Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 0198/19.4BELSB |
Data do Acordão: | 04/04/2019 |
Tribunal: | 1 SECÇÃO |
Relator: | TERESA DE SOUSA |
Descritores: | CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL EFEITO SUSPENSIVO CADUCIDADE DO DIREITO DE ACÇÃO |
Sumário: | I - Será de levantar o efeito suspensivo da interposição da acção se se concluir que os prejuízos que resultarão da manutenção do efeito suspensivo se mostram superiores aos prejuízos que possam resultar da retoma do prosseguimento do procedimento pré-contratual na fase pós-adjudicatória. II - As notificações previstas no CCP devem ser feitas através de correio electrónico ou da transmissão eletrónica de dados (cfr. art. 467º do CCP), considerando-se feitas, de acordo com o art. 469º, nº 1, al. a) deste diploma, “Na data da respectiva expedição, quando efectuadas através de correio electrónico ou de outro meio de transmissão escrita e electrónica de dados…”, pelo que foi o dia 10.08.2018, aquele a partir do qual se conta o prazo de impugnação (cfr. art. 59º, nº 2 do CPTA). III - Se o prazo de que a A. dispunha para intentar a acção de contencioso pré-contratual contra a adjudicação, nos termos do art. 100º e 101º do CPTA – um mês -, terminou a 11.09.2018, tendo a acção sido enviada ao Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa a 30.01.2019, verifica-se a sua manifesta intempestividade, por caducidade do direito de acção, que configura uma excepção dilatória (art. 89º, nº 4, alínea k), do CPTA), obstando a que o Tribunal conheça do mérito da causa, dando lugar à absolvição dos Réus da instância (nº 2 do art. 89º do CPTA). |
Nº Convencional: | JSTA000P24415 |
Nº do Documento: | SA1201904040198/19 |
Data de Entrada: | 03/19/2019 |
Recorrente: | A............, SA |
Recorrido 1: | TRIBUNAL CONSTITUCIONAL E OUTRA |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo 1. Relatório O Tribunal Constitucional na sua contestação apresentou defesa por excepção invocando a incompetência do tribunal em razão da hierarquia e a caducidade do direito de acção e por impugnação. O Tribunal Constitucional veio requerer o levantamento do efeito suspensivo automático, nos termos do art. 103º-A CPTA, atendendo à manifesta e urgente necessidade que tem de ser provido com serviços de telecomunicações, sem os quais, hoje em dia, nenhuma entidade funciona, com os fundamentos constantes do requerimento de fls. 21 a 25. Cumpre apreciar e decidir.
“7. ELEMENTOS QUE CONSTITUEM AS PROPOSTAS Cláusula 1.ª O presente caderno de encargos compreende as cláusulas a incluir no contrato a celebrar no âmbito do procedimento identificado em epígrafe. Cláusula 2.ª A execução do contrato obedece:a) Ao Código dos Contratos Públicos b) À restante legislação e regulamentação aplicável, nomeadamente a que respeita à higiene e segurança, prevenção e medicina no trabalho e à responsabilidade civil perante terceiros. Cláusula 3.ª 1. O Contrato terá a duração de 1 (um) ano, podendo ser automaticamente renovado por igual período desde que nenhuma das partes o denuncie, mediante notificação à outra parte por carta registada com aviso de receção, com a antecedência mínima de 60 (sessenta) dias em relação ao seu termo.2. O prazo máximo de vigência, incluindo as renovações, é de 3 (três) anos. Cláusula 4.ª 1. Pelo cumprimento das obrigações decorrentes do contrato, o Tribunal Constitucional pagará ao adjudicatário a quantia constante da proposta adjudicada, acrescida de IVA à taxa legal em vigor.(…) Cláusula 27.ª Requisitos mínimos a assegurar no fornecimento de voz e dados móveis1. Equipamentos de voz móvel com um plafond igual ou superior a € 5.750,00 (sem IVA). 2. Voz móvel com chamadas, SMS e roaming UE incluindo redes fixas nacionais e outras redes móveis com um tráfego de 3000 minutos/SMS. - cfr. doc. 6, fls. 25 a 33 do p.i., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. 4 - A Autora apresentou proposta ao Convite de Procedimento promovido pelo Tribunal Constitucional, pelo preço anual de € 47.122,80 (sendo o valor para 3 anos de € 141.122,80), nos termos constante de fls. 50 e 77 a 92 do p.i., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. 