Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0306/12.6BELLE 01136/16
Data do Acordão:11/21/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:NUNO BASTOS
Descritores:IRC
CUSTOS
INDISPENSABILIDADE DE CUSTOS
JUROS COMPENSATÓRIOS
FUNDAMENTAÇÃO
Sumário:I - Para os efeitos do disposto no artigo 23.º, n.º 1, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, na sua redação inicial, são, em princípio, de considerar indispensáveis para a realização e proveitos ou ganhos do sujeito passivo que se dedique à atividade de compra e venda de bens imobiliários os encargos que tenha suportado como promitente vendedor com indemnizações pela rescisão de contratos-promessa de compra e venda de imóveis;
II - Do facto de a fatura não conter todos os elementos necessários à justificação do custo não deriva que o encargo não se encontre devidamente documentado para os efeitos do artigo 42.º, n.º 1, alínea g) do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, se existirem e forem exibidos outros documentos que concorram para a justificação da operação contabilística em causa.
III - Não padece de falta de fundamentação a liquidação dos juros compensatórios que não contenha a indicação dos factos que integram o comportamento ilícito e culposo do contribuinte, se esses factos se encontram descritos no próprio relatório de inspeção tributária que contenha a fundamentação da liquidação do imposto correspondente.
Nº Convencional:JSTA000P25191
Nº do Documento:SA2201911210306/12
Data de Entrada:10/19/2016
Recorrente:AT-AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A........LIMITED - SUCURSAL EM PORTUGAL
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. Relatório

1.1. A Representante da Fazenda Pública recorre da sentença proferida pela Mm.ª Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, na parte em que julgou procedente a impugnação judicial da decisão proferida no recurso hierárquico da decisão que indeferiu a reclamação graciosa das liquidações de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas n.º 2010 8310016661, relativa ao exercício de 2007, de juros compensatórios n.ºs 2010 00001661454 e 2010 00001661455, bem como da demonstração do acerto de contas n.º 2010 2222216332, no valor total de € 3.644.233,11.

Impugnação esta que tinha sido deduzida por A……….. Limited – Sucursal em Portugal da sociedade de direito irlandês A’………. Limited, com o número de pessoa coletiva …………, com domicílio indicado na Quinta ………., …….. Rua …….., ……., ………, em Vila Nova de Gaia, e esposa B…………., N.I.F. ……….., com o mesmo domicílio.

O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Notificada da sua admissão, apresentou alegações, que rematou com as seguintes conclusões:

«(…) 1. A douta sentença recorrida decidiu pela procedência parcial do pedido anulando o imposto correspondente às correcções respeitantes aos custos contabilizados pela Impugnante com indemnizações pela revogação de contratos-promessa de compra, às correcções da factura contabilizada como custo na parte do valor de € 1.633.500,00 e, bem assim, a liquidação de juros compensatórios;

2. Para tanto, fundamentou a Mmª Juiz a quo que a AT não evidenciou factos que pudessem concluir que os custos com as indemnizações não foram suportados no interesse da sociedade entendendo que da prova produzida nos autos ficou demonstrado que os montantes em causa foram suportados pela Impugnante no âmbito do seu objecto social por motivações empresariais cuja bondade a Fazenda Pública (FP) não pode questionar sob pena de violação do princípio da livre gestão ancorando tal entendimento nos doutos Acórdãos do STA de 2010-04-21 e 2008-02-13 proferidos nos recursos 774/09 e 798/07 respectivamente;

3. Com o sempre devido respeito, não pode a FP concordar com tal afirmação;

4. Conforme doutrina da autoria de Rui Duarte Morais in "Apontamentos ao IRC", citada pela douta sentença recorrida, o custo não deve ser fiscalmente aceite quando se deva concluir que o encargo foi determinado por outras motivações (interesse pessoal dos sócios, administradores, credores, outras sociedades do mesmo grupo, parceiros comerciais, etc.) porquanto tal custo não deve ser havido por indispensável;

5. Sendo efectivamente de respeitar o princípio da livre gestão empresarial, o facto é que cabe à AT, no âmbito das suas competências constitucionais e legais, garantir o cumprimento das leis fiscais e combater a evasão e fraude fiscais;

6. Conforme consta do Relatório de Inspecção Tributária inserto nos autos (RIT), as indemnizações objecto de correcções ultrapassavam em muito os montantes acordados a título de sinal e cláusula penal nos contratos-promessa outorgados;

7. Encontrando-se convencionado nos contratos as obrigações das partes em caso de incumprimento, e não tendo havido qualquer alteração aos mesmos, não seriam judicialmente exigíveis montantes superiores;

8. Conforme entendimento de Ângelo Abrunhosa in "O Contrato-Promessa", Porto 2006, o sinal e restantes cláusulas são a medida da indemnização devida em caso de incumprimento nos termos do art.º 442º n.º 2 do Código Civil";

9. Em caso de não cumprimento, o promitente-comprador não faltoso tem dois direitos, a saber, a restituição do sinal que contratou acrescido dos restantes valores previstos no contrato ou requerer a execução específica do contrato-promessa uma vez que a mesma foi expressamente convencionada;

10. Nos termos do art.º 811º n.º 1 do CC, o credor não pode exigir cumulativamente o cumprimento coercivo da obrigação principal e o pagamento da cláusula penal;

11. O douto Ac. do STJ de 2009-05-07 entendeu que a execução específica apenas tem lugar quando não há incumprimento definitivo mas simples mora enquanto a exigência do sinal somente é possível numa situação de incumprimento definitivo;

12. In casu, a alienação a terceiro do bem objecto da compra e venda impede a execução específica por impossibilidade de realização do contrato definitivo;

13. A aceitação pelos promitentes-compradores dos valores contabilizados como custos pela impugnante e aceites pela AT inibiria o recurso à execução específica das promessas não sendo, por essa razão, plausível a justificação da Impugnante aceite na douta sentença recorrida;

14. Quanto às entidades C…………" e "D……… Limited", o RIT explana que não foi feita prova da entrega de sinal e princípio de pagamento nem estava contratada qualquer indemnização em caso de incumprimento do promitente-vendedor;

15. Tais entidades mantinham relações especiais com a Impugnante pelo facto do administrador da sociedade-mãe irlandesa, Sr. ………., ser também administrador da "D……….Limited" e C……….. era accionista da primeira;

16. Por essa razão foram as condições contratadas diferentes dos restantes contratos-promessa;

17. Se os sócios irlandeses tinham interesse em ser ressarcidos de eventuais entregas (não provadas) tinham igualmente interesse em que a venda se efectuasse ao terceiro que adquiriu o terreno a final;

18. À luz do Direito das Sociedades, o interesse dos sócios resume-se ao direito à distribuição dos lucros e não na utilização dos negócios sociais para obtenção de outras vantagens patrimoniais;

19. Pelo que não fica igualmente justificado o recurso a qualquer execução específica;

20. Pelo exposto, as correcções respeitantes às indemnizações devem manter-se;

21. Quanto ao valor facturado pela sociedade-mãe à Impugnante no valor total de € 3.414.999,00, entendeu a douta sentença sob recurso que o valor de € 1.633.500,00 respeitante a uma factura emitida pela sociedade irlandês E………. LIMITED deve ser aceite como custo fiscal pelo facto da única actividade daquela sociedade irlandesa ser o projecto em Portugal não obstante a falta de descrição dos concretos serviços a que se refere e atenta a prova testemunhal produzida nos autos;

22. Também quanto a este ponto não pode a FP conformar-se;

23. Como bem fundamentou a Mmª Juiz a quo, o CIRC exige duas ordens de requisitos quanto à admissibilidade de custos fiscais, uma de natureza formal e outra de substância;

24. As despesas efectuadas comprovadamente nos termos do então em vigor art.º 23º do CIRC, implicam um documento de suporte que identifique as principais características das operações;

25. Tal requisito não se verifica no documento apresentado pela Impugnante que, não obstante revestir a forma de factura, não revela o que foi transmitido/prestado;

26. Tais exigências formais visam atingir um eficaz controlo das relações económicas quer do lado adquirente quer do fornecedor uma vez que ao custo de um corresponde um proveito do outro;

27. A aceitação de tal documento equivaleria a fazer tábua rasa das obrigações contabilísticas e um convite à fuga ao sistema fiscal como denota o douto Acórdão desse STA de 2012-07-05 proferido no Procº 0658/11;

28. A existência de relações especiais entre a sociedade-mãe e a E………., nos termos supra expostos, obriga a uma exigência acrescida no controlo dos movimentos financeiros entre as mencionadas entidades;

29. No RIT, fundamenta-se que a Impugnante foi notificada para apresentar cópia do contrato de prestação de serviços celebrado entras as empresas o que aquela não fez;

30. Finalmente, no tocante à liquidação de juros compensatórios impugnada, decidiu a douta sentença recorrida pela falta de fundamentação da actuação culposa do contribuinte;

31. O Acórdão desse STA de 2009-02-11 proferido no Procº 01002/08 doutamente entendeu que em matéria de fundamentação de juros compensatórios o n.º 9 do art.º 35º da LGT estabelece quais os requisitos para se considerar fundamentada a liquidação dos juros;

32. Tais requisitos mostram-se preenchidos no Doc. n.º 21 inserto nos autos;

33. O n.º 9 do art.º 35º da LGT, aplicável por força do art.º 94º do CIRC (actual art.º 102º) é norma especial relativamente a quaisquer outras disposições legais nesta matéria;

34. Tendo decidido no sentido da procedência parcial do pedido, incorreu o julgador da 1ª instância em erro de julgamento e violou o disposto no art.º 23º do CIRC e art.º 35º n.º 9 da LGT».

