o legislador ficciona como transmissão sujeita a imposto a situação em que é celebrado um contrato de arrendamento/subarrendamento de um bem imóvel por mais de trinta anos.
III - O citado normativo deve ser interpretado no sentido de que o legislador ficciona como transmissão sujeita a imposto a situação em que é celebrado um contrato de arrendamento/subarrendamento de um bem imóvel por mais de trinta anos, e somente neste caso a transmissão, para efeitos do I.M.T., ocorre na data da celebração do contrato, incidindo o imposto sobre a transmissão, também nessa data. Já assim não acontecerá, pelo que estão fora da previsão de incidência objectiva da norma, os casos em que o arrendamento é celebrado por prazo não superior a trinta anos, apesar da possibilidade de prorrogação contratual, por acordo dos contraentes e ocorrida durante a vigência do contrato.
(sumário da exclusiva responsabilidade do relator)
Nº Convencional:JSTA00071573
Nº do Documento:SA2202210120840/16
Data de Entrada:12/17/2020
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A............, S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
ACÓRDÃO
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RELATÓRIO
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O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mº. Juiz do T.A.F. de Aveiro, constante a fls.357 a 363 do processo, a qual julgou procedente a presente impugnação intentada pela sociedade recorrida, "B…………, S.A.", anterior "A…………, S.A.", visando acto de liquidação de I.M.T., relativo ao ano de 2009 e no valor total de € 637.361,51, já incluindo juros compensatórios.
X
O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.365 a 374-verso do processo físico) formulando as seguintes Conclusões:
I-Visa o presente recurso reagir contra a sentença proferida nos autos em epígrafe, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A…………, S.A. contra a liquidação de IMT referente ao ano de 2009.
II-A questão decidenda a submeter ao julgamento do Tribunal ad quem consiste em saber se a sentença padece de erro de julgamento de direito, por ter decidido no sentido da inexistência de facto tributário sujeito a IMT na data da celebração do contrato de arrendamento, por não aplicação do disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 2.º do Código do IMT.
III-Quanto aos factos dados como provados, acompanhamos e remetemos, por uma questão de economia processual, para a formulação do Tribunal a quo que se encontra elencada nas pág. 3 a 7 da sentença, a qual não nos merece qualquer reparo ou censura.
IV-A divergência da recorrente prende-se com a fundamentação de direito que o Tribunal entendeu verter em tal decisão e que conduziu à anulação da presente liquidação.
V-O IMT sujeita a imposto os arrendamentos ou subarrendamentos a longo prazo, considerando como tais aqueles que “devam durar mais de 30 anos”.
VI-A incidência do imposto ocorre apesar de não resultar desses contratos qualquer transmissão de direitos reais.
VII-A sujeição a imposto resulta de uma ficção legal de transmissão que a lei estabelece, o que igualmente ocorre com outros tipos de actos ou contratos tipificados no CIMT.
VIII-Esta opção legislativa explica-se pela preocupação do legislador no sentido de evitar situações de fraude e evasão fiscais.
IX-Tal como noutras situações que a lei tipifica, o legislador do IMT considera que a disponibilidade do gozo de um bem por um período prolongado de tempo, neste caso de 30 anos, corresponde, em termos materiais e de valor económico, à titularidade dos direitos reais correspondentes sobre os bens.
X-O conceito do arrendamento ou subarrendamento a longo prazo considera-se consubstanciado pela duração, por mais de 30 anos, do arrendamento.
XI-Essa duração pode ser convencionada, desde logo, no contrato ou em negócio jurídico posterior, do qual resulte a prorrogação.
XII-O que releva para a sujeição é a existência de um acordo de vontades, do qual resulte a formação do direito ao arrendamento por período superior aos 30 anos.
XIII-Se esse direito emerge imediatamente do contrato, independentemente da designação que tiver, haverá sujeição a imposto.
XIV-Se o mesmo direito emergir de qualquer outra convenção contratual acordada entre as partes, da qual resulte uma prorrogação que faça ultrapassar aquele prazo, independentemente da designação dessa convenção, haverá sujeição ao imposto.
XV-A incidência ocorre na data da celebração da convenção contratual em que se constitua um direito ao arrendamento que, na soma da sua vigência, o faça ultrapassar a duração dos 30 anos.
XVI-Se essa duração resultar, desde logo, do contrato, é na data da sua celebração que ocorre a incidência.
XVII-Quando o contrato contém uma cláusula a estabelecer que o mesmo é celebrado por 30 anos, seguida de uma outra que prevê uma cláusula vinculativa de prorrogação por períodos sucessivos de cinco anos, salvo em caso de denúncia do contrato, a incidência ocorre na data da celebração daquele.
XVIII-Neste caso, o que resulta do contrato é um arrendamento que, desde logo, se fixa por um período superior a 30 anos, pelo que se preenchem os pressupostos da incidência do imposto.
XIX-A doutrina vertida na informação vinculativa referida na sentença não infirma, mas – ao invés – corrobora, a posição da recorrente.