5 – A B………… Portugal – …………, SA, apresentou a sua proposta no referido procedimento, pelo preço anual de € 44.390,52 (valor para 3 anos € 133.171,56), nos termos constantes de fls. 93 a 116 do p.i., que aqui se dão por integralmente reproduzidos. 6 - Após análise no Relatório Preliminar, veio o júri propor a exclusão da proposta da A…………, tendo admitido a da Contra-interessada B………… - cfr. doc. de fls. 117 a 120 do p.i., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, concluindo no sentido de dever ser readmitida a proposta da requerente “por a mesma não conter qualquer vício que inquine o contrato a celebrar, tendo a ora Requerente aderido completamente ao projecto de contratual desenhado pela Entidade Adjudicante e as garantias deles emergentes visadas pelo interesse público subjacente à decisão de contratar, nem padecer de qualquer conteúdo que possa implicar a aplicação de sanção de exclusão nos termos legais e regulamentares”, e, de exclusão da proposta da concorrente B…………. 7 – A A………… notificada do Relatório Preliminar de Avaliação de Propostas, a 30 de Julho de 2018 veio exercer o seu direito de pronúncia sobre o mesmo, nos termos constantes de fls. 127 a 139 (em documento anexo ao Relatório Final), e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. 8 – Em 08.08.2018, o Júri, nos termos do art. 148º do CCP, elaborou o Relatório Final, indeferindo no seu ponto III o invocado em audiência prévia pela A…………, concluindo do seguinte modo: “IV. CONCLUSÃO Termos em que, com os fundamentos que antecedem, o Júri deliberou manter o teor e as conclusões do Relatório Preliminar, a saber: a) A admissão da proposta da B………… Portugal, …………, S.A.; b) A exclusão da proposta da A…………, S.A., nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 70.º, por remissão da alínea o) do n.º 2 do artigo 146.º e por remissão do n.º 1 do artigo 148.º, todos do CCP. Mais deliberou o júri propor ao Conselho Administrativo do Tribunal Constitucional, órgão competente para adjudicar – considerando o valor do contrato, incluindo as renovações, artigo n.º 1 do 17.º do CCP, nos termos da alínea b) do n.º 1 ao artigo 17.º (Competência para autorizar despesas) do Decreto-Lei n.º 197/99, de 8 de junho, na sua redação atual, conjugada com o artigo 47.º-C da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua redação atual -, a adjudicação ao concorrente B………… Portugal, …………, S.A., pelo valor anual de € 44.390,52 (quarenta e quatro mil e trezentos e noventa euros e cinquenta cêntimos), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, por um ano, eventualmente renovável. O presente Relatório Final será publicitado na plataforma ComprasPT.” - cfr. doc. de fls. 117 a 126 do p.i., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (e seu anexo contendo a Pronúncia em audiência prévia da A…………). 9 - Por Deliberação do Conselho Administrativo do Tribunal Constitucional, de 09.08.2018, foi adjudicada a proposta apresentada pela B………… Portugal - ………… SA., no concurso público para “Aquisição de Sistema de Comunicações de Voz Fixa e Móvel, Internet e Televisão” – cfr. fls. 140 do p.i. e tramitado na plataforma electrónica ComprasPT, sob a referência CP/2/DAF/2018 (cfr. fls. 65-79 do suporte electrónico dos autos). 10 – Em 10.08.2018, às 10h50m foi introduzida na plataforma electrónica de contratação ComprasPT, uma comunicação do seguinte teor: “Caro utilizador A…………, SA,… Foi adicionado ao procedimento CP/2/DAF/2018 – “Prestação de serviços de telecomunicações” da entidade Tribunal Constitucional, o documento “Relatório Final ou Proj. Decisão. Para visualizá-lo, aceda por favor ao procedimento em questão através do link (…)” – cfr. doc. 1, junto com a contestação do TC, fls. 93 dos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido. 11 - Do Workflow do procedimento ComprasPT, plataforma de contratação pública utilizada palo R., constam, nomeadamente, os seguintes itens “Notificação”/“Notificação para apresentação Docs. Habilitação” “Relatório Final”/ “Rel. Final ou Proj. Decisão”, consultado e descarregado pela A. no dia 14.08.2018, pelas 17:37:28.0 – cfr. doc. 2 junto com a contestação do TC, fls. 97 dos autos. 