Concluiu dizendo que deve ser concedido provimento ao recurso e pedindo a revogação da douta sentença recorrida e a sua substituição por outra que considere o pedido improcedente.

A Recorrida não apresentou contra-alegações.

1.2. Recebidos os autos neste tribunal, foi ordenada a abertura de vista ao Ministério Público.

O Ex.mo Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer, que sumariamos do seguinte modo:

a) Os factos constantes do probatório e dos seus pontos “EE” a “JJ” em particular demonstram que os custos relativos ao valor da indemnização paga e desconsiderados pela Administração Tributária foram incorridos no interesse da empresa;

b) A falta de documento externo comprovativo do custo relativo a «serviços de gestão» pode ser suprida por outros meios de prova que demonstrem de forma inequívoca a justeza do lançamento efetuado;

c) Os factos constantes das alíneas “K”, “YY” e “AAA” do probatório permitem concluir que este custo é um custo da sociedade-mãe a imputar à impugnante/recorrida, nos termos do disposto no artigo 50.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas e do artigo 7.º, n.º 3, da Convenção contra a Dupla Tributação entre Portugal e a Irlanda, aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 29/94, publicada na I Série-A do Diário da República n.º 144, de 24 de junho de 1996;

d) O ato de liquidação dos juros compensatórios está insuficientemente fundamentado porque dele não consta a situação fáctica violadora da lei que justifica a liquidação.

Concluiu dizendo que deve ser negado provimento ao presente recurso jurisdicional e deve ser mantida a sentença recorrida.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.



2. Do objeto do recurso e das questões a decidir

O recurso tem por objeto mediato a sentença recorrida na parte em julgou procedente a impugnação judicial.

São questões a decidir a de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao concluir que padeciam de violação da lei as decisões administrativas de desconsideração dos custos suportados com indemnizações pela revogação de contratos promessa de compra e venda e com serviços de gestão.

Importa ainda decidir se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao concluir que a liquidação de juros compensatórios se encontra insuficientemente fundamentada.



3. Dos fundamentos de facto

Foi o seguinte o julgamento de facto em primeira instância:

«Com interesse para a decisão da causa, de acordo com as soluções plausíveis de direito, considera-se provada a factualidade que se passa a subordinar por alíneas:

A. Ao abrigo da ordem de serviço n." OI201001379, de 28.06.2010, a Direção de Finanças de Faro levou a cabo uma ação de inspeção externa à Impugnante, de âmbito geral para o exercício de 2007 - cfr. o Relatório de Inspeção (RIT) a fls. 334 a 364 dos autos.

B. A referida inspeção foi desencadeada «em virtude do sujeito passivo...em 2005, 2006 e 2008 declarar uma estrutura de custos e proveitos demonstrando uma actividade muito reduzida e em 2007 os custos extraordinários declarados parecerem anormalmente elevados» - cfr. o ponto II.2 do RIT a fls. 334 a 364 dos autos.

C. Em 08.06.2010 foi elaborado o Relatório Final de Inspeção Tributária (RIT), superiormente sancionado em 09.12.2010, do qual se extrai o seguinte:

«(...)

III - DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL

Imposto sobre o rendimento de pessoas Colectivas (IRC)

O sujeito passivo contabilizou na conta "69581 - Custos e Perdas Extraordinárias - Outras Penalidades - Rescisões Contratuais" o valor global de 20.648.926, 02€ relativo aos acordos de rescisão celebrados em 20 de Março de 2007 com os diversos promitentes-compradores dos lotes da Quinta ………. de acordo com os contratos promessa de compra e venda celebrados em Junho de 2005 conforme se descrimina:

Os contratos promessa de compra e venda celebrados entre o sujeito passivo e as entidades "………, SA", "…….., Lda.", ………, SA", "………,SA", " ………, SA" e "………., Lda." previam que no caso de não celebração da escritura de compra e venda dos lotes por facto imputável ao promitente-vendedor, o promitente-comprador terá direito ao reembolso das quantias adiantadas a título de sinal e de princípio de pagamento acrescido de juros calculados à taxa Euribor a 6 meses deduzida do spread de 0,5%, bem como, direito a uma indemnização de igual valor às quantias adiantadas a título de sinal e de princípio de pagamento.

Deste modo, o sujeito passivo apenas estava obrigado a restituir aos restantes outorgantes as quantias adiantadas a título de sinal e de princípio de pagamento acrescido de juros calculados à taxa Euribor a 6 meses deduzida do spread de 0,5%, bem como, uma indemnização de valor igual às quantias adiantadas a título de sinal e de princípio de pagamento, não se verificando como indispensável para obtenção dos rendimentos o pagamento de qualquer outra indemnização superior à inicialmente acordada.

Pelo que, nos termos do n.º 1 do artigo 23º do Código do IRC, não são aceites como custo fiscal qualquer valor escriturado a título de indemnização superior ao inicialmente acordado entre as partes.

Dado que as partes acordaram como indemnização o valor igual às quantias adiantadas a titulo de sinal e de princípio de pagamento, bem como, o juro gerado entre a data da celebração do acordo e a data de rescisão do acordo pelas quantias adiantadas calculado à taxa Euribor a 6 meses deduzida do spread de 0,5%.

[...]

Por conseguinte, apenas é aceite como custo fiscal a título de indemnização o valor de 1.044.000,00€ acrescido dos juros no montante de 42.875,57€ e não o valor de 2.044.000,00€ contabilizado e pago pelo sujeito passivo aos diversos outorgantes acima identificados.

Relativamente às entidades C……….. e D………. Limited, dado que não existem comprovativos de que as mesmas tenham efectuado o adiantamento de qualquer importância a título de sinal e de princípio de pagamento, conforme exposto anteriormente, a empresa não estava obrigada ao cumprimento da cláusula do acordo que previa como indemnização o valor igual às quantias adiantadas a título de sinal e de princípio de pagamento.

Deste modo, nos termos do n.º 1 do artigo 23.º do Código do IRC, não são aceites como custo fiscal os valores escriturados a título de indemnização para as entidades C……… e D………Limited nos montantes de 6.500.000,00€ e 11.648.926,00€, respectivamente.

O sujeito passivo contabilizou na conta "622369 – Fornecimentos e Serviços Externos – Trabalhos Especializados - Outras" o montante de 3.414.999,00€ relativos a serviços de gestão prestados pela empresa mãe, tendo sido notificado para demonstrar que foi observado o estatuído no n.º 1 do art. 63° do CIRC, bem como, para proceder à comprovação da indispensabilidade do referido custo para obtenção dos proveitos do estabelecimento estável de acordo com estipulado no art. 23º do CIRC.

De acordo com o art. 58° do CIRC, bem como da alínea a) do n.º 3 do art. 1º da Portaria 1446C/2001 de 21 de Dezembro, as operações realizadas, no âmbito de um qualquer acordo, designadamente de partilha de custos, entre um sujeito passivo não residente e um seu estabelecimento estável situado em Portugal estão abrangidos pelo princípio da plena concorrência.

Relativamente a este ponto o sujeito passivo referiu tratar-se de uma imputação directa ao seu estabelecimento estável dos custos originalmente facturados por entidades terceiras e suportados pela entidade não residente, pelo que no caso em apreço estamos na presença de uma situação bem diferente da existência de um acordo de partilha de custos.

Mais foi referido por …………., actual administrador do estabelecimento estável, que por acordo de accionistas, foi decidido que todos os serviços seriam adquiridos externamente e que a gestão da entidade Irlandesa seria feita e dirigida através dos escritórios de ………….. e da E………..Ltd. E que relativamente à sucursal em Portugal, esta contratava os seus próprios consultores e gestores, bem como, empregava e nomeava o seu próprio representante (administrador) que seria residente no país, na altura o Sr. ………….., como anteriormente referido.

De notar que da análise aos elementos contabilísticos do sujeito passivo verificou -se que este contabilizou os seguintes custos:

• Comissão de venda facturada, em Junho de 2007, pela entidade "…………., Lda. - NIPC: ………." no montante total de 2.000.000,00€, relativa à intermediação no negócio da venda do imóvel "Quinta ………..".

• Serviços de consultadoria prestados e facturados pela entidade" ………….., SA - NIPC: ………." no montante 66.550,00€.

• Serviços jurídicos prestados e facturados pela entidade "………….. – Soc. Advogados - NIPC: ………." no montante de 115.715,79€.

• Serviços de arquitectura prestados e facturados pela entidade "……………….., Lda. - NIPC: ………." no montante de 151.250,00€.