XX-Incorreu-se na sentença em erro de julgamento de direito, por violação do disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 2.º do Código do IMT, devendo esta norma ser interpretada e aplicada no sentido de que, nos contratos de arrendamento que contenham uma cláusula que estabeleça que o contrato é celebrado por 30 anos, seguida de uma outra que estipule uma cláusula vinculativa de prorrogação por períodos sucessivos de cinco anos, salvo em caso de denúncia do mesmo, a incidência ocorre logo na data da celebração do contrato.
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A sociedade impugnante e ora recorrida produziu contra-alegações no âmbito da instância de recurso (cfr.fls.377 a 383-verso do processo físico), as quais encerra com o seguinte quadro Conclusivo:
1-A Recorrente não se conforma com a decisão de 30.09.2020 proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro que anulou as liquidações de IMT e juros compensatórios, referentes ao ano de 2009, com fundamento na inexistência de facto tributário sujeito a IMT na data da celebração de contrato de arrendamento por parte da Recorrida.
2-Para a Recorrente “Dando-se por assente que o contrato não tem uma duração inicial superior a 30 anos, a questão que aqui se levanta prende-se, assim, com a determinação da data da produção do facto gerador no caso da prorrogação da sua vigência, mais concretamente se se verifica na data da celebração do contrato ou apenas na data da sua prorrogação”.
3-Alega em suma, a Recorrente que a decisão recorrida “(…) incorreu-se na mesma em erro de julgamento de direito, por violação do disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 2.º do Código do IMT, devendo esta norma ser interpretada e aplicada no sentido de que, nos contratos de arrendamento que contenham uma cláusula que estabeleça que o contrato é celebrado por 30 anos, seguida de uma outra que estipule uma cláusula vinculativa de prorrogação por períodos sucessivos de cinco anos, salvo em caso de denúncia do mesmo, a incidência [de IMT] ocorre logo na data da celebração do contrato”.
4-A Recorrida não pode concordar com a interpretação dada pela Recorrente ao disposto na al. c) do n.º 2 do art. 2º do art. 2º do Código do Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas, entendendo que bem andou o Tribunal a quo ao anular as liquidações de IMT e juros compensatórios com fundamento na existência de facto tributário no momento de celebração do contrato.
5-A sentença recorrida não enferma, assim, de qualquer erro de julgamento tendo interpretado e aplicado correctamente ao presente caso o disposto na al. e) do n.º 2 do art. 2º do CIMT.
Vejamos:
6-De acordo com o disposto no n.º 1 e al. c) do n.º 2 do art. 2º do CIMT “O IMT incide sobre as transmissões, a título oneroso, do direito de propriedade ou de figuras parcelares desse direito, sobre bens imóveis situados no território nacional”, sendo que “(…) integram, ainda, o conceito de transmissões bens imóveis: (…) Os arrendamentos ou subarrendamentos a longo prazo, considerando-se como tais os que devam durar mais de 30 anos quer a duração seja estabelecida no início do contrato, quer resulte de prorrogação, durante a sua vigência, por acordo expresso dos interessados, e ainda que seja diferente o senhorio, a renda ou outras cláusulas contratuais”.
7-Do contrato de arrendamento celebrado pela Recorrida em 08.08.2009, resulta que (cfr. Cfr. ponto B dos factos dados como provados na sentença recorrida):
a) O arrendamento tem a duração de 30 (trinta) anos;
b) A duração inicial do arrendamento de 30 anos poderá ser prorrogada se nenhuma das Partes denunciar o contrato mediante notificação dirigida à outra Parte com pelo menos um ano de antecedência relativamente ao termo do período inicial.
8-Assim, quanto à duração do arrendamento estabelecida no contrato, resulta claro que a mesma é igual a 30 anos (e não superior a 30 anos), pelo que, à luz do disposto na al. c) do n.º 2 do art. 2º do CIMT, inexiste qualquer facto tributário sujeito a IMT na data da celebração do contrato (08.08.2009).
9-No que se refere à prorrogação da inicial duração do arrendamento, durante a sua vigência, é certo que o contrato de arrendamento celebrado pela Recorrida prevê a sua renovação automática. Contudo,
10-O facto de o contrato prever a possibilidade da sua renovação, e por isso, prever a possibilidade da prorrogação da sua duração inicial, não consubstancia, por si só, um facto tributário sujeito a IMT no momento da celebração do contrato. Porquanto,
11-A possibilidade de renovação do contrato e, por isso, a possibilidade de prorrogação da sua duração inicial de 30 anos, está dependente da não oposição expressa das Partes a essa renovação/prorrogação.
12-Com efeito, o facto tributário sujeito a IMT apenas ocorrerá in casu se as Partes do contrato não se opuserem expressamente à renovação do mesmo.
13-Ao contrário do alegado pela Recorrida, a prorrogação da duração inicial do contrato não ocorre automaticamente com a sua celebração.
14-A prorrogação da duração inicial do contrato apenas ocorrerá com a sua efectiva renovação - o que ainda não sucedeu, nem é ainda possível saber se sucederá, na medida em que as Partes podem opor-se a essa renovação dentro do prazo contratualmente previsto para o efeito.