12 – A notificação indicada em 11, é do seguinte teor: “AQUISIÇÃO DE SISTEMA DE COMUNICAÇÕES DE VOZ FIXA E MÓVEL, INTERNET E TELEVISÃO NOTIFICAÇÃO 1. Relativamente à aquisição de serviços identificados em epígrafe, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 76.º (Dever de adjudicação) do Código dos Contratos Públicos (CCP) e no seguimento da proposta formulada pelo júri no Relatório Final, comunica-se que por deliberação do Conselho Administrativo de 9/8/2018, a mesma foi adjudicada à B………… Portugal, …………, S.A., pelo valor de € 44.390,52 (quarenta e quatro mil trezentos e noventa euros e cinquenta e dois cêntimos), acrescidos de IVA à taxa legal em vigor, pelo prazo de um ano, eventualmente renovável.2. Em cumprimento do disposto no artigo 100.º do CCP, junto se remete, para aprovação pela B………… Portugal, …………, S.A. no prazo de cinco dias úteis, a minuta do contrato. 3. Em cumprimento do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 77.º e do artigo 81.º do CCP, solicita-se o carregamento na Plataforma ComprasPT, no mesmo prazo indicado no ponto anterior, dos seguintes documentos: (…)” – cfr. doc. 2 junto com a contestação, fls. 99 e fls. 146 do p.i. 13 – O Contrato referente ao presente concurso foi celebrado em 20 de Agosto de 2018 – cfr. fls. 179 a 181 do p.i, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. 14 - Em 30.01.2019, a petição inicial da presente acção, foi enviada, por correio, ao Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa - cfr. fls. 1 dos autos (processo físico). 3. O Direito A presente acção de contencioso pré-contratual foi intentado pela A…………, com vista à anulação da decisão de adjudicação pelo Tribunal Constitucional da proposta que a contra-interessada B………… apresentou no concurso público em referência, bem como a condenação da Entidade Demandada na prática do acto de adjudicação à Autora no referido concurso e na não exclusão da sua proposta. 3.1 Levantamento do efeito suspensivo automático O Tribunal Constitucional, réu nos autos, veio requerer o levantamento do efeito suspensivo automático da execução do contrato de prestação de serviços de comunicação de voz fixa e móvel, internet e televisão, nos termos do art. 103-A, nº 2 do CPTA. Alega que apesar da manifesta extemporaneidade da acção e a sua apresentação junto de tribunal incompetente, certo é que a sua mera propositura implica, automaticamente, a suspensão da execução do contrato entretanto celebrado (art. 103-A, nº 1 do CPTA). Mostrando-se evidente o cumprimento dos pressupostos de que a lei faz depender o levantamento do efeito suspensivo automático num juízo de ponderação de interesses, são manifestamente maiores os prejuízos decorrentes da manutenção da suspensão da execução em comparação com os que podem resultar do seu levantamento. Sendo facto notório que os serviços de telecomunicações e de internet são indispensáveis na actividade jurisdicional e no funcionamento administrativo de um Tribunal. Por essa razão, caso tais serviços sejam suspensos ou interrompidos, será inquestionavelmente atingido o serviço de justiça, pela impossibilidade de Juízes Conselheiros, Assessores, Oficiais de Justiça e Funcionários recorrerem a telecomunicações, acederem a correio electrónico ou a plataformas informáticas. Mais alega que a suspensão da execução do contrato é gravemente prejudicial para o interesse público, sendo facto notório e de conhecimento público que as comunicações móveis e via internet são essenciais para o bom funcionamento de qualquer entidade, no caso o Tribunal Constitucional (e da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos, que aquele compreende), inviabilizando-se de forma séria, grave e irrecuperável o exercício da sua normal actividade, porquanto: a. Passa a ser impossível ao Tribunal Constitucional