Suportou custos no montante de 432.254,86€ relativos a contencioso e notários. Suportou custos de Assessorias Fiscal/Legal no montante de 251. 678,95€, sendo que 182.265,79€ dizem respeito aos serviços facturados pelas empresas …….., SA e ………….. – Soc. Advogados.

• Suportou custos no montante de 188.155,00€ relativos a consultaria imobiliária.

• Suportou custos relativos a juros com empréstimos bancários no montante de 245.378,69€, entre outros.

Deste modo a imputação dos custos incorridos pela entidade não residente, sem a observação do art. 63º do CIRC, nomeadamente quanto à inexistência de um acordo de partilha de custos, bem como, pela análise da descrição efectuada pelo administrador, quanto ao tipo de custos incorridos pela empresa mãe na Irlanda e aos custos suportados pelo sujeito passivo em Portugal, dada a sua duplicação, visam uma economia do imposto a pagar pelo estabelecimento estável em território nacional.

Assim sendo o sujeito passivo não comprovou a indispensabilidade do custo imputado pela empresa mãe ao estabelecimento estável para a obtenção do proveito, uma vez que os custos suportados pela entidade não residente são semelhantes aos custos incorridos pela sucursal em Portugal para a obtenção do mesmo e único proveito, pelo que nos termos do n.º 1 do artigo 23º do Código do IRC não é aceite como custo fiscal o valor escriturado a título de serviços de gestão no montante de 3.414.999,00. Consequentemente propomos uma correcção a matéria colectável declarada no montante de 22.977.049,45€ conforme se demonstra:

[...]

IX. DIREITO DE AUDIÇÃO

[...]

Pelos documentos juntos no exercício do direito de audição relativos aos comprovativos dos adiantamentos efectuados, a título de sinal e de princípio de pagamento dos contratos promessa celebrados, pelas entidades "C……” e "D…….Limited'', nos montantes de 3.700.000,00€ e 6.000.000,00€, respectivamente, procederemos, em sede de IRC, à alteração da correcção proposta ao rendimento colectável do ano de 2007. Pelos restantes motivos invocados, não procederemos a qualquer alteração ao valor inicialmente proposto.

Assim propomos uma correcção a matéria colectável declarada no montante de 13,277.049,45€ conforme se demonstra:



D. Ato impugnado: Na sequência das correções a que se refere o RIT identificado na alínea anterior foi emitida em 20.12.2010 a liquidação adicional de IRC relativa ao exercício de 2007 com o n.º 2010 8310016661, que apurou imposto a pagar no valor de € 3.311.388,41 e € 332.113,90 de juros compensatórios – cfr. fls. 365 dos autos.

E. Ato impugnado: A demonstração da liquidação dos juros compensatórios a que se refere a alínea que antecede tem o seguinte teor:

- cfr. fls. 366 dos autos.

F. Ato impugnado: Da demonstração de acerto de contas resultou a pagar a quantia de € 3.644.233,11, até 31.01.2011, respeitante à liquidação identificada em D), valor que inclui o estorno da quantia de € 730,80 da liquidação inicial relativa ao período em causa e € 67,83 de juros compensatórios sobre o mesmo valor - cfr. fls. 367 dos autos.

G. Em 31.05.2011 a lmpugnante deduziu reclamação graciosa nos termos constantes de fls. 2 a 73 do processo de reclamação apenso, que aqui se dão por reproduzidos, onde invoca, em síntese, os mesmos fundamentos que sustentam o pedido formulado nos presentes autos - cfr. fls. 2 a 73 e 169 do processo de reclamação graciosa apenso.

H. Por despacho de 06.09.2011 a reclamação foi indeferida com os fundamentos constantes de fls. 242 a 244 do processo de reclamação apenso, que aqui se dão por reproduzidos, e que, no essencial, mantem os fundamentos das correções efetuadas em sede inspeção acrescentando, quanto à liquidação de juros compensatórios, serem os mesmos devidos pelo retardamento da liquidação do imposto ao considerar custos fiscais que não podiam ser aceites – cfr. fls. 242 a 244 do processo de reclamação graciosa apenso.

I. Em 14.10.2011 a lmpugnante apresentou recurso hierárquico da decisão que antecede sobre o qual foi proferido, em 20.01.2012, despacho de indeferimento, com os mesmos fundamentos das correções efetuadas em se de inspeção – cfr. fls. 156 até final do processo de reclamação graciosa apenso.

J. A Impugnante constitui a representação permanente em território nacional da sociedade A……….. LIMITED, com sede na República da Irlanda - cfr. doc. 2 junto com a petição inicial.

K. A A………… LIMITED foi constituída por promotores irlandeses com o concreto e único objetivo de investir no projeto imobiliário, localizado em território português, no imóvel designado por "Quinta ……..", e não desenvolveu outras atividades para além das relacionadas com este projeto, conforme teor do documento 26 junto com a petição inicial que aqui se dá por reproduzido - depoimento da testemunha ………. e cfr. doc. 26 junto com a petição inicial.

L. Em 14.01.2005, a Impugnante declarou o início da sua atividade em Portugal indicando que se dedicava à compra e venda de bens imobiliários (CAE 12211014) - por acordo.

M. Em 03.06.2005, a Impugnante celebrou um contrato-promessa de compra e venda com o Fundo de Investimento Imobiliário ……….. (FII ……..), para aquisição do imóvel designado por "Quinta ………..", descrito na matriz predial rústica da freguesia de ……., Loulé, sob o número 2452 - cfr. doc. 3 junto com a petição inicial.

N. No contrato identificado foi estipulado, designadamente, o seguinte:

i. a Impugnante obrigou-se a adquirir o imóvel pelo preço de € 51.250.000,00;

ii. o preço estipulado encontrava-se sujeito a ajustamento, a final em função da área de construção que viesse a ser efetivamente aprovada para o loteamento cujo projeto se encontrava pendente de aprovação pela Câmara Municipal de Loulé;

iii. o preço deveria ser pago da seguinte forma: a) € 5.000.000,00, na data da celebração do contrato promessa de compra e venda; b) € 5.000.000,00, até ao dia 15.12.2005; c) € 2.500.000,00 até um ano após a celebração do contrato promessa de compra e venda ou na data do contrato prometido, consoante o que ocorresse em primeiro lugar; e d) o remanescente, na data do contrato prometido;

iv. a aquisição definitiva do imóvel pela Impugnante apenas seria realizada após a aprovação do Projeto de Loteamento e do Projeto de Obras de Urbanização, pendentes na Câmara Municipal de Loulé;

v. a prometida compra e venda deveria ocorrer entre o dia 15.02.2006 e o dia 15.02.2008;

vi. uma vez obtido o Alvará de Loteamento e registados os Lotes de terreno para construção decorrentes do mesmo, caberia ao FII ……… marcar a escritura pública de compra e venda, notificando a Impugnante da data da outorga com a antecedência mínima de 30 dias - cfr. doc. 3 junto com a petição inicial.

O. Nos dias 30.09.2005 e 14.06.2006, a Impugnante celebrou com o FII B………, dois aditamentos ao contrato promessa identificado em M), alterando, sucessivamente, as datas previstas para o pagamento das segunda e terceira tranches do sinal que passaram para os dias 29.06.2006 e 15.12.2006, respetivamente – cfr. docs. 4 e 5 juntos coma petição inicial.

P. Em cumprimento do previsto no contrato promessa de compra e venda e nos aditamentos posteriores, a Impugnante entregou ao FII ……., a título de sinal e princípio de pagamento, o valor global de € 12.500.000,00 – cfr. docs. 3 a 5 juntos com a petição inicial.

Q. Em simultâneo com a negociação com o FII ………., a Impugnante iniciou a promoção do projeto imobiliário "Quinta …….." junto de potenciais interessados nos lotes de terreno para construção que viessem a resultar do Alvará de Loteamento que aguardava aprovação - depoimento das testemunhas ……… e ……….

R. No âmbito da promoção a que se refere a alínea que antecede, entre junho e julho de 2005, a Impugnante celebrou oito contratos promessa de compra e venda, tendo prometido vender parte dos lotes de terreno que viessem a resultar do loteamento - cfr. docs. 6 a 13 juntos com a petição inicial.

S. Em 03.06.2005, a Impugnante celebrou com a sociedade …………., LDA., um contrato promessa de compra e venda de cinco lotes de terreno para construção, com uma área global de construção de 1.350 m2, de acordo com o qual:

i. O preço global dos cinco lotes de terreno para construção seria de € 900.000,00, pago da seguinte forma: (a) 10% na data da assinatura do contrato promessa; (c) 40% após a aprovação do Projeto de Loteamento por parte da Câmara Municipal de Loulé; e (c) os restantes 50% na data da outorga da escritura de compra e venda dos mesmos lotes;

ii. O contrato definitivo estava condicionado à aprovação e registo do Projeto de Loteamento até ao dia 31.12.2008 e deveria ser celebrado até ao dia 15.02.2009.

iii. Caso o contrato definitivo não viesse a ser realizado até àquela data, por facto imputável à promitente-compradora, a Impugnante teria direito a fazer suas as quantias já entregues, a título de compensação;

iv. No caso de o contrato prometido não ser celebrado antes de 15.02.2009, por facto imputável à Impugnante, a promitente-compradora teria direito à devolução dos valores entregues acrescidos de juros, bem como a uma indemnização no valor equivalente aos valores entregues, sem prejuízo da possibilidade de recurso à execução específica (cláusula 6ª do contrato)

- cfr. doc. 6 junto com a petição inicial.