15-A previsão de uma cláusula de renovação automática num contrato de arrendamento, não implica qualquer a obrigação jurídica de vigência do contrato para além da duração inicial nele estabelecida, uma vez que as Partes podem opor-se a essa renovação, através da denúncia do contrato.
16-Por isso, e ao contrário do alegado pela Recorrente, o dever do senhorio de disponibilizar o imóvel à Recorrida por tempo superior a 30 anos não ocorre com a celebração do contrato de arrendamento, tal dever só ocorrerá se este decidir não se opor à renovação do contrato.
17-Tendo o contrato de arrendamento sido celebrado pela Recorrida por um prazo igual a 30 anos e não sendo possível determinar, à data da celebração do contrato, se o arrendamento deverá ter uma vigência superior a 30 anos, sobre o mesmo não pode, de modo algum, incidir o IMT.
18-De facto, o IMT apenas poderá vir a incidir sobre o referido arrendamento se e quando for possível determinar que o mesmo deverá vigorar por mais de 30 anos – o que apenas ocorrerá com a sua efectiva renovação.
19-O entendimento sufragado pela Recorrente de que o facto tributário sujeito a imposto ocorre na data da celebração do contrato, independentemente da sua duração inicial, e não no momento em que a duração do contrato deva, em resultado da sua prorrogação, durar mais de 30 anos, não poderá em caso algum colher, porquanto, tal entendimento conduzir-nos-ia à conclusão absurda de que todos e quaisquer contratos de arrendamento que contenham cláusulas de renovação automática estão sujeitos a IMT no momento da sua celebração.
20-De facto, se, como defendido pela Recorrente, atendêssemos apenas à possibilidade prevista no contrato de renovação do prazo contratual (e não à sua duração inicial), todos os contratos de arrendamento que contivessem cláusulas de renovação automática estariam sujeitos a IMT na medida em que, nesse caso, todos se afigurariam potenciais arrendamentos de duração superior a 30 anos.
21-Ao aplicarmos o entendimento sufragado pela Recorrente constata-se que, por exemplo, um contrato de arrendamento celebrado com uma duração inicial de 15 anos, automaticamente renovável por períodos iguais e sucessivos de 5 anos, salvo denúncia expressa das Partes, estaria desde logo, na data da sua celebração, sujeito a IMT, na medida em que o mesmo prevê ad initio a possibilidade de renovações automáticas e, por isso, a possibilidade de a duração inicial do contrato ser prorrogada de forma a que a sua vigência seja superior a 30 anos (o que aconteceria se as partes não denunciassem o contrato e este se renovasse pelo menos 4 vezes).
22-Este entendimento – que é o entendimento da Recorrente – claramente não se coaduna nem se revê minimamente na letra da norma contida na al. c) do n.º 2 do art. 2º do CIMT, nem tão-pouco no pensamento do legislador.
23-No entender da Recorrente afigura-se pacífico que o que resulta do disposto na al. c) do n.º 2 do art. 2º do CIMT é que um arrendamento estará sujeito a IMT, nos casos em que o mesmo deva vigorar por período superior a 30 anos, o que sucederá nas situações em que contrato seja celebrado ad initio com uma duração inicial superior a 30 anos ou, quando celebrado com duração inicial inferior, nos casos em que em resultado das suas renovações/prorrogações a sua vigência deva durar mais de 30 anos. Pelo que,
24-Do exposto resulta claro que, o arrendamento celebrado pela Recorrida não se afigura como um arrendamento a longo prazo na acepção dada pela al. c) do n.º 2 do art. 2º do CIMT, não estando por isso sujeito a IMT no momento da sua celebração.
25-No mesmo sentido, e conforme aliás citado na sentença recorrida, refere José Maria Fernandes Pires a propósito do arrendamento de prédio a longo prazo que “A Lei prevê também a incidência do imposto nos casos de contratos de arrendamento celebrados inicialmente por um período inferior a 30 anos e posteriormente prorrogados por um período que uma vez adicionado ao período inicial, soma um total superior a 30 anos. Nesse caso o facto tributário sujeito a imposto ocorre na data da prorrogação do contrato (José Maria Fernandes Pires, “Lições de Impostos sobre o Património e do Selo”, 3ª Edição, 2015, pág. 245.)
26-Assim, bem andou o Tribunal a quo ao entender que a “(…) vingar a interpretação efetuada pela IT, de que o arrendamento é por prazo superior a 30 anos sempre que estiver previsto um prazo que, adicionado das eventuais prorrogações seja superior, ocorrendo o facto tributário aquando da sua celebração não pode vingar. A prevalecer esse entendimento, todos os contratos onde fosse clausulada a possibilidade de prorrogação e não fosse clausulado um limite a tais prorrogações seriam sempre sujeitos a IMT na medida em que, havendo prorrogações suficientes ao prazo inicial, sempre poderiam vigorar por mais de 30 anos. O desacerto da posição da AT é, assim, bem espelhado. No caso em apreço, o contrato prevê a possibilidade de prorrogação, mas também de oposição à renovação mediante denúncia. Tendo este a duração inicial de 30, o facto tributário ocorrerá (se nessa altura o CIMT ainda previr tal) na data da primeira renovação, porque só aí se encontra vigente contrato de arrendamento com duração superior a 30 anos”.