aceder às normas legais e regulamentares que constituem o objecto da fiscalização da constitucionalidade, já que estas estão apenas disponíveis em suporte electrónico na internet (Diário da República Electrónico, em face do fim do Diário da República em papel), paralisando totalmente a actividade do Tribunal; b. Torna-se inviável o estabelecimento de contactos e transmissão de informações com outras estruturas públicas exclusivamente acessíveis através da internet e que identifica (cfr. fls. 23); c. Impede-se a emissão DUC’s, no âmbito do normal funcionamento do Tribunal Constitucional e da Entidade de Fiscalização e Financiamentos Políticos; d. Paralisa-se totalmente a Entidade de Fiscalização e Financiamentos Políticos, cujas comunicações são, por força da lei, electrónicas (art. 46º-A da Lei Orgânica nº 2/2005 de 10/1, na redacção que lhe foi conferida pela Lei Orgânica nº 1/2018, de 19/4, e Lei nº 71/2018, de 31/12; e. O alarme nas instalações deixará de comunicar a detecção de intrusões e/ou alertas de eventuais incêndios; f. Veda-se o acesso telefónico bem como de outros meios de contacto (FAX e correio electrónico de todos os interessados à secretaria judicial, mormente dos advogados em representação dos seus clientes); g. Deixa de ser viável a utilização do correio electrónico como via de comunicação entre Juízes Conselheiros, Assessores e Funcionários, designadamente em sede de preparação das decisões colegiais, muitas delas com prazos curtos para a sua adopção. Na sua resposta (a fls. 129/132) a A. alegou, em síntese útil, que o R. não alegou factos concretos e de prova de prejuízos se não for levantado o efeito suspensivo automático, e que “os mecanismos existem exactamente para o período posterior ao procedimento, até que as decisões em sede de instância judicial se esgotem”. E que a adjudicação da proposta da contra-interessada está inquinada por ilegalidade e violação de lei, pelo que o Tribunal, se efectuasse o levantamento do efeito suspensivo automático, estaria a sanar uma ilegalidade latente, “sancionando de forma positiva, o comportamento ilegal que se intende demonstrar nos presentes Autos, pela Entidade Adjudicante”. Alega, ainda, que só se se concluir pela gravidade dos prejuízos invocados e/ou pela patente desproporcionalidade da lesão de outros interesses é que se deverá aplicar o critério do art. 120º, nº 2 do CPTA, devendo o tribunal decidir em primeiro lugar se foram alegados e provados factos que corporizem prejuízos para o interesse público ou o carácter claramente desproporcional em resultado da manutenção do efeito suspensivo para outros interesses envolvidos. Em segundo lugar, ultrapassado este crivo, seria de ponderar se se pode concluir pela superioridade desses prejuízos relativamente ao dano que o levantamento de tal efeito suspensivo provocará ao demandante. Vejamos. Prevê o art. 103-A do CPTA, sob a epígrafe Efeito suspensivo automático, o seguinte: “1 – A impugnação de atos de adjudicação no âmbito do contencioso pré-contratual urgente faz suspender automaticamente os efeitos do ato impugnado ou a execução do contrato, se este já tiver sido celebrado. 2 – No caso previsto no número anterior, a entidade demandada e os contrainteressados podem requerer ao juiz o levantamento do efeito suspensivo, alegando que o deferimento da execução do ato seria gravemente prejudicial para o interesse público ou gerador de consequências lesivas claramente desproporcionadas para outros interesses envolvidos, havendo lugar, na decisão, à aplicação do critério previsto no n.º 2 do artigo 120.º. 3 – No caso previsto no número anterior, o demandante dispõe do prazo de sete dias para responder, findo o que o juiz decide no prazo máximo de 10 dias, contado da data da última pronúncia apresentada ou do termo do prazo para a sua apresentação. 4 - O efeito suspensivo é levantado quando, ponderados os interesses suscetíveis de serem lesados, os danos que resultariam da manutenção do efeito suspensivo se mostrem superiores aos que podem resultar do seu levantamento.” Sobre a compatibilização dos nºs 2 e 4 deste preceito se pronunciou já este STA nos acórdãos de 26.04.2018, Proc. nº 062/18 e de 05.04.2017, Proc. nº 031/17 (citando ainda doutrina sobre tal matéria). Assim, no acórdão de 26.04.2018, escreveu-se o seguinte: «Ora, independentemente de não ser linear a relação entre os nº 2 e nº 4 deste art. 103º-A e ainda com o nº 2 do artigo 120º ambos do CPTA, resulta do preceito supra transcrito que estamos perante a alegação de uma situação alternativa entre a grave prejudicialidade para o interesse público e geração de consequências lesivas claramente desproporcionadas em relação aos outros interesses envolvidos. Mas sendo o objetivo do efeito suspensivo automático constante do referido artigo 103º-A/1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos a tutela jurisdicional efectiva da posição jurídica do autor, evitando o facto consumado, a finalidade da suspensão nem por isso deixa de terminar sempre por uma ponderação racional e expressa, num juízo de prognose, de proporcionalidade entre todos os interesses em causa e os respetivos danos com base nos factos. Assim, será de levantar o efeito suspensivo da interposição da ação se se concluir que os prejuízos que resultarão da manutenção do efeito suspensivo se mostram superiores aos prejuízos que possam resultar da retoma do prosseguimento do procedimento pré-contratual na fase pós-adjudicatória.» No caso, no presente incidente o Tribunal Constitucional invocou factos demonstrativos de grave dano para o interesse público com a suspensão automática do acto impugnado, quais sejam a paralisação do normal funcionamento deste órgão de soberania, por falta do regular funcionamento dos diversos meios de comunicação que o contrato aqui em causa visa assegurar. E, tal como alega o R., este é um interesse público de tal relevância que não é sequer admissível a hipótese de que venha a ser perturbado ou interrompido, sob pena de pôr em crise o próprio Demandado. Já a A. apenas invoca motivos ligados às ilegalidades que imputa ao acto de adjudicação na acção. Não alegou, porém, qualquer prejuízo para si decorrente de referido levantamento da suspensão. Assim, face ao interesse público específico que aqui importa salvaguardar, consubstanciado na necessidade de continuarem a ser assegurados os serviços de telecomunicações no Tribunal Constitucional, nas várias vertentes a que o contrato de prestação de serviços respeita, em contraposição à falta de alegação de danos por parte da autora e falta de impugnação especificada do alegado pelo demandado, é de considerar que o seu interesse no não levantamento é o interesse particular de qualquer concorrente num concurso de vir a ser escolhido para adjudicação (embora, no caso, até tenha visto a sua proposta excluída), pelo que, sobrepondo-se claramente o interesse público invocado, deve ser levantada a suspensão automática da execução do contrato, nos termos do disposto no nº 2 do art. 103º-A do CPTA, conforme requerido. 3.2 Caducidade do direito de acção Alegaram a Entidade Demandada e a Contra-interessada que caducou o direito de intentar a acção por parte da Autora. Notificada para se pronunciar sobre esta excepção a A. veio dizer que “…inexiste qualquer elemento nos referidos documentos [documentos 1 e 2 juntos com a contestação do R.] que demonstre a aposição de uma decisão final de adjudicação à B………… no sistema em causa, nem existe quaisquer elementos que permitam identificar o envio de notificação (neste caso eletrónica) à ora Impugnante da referida decisão final do procedimento”. Vejamos. Resulta dos factos provados que a A…………. intentou a presente acção no dia 30.01.2019, sendo que foi informada, através da plataforma electrónica de contratação utilizada neste procedimento pré-contratual, no dia 10.08.2018, de que fora publicado e estava disponível o relatório final e decisão de adjudicação. Tendo de seguida, em 14.08.2018, descarregado da plataforma electrónica os elementos procedimentais, designadamente a referida notificação de que “no seguimento da proposta formulada pelo júri no Relatório Final, comunica-se que por deliberação do Conselho Administrativo de 09.08.2018, a mesma foi adjudicada à B………… Portugal, …………, S.A.” (cfr. pontos 14, 10, 11 e 12 dos FP). A Autora alega logo na petição inicial não ter sido formalmente “notificada do Relatório final e da Adjudicação”, considerando que nada prova tê-lo sido. A notificação em causa, da decisão de adjudicação, encontra-se prevista no art. 77º do CCP, sendo feita em simultâneo a todos os concorrentes (respectivo nº 1). As notificações previstas no CCP devem ser feitas através de correio electrónico ou da transmissão eletrónica de dados (cfr. art. 467º do CCP), considerando-se feitas, de acordo com o art. 469º, nº 1, al. a) deste diploma, “Na data da respectiva expedição, quando efectuadas através de correio electrónico ou de outro meio de transmissão escrita e electrónica de dados…”, pelo que foi o dia 10.08.2018, aquele a partir do qual se conta o prazo de impugnação (cfr. art. 59º, nº 2 do CPTA). Aliás, demonstra-se na plataforma de contratação pública utilizada de que a A. teve efectivo conhecimento da adjudicação, ao ter consultado e descarregado a notificação da decisão de adjudicação e o relatório final no dia 14.08.2018, às 17:37 (ponto 11 dos FP). Se desconhecia o exacto teor da decisão de adjudicação, o que não foi por si alegado, deveria ter lançado mão dos meios previstos no art. 60º, nºs 2 e 3 do CPTA, ao ser notificada de que a decisão de adjudicação foi tomada, o que não fez. Ora, não há dúvida de que a A………… foi notificada da decisão de adjudicação, pelo menos nos termos da “Notificação” indicada em 12 do probatório (de acordo com o respectivo ponto 1.), pelo que não pode também invocar o previsto no nº 1, do mesmo art. 60º do CPTA, ao estabelecer, para efeitos da impugnação contenciosa, um princípio de inoponibilidade da notificação ou da publicação, quando esta não dê a conhecer ao interessado o sentido da decisão, o que significa que se não inicia o prazo para a utilização do meio processual impugnatório enquanto não for efectuada uma nova notificação que identifique o conteúdo e o objecto da decisão. Quando faltem outros elementos que devam constar da notificação e que o interessado considere necessários para deduzir o meio impugnatório, poderá este requerer a notificação das indicações em falta ou passagem de certidão que as contenha (cfr. o nº 2 do referido preceito). No caso de notificação ou publicação deficientes, por delas não constar a indicação do autor, da data ou dos fundamentos da decisão, o acto administrativo é oponível ao interessado, mas este tem a faculdade de requerer à entidade que proferiu o acto a notificação das indicações em falta ou a passagem de certidão que as contenha, bem como, se necessário, de pedir a correspondente intimação judicial, nos termos previstos nos arts. 104º e seguintes do CPTA. Assim, pretendendo a Autora impugnar o acto de adjudicação, dispunha do prazo de um mês para intentar a respectiva acção, previsto no artigo 101º do CPTA, contado da notificação ao destinatário do acto (nº 2 do art. 59º do CPTA), prazo este que se aplica a todos os actos que se queiram impugnar, independentemente da ilegalidade de que estejam feridos (serem anuláveis ou nulos). Por outro lado, o contencioso pré-contratual tem carácter urgente, nos termos do art. 36º, nº 1, al. c) do CPTA, contando-se o prazo para intentar a acção nos termos do art. 58º, nº 2, do CPTA, correndo em férias (nº 2 do referido art. 36º). Significa isto que o prazo de que a A. dispunha para intentar a acção de contencioso pré-contratual contra a adjudicação, nos termos do art. 100º e 101º do CPTA, terminou a 11.09.2018. Nestes termos, tendo a presente acção sido enviada ao Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa a 30.01.2019, verifica-se a sua manifesta intempestividade, por caducidade do direito de acção, que configura uma excepção dilatória (art. 89º, nº 4, alínea k), do CPTA), obstando a que o Tribunal conheça do mérito da causa, dando lugar à absolvição dos Réus da instância (nº 2 do art. 89º do CPTA), procedendo, consequentemente, a excepção invocada. 3.3 Litigância de má-fé Veio a B………… na sua contestação alegar que a Autora devia ser condenada como litigante de má-fé. Alega que a A…………, ao propor e pela forma como propôs esta acção, incorre em todos os comportamentos condenados pelas alíneas do art. 542º, nº 2, do CPC, pelo que, como determina o nº 1 anterior e se requer, não só a acção deve ser julgada total e liminarmente improcedente, como este comportamento lamentável da A………… não pode passar incólume. Vejamos. Dispõe o art. 542º do CPC, sob a epígrafe Responsabilidade no caso de má-fé – Noção de má-fé, o seguinte: “1. Tendo litigado de má-fé, a parte é condenada em multa e numa indemnização à parte contrária, se esta a pedir. 2. Diz-se litigante de má-fé quem, com dolo ou negligência grave: a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar; b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa; c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação; d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objetivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a ação da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão. (…)”. No entender da CI a Autora teria incorrido em conduta subsumível a todas as alíneas do nº 2 do art. 542º do CPC. No entanto, não se nos afigura que haja elementos seguros para condenar a autora como litigante de má-fé. Com efeito, a sua pretensão na presente acção é a de que seja anulado um determinado acto de adjudicação, com o fundamento de que a proposta da outra concorrente (a adjudicatária) devia ter sido excluída e que a sua (que foi excluída) devia ter sido admitida por cumprir com todos os atributos do PC e do CE, sendo-lhe adjudicado o concurso. Tenha ou não razão no que invoca, a sua pretensão é admissível e, mesmo que tivesse sido apreciada (o que não sucedeu face à verificação da caducidade do direito de acção), a improcedência da sua pretensão não significaria, por si só, que estivesse a litigar de má-fé. Quanto ao que se prevê nas alíneas b) e c), não se vê que a autora tenha alterado a verdade dos factos, omitido factos relevantes para a decisão ou tenha praticado omissão grave do dever de cooperação. É certo que este Tribunal entendeu, face à prova produzida, que a A. foi notificada da decisão de adjudicação, que continha igualmente a sua exclusão do Concurso, em 10.08.2018, e que a mesma acedeu a tal decisão pelo menos em 14.08.2018, mas a autora entende diversamente que não foi formalmente notificada do Relatório Final do concurso e da Decisão de Adjudicação. A nosso ver a sua posição não é a correcta, face às disposições legais acima indicadas, mas consubstancia uma diferente interpretação de tais preceitos que sempre será admissível, embora possa não estar longe da má-fé. Por fim, o facto de a acção ter sido intentada no TAC de Lisboa quando o devia ter sido neste STA, consubstanciando uma errada interpretação do estabelecido no ETAF e CPTA (art. 24º, nº 1, al. a), subalínea v) e art. 16º, nº 1 do CPTA), não permite considerar que se trata de conduta reprovável, para os efeitos da al. d) do nº 2 do art. 542º do CPC, já que só o facto de a entidade adjudicante ser o Tribunal Constitucional faz afastar a regra geral que determinaria que a competência pertencesse ao Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa (art. 16º, nº 1 do CPTA). Termos em que improcede o pedido da B………… de condenação da autora como litigante de má-fé. 3.4 Valor da acção Fixa-se à acção o valor de € 30.000,01 indicado pela autora. Pelo exposto, acordam em: a) - julgar procedente o incidente do levantamento do efeito suspensivo automático suscitado pela Entidade Demandada; b) – julgar procedente a excepção dilatória de caducidade do direito de acção, absolvendo os Réus da instância; c) – condenar a Autora nas custas. Lisboa, 4 de Abril de 2019. - Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa (relatora) – José Francisco Fonseca da Paz – Maria do Céu Dias Rosa das Neves |