T. Na data da celebração do contrato promessa que antecede a promitente compradora entregou à Impugnante a quantia de € 90.000,00, correspondente a 10% do preço global, e a Impugnante entregou àquela uma garantia bancária de igual valor - cfr. doc. 6 junto com a petição inicial.

U. Na mesma data, a Impugnante celebrou, ainda, com as sociedades …………, LDA., …………. - ………. ., S.A., …………, S.A, E …………, S.A., contratos promessa de compra e venda de diversos conjuntos de lotes de terreno para construção no mesmo empreendimento imobiliário nos quais foi acordado com cada uma das promitentes compradoras que:

i. O preço global dos lotes de terreno a transmitir a cada uma seria de € 900.000,00 pago da seguinte forma: (a) 20% na data da assinatura do contrato promessa; (b) 40% após a aprovação do Projecto de Loteamento por parte da Câmara Municipal de Loulé; e (c) os restantes 40% na data da outorga da escritura de compra e venda dos mesmos lotes;

ii. A celebração do contrato definitivo estava condicionada à aprovação e registo do Projeto de Loteamento até ao dia 31.12.2008;

iii. As escrituras de compra e venda deveriam ser outorgadas até ao dia 15.02.2009;

iv. Caso o contrato definitivo não viesse a ser realizado até àquela data, por facto imputável às promitentes compradoras, a Impugnante teria direito a fazer suas as quantias já entregues, a título de compensação;

v. Caso o contrato prometido não viesse a ser celebrado antes de 15.02.2009, por facto imputável à Impugnante, as promitentes compradoras teriam direito à devolução dos valores entregues acrescidos de juros, bem como a uma indemnização no valor equivalente aos montantes entregues, sem prejuízo da possibilidade de requererem a execução específica.

- cfr. docs. 7 a 10 juntos com a petição inicial.

V. Na data da celebração dos contratos promessa identificados em U), cada uma das promitentes-compradoras entregou à Impugnante a quantia de €180.000,00, correspondente a 20% do preço global acordado e a Impugnante entregou a cada uma das promitentes compradoras uma garantia bancária de igual valor - facto não controvertido (cfr. docs. 7 a 10 juntos coma petição inicial).

W. Em 15.06.2005, a Impugnante celebrou com a sociedade D………. LIMITED, com sede na Irlanda, um contrato promessa de compra e venda para a aquisição de um outro conjunto de lotes de terreno para construção no mesmo empreendimento imobiliário identificado em M), no qual foi acordado que:

i. O preço global dos lotes seria de € 15.256.500,00 pago através de um acordo de financiamento, nos termos do qual a Impugnante emitiria notas de crédito, convertíveis em ações (financiamento mezzanine);

ii. A escritura pública de compra e venda dos lotes deveria ser outorgada até ao dia 15.02.2009;

iii. No caso de o contrato definitivo não vir a ser outorgado até ao dia 15.02.2009 por facto imputável à promitente-compradora, a Impugnante poderia resolver o contrato promessa e fazer suas as quantias que já lhe tivessem sido entregues por aquela promitente-compradora;

iv. No caso de o contrato definitivo não ser celebrado por facto imputável à Impugnante a promitente-compradora poderia resolver o mesmo contrato promessa, tendo direito à devolução do valor entregue e a uma indemnização de igual valor ou, em alternativa , a requerer a execução específica.

- cfr. doc. 11 junto com a petição inicial.

X. Entre o dia da assinatura do contrato-promessa identificado em W) e o dia 20.03.2007, a promitente-compradora entregou à IMPUGNANTE a quantia total de € 6.000.000,00, por conta do preço global acordado no mesmo contrato - facto não controvertido (cfr. cap. IX do RIT junto à petição inicial como doc. 19).

Y. Ainda no dia 15.06.2005 a IMPUGNANTE celebrou com C………., residente na Irlanda, um contrato promessa de compra e venda dos lotes de terreno a que corresponderiam as zonas 6 e 7 do mesmo empreendimento imobiliário de acordo com o qual:

i. Foi acordado o preço global de € 15.021.000,00, pago da seguinte forma: (a) € 1.200.000,00, na data da assinatura do contrato promessa de compra e venda; (b) € 2.500.000,00 (dois milhões e quinhentos mil euros) no dia 05.12.2006; e (c) o remanescente, na data da outorga da escritura pública de aquisição dos lotes;

ii. Caso a escritura pública de compra e venda não viesse ser realizada até ao dia 15.02.2009 por facto imputável ao promitente-comprador a Impugnante poderia resolver o contrato promessa de compra e venda, fazendo suas as quantias já entregues por aquele promitente-comprador;

iii. No caso de o contrato definitivo não ser celebrado até àquela data por facto imputável à Impugnante, o promitente-comprador poderia resolver o contrato promessa tendo direito à devolução do valor entregue e a uma indemnização de igual valor ou, alternativa, a requerer a execução específica

- cfr. doc. 3 junto com a petição inicial.

Z. Em cumprimento do previsto no contrato promessa de compra e venda, o promitente-comprador, C………., entregou à Impugnante o valor global de 3.700.000,00, correspondente às primeira e segunda tranches do sinal - facto não controvertido (cfr. cap. IX do RIT junto à petição inicial como doc. 19).

AA. No dia 02.07.2005 a Impugnante celebrou com a ………… PROMOÇÃO IMOBILIÁRIA, S.A., um contrato promessa de compra e venda de seis lotes de terreno no mesmo empreendimento imobiliário, pelo preço de € 1.170.000,00, em condições semelhantes às anteriormente indicadas para os promitentes-compradores identificados em S), U), W) e Y), conforme doc. 13 junto com a petição inicial que aqui se dá por reproduzido – cfr. doc. 13 junto com a petição inicial.

BB. Em cumprimento do estabelecido no contrato promessa identificado em AA), a promitente compradora entregou à Impugnante a quantia de € 234.000,00, correspondente a 20% do preço global acordado e a Impugnante entregou àquela uma garantia bancária em valor equivalente - facto não controvertido e cfr. doc. 13 junto com a petição inicial.

CC. Em 27.06.2006, a Impugnante obteve a aprovação de um empréstimo solicitado ao ………… - BANCO DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO, destinado a financiar a construção do empreendimento denominado "Quinta ……….", conforme doc. 4 junto com a petição inicial, cujos termos aqui se dão por reproduzidos - cfr. doc. 14 junto com a petição inicial.

DD. Com o decorrer do tempo, a Impugnante apercebeu-se da dificuldade de comercialização antecipada dos lotes do empreendimento imobiliário que pretendia desenvolver - cfr. depoimento da testemunha ………….

EE. O valor global dos fundos que a Impugnante tinha assegurado, quer pela celebração dos contratos promessa de compra e venda já indicados, quer pela celebração do contrato de financiamento com o BANCO ……………, não era suficiente para garantir a aquisição do imóvel ao FII B…….., conforme promessa identificada em M), e suportar todos os encargos inerentes ao empreendimento projetado - cfr. depoimento da testemunha …………….

FF. A sociedade ….. II FUNDO ESPECIAL DE INVESTIMENTO IMOBILIÁRIO FECHADO (FUNDO ……….. II) propôs à Impugnante a aquisição da totalidade do imóvel "Quinta ………" – cfr. depoimento da testemunha ………..

GG. O FUNDO ………. II tinha interesse em adquirir o imóvel "Quinta ……….." e desenvolver o empreendimento previsto para o mesmo, ainda que em moldes diversos dos constantes do projeto inicial - cfr. depoimento da testemunha …...

HH. No âmbito das negociações com o FUNDO ………. II, a Impugnante informou que já tinha celebrado diversos contratos promessa tendentes à venda de parte dos lotes de construção que viessem a resultar do Alvará de Loteamento acima indicado – cfr. depoimento da testemunha ………..

II. O FUNDO ……… II fez saber à Impugnante que a proposta negocial apresentada só se manteria no caso de se tratar da aquisição da totalidade do imóvel ou dos lotes dele resultantes e impôs como condição para a realização do negócio a inexistência de qualquer compromisso entre a Impugnante e terceiros para a venda de quaisquer lotes - cfr. doc. 15 junto com a petição inicial e depoimentos das testemunhas ………. e ………….

JJ. O interesse na aquisição da totalidade da propriedade "Quinta ………." por parte do FUNDO ……… II justificava-se pela circunstância de aquele Fundo pretender desenvolver o empreendimento imobiliário em conjunto com um outro projeto ligado ao Golf e não apenas adquirir lotes de terreno no mesmo – cfr. doc. 15 junto com a petição inicial e depoimento da testemunha ………...

KK. Em 16.03.2007, a Impugnante celebrou com a ………….. - GESTÃO DE FUNDOS DE INVESTIMENTO, S.A, entidade gestora do referido FUNDO ………….. II, o contrato promessa de compra e venda do imóvel denominado "Quinta ………" - cfr. doc., 16 junto com a petição inicial.

LL. No contrato identificado em KK) foi estipulado, além do mais, o seguinte:

i. O preço acordado para a prometida compra e venda foi de € 81.500.000,00 e seria pago da seguinte forma: a) € 12.500.000,00 na data da assinatura do contrato promessa; € 59.000.000,00 na data da outorga da escritura de compra e venda do imóvel e € 10.000.000,00 após o registo do Alvará de Loteamento na Conservatória do Registo Predial, ou 180 dias após a data da outorga da escritura pública de compra e venda do imóvel

ii. A celebração do contrato definitivo ficou sujeita à verificação de diversas condições ("condições precedentes"), nomeadamente que "as Declarações e Garantias, tal como definidas na Cláusula 7, sejam completas, correctas, verdadeiras, precisas e fiáveis".

iii. Entre outras condições a Impugnante garantiu ao FUNDO ………..II, que na data da celebração do contrato definitivo, não teria "com quaisquer terceiros qualquer contrato promessa de compra e venda do Imóvel, ou de qualquer parte do mesmo".

iv. O contrato definitivo deveria ser outorgado até ao dia 15.02.2008.

v. No caso de o contrato definitivo não ser celebrado até essa data, ou no caso de qualquer das "condições precedentes" não se encontrar verificada até ao dia 31.12.2007 por facto imputável à Impugnante, o FUNDO ……….. II poderia: (a) resolver o contrato, devendo a Impugnante devolver o montante pago a título de sinal e pagar o valor equivalente ao sinal recebido a título de compensação, ou (b) recorrer à execução específica.

vi. N o caso de o contrato definitivo não ser outorgado até ao referido dia 15.02.2008 por facto imputável ao FUNDO ………….. II, a Impugnante poderia resolver o contrato e fazer seus os montantes já entregues a título de sinal – cfr. doc. 16 junto com a petição inicial.

MM. Na data da assinatura do contrato identificado em KK), o FUNDO …………… II entregou à Impugnante o valor de € 12.500.000,00 a título de sinal e princípio de pagamento – cfr. doc. 16 junto com a petição inicial.

NN. No dia 20.03.2007, a Impugnante adquiriu ao FII B…….. o imóvel "Quinta …………", pelo preço total de € 53.736.137,50 - facto não controvertido.

OO. Também em 20.03.2007, a Impugnante e os anteriores promitentes-compradores acordaram os termos da cessação dos contratos promessa de compra e venda assinados em junho e julho de 2005, obrigando-se aquela a (i) proceder à restituição. das quantias entregues pelos anteriores promitentes compradores a título de sinal e princípio de pagamento e (ii) a proceder ao pagamento da(s) contrapartida(s) que aqueles promitentes compradores exigiram - facto não controvertido (cfr. doc. 19 junto com a petição inicial (referência constante do Relatório de Inspecção), resultante ainda depoimento da testemunha ………...

PP. Na sequência dos acordos referidos em OO) a Impugnante restituiu aos promitentes- compradores os montantes que estes lhe haviam entregue a título de sinal e princípio de pagamento e procedeu ao pagamento aos mesmos das seguintes contrapartidas:


QQ. Por escritura realizada em 20.03.2007 a Impugnante vendeu ao FUNDO ………II o imóvel denominado "Quinta …….." - cfr. doc. 17 junto com a petição inicial.

RR. Na escritura que antecede as partes declararam que a compra e venda era "efectuada nos termos e nas condições estabelecidas na (...) escritura e ainda nos termos das cláusulas constantes do referido contrato promessa de compra e venda (...)", cujos termos reproduziram no documento completar que faz parte integrante da escritura - cfr. doc. 17 junto com a petição inicial.

SS. No documento complementar referido em RR) a Impugnante expressamente declarou que "[a]quando da outorga da presente escritura pública, o Vendedor não tem com quaisquer terceiros, qualquer contrato promessa de compra e venda do Imóvel, ou de qualquer parte do mesmo, nem constituiu qualquer tipo de Encargo sobre o Imóvel, ou sobre parte do mesmo, de que possa resultar qualquer tipo de limitação ou restrição aos direitos de uso, fruição ou disposição do Imóvel ( ... )"- cfr. ponto II. 1, alínea f) do documento complementar que integra o doc. 17 junto com a petição inicial.

TT. Na data da escritura pública referida em QQ), o FUNDO ……… II pagou à Impugnante a quantia de € 59.000.000,00 - cfr. doc. 17 junto com a petição inicial.

UU. No exercício de 2007 a atividade da Impugnante consistiu na aquisição e alienação do imóvel denominado "Quinta …………." - cfr. Relatório de Gestão junto como doc. 17 da petição inicial e depoimento da testemunha ...

VV. No exercício de 2007, a Impugnante contabilizou o valor de € 20.648.926,02 na conta "69581 - Custos e Perdas Extraordinárias - Outras Penalidades - Rescisões Contratuais ( ... ) relativo aos acordos de rescisão celebrados em 20 de Março de 2007 com diversos promitentes compradores dos lotes da Quinta …….. de acordo com os contratos promessa de compra e venda celebrados em Junho de 2005 ( ... )" - facto não controvertido (cfr. o RIT junto como doc. 19 com a petição inicial).

WW. Em 31.12.2007 a A……… LIMITED emitiu uma fatura à Impugnante no valor total de E 3.414.999,00 que foi registada na contabilidade da Impugnante na conta "622369 - Fornecimentos e Serviços Externos - Trabalhos Especializados - Outras" - facto não controvertido (cfr. o RIT junto como doc. 19 com a petição inicial).

XX. A fatura identificada em WW) refere-se a custos suportados pela A’………. LIMITED, relacionados com o projeto "Quinta ………", referentes, designadamente, a serviços de aconselhamento jurídico e assessoria fiscal prestados por terceiros entre abril de 2005 e dezembro de 2007 - depoimento da testemunha ………. e cfr. doc. 31 junto com a petição inicial.

YY. Da quantia identificada em WW) € 1.633.500,00 correspondem a serviços faturados pela sociedade irlandesa "E……… Limited" - facto não controvertido (cfr. o RIT junto como doc. 19 com a petição inicial).

ZZ. Em 31.05.2011 …………, da sociedade "……… …….", dirigiu a ………., via mail, a informação de ter recebido da A’……… LIMITED a quantia de € 559.776,13, "pelos serviços prestados em relação a propriedades portuguesas - cfr. doc. 30 junto com a petição inicial.

AAA. A A’…………. LIMITED celebrou com o seu administrador, ……….., um acordo designado de "Contrato de Serviços de Gestão", conforme doc. 27 junto com a petição inicial e que aqui se dá por integralmente reproduzido, de acordo com o qual para além dos serviços de gestão da propriedade "Quinta …….", aquele utilizava instalações próprias para o funcionamento da sociedade-mãe - cfr. doc. 27 junto com a petição inicial e depoimento da testemunha ………..

BBB. Em 17.09.2005 o Conselho de Administração da A’………. LIMITED deliberou, em relação ao acordo que antecede, aceitar a cedência da posição contratual ………….. para a sociedade E………. LTD - cfr. doc. 28 junto com a petição inicial e depoimento da testemunha …………..

CCC. Em 02.06.2008, a Impugnante apresentou a declaração Modelo 22 de IRC, referente ao exercício de 2007, tendo declarado um resultado líquido do exercício e um lucro tributável no montante de € 358.086,04 - facto não controvertido (cfr. o RIT junto como doc. 19 com a petição inicial).

DDD. Em 08.05.2012 foi a presente Impugnação remetida a este TAF via sitaf – cfr. fls. 3 dos autos.

Não resultaram provados quaisquer outros factos com relevância para a decisão do mérito da causa. (…)».



4. Do Direito

4.1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença da Mm.ª Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé na parte em que, além do mais, julgou ilegal a desconsideração pela Administração Tributária dos custos suportados pelo sujeito passivo com indemnizações pela revogação de contratos-promessa de compra e venda que excediam os previstos nesses mesmos contratos.

Com o assim decidido não se conforma a Recorrente – se bem interpretamos – por três razões fundamentais:

a) porque o custo não deve ser fiscalmente aceite quando for de concluir que o encargo foi determinado por outras motivações (artigo 23.º das doutas alegações do recurso e 4.ª conclusão);

b) porque o princípio da livre gestão empresarial não pode pôr em causa as suas competências constitucionais e legais, como a de garantir o cumprimento das leis fiscais e evitar a evasão e fraude na atuação dos contribuintes (seu artigo 24.º e 5.ª conclusão);

c) porque as indemnizações pagas pela impugnante e objeto das correções ultrapassam em muito os montantes acordados a título de sinal e cláusula penal nos contratos –promessa outorgados (artigo 26.º a 36.º e 6.ª a 13.ª conclusões).

Vamos analisa-las separadamente.

A primeira das razões apresentadas pela Recorrente para a sua discordância com o decidido pelo tribunal recorrido neste segmento peca por inconcludência. Porque, depois de afirmar que «o custo não deve ser fiscalmente aceite quando se deva concluir que o encargo foi determinado por outras motivações (interesse pessoal dos sócios, administradores, credores, outras sociedades do mesmo grupo, parceiros comerciais, etc.», nunca chega a concluir verdadeiramente que foi isso que se passou no caso dos autos ou que é isso que resulta da factualidade dada como provada nos autos. Parece mesmo que o que pretende é deixar aberta essa possibilidade e mobilizar a seu favor a dúvida que pretende semear no espírito do julgador.

A verdade é que não encontramos no discurso fundamentador do ato impugnado qualquer referência às (verdadeiras) motivações da ora Recorrida quando aceitou indemnizações pela rescisão dos contratos-promessa em montantes muito superiores aos inicialmente acordados. A única coisa que a Administração Tributária fez a este propósito foi refutar as razões que lhe foram apresentadas em audição prévia, como necessidade de acautelar a reputação comercial da empresa. E sublinhar que o sujeito passivo nada diz sobre qual ou quais os benefícios que lhe advieram de um tal acordo de rescisão, «sendo certo que tal ónus lhe pertencia» (cit. pág. 20 do relatório de inspeção tributária).

No que não se concede, porém. Desde logo porque a qualificação de um custo como «indispensável» para os efeitos do disposto no artigo 23.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 107-B/2003, de 31 de dezembro, não depende do estabelecimento de um nexo causal entre o custo e o benefício correspondente.

A qualificação de um custo como indispensável não depende do estabelecimento de um nexo causal entre o custo e o benefício, do tipo objetivo, porque pode não haver benefício (o que traria o grave inconveniente da não aceitação de custos indispensáveis, no sentido de inevitáveis ou incontornáveis, que não se traduzissem em proveitos); e não depende do estabelecimento de um nexo causal entre custo e benefício, do tipo subjetivo, porque boas decisões e boas práticas de gestão nem sempre se traduzem em bons resultados (o que traria o grave inconveniente da não aceitação de custos julgados indispensáveis para a obtenção do lucro que não se materializou).

A validação do custo com base no estabelecimento de uma relação causal direta entre custo e benefício corresponde a uma conceção de «indispensabilidade» que a associava à eficiência na gestão empresarial, ou a «indispensabilidade eficiente». E que foi progressivamente abandonada, não apenas por implicar a não aceitação de muitos custos com potencialidade abstrata para a obtenção e proveitos, mas também por «abrir a porta a uma perigosa sindicância a posteriori da dedutibilidade do custo, em função dos respetivos resultados. Ou seja, à consagração de um poder geral de intromissão na gestão da sociedade» [cit. António Moura Portugal, in «A Dedutibilidade dos Custos na Jurisprudência Fiscal Portuguesa, Coimbra Editora 2004, páginas 242 e seguintes].

Certo é que, mesmo que fosse de medir a indispensabilidade do custo pela da eficiência da gestão, a Recorrida não ficaria mal nessa avaliação. Porque, se tomarmos por referência apenas os elementos da operação relevados pela Administração Tributária no relatório de inspeção, o benefício derivado da alienação por € 81.500.000,00 de um imóvel que havia adquirido por € 53.736.137,50 suplanta largamente o curto total das indemnizações aos promitentes compradores que foram preteridos nessa operação.

Observação que aqui se deixa, não para validação económica da decisão de gestão (discussão que não vem ao caso e nem aqui deve ser feita), mas para demonstração de que o encargo suportado com as rescisões dos contratos promessa é, por si só, insuficiente para revelar ou até indiciar o que quer que seja sobre as verdadeiras motivações da Recorrida ou dos seus administradores.

Motivações estas que a Administração Tributária não se podia escusar a demonstrar, se pretendia delas se servir para a afastar a dedutibilidade dos custos. Porque, se é verdade que recai sobre o sujeito passivo o ónus de demonstrar que a despesa existiu e colaborar ativamente com a Administração Tributária quando não seja aparente a justificação para o ter suportado, em última análise é a Administração Tributária que tem que demonstrar as verdadeiras motivações do sujeito passivo, quando nelas pretenda assentar as suas razões para não admitir o custo. É o que resulta do artigo 74.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária.

A segunda das razões apresentadas pela Recorrente para a sua discordância com o decidido pelo tribunal recorrido no mesmo segmento peca também por inconcludência. Porque, depois de afirmar que lhe cabe «no âmbito das suas competências constitucionais e legais, garantir o cumprimento das leis fiscais e evitar a evasão e fraude na atuação dos contribuintes» (artigo 24.º das doutas alegações do recurso), nunca chega a configurar uma situação de fraude ou de evasão fiscal na esfera de atuação da Recorrida. E bem se compreende que não o tenha feito, porque a fiscalização tributária também não o fez.

Diga-se desde já, desassombradamente, que uma situação em que promitente vendedora e promitentes compradores acordam em valores indemnizatórios muito superiores aos que derivavam do acordo inicial e da lei e tendo em vista a viabilização da venda a terceiro do mesmo bem pode indiciar a participação dos promitentes compradores no outro negócio. Não há como excluir, em abstrato, a possibilidade de evasão e fraude numa tal situação.

Mas isso não significa que a Administração Tributária possa fazer assentar na mera possibilidade de fraude a não dedutibilidade do custo. Tal só poderia ocorrer se a fraude fosse demonstrada no caso concreto ou se fosse mobilizada para o efeito uma norma de combate à evasão fiscal que a dispensasse de fazer tal demonstração.

E a Administração Tributária não fez nem uma coisa nem outra: não demonstrou nenhuma situação de fraude ou evasão fiscal nem invocou nenhuma norma em que devesse assentar uma tal presunção. Pelo que a referência em abstrato aos seus deveres constitucionais e legais e, já agora, a diretivas comunitárias que abordam o problema da elisão fiscal em contexto internacional se afiguram aqui, no mínimo, deslocadas e inconsequentes.

A mais importante das razões apresentadas pela Recorrente para a sua discordância com o decidido pelo tribunal recorrido é, sem dúvida alguma, a terceira. Não apenas por ser aquela a que dispensou alguma concretização, mas também por ser a que a Administração Tributária vinha invocando desde o primeiro momento: o facto de o sujeito passivo não estar obrigado legal e contratualmente a indemnizar os promitentes compradores nos montantes a que correspondem as correções.

A mobilização do critério da «obrigatoriedade» do custo para a determinação da sua «indispensabilidade» corresponde a uma outra abordagem, igualmente restritiva, clássica entre nós e que a associava à «exigibilidade» ou «absoluta necessidade» do custo. É tão restritiva que deixa de fora uma parte dos custos enunciados nas diversas alíneas do n.º 1 daquele artigo 23.º e, como tal, expressamente reconhecidos pela lei fiscal [sobre este tema, ver também António Moura Portugal, ob. cit., pág. 250].

Mas é sobretudo inoperante no caso, porque resulta da alínea “OO)” dos factos provados que as contrapartidas pagas pela revogação dos contratos-promessa também derivam de um acordo celebrado com os promitentes compradores, nos termos dos quais a promitente vendedora, ora Recorrida, se obrigava a proceder ao pagamento das contrapartidas que aqueles promitentes compradores exigiram. O que significa que aquelas contrapartidas também foram contratualmente acordadas e eram, nesse sentido igualmente «obrigatórias» para o sujeito passivo.

O que vale por dizer que a verdadeira razão porque a Administração Tributária declinou reconhecer este custo não tem nada a ver com a sua «obrigatoriedade», mas com a sua «razoabilidade»: considerando, no fundo, que não há nenhuma razão atendível para a Recorrida ter assumido obrigações que não advinham do acordo inicial. E se há algo em que podemos assentar com veemente certeza depois da discussão que se desenvolveu a este respeito em torno do vetusto artigo 26.º do Código das Contribuição Industrial é que o conceito da «indispensabilidade» não deriva do da «razoabilidade» [para uma análise histórica deste tema, ver Tomás Tavares, in «Da relação de dependência parcial entre a contabilidade e o direito fiscal…», Ciência e Técnica Fiscal n.º 396, out/dez 1999, pág. 130].

É chegada a altura de dizer que a jurisprudência estabilizou há já algum tempo na assunção de uma interpretação mais lata do termo «indispensabilidade», como deriva do acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal de 27 de junho de 2018 (processo n.º 01402/17), segundo o qual «[o] conceito de indispensabilidade dos custos, a que se reporta o artigo 23.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas refere-se aos custos incorridos no interesse da empresa ou suportado no âmbito das atividades decorrentes ao seu escopo societário». E mais impressivamente da seguinte passagem: «Só quando os custos resultarem de decisões que não preencham tais requisitos, nomeadamente quando não apresentem qualquer afinidade com a atividade da sociedade, é que deverão ser desconsiderados».

Ora, os custos com indemnizações pela rescisão de contratos-promessa de compra e venda de imóveis que o sujeito passivo prometeu vender cabem sem dificuldade nos custos em que incorre ou pode incorrer quem se dedique à atividade de compra e venda de bens imobiliários, precisamente a atividade em que se encontra coletada a Recorrida e que reconhecidamente exerceu no período em causa. É inclusive um gasto em que pode incorrer quem quer que se dedique a essa atividade com um escopo lucrativo e aceite, para o efeito, os riscos normais do incumprimento ou de impossibilidade do cumprimento no âmbito dos contratos-promessa de compra e venda em que intervenha, quer como vendedor, quer como comprador. São, por isso, «indispensáveis», no sentido de que estão inelutavelmente associados a quem, no exercício dessa atividade, tenha que assumir os correspondentes riscos contratuais.

No caso, porém, eram indispensáveis também por outra razão: é que também ficou provado nos autos que o valor global dos fundos que a Impugnante (ora Recorrida) tinha assegurado com a promessa de venda dos lotes (que constituíam o objeto daqueles contratos-promessa) quer pela celebração do contrato de financiamento com um Banco «não era suficiente para garantir a aquisição do imóvel» a lotear «e suportar todos os encargos inerentes ao empreendimento projetado» [alínea “EE)” dos factos provados]. A proposta da “Fundo ……….. II” constituía, por isso, uma resposta a esse problema, mas era uma resposta que só poderia concretizar-se se não existisse «qualquer compromisso entre a Impugnante e terceiros para a venda de quaisquer lotes» [alínea “II)” dos factos provados].

O que significa que a Recorrida precisava de concretizar aquele negócio mas precisava para isso de se desvincular previamente de contratos anteriores. O que, embora não esteja totalmente esclarecido nos autos, poderá ter determinado ou contribuído para inflacionar as contrapartidas exigidas pelos promitentes compradores. A esta luz, pode até dizer-se que o custo em causa não tem conexão apenas com a atividade da empresa, sendo notória uma conexão mais direta e estreita com os proveitos decorrentes da ulterior operação de venda do imóvel.

Pelo que o recurso não pode deixar de improceder nesta parte.

4.2. Prossegue a Recorrente alegando que, quanto às entidades “C…………” e “D…….. Limited”, nem sequer houve prova dos valores contratados como sinal e princípio de pagamento e nem, quanto a estas entidades, estava contratada qualquer indemnização em caso de incumprimento do promitente vendedor (artigo 37.º das doutas alegações do recurso e 14.ª conclusão).

E que tais entidades mantinham relações especiais uma vez que o administrador da sociedade mãe irlandesa era também administrador da “D………..Limited” e “C………….” era acionista da sociedade mãe (artigo 38.º das doutas alegações do recurso e 15.ª conclusão) e eram diferentes as condições contratadas com estas entidades das que foram contratadas com as restantes (artigo 39.º das doutas alegações do recurso e 16.ª conclusão).

A este respeito, importa dizer que, se a primeira destas razões para a não aceitação do custo consta da decisão impugnada, a segunda não. Embora o relatório tivesse assinalado as relações que os referidos sujeitos mantinham com ambas as entidades, não extraiu daí consequências relevantes, nomeadamente quanto ao estabelecimento de condições diferentes daquelas que teriam sido contratadas em condições de plena concorrência. Aliás, mesmo quando assinalou a «anormalidade» dos valores acordados para a rescisão contratual, não o fez contrapondo os acordados com estas entidades aos acordados com os demais promitentes-compradores. Pelo contrário, generalizou a crítica. Qualificou como anormais os valores acordados com todos os promitentes compradores para a rescisão. O que significa que o problema nunca esteve no facto de os dois promitentes compradores com sede na Irlanda serem entidades relacionadas com a Recorrida, mas nos valores avultados de indemnização que todas as entidades conseguiram extrair do acordo de rescisão. Quer as que tinham relações próximas aparentes, quer as que as não tinham.

Ora, não tendo a existência de relações especiais constituído fundamento das correções em causa, também não pode constituir fundamento do recurso. Porque não pode a Recorrente contrapor à sentença recorrida uma fundamentação do ato que não constava dos seus fundamentos.

Estamos, por isso, reconduzidos à falta de documentação do custo. Em boa verdade, porém, não é de falta de documentação do custo que se trata. No relatório de inspeção tributária não se põe em causa que a Recorrida tenha pago os valores acordados de rescisão. O que se põe em causa é que esses valores possam ser justificados com valores que não foram comprovadamente adiantados a título de sinal ou de princípio de pagamento.

Está bem de ver que esta questão é ainda a questão da «indispensabilidade» do custo que já analisamos no ponto anterior. No fundo, a Recorrente não se conforma com o facto de ter sido aceite como custo uma quantia que a Recorrida não estava, comprovadamente, obrigada a suportar a título de indemnização pela rescisão do contrato. Porque, se não se prova a entrega do valor do sinal (ou de parte dele), também não se comprova o dever de indemnizar em montante equivalente.

Nada de novo, por isso, que justifique nova abordagem do tema. Ao tribunal de recurso resta remeter para o que acima foi dito a respeito da associação do conceito de «indispensabilidade» ao de «obrigatoriedade». E de rematar agora dizendo que o recurso também deve improceder nesta parte, pelas mesmas razões.

4.3. A terceira parte do recurso relaciona-se com os custos com «serviços de gestão» cobrados à sociedade mãe e por esta imputados à Recorrida, no montante de € 1.633.500,00, que os contabilizou na conta 622369 («Fornecimentos e serviços externos – Trabalhos especializados - Outras»).

Conclui a Recorrente, a este respeito, que o documento de suporte, não obstante revestir a forma de fatura, não revela o que foi transmitido/prestado (25.ª conclusão) e não respeita, por isso, as exigências formais que derivam do artigo 23.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas.

Deve começar por se assinalar que se, por um lado, a Recorrente não contesta que o documento comprovativo daquele custo revestia a forma de fatura, por outro lado, a sentença recorrida assume que nesse documento não vem especificado o tipo de serviços prestados. Observação que se julga pertinente fazer porque, apesar de todos os esforços despendidos, o tribunal de recurso não conseguiu localizar nos autos ou no processo administrativo a dita fatura nem documento que a reproduzisse.

Sobre esta matéria, alegou a Recorrida, no artigo 144.º da douta petição inicial que se tratava da fatura n.º 2, emitida em 31-12-2007 pela empresa mãe “A’……… Limited”, com o descritivo «Management Services provided to Portugueses branch» (o que, em tradução mais ou menos livre, convertemos agora para «serviços de gestão prestados à filial/sucursal portuguesa»). Mas este facto não ficou consignado nos autos como deriva das alíneas “WW” e “YY” dos factos provados. Pelo que nos vemos agora impedidos de assumir que o descritivo da fatura inclua sequer uma referência a «serviços de gestão».

À questão de saber se constitui exigência da lei a descrição do tipo de serviços prestado respondemos que constitui exigência da lei a descrição dos elementos necessários à justificação do respetivo lançamento contabilístico.

Com efeito, deriva do artigo 23.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas que o custo deve estar documentado e que esse documento deve ser adequado a comprovar o lançamento contabilístico da despesa [isto é, a constituir um «documento justificativo» nos termos e para os efeitos do artigo 115.º, n.º 3, alínea a) do Código], o que pressuporá a indicação de elementos de que dependa a identificação da operação subjacente.

O que significa que se deve dar razão à Recorrente quando refere que o documento de suporte deve identificar as principais características das operações.

No caso, e estando em causa uma despesa enquadrada na conta 62 do P.O.C. («fornecimentos e serviços externos») entendemos que o grau de concretização exigível será o necessário a incluir a despesa numa das suas subcontas. O que passaria pela especificação do tipo de serviços técnicos faturados (a que permitisse o seu enquadramento na conta «trabalhos especializados» e não, por exemplo, na de «publicidade e propaganda», de «honorários», de «comissões» ou outras).

O que significa que também se deve dar razão à Recorrente quando sugere que a identificação das principais características das operações passaria no caso pela indicação do tipo de serviços prestados. E, como vimos, não é possível concluir que a fatura em causa satisfaça tal requisito, porque não foi possível sequer confirmar que o descritivo da fatura incluísse uma referência a «serviços de gestão».

Só que do facto de a fatura não conter todos os elementos necessários à justificação do custo não deriva que o encargo não se encontre devidamente documentado para os efeitos do artigo 42.º, n.º 1, alínea g) do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas. E que, por conseguinte, o respetivo custo não seja dedutível. Não será assim, designadamente, quando existirem outros documentos que, em conjugação com o primeiro, concorram para a justificação da operação contabilística em causa.

O que sucede porque a fatura não é o único documento adequado a justificar a operação em IRC. Se em IVA a fatura é o documento substancial pelo qual se constitui ou forma um título de crédito com a incorporação do direito (credito do imposto) no documento e se dispensa a demonstração da relação jurídica subjacente, em IRC a fatura é um documento probatório, destinado a reproduzir o negócio jurídico e a «constituir um eficaz instrumento de controlo, um instrumento de prova que aqui se valora especialmente por constituir um documento emitido, em regra, pelo vendedor do bem ou prestador do serviço e traduzir, a esse nível, uma “confissão escrita”» (cit. Tomás Tavares (ob. e loc. citados, págs. 123 e seguintes).

Resulta do relatório de inspeção tributária que a fiscalização começou por apontar ao sujeito passivo o facto de os custos suportados pela empresa mãe serem semelhantes aos incorridos pela sucursal em Portugal e que tal constituiria uma duplicação de custos, dirigida à obtenção de uma economia de imposto a pagar pela sucursal. E o que daqui retiramos é que a fiscalização começou por não se deparar com dificuldades na identificação e no enquadramento do custo, porque só pode encarar a sua duplicação quem se encontra em poder dos elementos necessários a conhecer a sua justificação.

Foi quando o sujeito passivo exibiu, em audição prévia, cópias das faturas emitidas pela entidade irlandesa “E………. Limited” à emitente da fatura em causa (a empresa mãe) que a fiscalização derivou para a falta de discriminação, por tipo de serviços prestado, do custo que lhe está associado e apontou a falta de junção de cópia do contrato de prestação de serviços. Ou seja, foi quando a o sujeito passivo exibiu documentos adicionais dirigidos a justificar o custo que a administração contrapôs as insuficiências do descritivo da fatura em causa. E sem, aparentemente, analisar criticamente a informação contida naqueles outros documentos.

Sendo que, pelo menos por essa altura, a fiscalização já sabia que a fatura em causa tinha a ver com «serviços de apoio à gestão» (como vem referido de fls. 25 a fls. 26 do relatório). E que, por conseguinte, as insuficiências de que padecia a fatura de suporte ao lançamento contabilístico tinham sido superadas com o recurso a documentos justificativos adicionais.

Também foi nessa altura que a fiscalização assinalou a falta de junção de cópia do contrato de prestação de serviços celebrado entre essas entidades. Ainda assim, sem explicar porque é que necessitava de mais esse documento e, sobretudo, sem convocar o sujeito passivo para o juntar, uma vez que efetuou de imediato as correções.

Documento que o sujeito passivo se apressou a juntar ainda em sede de reclamação graciosa (como constatamos por análise do processo administrativo em apenso – doc. 10) clamando que nele se encontra plasmada a descrição e a natureza dos serviços (cfr. o artigo 165.º do recurso hierárquico).

E, neste enquadramento, já se tem muito dificuldade em perceber porque é que a Recorrente continua a invocar as exigências formais em sede de comprovação de custos, bem como a necessidade de controlo das relações económicas e do combate à evasão fiscal. Porque as deficiências de que padecesse o documento de suporte não foram de molde a obstaculizar a confirmação a sua natureza e origem e a assegurar a tarefa de verificar a sua justificação material e, nessa medida, obviar à eventual fuga do sistema fiscal que lhe pudesse estar subjacente.

Poderá, no entanto, a Recorrente pretender dizer que a existência de «relações especiais» entre a fornecedora e a empresa mãe suportava uma exigência adicional de documentação do custo e, por conseguinte, a rejeição dos custos insuficientemente fundamentados em situações em que o risco de evasão fiscal fosse objetivamente mais elevado.

Parece ser isso que sugere o artigo 51.º das doutas alegações de recurso, onde a Recorrente assinala que o administrador da sociedade irlandesa “E……….” é o mesmo administrador da Impugnante, e que se torna «ainda mais essencial, se assim se poderá dizer, a exigência formal não cumprida».

A ser correta esta interpretação, deve contrapor-se desde já que não a acompanhamos. Fundamentalmente, porque não existe norma de suporte a tal exigência. E as necessidades de combate à evasão fiscal que agravem os deveres de documentação do sujeito passivo carecem de respaldo legal, até porque interferem com as regras legais de distribuição o ónus probatório.

Por outro lado, as relações especiais colocam normalmente problemas que não se localizam no plano da existência do custo, mas no plano da relação entre um custo cuja existência não se contesta e o custo normal ou aquele que seria suportado em condições de sã concorrência. E que são objeto de um tratamento bem distinto no Código (cfr. o artigo 58.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas).

Como decorre do decidido no acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal de 27 de junho de 2018 (processo n.º 01402/17), as questões de existência e de indispensabilidade do custo e as questões de transferência de custos operam em planos distintos. As primeiras são transversais e as normas respetivas operam sobre as condições gerais de dedutibilidade. As segundas são excecionais, operam em situações patológicas e regulam as situações de abuso de dedutibilidade.

Pelo que o recurso também não merece provimento nesta parte.

4.4. A quarta e última parte do recurso respeita à liquidação dos juros compensatórios.

Na douta sentença recorrida considerou-se que a demonstração da liquidação dos juros compensatórios que reproduz na alínea “E” dos factos provados não continha «qualquer indicação dos factos que fundamentam a atuação culposa do contribuinte, nem tal fundamentação se encontrava prevista no relatório de inspeção». Razão pela qual essa liquidação se deveria considerar insuficientemente fundamentada.

A Recorrente não se conforma com o assim decidido por entender que o documento observa as exigências de fundamentação impostas pelo artigo 35.º, n.º 9, da Lei Geral Tributária.

É sabido que «as exigências de fundamentação variam conforme as circunstâncias concretas, designadamente o tipo de ato, a não participação do interessado no procedimento anterior ao ato ou, no caso da participação, a extensão desta» (acórdão deste tribunal de 30 de novembro de 2011, Processo n.º 619/11).

Integrando-se os juros compensatórios na própria dívida do imposto, alguns dos seus fundamentos podem sobrepor-se aos fundamentos da liquidação do imposto. O que sucederá, em regra, quando estejam em causa atos ou omissões de que derive o atraso na liquidação do imposto devido ou de parte dele, em que o comportamento ilícito e culposo do contribuinte se encontra descrito no próprio relatório de inspeção tributária.

É por isso, a nosso ver, que o n.º 9 do artigo 35.º da Lei Geral Tributária dispõe que a liquidação deve sempre evidenciar claramente o montante principal da prestação e os juros compensatórios, explicando com clareza o respetivo cálculo e distinguindo-os das outras disposições devidas. Dispositivo que deve ser interpretado como a exigência do conteúdo mínimo de fundamentação que devem conter mesmo os atos cuja fundamentação possa ser colhida parcialmente a partir dos fundamentos que suportam a liquidação do imposto.

Ora, o relatório de inspeção tributária contém, mesmo na parte não anulada, a descrição dos factos imputados ao sujeito passivo e que suportaram as correções e que conduziram ao retardamento da liquidação, bem como a sua qualificação como um comportamento ilícito, não faltando sequer a referência ao seu enquadramento legal como um ilícito contraordenacional. Pelo que não se consegue acompanhar a sentença recorrida quando conclui que os factos que fundamentam a atuação culposa do contribuinte não se retiram do relatório de inspeção.

Por outro lado, os autos evidenciam eloquentemente uma estreita participação do sujeito passivo ou dos seus representantes no procedimento que precedeu a liquidação. Que, por isso, não podia desconhecer a situação fática violadora da lei que justifica tanto a liquidação do imposto como a dos juros compensatórios.

Razão porque se entende que a Recorrente tem razão nesta parte e deve ser revogada a decisão recorrida na parte referente aos juros compensatórios.



5. Conclusões

I. Para os efeitos do disposto no artigo 23.º, n.º 1, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, na sua redação inicial, são, em princípio, de considerar indispensáveis para a realização e proveitos ou ganhos do sujeito passivo que se dedique à atividade de compra e venda de bens imobiliários os encargos que tenha suportado como promitente vendedor com indemnizações pela rescisão de contratos-promessa de compra e venda de imóveis;

II. Do facto de a fatura não conter todos os elementos necessários à justificação do custo não deriva que o encargo não se encontre devidamente documentado para os efeitos do artigo 42.º, n.º 1, alínea g) do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, se existirem e forem exibidos outros documentos que concorram para a justificação da operação contabilística em causa.


III. Não padece de falta de fundamentação a liquidação dos juros compensatórios que não contenha a indicação dos factos que integram o comportamento ilícito e culposo do contribuinte, se esses factos se encontram descritos no próprio relatório de inspeção tributária que contenha a fundamentação da liquidação do imposto correspondente.


6. Decisão

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes da Secção Tributária deste Tribunal em
a) Conceder parcial provimento ao recurso;
b) Revogar a decisão recorrida na parte em que anulou a liquidação dos juros compensatórios correspondentes à parte não anulada da liquidação do imposto;
c) No mais, manter a decisão recorrida.

Custas nesta instância na proporção de 75% pela Recorrente. e 25% pela Recorrida.

Mantêm-se os pressupostos enunciados na douta sentença e que conduziram à dispensa do pagamento do remanescente de taxa de justiça em primeira instância e que aqui se dão por reproduzidos. Razão porque, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 7 do Regulamento das Custas, se decide também dispensar o pagamento do remanescente da taxa de justiça que seria devido nesta instância.

Registe e notifique.

Lisboa, 21 de novembro de 2019. – Nuno Bastos (relator) - Ascensão Lopes – José Gomes Correia.