27-E, nessa medida, bem andou o Tribunal a quo ao decidir pela anulação das liquidações de IMT e juros compensatórios por inexistência de facto tributário no momento da celebração do contrato.
28-Por conseguinte, ao contrário do defendido pela Recorrente, não enferma a decisão recorrida de qualquer erro na interpretação e aplicação do disposto na al. c) do n.º 2 do art. 2º do CIMT, devendo a mesma ser mantida.
29-Pelo que, deverá o presente recurso improceder.
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no qual termina pugnando pelo provimento do recurso (cfr.fls.391 e 392 do processo físico).
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Corridos os vistos legais (cfr.fls.396 e 398 do processo físico), vêm os autos à conferência para deliberação.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.358 a 360 do processo físico):
A-Em 8 de Agosto de 2009 foi celebrado contrato de arrendamento para fins não habitacionais, entre «FUNDO DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO ABERTO …………» na qualidade de senhorio e «C…………, S.A.,» na qualidade de inquilino relativamente aos seguintes imóveis:
“1 - prédio urbano, denominado Lote …… - “……” , sito na Zona Industrial da ……, Rua …… composto por um edifício de rés-do-chão e andar, destinado a armazém de actividade industrial, com a área coberta de 2.314 m2 e descoberta de 1.851 m2, descrito na Conservatória do Registo Predial de ílhavo sob o n.º ……… - freguesia de Gafanha da Encarnação, omisso à matriz mas à mesma participado em virtude do que lhe foi atribuído o artigo provisório ………, tendo estado inscrito na matriz sob o artigo ………;
2 - prédio urbano, denominado Lote …… - “……” , sito na Zona Industrial da ……, Rua ……, composto por um edifício de rés-do-chão e andar, destinado a armazém e actividade industrial, com a área coberta de 2.553 m2 e descoberta de 2.003,50 m2, descrito na Conservatória do Registo Predial de ílhavo sob o n.º ………-freguesia de Gafanha da Encarnação, omisso à matriz mas à mesma participado em virtude do que lhe foi atribuído o artigo provisório ……, tendo estado inscrito na matriz sob o artigo ……;
3 - prédio urbano, composto pelos Lotes …… e ……, sito na Zona Industrial da ……, Rua ……, composto por um edifício de rés-do-chão, andar e logradouro destinado a armazém de actividade industrial, com a área coberta de 5.640 m2 e descoberta de 2.690 m2, descrito na Conservatória do Registo Predial de ílhavo sob o n.º ……-freguesia de Gafanha da Encarnação, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ……, tendo estado inscrito na matriz sob os artigos …… e …….”
[cfr. contrato de arrendamento constante da peça n.º 004476137 do SITAF fls. 1 a 7].
B-O contrato referido no facto precedente continha as seguintes cláusulas:
a. Cláusula segunda n.º 3:
“Os Locais Arrendados são entregues à Arrendatária na data de celebração do presente contrato”
b. Cláusula terceira, n.ºs 1 a 3:
“O contrato de arrendamento terá uma duração inicial de 30 (trinta) anos, com início na presente data.”
2. Findo o prazo inicial previsto no número um da presente cláusula, o contrato de arrendamento será automaticamente renovado por períodos iguais e sucessivos de 5 (cinco) anos, nos mesmos termos e condições, salvo se for denunciado por qualquer das Partes, de acordo com o estabelecido no presente contrato de arrendamento e nos termos prescritos na lei.
3. A denúncia do contrato de arrendamento por qualquer das Partes, nos termos previstos no número anterior, terá de ser notificada à outra parte com pelo menos um ano de antecedência relativamente ao termo do período inicial ou da sua renovação. As Partes expressamente acordam que a não renovação do presente contrato não confere o direito a qualquer compensação.”
[cfr. contrato de arrendamento constante da peça n.º 004476137 do SITAF fls. 1 a 7].
C-A Impugnante anteriormente tinha a designação de «C…………, S.A.»
[cfr. relatório da ação inspetiva constante de fls. 3 a 34 da peça do SITAF n.º 004476136].
D-A Impugnante foi alvo de ação inspetiva onde foi proposta a liquidação de IMT nos seguintes termos:
“III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORREÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS
(…)
III.3 EM SEDE DE IMT
III.3.1 EXERCÍCIO DE 2009
III.3.1.1. O Contrato de arrendamento para fins não habitacionais das instalações da empresa celebrado em 2009 – sujeição a IMT nos termos do artigo 2º, nº 2, alínea c) do CIMT
Conforme foi referido no ponto II.3.6.1. do presente relatório o sujeito passivo celebrou em 2009 um contrato de arrendamento para fins não habitacionais com o Fundo de Investimento Imobiliário Aberto ……… NIF ……… relativo às instalações onde funciona a A………… SA (anterior C…………) (anexo 9).
