Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01124/11
Data do Acordão:01/16/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:DULCE NETO
Descritores:IRC
MAIS VALIAS
REINVESTIMENTO
Sumário:I – O que resulta do nº 1 do art. 44º do CIRC, na redacção dada pela Lei nº 52-C/96, de 27 de Dezembro, é que se o contribuinte manifestar a intenção de reinvestir o montante das mais valias realizadas, total ou parcialmente, durante os três exercícios seguintes, a respectiva tributação suspende-se durante esse período, após o que a tributação terá ou não lugar em função da verificação desse reinvestimento e na medida dele.

II – A nova redacção dada ao art. 44º nº 5 do CIRC pela Lei nº 30-G/2000, que entrou em vigor em 1/01/2001, apenas rege para o futuro, em conformidade com o disposto no artº 12º Lei Geral Tributária e no art.º 12º do Código Civil.

III – Tendo a impugnante realizado a alienação no exercício económico de 1999, a tributação das respectivas mais-valias, por falta de reinvestimento nos três exercícios seguintes, deve obedecer ao regime contido no art. 44º nº 5 do CIRC na redacção dada pela Lei nº 52-C/96, de 27 de Dezembro, por ser esse o regime vigente à data do facto tributário, isto é, à data da alienação que originou as mais-valias, e cuja tributação se encontrava suspensa.

Nº Convencional:JSTA000P15132
Nº do Documento:SA22013011601124
Data de Entrada:12/09/2011
Recorrente:A.... SA
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. A…………, S.A., com os demais sinais dos autos, recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou improcedente a impugnação judicial que deduziu contra o acto de liquidação adicional de IRC referente ao exercício económico de 2002 e respectivos juros compensatórios, no montante de € 12.351,27.
1.1. Rematou as alegações de recurso com as seguintes conclusões:

A. A sentença proferida pelo Tribunal a quo, que julgou improcedente a impugnação judicial apresentada, por via da qual se pugnou pela anulação da liquidação de IRC e respectivos juros compensatórios, relativa ao período de tributação de 2002, no montante de € 12.351,27, deve ser revogada e substituída por Acórdão que anule a referida liquidação.

B. A sentença que ora se recorre padece de erro julgamento porquanto entendeu ser aplicável o n.º 5 do art. 44º do CIRC na redacção dada pela Lei n.º 2-C/96, de 27 de Dezembro.

C. No entanto, ao caso sub judice, é aplicável, em conformidade com o regime transitório estabelecido pelo art. 7.º, n.º 7, da Lei nº 30-G/2000, de 29 de Dezembro, o n.º 5 do mesmo art. 44º do CIRC, mas de acordo com a redacção introduzida por este último diploma.

D. Para que fosse aplicável o art. 44º do CIRC na redacção anterior à introduzida pela Lei n.º 30-G/2000, de acordo com o citado regime transitório, impunha-se que a Recorrente tivesse procedido ao reinvestimento do valor realizado com o bem alienado em 1999 e que daria origem a uma mais-valia fiscal.

E. Tal reinvestimento nunca ocorreu.

F. Assim, de acordo com o regime transitório estabelecido pela Lei n.º 30-G/2000, as correcções a efectuar pela Recorrente, justamente por não ter efectuado qualquer reinvestimento, deveriam observar - como, aliás, observaram - o disposto pelo art.44º n.º 5 do CIRC na redacção introduzida por aquele diploma.

G. A mais-valia obtida pela Recorrente em 1999 foi correctamente tributada no período de tributação de 2002, tendo sido acrescentada ao resultado líquido daquele período, majorada em 15%, tal como estabelecia o art. 44º, n.º 5, do CIRC, de acordo com a redacção dada pela Lei n.º 30-G/2000, aplicável in casu.

H. Não se vislumbram fundamentos para que seja acolhido entendimento diverso - tal como o sustentado pela Administração Fiscal e pelo Tribunal a quo -, que considera que a correcção a efectuar, em resultado da não realização de reinvestimento, passaria por calcular o IRC que deixou de ser liquidado em 1999, a respectiva derrama, assim como os juros compensatórios, de acordo com o estabelecido pelo art. 44º, n.º 5, do CIRC, com a redacção dada pela Lei n.º 52-C/96, de 27 de Dezembro, em vigor à data da alienação que originaria a mais-valia fiscal.