Segundo o teor do mesmo, o contrato de arrendamento foi celebrado, considerando o seguinte:
“ Terceiro - As partes celebraram no dia 9 de Junho de 2006 um contrato de promessa de arrendamento para fins não habitacionais.
Quarto - A Arrendatária tem intenção de no futuro vir a adquirir os imóveis ora locados, pelo que, e não obstante não se fixar no presente contrato qualquer opção de compra nesse sentido, o Senhoria desde já declara ter conhecimento da intenção da Arrendatária"
A Cláusula Terceira do documento define depois o Prazo, Denúncia e Revogação:
1. O contrato de arrendamento terá uma duração inicial de 30 (trinta) anos, com início na presente data.
2. Findo o prazo inicial previsto no número um da presente cláusula, o contrato de arrendamento será automaticamente renovado por períodos iguais e sucessivo de 5 (cinco) anos, nos mesmos termos e condições, salvo se for denunciado por qualquer das Partes, de acordo com o estabelecido no presente contrato de arrendamento e nos termos prescritos na lei.
Nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 2.º do Código do IMT, é considerada transmissão de bens imóveis e, como tal, sujeita a IMT, o arrendamento a longo prazo, sendo considerado como tal o que deva durar mais de 30 anos, quer a sua duração se encontre desde logo estabelecida no contrato, quer resulte de prorrogação - durante a sua vigência – por acordo expresso dos interessados.
No caso em apreço, os contraentes estipularam nos pontos 1. e 2. da cláusula terceira que o contrato teria uma duração inicial de 30 anos e que, findo esse prazo, seria automaticamente renovado por períodos iguais e sucessivos de 5 anos, caso não fosse denunciado por qualquer das partes e sucessivos de 5 anos, caso não fosse denunciado por qualquer das partes.
Por conseguinte, existindo uma situação de prorrogação, por acordo expresso e voluntário, do prazo do contrato, verifica-se o necessário pressuposto da incidência previsto na norma supra citada, na medida em que o contrato em causa deve durar mais de 30 anos.
Tendo presente que nos termos do art. 35.º do CIMT, conjugado com o art. 45.º, n.º 1, in fine, da LGT, o prazo de caducidade do direito à liquidação do IMT é de oito anos a contar do facto tributário ‟contrato celebrado em 8 de Agosto de 2009” - ainda decorre o prazo para a liquidação deste imposto.
De acordo com o artigo 4.º do CIMT, o IMT é devido pelas pessoas, singulares ou coletivas, para quem se transmitam os bens imóveis e, de acordo com o n.º 2 do artigo 5.º do mesmo normativo, “a obrigação tributária constitui-se no momento em que ocorrer a transmissão”.
Temos então que o imposto é devido pela empresa A………… SA e o momento em que ocorreu a transmissão foi o dia 8 de Agosto de 2009.
O IMT incide sobre o valor constante do ato ou do contrato ou sobre o valor patrimonial tributário dos imóveis, consoante o que for maior (artigo 12.°, n.º 1 do CIMT). De acordo com a regra 10.ª do n.º 4 do mesmo artigo, "nos arrendamentos e nas sublocações a longo prazo, o imposto incide sobre o valor de 20 vezes a renda anual, quando seja igual ou superior ao valor patrimonial tributário do respetivo prédio”. E, segundo o n.º 1 do artigo 22.º do CIMT, a liquidação do imposto deve preceder o ato ou facto translativo dos bens. Quanto ao pagamento do imposto, o mesmo deve ser efetuado no próprio dia da liquidação ou no 1.º dia útil seguinte, de acordo com o n.º 1 do artigo 36.º do CIMT.
No decurso da ação inspetiva constatou-se que o IMT devido pelo arrendamento das instalações à empresa A………… S.A. não foi devidamente liquidado pelo que importa apurar o montante de imposto em falta reportado à data de início da cedência que foi 8 de Agosto de 2009.
De acordo com o ponto 1 da cláusula 4.ª do contrato, já citado, o valor da renda mensal é de 32.812,50 €. O valor anual da renda estipulado é, portanto, de 393.750,00 € (32.812,50 € x 12 meses).
Para efeitos de cálculo do IMT devido, e atendendo ao referido na citada regra 10.ª, importa comparar o valor de 20 vezes a renda anual com o valor patrimonial do(s) prédio(s) cedidos:
Valor de 20 vezes a renda anual:
20 x 393.750,00 € = 7.875.000,00 €
-> Valor Patrimonial do(s) prédio(s):
- Artigo urbano n.r …… da freguesia de Gafanha da Encarnação com um Valor Patrimonial à data do contrato de arrendamento (08/08/2009) de 972.330,30 €.
- Artigo urbano n.r …… da freguesia de Gafanha da Encarnação com um Valor Patrimonial à data do contrato de arrendamento (08/08/2009) de 371.630,00 € .
- Artigo urbano n.r …… da freguesia de Gafanha da Encarnação com um Valor Patrimonial à data do contrato de arrendamento (08/08/2009) de 409.000,00 €.
Face ao exposto considera-se, como Valor Tributável para efeitos de IMT, o montante correspondente a 20 vezes a renda anual, ou seja, 7.875.000,00 €.
A taxa do IMT aplicável é de 6,5% de acordo com o estipulado na alínea d) do n.º 1 do artigo 17.º do CIMT.
(…)
importa identificar os argumentos apresentados pelo sujeito passivo relativamente à proposta de correção referida no ponto
III. 3.1.1.- O Contrato de arrendamento para fins não habitacionais das instalações da empresa celebrado em 2009 - sujeição a IMT nos termos do artigo 2°, nº 2, alínea c) do CIMT.
O sujeito passivo indica que o contrato de arrendamento (assinado em 2009 e não em 2006, como refere o articulado no seu ponto 21; e não de duração de 5 anos, como indica no articulado 22) refere um prazo de duração de 30 anos e não um prazo superior a 30 anos, além de que a prorrogação não poderia ser considerada porque se trata, neste momento, de uma mera possibilidade.
No entanto, este argumento (vertido no artigo 30.º do direito de audição) não fará grande sentido se atendermos à motivação do legislador que presidiu à elaboração da norma em causa (artigo 2.º 2 c) do CIMT e não artigo 2.º 2 a) como diz o contribuinte no artigo 29.º do requerimento. Com efeito, se o que se pretendeu foi prevenir os “abusos que se praticavam disfarçando-se de verdadeiras vendas sob a forma de arrendamento” (como dizia FRANCISCO ALVES DOS SANTOS, no artigo “O Código da Sisa e o Código Civil” , CTF n.º 120, pág. 184), ou ainda a posse do direito de propriedade ou de outros direitos reais de gozo, tal como o usucapião, seguir a perspetiva do contribuinte significaria que a AT teria de aguardar 30 anos até ao termo inicial do contrato e, só então, caso houvesse efetivamente uma prorrogação, tributar o facto em sede de IMT.
No entanto, inexistindo qualquer cláusula de suspensão ou interrupção da caducidade específica para estas situações, é claro que, nesse momento, a AT já não poderia liquidar qualquer imposto porque o mesmo já teria caducado há muito, pervertendo-se - assim - o principal objetivo da norma (o combate à evasão tributária).
Por outro lado, o próprio teor literal da norma está de acordo com a interpretação da AT: diz-se naquela alínea que são arrendamentos a longo prazo os que “devam durar mais de trinta anos” e não os que “durem mais de trinta anos”, o que significa que o legislador não terá pretendido limitar a sujeição a imposto àqueles casos em que os contratos efetivamente durem mais do que 30 anos, mas antes tributar os casos em que tais contratos sejam suscetíveis de durar mais do que 30 anos, quer esse prazo decorra de estipulação inicial, quer por lhe apondo um acrescento pela via da prorrogação.
Está-se perante um contrato de arrendamento inicialmente com prazo certo “30 anos” (pois o Código Civil não permite contratos por mais de 30 anos nº 2 do artº 1095.º e artigo 1025º), ao qual lhe é introduzida uma extensão complementar através da prorrogação [Ainda assim, no contrato em apreço, o prazo de 30 anos é prorrogado por 5 anos, ao invés de prorrogável, de onde se infere também, que a prorrogação tem escopo impositivo ao invés de optativo.] Ou seja, constitui facto tributário a possibilidade da ocorrência e não apenas a realização da ocorrência (aliás, à semelhança do alargamento da base de incidência de outros negócios jurídicos). Pois em boa verdade, qualquer contrato pode a todo o tempo ser resolvido.
Face a todo o exposto, considerando que o sujeito passivo não apresentou factos novos suscetíveis de alterar as correcções propostas no projeto de relatório, parece-me ser de manter a posição aí vertida.”
[cfr. relatório da ação inspetiva constante de fls. 3 a 30 da peça do SITAF n.º 004476136].
E-Em 3 de maio de 2016 o serviço de Finanças de Ílhavo remeteu à mandatária da Impugnante o ofício n.º 1795, com o assunto de “liquidação de IMT” e o seguinte teor:
“Fica por este meio notificado para, no prazo de 30 dias a contar da data da assinatura do aviso de recepção, solicitar neste Serviço de Finanças as guias de liquidação de IMT respeitantes ao contrato de arrendamento para fins não habitacionais celebrado com o Fundo de Investimento Imobiliário Aberto ………, NIF ………, dos prédios urbanos inscritos na respectiva matriz predial da freguesia de Gafanha da Encarnação sob os artigos n° ……, …… e ……, para pagamento da importância de 511.875,00 €, resultante da aplicação da taxa referida na alínea d) do n° 1 do artigo 17° do CIMT ao respectivo valor tributável, conforme consta da informação elaborada pelos Serviços de Inspecção Tributária da qual foi previamente notificado, apurado da forma a seguir indicada:
Valor de 20 vezes a renda anual: 20 x 393.750,00 = 7.875.000,00 €
Valor Patrimonial dos prédios: 972.330,30 + 371.630,00 + 409.000,00 = 1.752.960,30 € IMT devido: 7.875.000,00 x 6,5% = 511.875,00 €
Ao valor do IMT acrescem juros compensatórios no montante de 125.486,51 €, contados desde a data da infracção (8/08/2009) até á data da detecção da mesma (21/05/2015):
511.875,00 x 4% x 2237/365 = 125.486,51 €
Não sendo efectuado o pagamento no prazo referido, haverá lugar a procedimento executivo, nos termos do n° 3 do artigo 38° do CIMT e artigos 88° e 162° do CPPT.