I. Acresce que, contrariamente ao que sustenta a sentença recorrida, não assume o regime transitório previsto pela Lei nº. 30-G/2000 qualquer carácter optativo.

J. Não resulta, para o sujeito passivo, do referido regime, qualquer faculdade que lhe permita optar entre o regime anterior e o novo regime de tributação das mais-valias fiscais.

K. Não se verificando - como não se verificam in casu - os pressupostos de que tal regime transitório faz depender a aplicação do art. 44º do CIRC na redacção anterior à dada pela Lei n.º 30-G/2000, nenhuma alternativa restará senão aplicar o mesmo dispositivo na nova redacção dada por este diploma, o que sucedeu.

L. Em face do exposto, não poderá proceder a interpretação a que procedeu o Tribunal a quo do regime transitório instituído pela Lei nº 30-G/2000, de 29 de Dezembro, pelo que deverá considerar-se a correcção a que procedeu a Recorrente na sequência do não reinvestimento conforme à lei, anulando a liquidação de imposto impugnada.

Nestes termos e nos mais de Direito, deverá o presente recurso ser julgado procedente, por provado e, consequentemente, revogada a sentença recorrida e substituída por Acórdão que determine a anulação da liquidação de IRC e respectivos juros compensatórios, n.º 20058310006397, de 27.04.2005, relativa ao período de tributação de 2002, que originou uma liquidação adicional de imposto no montante de € 12.351,27, com as demais consequências legais.

1.2. Não foram apresentadas contra-alegações.


1.3. O Exmo. Procurador-Geral-Adjunto emitiu douto parecer no sentido de que o recurso não merece provimento, com a seguinte argumentação:
«A questão de direito colocada por A……….. S.A. é relativa à norma que há que aplicar em sede de tributação de mais valias: alega-se que, em vez do disposto no art. 44º n.º 5 do CIRC na redacção da Lei n.º 2-C/96, de 27-12, devia ter sido aplicada a redacção dada à mesma disposição pela Lei n.º 30-G/2000, de 29/12, e que em conformidade com o regime transitório constante do seu art. 7.º n.º 7 não era de proceder à correcção de IRC, derrama e juros compensatórios que foi impugnada.

Da matéria de facto apurada consta resumidamente o seguinte: (...)

Quanto à referida matéria de direito:

No que respeita à alienação de bens do activo imobilizado corpóreo, o regime especial de tributação de mais e menos valias fiscais realizadas antes de 1 de Janeiro de 2000, a que o caso dos autos se reporta, veio a ser alterado pela referida Lei n.º 30-G/2000, em que foi introduzida a referida norma transitória.
Por esta última lei procedeu-se a uma alteração do regime de que resultava uma tributação diferida no tempo - assim, Tânia Almeida Ferreira, em Fiscalidade 10, p. 95 e ss., que se vai seguir de perto quanto à caracterização do mesmo.

Segundo a mesma, o saldo das mais e menos valias anteriormente obtidas podia ser abatido aos lucros durante certo número de anos desde que o mesmo fosse reinvestido.

A partir da vigência da dita Lei, necessário se tornava para que ocorresse a sujeição ao novo regime que viesse a ter lugar o reinvestimento.

Pressupostos da sua aplicação era que o sujeito passivo mencionasse a intenção de efectuar o reinvestimento e que tal viesse a ser comprovado nos ditos anos seguintes.

Segundo a norma transitória constante do art. 7.º n.º 7 da Lei n.º 30-G/2000 três situações eram possíveis:

a) Uma, relativa a mais-valias anteriores, em que se admite a aplicação da lei antiga quanto ao prazo de reinvestimento;

b) Outra, para o caso de haver reinvestimento, mas ser o mesmo parcial;

c) Outra ainda, quanto ao prazo a considerar para efeitos do dito reinvestimento, sendo as mais valias posteriores.

Certo é que, pese embora a recorrente tenha manifestado a intenção de reinvestimento - daí talvez a referência efectuada na sentença recorrida à opção pelo novo regime -, não se procedeu à sua aplicação tal como previsto foi.
Foi decidido aplicar o disposto no art. 44º n.º 5 do CIRC, na redacção anterior à dita Lei n.º 30-G/2000.
Tal está de acordo com o regime geral relativo à aplicação da lei fiscal no tempo, incluindo quanto às normas de incidência que, conforme previsto no art. 12º n.ºs 1 e 4 da LGT, só se aplica aos factos posteriores.

Quer parecer que bem se decidiu até porque, não tendo ocorrido o dito reinvestimento, não se está face a situação em que seja aplicável o disposto no art. 7.º als. b) e c), nem parece que os factos se devam considerar de formação sucessiva.

Com efeito, o valor considerado para efeitos de determinação da mais e menos valia foi o correspondente ao da alienação realizada em 1999, razão pela qual parece correcto não só o ajustamento no IRC que deixou de ser liquidado em 2000, bem como ao cômputo dos juros compensatórios calculados desde a data de entrega da declaração relativa a esse ano.

E quanto à derrama, cujo regime legal é omisso quanto a ser de sujeitar a outras regras que não as da determinação da matéria colectável, a única via para integrar essas lacunas consiste em aplicar à derrama o regime previsto para o I.R.C, como sustenta Manuel Anselmo Torres, na mesma revista Fiscalidade n.° 38, a fls. 159.
Concluindo, quer parecer que o recurso é de improceder.»

1.4. Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Conselheiros Adjuntos, cumpre decidir.

2. A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:

a) No seguimento da ordem de serviço n.º 01200500731 a impugnante foi alvo de uma acção inspectiva de âmbito parcial - IRC, tendo em vista apurar, quanto às mais valias não tributadas, se o sujeito passivo realizou o reinvestimento nos termos do art. 44º do CIRC (cf. relatório inspectivo de fls. 23 a 32 do processo administrativo apenso aos autos, doravante apenas PA).

b) Visaram os SIT “(...) a verificação da efectiva realização de reinvestimento pelo facto do sujeito passivo ter obtido, no exercício de 1999, mais valias fiscais, no valor de € 104.273,36, as quais não foram tributadas naquele exercício, porquanto o mesmo manifestou a intenção de reinvestir o respectivo valor de realização, proveniente da alienação de elementos do activo imobilizado, até ao fim do terceiro exercício seguinte ao da alienação, ou seja, exercício de 2002” (cf. Doc. de fls. 25 do PA).

c) Do relatório inspectivo resulta que a impugnante durante o ano de 1999, procedeu à alienação de bens do seu activo imobilizado corpóreo, que constituíam a denominada “…………”, consistindo o valor da realização em €283.808,79 (cf. relatório inspectivo).

d) Em consequência da alienação referida em c), foi apurado um lucro contabilístico no valor de € 107.098,25, tendo a impugnante manifestado a intenção de reinvestir o montante no período de 3 anos (2000, 2001 e 2002), pelo que a mais-valia apurada no montante de € 104.273,37 não foi objecto de tributação em sede de IRC no exercício de 1999 (cf. relatório).

e) Os SIT apuraram que “entre os exercícios de 1999 a 2002 (inclusive) não se verificou, no todo ou em parte do valor de realização, qualquer reinvestimento (...) em quaisquer elementos a incorporar no activo imobilizado, do sujeito passivo” (cf. doc. de fls. 26 do PA).

f) Tal facto originou correcções à matéria tributável em sede de IRC, que veio a originar o montante de imposto em falta de € 12.689,73, correspondendo à diferença entre o valor corrigido e o valor constante da declaração modelo 22, concretizado da seguinte forma: € 35.569,12 - € 22.879,39 = € 12.689,73 (cf. doc. de fls. 30 e 31 do PA).

g) A impugnante foi notificada do projecto de relatório inspectivo para efeitos de audição prévia, através do ofício registado n.º 406118 de 24/02/2005, nada tendo aduzido (cf. PA).

h) A impugnante foi notificada do relatório inspectivo e da decisão que sobre ele recaiu através do ofício n.º 412551, de 11/04/2005, assinado pelo chefe de Divisão – B………… (cf. doc. de fls. 38 a 40 do PA).

i) Pelo Director Geral das Finanças foi emitida em 29/04/2004, a liquidação adicional n.º 200500003504262, no montante de € 12.351,27, com data limite de pagamento de 08/06/2005, sendo remetido para o efeito o aviso/notificação de cobrança com o seguinte teor “Fica V Exa. notificado(a) para, no prazo de 30 dias a contar do 3.º dia útil posterior ao do registo, efectuar o pagamento do saldo apurado, de acordo com a demonstração de compensação junta. Não sendo efectuado o pagamento haverá lugar a procedimento executivo” (cf. doc. de fls. 18 dos autos).

j) O Despacho de subdelegação de competências n.º 5790/2006 (2ª série), do Director de Finanças - Adjunto do Porto – C………, publicado no DR - II Série, n.º 51, de 13 de Março de 2006 (cf. doc. de fls. 41 a 42 do PA).

k) O Despacho de subdelegação de competências n.º 8432/2005 (2ª série), do Director de Finanças-Adjunto do Porto – C……….., publicado no DR - II Série, n.º 76, de 19 de Abril de 2005 (cf. doc. de fls. 43 do PA).

l) O Despacho de delegação e subdelegação de competências n.º 8433/2005 (2ª série), do Director de Finanças – D……….., foi publicado no DR - II Série, n.º 76, de 19 de Abril de 2005 (cf. fls. 43 e 44 do PA).

m) Os Despachos de subdelegação de competências n.º 4543/2005 (2ª série), e n.º 4544/2005 (2ª série), dos Directores de Finanças Adjuntos – E………. e C…………., respectivamente, publicado no DR - II Série, n.º 43, de 2 de Março de 2005 (cf. doc. de fls. 45 do PA).

n) A presente impugnação foi deduzida em 12/09/2005 (cf. doc. de fls. 1 dos autos).


3. A questão que a Impugnante, ora Recorrente, coloca à apreciação deste Tribunal é a de saber se, quanto à tributação das mais-valias originadas pela alienação ocorrida em 1999 de elementos do seu activo imobilizado (e que não foram tributadas nesse exercício por virtude de a Impugnante ter manifestado a intenção de reinvestir o valor de realização até ao fim do 3.º exercício seguinte ao da alienação, ou seja, até ao final de 2002), a sentença padece de erro de julgamento em matéria de direito por ter considerado aplicável, na tributação que veio a ter lugar em 2002 por ausência desse reinvestimento, o regime contido no nº 5 do artigo 44º do CIRC na redacção vigente em 1999 (dada pela Lei nº 52-C/96, de 27 de Dezembro) e não o regime contido nesse preceito legal na redacção que já vigorava em 2002 (dada pela Lei nº 30-G/2000, de 29 de Dezembro).
Com efeito, segundo a matéria fáctica apurada e que não vem questionada, no ano de 1999 a Impugnante procedeu à alienação de bens do seu activo imobilizado corpóreo pelo valor de realização de € 283.808,79, obtendo um lucro contabilístico de € 107.098,25, e manifestou a intenção de proceder ao seu reinvestimento no período de 3 anos, pelo que a mais-valia fiscal obtida, no montante de € 104.273,37 não foi tributada nesse período de tributação (1999), tendo em conta o que dispunha o artigo 44º do CIRC sobre o regime especial de tributação das mais e menos valias – o denominado regime de reinvestimento - com o qual o legislador «pretendeu incentivar o investimento produtivo por parte das empresas, permitindo-lhes deduzir ao lucro tributável do exercício as mais valias realizadas, obtendo-se desta forma uma exclusão de tributação das mesmas (apenas) no exercício em que são geradas. Efectivamente, não estamos perante uma exclusão de tributação mas tão somente perante um diferimento da mesma» - TÂNIA ALMEIDA FERREIRA, inRegime das Mais Valias e do Reinvestimento – IRC – Sujeitos Passivos Residentes”, publicado na Revista Fiscalidade, n.º 10, págs. 95 e seguintes.
Assim, nos termos do referido dispositivo legal, e no regime vigente até 31 de Dezembro de 2000, não concorre para o lucro tributável do exercício a parte que respeitar, e na porção em que tenha influenciado a base tributável, a diferença positiva entre as mais e as menos valias realizadas mediante a transmissão onerosa de elementos do activo imobilizado corpóreo sempre que o valor de realização correspondente à totalidade dos referidos elementos fosse reinvestido na aquisição, fabricação ou construção de elementos do activo imobilizado corpóreo até ao fim do terceiro exercício seguinte ao da realização. Por outro lado, se apenas se verificasse o reinvestimento parcial do valor de realização, não concorreria para o lucro tributável a parte proporcional da diferença positiva entre as mais e as menos valias realizadas. Mas «não havendo reinvestimento até ao final do período estabelecido, existirá uma penalização que consiste num ajustamento ao IRC que deixou de ser liquidado, acrescido dos respectivos juros compensatórios.» - cfr. obra citada, pág. 103.
Com efeito, o art. 44°, nº 5, do CIRC, na redacção vigente em 1999 dispunha que «5 - Não sendo concretizado o reinvestimento, ao valor do IRC liquidado relativamente ao terceiro exercício posterior ao da realização adicionar-se-á o IRC que deixou de ser liquidado em virtude do disposto no n.º 1, acrescido dos juros compensatórios correspondentes, ou, não havendo lugar ao apuramento de IRC, corrigir-se-á, em conformidade, o prejuízo fiscal declarado».
No caso vertente, a Impugnante acabou por não proceder ao reinvestimento, mas em vez de proceder ao referido ajustamento ao IRC que em 1999 deixara de liquidar, acrescentou ao resultado líquido do 3.º exercício posterior (2002) o valor dessa mais-valia majorada em 15%, por considerar que lhe era aplicável o regime que passou a vigorar após 31 de Dezembro de 2000, isto é, a nova redacção dada ao art. 44º do CIRC pela Lei n.º 30-G/2000, de 20 de Dezembro, segundo o qual «5 - Não sendo concretizado o reinvestimento até ao fim do segundo exercício seguinte ao da realização, considerar-se-á como proveito ou ganho desse exercício a parte da diferença prevista no n.º 1 ainda não incluída no lucro tributável, majorada em 15%.». Isto é, segundo esta nova redacção dada ao preceito, e que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2001, não havendo reinvestimento até ao final do período estabelecido passou a existir uma penalização que consiste em considerar como proveito ou ganho desse exercício a parte da mais valia fiscal correspondente ao valor de realização não reinvestido, ainda não incluída na base tributável, majorada em 15%.
Segundo o entendimento vertido na sentença, «Em causa está, uma mais-valia apurada em 1999, para a qual a impugnante declarou o reinvestimento, no prazo de três anos, mas que não veio a ocorrer.
(…) A dita mais-valia não foi tributada em IRC no exercício de 1999, por força do disposto no art. 44º, n.º 1 e 4 do CIRC ao tempo em vigor, uma vez que a impugnante manifestou a intenção de reinvestir aquele montante nos três exercícios seguintes, ou seja, 2000, 2001 e 2002.
(…) Ora, a impugnante não procedeu a qualquer reinvestimento, total ou parcial, por tal facto há que repor a situação, tributando o montante que deveria ter sido tributado em 1999, se a impugnante não tivesse declarado a sua intenção de reinvestir o capital, ou seja, aplicando o disposto no art. 44º, n.º 5 do CIRC na redacção ao tempo em vigor.
Tal situação acabada de descrever é uma decorrência legal, que não desencadeia outro tipo de consequência que não seja a da emissão da competente liquidação reportada à data da obtenção do rendimento.
É que a liquidação só poderia ser feita na data em que foi porque até então estava suspensa tal possibilidade pela declaração do contribuinte da intenção de reinvestir no período de 3 anos garantido por lei.
(…) O regime transitório instituído pela Lei 30-G/2000 e consagrado no art. 7.º, n.º 7 só prevê a opção pela aplicação do novo regime no caso em que se verifique o reinvestimento total ou parcial e nas condições enumeradas nas alínea a), b) e c).
Sucede que não ocorreu qualquer reinvestimento, não sendo legítimo à impugnante tributar as mais-valias no exercício de 2002, pelo regime vigente para esse ano.».

Defende, porém, a Recorrente que o regime transitório previsto art. 7º, nº 7, da Lei nº 30-G/2000, não permite que o sujeito passivo opte entre o anterior e o novo regime de tributação das mais-valias fiscais, e que a aplicação do novo regime de tributação – plasmado na redacção dada ao art.º 44º do CIRC por esta Lei n.º 30-G/2000 – se impõe desde que não ocorram os requisitos de que a norma transitório faz depender a aplicação do regime anterior (plasmado na redacção dada ao art.º 44º do CIRC pela Lei nº 52-C/96). Nesse contexto, insiste que é aplicável ao caso sub judice a nova redacção do art.º 44º do CIRC, pois para que fosse aplicável a redacção anterior impunha-se que tivesse procedido ao reinvestimento do valor realizado com o bem alienado em 1999, o que não fez.
Esquematicamente, poderá dizer-se, então, que a questão se reconduz a saber se tendo a alienação ocorrido em 1999, e não se tendo concretizado o reinvestimento nos três exercícios seguintes, a tributação das respectivas mais-valias deve ser efectuada à luz da regra contida no nº 5 do art. 44º do CIRC na redacção vigente nesse ano de 1999 (dada pela Lei nº 52-C/96) ou, antes, em conformidade com a regra contida na mesma disposição legal mas já com a redacção dada pela Lei nº 30-G/2000, atenta a norma de direito transitório contida no art. 7º, nº 7, desta última Lei, tendo em conta que na sentença se entendeu que do teor desta norma decorre que a nova redacção do art. 44º só é aplicável se tiver ocorrido o reinvestimento, enquanto a Recorrente conclui exactamente o contrário, ou seja, que a nova redacção do art. 44º é aplicável precisamente às situações em que não ocorreu o reinvestimento.
Para a dilucidação da questão importa apreciar os termos em que as normas em apreço se relacionam entre si, o que convoca o problema da sucessão de leis e sua aplicação no tempo, o qual, como se sabe, tem de ser resolvido, em primeiro lugar, através das normas de direito transitório especial (normas da lei nova que disciplinem a sua aplicação no tempo), depois pelas normas de direito transitório sectorial (normas que regulam a aplicação no tempo das leis sobre certa matéria) e, finalmente, pelas normas de direito transitório geral que definem o modo de aplicação no tempo da generalidade das leis, independentemente da matéria sobre que versam, como é o caso da norma ínsita no artigo 12º do Código Civil.
Na verdade, para resolver estas situações de transição quanto à lei aplicável e afastar a dúvida sobre se estão sujeitas ao domínio da lei antiga ou se, ao invés, já se encontram sob a autoridade da lei nova, a própria lei pode estabelecer disposições transitórias, de ordem material ou formal, solucionando as hipóteses que surgem na delimitação de uma e outra lei. Na falta desse direito transitório, rege o artigo 12.º da Lei Geral Tributária, que dispõe sobre a aplicação da lei tributária no tempo e, subsidiariamente, o artigo 12º do Código Civil que, como princípio geral, vale no Direito privado e no Direito público.
O artigo 12º da Lei Geral Tributária dispõe o seguinte:

Artigo 12.º
Aplicação da lei tributária no tempo
1 - As normas tributárias aplicam-se aos factos posteriores à sua entrada em vigor, não podendo ser criados quaisquer impostos retroactivos.
2 - Se o facto tributário for de formação sucessiva, a lei nova só se aplica ao período decorrido a partir da sua entrada em vigor.
3 - As normas sobre procedimento e processo são de aplicação imediata, sem prejuízo das garantias, direitos e interesses legítimos anteriormente constituídos dos contribuintes.
4 - Não são abrangidas pelo disposto no número anterior as normas que, embora integradas no processo de determinação da matéria tributável, tenham por função o desenvolvimento das normas de incidência tributária.

Consagra-se, assim, o princípio geral da não retroactividade da lei tributária, no sentido de que ela só se aplica para o futuro, em consonância, aliás, com o que dispõe também o art.º 12º do Código Civil.
E em conformidade com esse princípio, a Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro, que introduziu uma reforma na tributação dos rendimentos e adoptou medidas destinadas a combater a evasão e fraude fiscais, alterando, designadamente, o Código do IRC, dispõe expressamente no art.º 21º que, «Sem prejuízo do disposto noutras normas da presente lei, esta entra em vigor no dia 1 de Janeiro de 2001, aplicando-se aos períodos de tributação que se iniciem a partir dessa data.». O que significa que o novo regime só é aplicável aos períodos de tributação iniciados a partir de 1 de Janeiro de 2001 e não aos períodos anteriores.
Todavia, este diploma continha uma norma de direito transitório - art. 7.º, n.º 7 – que dispunha o seguinte :
«7 – O disposto na nova redacção do artigo 44º do Código do IRC aplica-se nos períodos de tributação iniciados a partir de 1 de Janeiro de 2001 sem prejuízo do seguinte:
a) O disposto na anterior redacção do artigo 44º do Código do IRC continua a aplicar-se às mais-valias e menos-valias realizadas antes de 1 de Janeiro de 2001 até à realização, inclusive, de mais-valias ou menos-valias relativas a bens em que se tenha concretizado o reinvestimento dos respectivos valores de realização;
b) A parte da diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias relativa a bens não reintegráveis, correspondente ao valor deduzido ao custo de aquisição dos bens em que se concretizou o reinvestimento nos termos do n.º 6 do artigo 44º do Código do IRC, na redacção anterior, será incluída no lucro tributável, em fracções iguais, durante 10 anos, a contar do da realização, caso se concretize, nos termos da lei, o reinvestimento da parte do valor de realização que proporcionalmente lhe corresponder;
c) Relativamente às mais-valias e menos-valias realizadas nos períodos de tributação iniciados em 2001, aplica-se o regime do artigo 44º do Código do IRC quando o reinvestimento a que se refere o nº. 1 deste artigo se verifique até ao fim do terceiro período de tributação seguinte ao da realização.».

Da análise desta norma decorre, claramente, que apesar da regra contida no citado art.º 21º, o legislador pretendeu que, nalguns casos, continue a aplicar-se a anterior redacção do artigo 44º do CIRC, isto é, que ela continue a aplicar-se às mais-valias e menos-valias realizadas antes de 1 de Janeiro de 2001 até à realização, inclusive, de mais-valias ou menos-valias relativas a bens em que se tenha concretizado o reinvestimento dos respectivos valores de realização.
Ora, nada referindo quanto às situações em que, não obstante ter sido manifestada a intenção de reinvestimento, este não tenha efectivamente ocorrido, parece-nos claro que o que se pretendeu disciplinar, nesta norma de direito transitório, são as situações em que tenha existido esse efectivo reinvestimento dos valores de realização. E, salvo o devido respeito por contrária opinião, não assiste qualquer razão à Recorrente quando defende que determinando esta norma de direito transitório a aplicação da anterior redacção do art. 44º do CIRC às situações em que se verificou o reinvestimento, então é porque se pretendeu que a nova redacção seja igualmente aplicável às situações em que não existiu esse reinvestimento.
Tal regra de direito transitório constitui, inquestionavelmente, e pela sua própria natureza, uma norma de carácter excepcional, que não pode, obviamente, ser alvo de interpretação extensiva; quer dizer, não se podem extrair dela consequências ou previsões que extravasem o seu conteúdo. E, por outro, não sendo uma norma interpretativa, a nova redacção dada ao art. 44º, nº 5, do CIRC pela Lei nº30-G/2000, apenas rege para o futuro, como resulta expressamente do disposto no artigo 21º dessa Lei e do corpo do seu art.º 7.º, bem como do disposto no artº 12º da LGT, tendo em conta que o facto tributário, consubstanciado na alienação e obtenção das mais-valias, ocorreu em 1999, ficando, assim, sujeito ao regime de tributação e de reinvestimento vigente nessa data.
Se assim não fosse, nem a Recorrente careceria de as integrar na declaração de rendimentos referente a esse exercício de 1999, nem de manifestar, então, nos termos do nº 4, do art. 44º do CIRC, a intenção de proceder ao seu reinvestimento para efeitos do disposto no nº 1 do mesmo preceito legal, como fez.
Acresce que, o que resulta do nº 1 do art. 44º do CIRC, na redacção da Lei nº 52-C/96, de 27 de Dezembro, é que se o contribuinte manifestar a intenção de reinvestir o montante das mais valias realizadas, total ou parcialmente, durante os três exercícios seguintes, a respectiva tributação suspende-se, durante esse período, após o que essa tributação, terá ou não lugar em função da verificação desse reinvestimento e na medida dele.
Ora, o que a Recorrente advoga é que o facto tributário radica não na realização das mais valias, mas sim, na ausência do seu reinvestimento, e, por conseguinte, na falta do pressuposto que determinaria a não tributação dessas mais-valias, entendimento que não tem, porém, qualquer apoio legal.
Sendo assim, tendo a impugnante realizado as mais-valias no exercício de 1999, há que concluir que a sua tributação terá de obedecer ao que dispõe o art. 44º, nº 5 do CIRC na redacção vigente nessa data.
Nesta conformidade, a sentença não merece a censura que lhe é dirigida, improcedendo todas as conclusões do recurso.

4. Termos em que acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.
Custas a cargo da Recorrente.

Lisboa, 16 de Janeiro de 2013. – Dulce Manuel Neto (relatora) – Ascensão LopesPedro Delgado.