Da referida liquidação poderá V a Exa reclamar nos termos e nos prazos previstos no artigo 70° do CPPT ou impugnar no prazo de 3 meses (artigo 102° do CPPT), com os fundamentos referidos no artigo 99° do CPPT.
Com os melhores cumprimentos
P’ O Chefe do Serviço de Finanças
O Adjunto
(ass.) ………
(……… -TAT2)”
[cfr. ofício que faz fls. 148 da peça do SITAF n.º 004476137].
X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: "…Não se provaram outros factos com interesse para a decisão…".
X
Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: "…No que respeita à fundamentação, a convicção do Tribunal baseou-se essencialmente numa apreciação crítica [artigos 396.° do Código Civil e 607.°, n.º 5 do CPC, ex vi do art.º 2.° do CPPT], e à luz das regras da experiência comum, do exame da globalidade dos documentos juntos aos autos, incluindo os constantes do procedimento administrativo apenso, não impugnados…".
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
X
Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida julgou procedente a presente impugnação, em consequência do que anulou o acto de liquidação de I.M.T., e respectivos juros compensatórios, objecto do processo (cfr.al.E) do probatório supra), com fundamento na inexistência de facto tributário na data de celebração do contrato de arrendamento (8/08/2009).
X
Relembre-se que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal "ad quem", ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, "ex vi" do artº.281, do C.P.P.Tributário).
O recorrente dissente do julgado alegando, em síntese, que a sentença recorrida padece de erro de julgamento de direito, por ter decidido no sentido da inexistência de facto tributário sujeito a I.M.T. na data da celebração do contrato de arrendamento, assim não aplicando ao caso dos autos a norma constante do artº.2, nº.2, al.c), do C.I.M.T. (cfr.conclusões I) a XX) do recurso). Com base em tal alegação pretendendo concretizar um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso comporta tal vício.
O Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (I.M.T.) é um imposto sobre a riqueza, cumprindo o comando constitucional que considera a riqueza como um dos dois indicadores fundamentais de capacidade tributária dos contribuintes (cfr.artº.103, nº.1, da C.R.Portuguesa).
O I.M.T. sujeita a imposto a aquisição onerosa de bens imóveis, independentemente do título ou da forma jurídica utilizada nessa aquisição. O objecto da sujeição do imposto não é propriamente o acto ou contrato que titulam a aquisição, mas sim o efeito desses actos ou contratos, ou seja, a transmissão da propriedade ou dos direitos correspondentes sobre esses imóveis. A sujeição a imposto da aquisição do direito de propriedade de bens imóveis prevista no artº.2, nº.1, do C.I.M.T., consubstancia o mais importante facto tributário do I.M.T. Trata-se do facto tributário paradigmático e nuclear do I.M.T. e aquele cuja verificação é a mais frequente. Esta norma sujeita a imposto, tanto a aquisição da propriedade do imóvel, como de figuras parcelares deste. O valor tributável sujeito a imposto segue a regra geral, do maior dos valores, ou o declarado ou o valor patrimonial do imóvel, tal como se prevê no artº.12, nº.1, do C.I.M.T. (cfr.ac.S.T.A-2ª.Secção, 10/03/2011, rec.386/10; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 7/04/2022, rec.1564/10.6BELRS; José Maria Fernandes Pires, Lições de Impostos sobre o Património e do Selo, Almedina, 3ª. Edição, 2016, pág.233 e seg.; António Santos Rocha e Outro, Tributação do Património, 2ª. Edição, Almedina, 2018, pág.433 e seg.).
"In casu", conforme se retira do probatório supra (cfr.al.D) da matéria de facto), a liquidação estruturada pela A. Fiscal fundamenta-se no artº.2, nº.2, al.c), do C.I.M.T. tendo por referência a celebração de contrato de arrendamento incidente sobre imóveis urbanos e datado de 8 de Agosto de 2009 (cfr.al.A) da matéria de facto).
O citado artº.2, nº.2, al.c), do C.I.M.T. ostenta a seguinte previsão e estatuição:
Artº.2
(Incidência objectiva e territorial)

1-O IMT incide sobre as transmissões, a título oneroso, do direito de propriedade ou de figuras parcelares desse direito, sobre bens imóveis situados no território nacional.
2 - Para efeitos do n.º 1, integram, ainda, o conceito de transmissão de bens imóveis:
(…)
c) Os arrendamentos ou subarrendamentos a longo prazo, considerando-se como tais os que devam durar mais de 30 anos, quer a duração seja estabelecida no início do contrato, quer resulte de prorrogação, durante a sua vigência, por acordo expresso dos interessados, e ainda que seja diferente o senhorio, a renda ou outras cláusulas contratuais;
(…)

É hoje pacífico que as normas fiscais se interpretam como quaisquer outras, havendo que determinar o seu verdadeiro sentido de acordo com as técnicas e elementos interpretativos geralmente aceites pela doutrina (cfr.artº.9, do C. Civil; artº.11, da L.G.Tributária).
Desde logo, se deverá levar em consideração que o artº.1025, do C. Civil, estabelece a duração máxima de trinta anos para o contrato de locação, o qual, quando tenha por objecto coisa imóvel, se designa por arrendamento (cfr.artº.1023, do C.Civil).
Nos termos do artº.2, nº.2, al.c), do C.I.M.T., tal como já acontecia em sede de regime da antiga Sisa (cfr.artº.2, §1, 4º., do C.Sisa), o legislador ficciona como transmissão sujeita a imposto a situação em que é celebrado um contrato de arrendamento/subarrendamento de um bem imóvel por mais de trinta anos. A transmissão, para efeitos do I.M.T., ocorre na data da celebração do contrato, incidindo o imposto sobre a transmissão, também nessa data. A lei prevê também a incidência do imposto nos casos de contratos de arrendamento celebrados inicialmente por um período inferior/igual a trinta anos e posteriormente prorrogados por um período que uma vez adicionado ao inicial, soma um total superior a trinta anos. Nesse caso o facto tributário sujeito a imposto ocorre na data da prorrogação do contrato. Este facto tributário produz-se mesmo nos casos em que ocorra alteração do proprietário ou do valor das rendas. Assim, mesmo que a prorrogação se efectue já por outro senhorio que entretanto tenha adquirido o prédio, a título gratuito ou oneroso, aplica-se da mesma forma a tributação, contanto que se mantenha o arrendatário. Por último, sempre se dirá que, quando estivermos em presença de um contrato de arrendamento realizado pelo prazo de trinta anos, o mesmo não se encontra sujeito a I.M.T., dado não integrar a previsão de incidência objectiva da norma. É que, na formalização do contrato de arrendamento, o prazo superior a trinta anos deve ser expressamente mencionado no contrato inicial, ou resultar de prorrogação por acordo expresso dos contraentes ocorrido durante a vigência do contrato (cfr.José Maria Fernandes Pires, Lições de Impostos sobre o Património e do Selo, Almedina, 3ª. Edição, 2016, pág.266 e seg.; António Santos Rocha e Outro, Tributação do Património, 2ª. Edição, Almedina, 2018, pág.441).
Concluindo, o citado normativo deve ser interpretado no sentido de que o legislador ficciona como transmissão sujeita a imposto a situação em que é celebrado um contrato de arrendamento/subarrendamento de um bem imóvel por mais de trinta anos, e somente neste caso a transmissão, para efeitos do I.M.T., ocorre na data da celebração do contrato, incidindo o imposto sobre a transmissão, também nessa data. Já assim não acontecerá, pelo que estão fora da previsão de incidência objectiva da norma, os casos em que o arrendamento é celebrado por prazo não superior a trinta anos, apesar da possibilidade de prorrogação contratual, por acordo dos contraentes e ocorrida durante a vigência do contrato.
"In casu", o contrato de arrendamento em causa tem a duração inicial de trinta anos, mais prevendo o mesmo acordo a possibilidade de prorrogação por cinco anos, mas também de oposição à renovação mediante denúncia (cfr.al.B) do probatório supra). Assim sendo, para que se produza o facto tributário, não basta que a prorrogação esteja prevista no contrato inicial, dado que essa é apenas uma possibilidade e um direito que as partes se atribuem uma à outra, de renovarem o contrato e de prorrogarem o arrendamento. A consumação dessa prorrogação depende do exercício desse direito, mediante a declaração expressa de vontade de prorrogação e do acordo de vontades entre ambas as partes nesse sentido.
Com estes pressupostos, deve concluir-se, com o Tribunal "a quo", que inexistiu facto tributário sujeito a I.M.T. e ao abrigo do examinado artº.2, nº.2, al.c), do C.I.M.T., na data da celebração do contrato de arrendamento, assim padecendo o acto tributário objecto do processo (cfr.al.E) do probatório supra) do vício de erro sobre os pressupostos de direito.
Atento o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, nega-se provimento ao presente recurso e, em consequência, mantém-se a decisão recorrida, embora com a presente fundamentação, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DESTE SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO EM NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA, a qual, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o recorrente em custas (cfr.artº.527, do C.P.Civil), com dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida no âmbito da presente instância de recurso.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 12 de Outubro de 2022. - Joaquim Manuel Charneca Condesso (relator) - Gustavo André Simões Lopes Courinha - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes.