Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0883/14
Data do Acordão:06/21/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:PLURALIDADE DE EXECUÇÕES
OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO
ABSOLVIÇÃO DA INSTÂNCIA
Sumário:I- A dedução de uma única oposição a diversas execuções fiscais que não estão apensadas constitui excepção dilatória inominada que obsta ao conhecimento do mérito daquela (art. 493º do CPC).
II- Considerando-se que a AT, apesar de não ter havido um acto expresso e formal do OEF a determinar a apensação das execuções em causa, procedeu à tramitação conjunta e à citação do recorrente para todos os processos executivos, através de um único acto de citação e englobando, aliás, a totalidade da dívida em execução, objecto dessas execuções, estas devem ter-se como apensadas de facto, pois que o dito acto de citação único é assimilador de todas as demais citações e exterioriza para um declaratário normal, pelo menos, uma apensação implícita das execuções ali contempladas.
Nº Convencional:JSTA00070245
Nº do Documento:SA2201706210883
Data de Entrada:07/11/2014
Recorrente:A...................
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF PENAFIEL
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL.
Legislação Nacional:CPC13 ART620 ART621 ART595 N3 ART576 ART577 ART279 N2 ART590 ART560.
CPPTRIB99 ART179 ART151.
LGT98 ART103 N1.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC026033 DE 2001/06/20.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

RELATÓRIO
1.1. A……………, com os sinais dos autos, recorre da sentença do TAF de Penafiel, de 11/03/2014, que julgou verificada a excepção da cumulação ilegal de execuções no âmbito da oposição que deduziu, na qualidade de responsável subsidiário, às execuções fiscais n° 3565200901037358 e n° 3190200901045440, este com os apensos n° 3565200901046403, n° 3565200901065009, n° 3565201001031511, n° 3565201001033263 e n° 3565201001041746, a correrem termos no Serviço de Finanças de Valongo-2, em que é executada originária a sociedade B…………, Lda., NIPC……………., instaurados para cobrança coerciva de dívidas provenientes de IVA devido pelos períodos de tributação relativos aos 1° a 4° trimestre de 2006, 2° a 4° trimestre de 2007, 1° a 4° trimestre de 2008, 2° trimestre de 2009, de IRC de 2009 e de coimas tributárias, no valor global de 103.192,68 Euros (€ 7.102,53 de IVA do 4° trimestre de 2008 em cobrança no processo de execução fiscal n° 3565200901037358 e € 96.090,15 no processo de execução fiscal n° 3190200901045440 e aps., e absolveu a Fazenda Pública da instância, nos termos dos artigos 288°, n° 1, alínea e), 493°, n.°s 1 e 2 e 495°, todos do anterior CPC, aplicável por força do disposto no art. 2°, alínea e), do CPPT.

1.2. Nas alegações que apresentou a fls. 296/300, formulou conclusões, as quais, após promoção do MP, vieram a ser reformuladas e completadas a fls. 348/351, nos termos seguintes:
- Em primeiro lugar o tribunal “a quo” dá como provados factos que entende fundamentarem a decisão recorrida quando, a verdade é que tais factos e a sua sequência apenas dão razão ao recorrente e, mais grave, não têm em consideração a sentença datada de 18/10/2013, violando grosseiramente uma decisão transitada em julgado.
Vejamos:
1º - O oponente foi citado para a sua morada na Bélgica em 29/05/2013, conforme documento, composto por 17 páginas (original da citação exatamente como foi recebida), que se juntou como n° 1.
2° - Como se pode verificar na citação a Autoridade Tributária, na página n° 4 (nossa numeração) começa logo por indicar o montante total dos processos (126.810,89 euros), montante que engloba todos os processos constantes da oposição e que agora a AT afirma não poderem ser cumulados.
3º - Se atentarmos no texto da citação, na página 5, a meio da página é referido que o revertido pode “Apresentar uma impugnação judicial… ”, ou seja, a AT admite que o revertido pode apresentar uma só impugnação judicial, uma só defesa.
4° - Na mesma página, no último parágrafo, a AT fala de um só crédito, pelo que, tal determina uma só defesa.
5º - Na página 7 da citação (nossa numeração) consta o número de todos os processos executivos que foram objeto da petição inicial de oposição. Como se pode ver, logo como primeiro da lista aparece o processo que agora a AT diz não poder ser cumulado.
6º - Como se pode verificar na página 7 da citação, ao contrário da posição defendida pela AT, que agora vem dizer que não se podem cumular execuções que versem sobre impostos diferentes, como se pode verificar foi a própria AT que incluiu junto com o processo dito principal (3565200901045440) processo com origem em IRC, os processos apensos, compostos por execuções com origem em IVA, Coimas e IRC.
7º- E, mais uma vez, na página 7 a AT trata a soma de todos os valores como um só crédito.
8° - Novamente na página 8 da citação a AT volta a referir a hipótese do executado poder pagar a quantia exequenda no valor de 126.810,89 euros, ou seja, a totalidade de todos os processos e, referindo-se ainda à totalidade de todos os processos diz ainda que o executado pode deduzir oposição judicial.
9° - Por outro lado, na página 10 (nossa numeração), a certidão de dívidas é só uma para todos os processos.
10° - Datado de 09/08/2013 foi recebido um despacho que admite que a AT, por lapso, não associou a oposição a todos os processos, pelo que a AT iria corrigir o erro, conforme se alcança pelo documento que se junta sob o n° 2.
11º - Por despacho datado de 20/09/2013, a AT corrigiu e admitiu a petição inicial, admitindo a cumulação de todos os processos, conforme documento que se junta sob o n° 3.
Em conclusão, para além da relevância do trânsito em julgado da sentença datada de 18/10/2013, como supra se demonstra, a própria Autoridade Tributária assume comportamentos e elabora despachos aceitando a cumulação de processos.
Assim, como se pode concluir foi a própria autoridade tributária que fez a “apensação” dos processos e, mais grave, como se pode concluir pela consulta à sentença notificada a 18/10/2013, o próprio Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel decide dar razão à reclamação apresentada e decide aceitar a petição de oposição apresentada e, tal sentença transitou em julgado.
Em segundo lugar, ao contrário do que a sentença recorrida pretende defender, esta viola o disposto no art. 37°, n° 2 do novo CPC, porquanto, como ficou demonstrado, para além de quem deu causa ter sido a própria AT, conclui-se que aos pedidos não correspondem formas de processo diferentes, nem a cumulação ofende regras de competência sejam elas quais forem e, principalmente, porque este dispositivo prevê que o juiz pode autorizar a cumulação, o que fez na primeira sentença com trânsito em julgado e que agora viola grosseiramente o disposto no art. 666°, n° 1 do anterior CPC (agora 613° CPC novo), que dispõe que proferida a sentença, fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional do juiz quanto à matéria da decisão proferida, viola o disposto no art. 671º do anterior CPC (agora 619° CPC), que dispõe que transitada em julgado a sentença, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo.
A fundamentar temos o seguinte:
1° - Pasme-se, após o trânsito em julgado de tal sentença, é recebida a notificação da contestação que pugna pela existência de uma excepção dilatória inominada, conforme se alcança pela consulta do documento que se junta sob o n° 6.
2° - No entanto, no ponto 11 da dita contestação é referido que “... nos processos de execução fiscal em causa mostram-se feitas apensações segundo a identidade da natureza dos tributos...”, nada mais falso, basta consultar a citação para vermos que tal não corresponde à verdade.
3º - Por outro lado, no ponto 14 da mesma contestação, argumenta-se com uma nulidade nos termos do disposto no art. 186°, n° 1 e 2, al. c) do CPC. Ora, aqui temos duas “conclusões a tirar, a primeira é que, analisando a alínea c) do referido artigo não vislumbramos que se estejam a cumular causas de pedir ou pedidos substancialmente incompatíveis mas, a entender-se que se verifica essa incompatibilidade então tal responsabilidade é única e exclusiva dos serviços da Autoridade Tributária e tal só poderá conduzir à invalidade de todos os processos e, em consequência à repetição das citações.
4º - Aliás, a contestação termina, estranhamente, por se fundamentar nas “... Disposições conjugadas dos arts. 576°, n° 2, e 494°, al. b), do CPC ...”, ou seja, disposições conjugadas de dois códigos diferentes (???).
- Em terceiro lugar, verifica-se a violação do art. 37°, n° 3 do CPC, isto porque, incumbe ao juiz adaptar o processo à cumulação autorizada através da dita sentença transitada em julgado, com acima se demonstrou.
- Em quarto lugar, viola o disposto no nº 4 do art. 37° do CPC, isto porque, se o tribunal entender que há inconveniente grave em que as execuções sejam instruídas, discutidas e julgadas conjuntamente, determina a notificação do autor para indicar qual o pedido ou pedidos que continuam a ser apreciados no processo, o que não foi feito.
- Em quinto lugar, viola o disposto no art. 179º do CPPT, tendo em consideração o teor da citação e o teor da sentença transitada em julgado, verifica-se que não estamos perante qualquer excepção dilatória dado que existem diferentes artigos que pugnam por soluções que promovem a economia processual e o aproveitamento do processado.
- Em sexto lugar, demonstrativo do desnorte desta decisão de que agora se recorre é que, ao longo dos vários despachos e duas sentenças, tanto se fundamenta com artigos do anterior Código de Processo Civil como se fundamenta com disposições do novo Código de Processo Civil. Assim, a decisão ora recorrida, ao julgar verificada a exceção da cumulação ilegal de execuções “... nos termos dos artigos 288°, n° 1, alínea e), 493º, n.ºs 1 e 2 e 495°, todos do anterior CPC …”, viola o disposto no art. 179º do CPPT, pois, não pode quem deu causa sair beneficiado de todo o imbróglio criado, isto porque a cumulação foi admitida por decisão transitada em julgado e foi efetuada pela AT.
Termina pedindo que a sentença recorrida seja revogada e, consequentemente, seja admitida a oposição, seguindo-se os demais termos até final.

1.3. Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4. O MP emitiu o seguinte Parecer:
«O recorrente acima identificado vem sindicar a sentença do Tribunal Fiscal e Administrativo de Penafiel, exarada a fls. 272/275, em 11 de Março de 2014.
A sentença recorrida julgou verificada a excepção dilatória inominada de cumulação ilegal de oposições e absolveu a Fazenda Pública da instância.
O recorrente termina as suas alegações com as conclusões de fls. 299/300, que, como é sabido, salvo questões de conhecimento oficioso e desde que dos autos constem todos os elementos necessários à sua integração, delimitam o objecto do recurso, nos termos do estatuído nos artigos 635°/4 e 639°/1 do CPC, e que aqui se dão por inteiramente reproduzidas.
A nosso ver o recurso merece provimento.
Sustenta o recorrente nas suas conclusões que por sentença de 18 de Outubro de 2013, transitada, o Tribunal recorrido já havia admitido a cumulação de oposições.
Tal conclusão, em nosso entendimento, não é correcta.
De facto, como resulta da decisão que faz fls. 203/205 dos autos o recorrente reclamou do despacho da secretaria que recusou a petição por, alegadamente, não ter sido paga a taxa de justiça, omitir a identificação das partes e não indicar o valor da causa.
Tal reclamação foi julgada procedente.
E certo que, na dita decisão, transitada em julgado, se refere, de forma genérica, que “Não existem excepções ou outras questões que obstem à apreciação do mérito da causa”.
Todavia, salvo melhor juízo, tal despacho tabular, pré-formatado, não faz caso julgado formal quanto à inexistência de excepções, nomeadamente, a excepção dilatória inominada de cumulação ilegal de oposições (artigos 620° e 621° do CPC).
Na verdade, para que se verificasse caso julgado formal necessário se tomava que o tribunal apreciasse, expressamente, a eventualmente arguida concreta questão da cumulação ilegal de oposições, como resulta do disposto no artigo 595°/3 do CPC. (Neste sentido, entre outros, acórdãos do STJ, de 27 de Novembro de 1991-PLENO- proferido no recurso n° 002964 e de 10 de Novembro de 1993, proferido no recurso n° 083823, disponíveis o sítio da Internet www.dgsi.pt).
Ora, como se disse o Tribunal recorrido não apreciou, em concreto, a excepção dilatória inominada de cumulação ilegal de oposições.
Inexiste, pois, decisão judicial transitada a admitir a cumulação de execuções.
Incumbe ao OEF e não ao Tribunal Tributário a apensação das execuções, nos termos do estatuído no artigo 179°/1 do CPPT.
Embora tenha uma tramitação processual autónoma, a oposição à execução fiscal funciona como uma contestação, pelo que aquele que foi citado em várias execuções, que não se encontram apensadas, não pode deduzir uma única oposição, ainda que os fundamentos sejam os mesmos, sob pena de ocorrer uma excepção dilatória inominada, de conhecimento oficioso, de cumulação ilegal de oposições.
A verificação de tal excepção determina, necessariamente, a absolvição da instância da Fazenda Pública, nos termos do estatuído nos artigos 576° e 577° do CPC (artigos 493°/1 e 494° do revogado CPC), ex vi do artigo 2°/e) do CPPT.
Acentue-se que com esta solução jurídica não fica o recorrente desprotegido na defesa dos seus direitos/interesses, uma vez que se sempre poderá prevalecer-se do estatuído no artigo 279°/2 ou 590° e 560° do CPC (artigos 289°/2 e 234°-A e 476° do CPC), no caso de absolvição da instância ou indeferimento liminar, respectivamente.
Antes da absolvição da instância não há que notificar o oponente para indicar qual o pedido que pretende que continue a ser apreciado (numa situação paralela à referida nos artigos 37°/4/5 e 38°/1/3 do CPC (artigos 31º e 31°-A do revogado CPC).
Com efeito, se essa solução tem a vantagem de aproveitar a PI como oposição dirigida a uma das execuções tem o claro inconveniente de deixar o oponente desprotegido quanto às restantes.
Também não haverá que aplicar o regime do artigo 4°/3 do CPTA, pois que a situação em apreço é de cumulação ilegal de oposições e não de pedidos, sendo ainda certo que o artigo 2° do CPPT elege como critério para determinar a ordem na aplicação da legislação subsidiária a natureza do caso omissão, pelo que quanto à execução fiscal há que dar prioridade ao CPC.
A sentença recorrida deu por provado que o PEF 35652200901037358 não se encontra apensado ao PEF 3190200901065009 e apensos e daí que tenha absolvida a Fazenda Pública da instância.
Nas suas alegações, o recorrente, além do mais, vem sustentar que, de facto, a Administração Tributária vem tramitando todas execuções, como se estivessem apensadas, tanto assim que, fazendo referência aos documentos que fazem fls. 245/267 juntos com o requerimento de fls. 243/44, não impugnados pela Fazenda Pública, refere que foi citado para todas as execuções, através do mesmo acto de citação, pois que de tal documento consta o montante exequendo de € 126.810,89 que, sem dúvida, engloba o montante exequendo em cobrança coerciva no PEF 35652200901037358.
Como é sabido se o recurso tiver por fundamento, também, matéria de facto o STA deixa de ter competência para apreciação do mesmo, embora seja certo que deve tomar conhecimento dos actos processuais e emitir juízos sobre eles, pois são actos do próprio tribunal ou praticados perante ele (acórdão do STA, de 20 de Junho de 2001, proferido no recurso n° 026033, cujo sumário e encontra disponível no sítio da Internet www.dgsi.pt)
Assim sendo parece que o STA deve apreciar a factualidade invocada pelo recorrente e constante de peça junta aos autos, não obstante não ter sido apreciada pela sentença recorrida.
Ora, se o PEF 3565200901037358 não está apensado aos PEF 3190200901045440 e apensos impunha-se, necessariamente, que fosse feita uma citação para cada um desses processos.
A verdade é que, como sustenta o recorrente, e resulta, incontestavelmente, da peça junta aos autos, o AT procedeu à citação do recorrente para todos os processos executivos, através de um único acto de citação, somando os montantes em dívida em todas as execuções fiscais.
Logo, embora não tenha havido um acto expresso de apensação das execuções, a verdade é que a citação conjunta para todas as citações exterioriza, para um declaratário normal, pelo menos, uma apensação implícita das execuções.
Na verdade, nos termos da citação feita ao recorrente, conforme documento junto a fls. 303, aquele só poderia, como fez, apresentar uma única oposição para todas as execuções.
Perante o circunstancialismo referido afigura-se abusivo considerar que ocorre cumulação ilegal de oposições, com consequente absolvição da instância da Fazenda Pública, obrigando o recorrente a deduzir duas novas oposições, nos termos do disposto no artigo 279° do CPC.
A sentença recorrida merece, assim, censura.
Termos em que deve dar-se provimento ao presente recurso e revogar-se a sentença recorrida, baixando os autos à 1ª instância para prosseguirem seus termos.»

1.5. Corridos os vistos legais, cabe decidir.

FUNDAMENTOS
2. A matéria de facto dada como assente na 1ª instância foi a que segue:
1º - A presente oposição foi deduzida pelo ora oponente na qualidade de responsável subsidiário às execuções fiscais nº 3565200901037358 e nº 3190200901045440, este com os apensos n° 3565200901046403, nº 3565201001031511, n° 3565201001033263 e n° 3565201001041746, a correr termos no serviço de finanças de Valongo-2, em que é executada originária a sociedade B…………, Lda., NIPC:…………., instaurados para cobrança coerciva de dívidas provenientes de IVA devido pelos períodos de tributação relativos aos 1° a 4° trimestre de 2006, 2° a 4° trimestre de 2007, 1° a 4° trimestre de 2008, 2° trimestre de 2009, de IRC de 2009 e de coimas tributárias, no valor global de € 103.192,68 (€ 7.102,53 de IVA do 4° trimestre de 2008 em cobrança no processo de execução fiscal n° 3565200901037358 e € 96.090,15 no processo de execução fiscal nº 3190200901045440 e aps. - cf. resulta dos autos, nomeadamente da informação do órgão de execução fiscal a fls. 177 dos autos.

3.1. A decisão recorrida, entendendo que o oponente deduz oposição contra duas execuções fiscais não apensadas pelo OEF, julgou verificada a excepção dilatória inominada de cumulação ilegal de pedidos (oposições), nos termos do disposto no actual art. 555º, nº 1 do CPC (anterior art. 470º, nº 1) e absolveu a Fazenda Pública da instância.
Para tanto, considera, no essencial, e apelando ao disposto no art. 179° do CPPT, que só é viável a apensação de execuções que corram contra o mesmo executado e se encontrem na mesma fase, e embora o processo de execução fiscal assuma a natureza de processo judicial, é ao OEF que incumbe a prática de atos de natureza não jurisdicional na execução, designadamente apensação de execuções fiscais (art. 103°, n°1 da LGT e arts. 1°, n° 1, al. f), 151°, n° 1 e 179°, todos do CPPT), sendo que a oposição deve reportar-se à respectiva execução fiscal e funcionando a oposição como uma espécie de contestação à execução, não pode ser deduzida uma única oposição contra várias execuções que se não encontrem apensadas (ou seja, deverá ser deduzida uma oposição para cada execução ou grupo de execuções).
Mais considera que a cumulação ilegal de oposições ou de pedidos é uma excepção dilatória inominada, que conduz à absolvição da Fazenda Pública da instância, nos termos dos arts. 288°, n° 1, al. e), 493°, n.ºs 1 e 2 e 495°, todos do anterior CPC, ficando, assim, prejudicada a apreciação das demais questões suscitadas.

3.2. O recorrente discorda do assim decidido alegando, desde logo, nas Conclusões 10ª e 11ª, que em anterior decisão proferida em 17/10/2013 (a fls. 203/205) o Tribunal a quo já havia admitido a cumulação de oposições e que, por isso, a sentença ora recorrida ocorre em violação de caso julgado.
Todavia, não é de sufragar tal alegação.
Com efeito, como resulta daquela primeira decisão, trata-se de decisão proferida no seguimento de reclamação apresentada contra a recusa da petição inicial, por parte da secretaria do TAF de Penafiel, por alegadamente não ter sido paga a taxa de justiça correspondente, e por em tal PI se omitir a identificação das partes e não se indicar o valor da causa.
Tal reclamação foi julgada procedente. E não obstante na respectiva decisão se ter inscrito uma Parte intitulada como “II - Saneamento”, na qual, de forma genérica, se exara que “Não existem excepções ou outras questões que obstem à apreciação do mérito da causa”, estamos perante mero despacho saneador tabular e que respeitará apenas à questão do mérito da recusa da PI e que não faz, portanto, caso julgado formal quanto à inexistência de excepções quanto aos pressupostos da acção e quanto ao fundo da causa, nomeadamente, a excepção dilatória inominada de cumulação ilegal de oposições (arts. 620° e 621° do CPC). Como sublinha o MP, para que se verificasse caso julgado formal nesta matéria, necessário se tornava que o tribunal apreciasse, expressamente, a eventualmente arguida concreta questão da cumulação ilegal de oposições, como resulta do disposto no art. 595°/3 do CPC (cfr. neste sentido, entre outros, os acórdãos do STJ - Pleno - de 27/11/1991, no proc. n° 002964 e de 10/11/1993, no proc. n° 083823).

3.3. Nas alegações e nas restantes Conclusões o recorrente sustenta, além do mais, que a AT vem tramitando todas as execuções como se estivessem apensadas, tanto assim que, atentando nos documentos que constituem fls. 245/267 (juntos com o requerimento de fls. 243/44) e não impugnados pela Fazenda Pública, deles se constata que o recorrente foi citado para todas as execuções, através do mesmo acto de citação, pois que de tal documento consta o montante exequendo de 126.810,89 Euros que, sem dúvida, engloba também o montante exequendo em cobrança coerciva no PEF 35652200901037358.
Vejamos.
O recorrente deduz oposição às execuções fiscais nº 3565200901037358 e nº 3190200901045440 (a esta estão apensadas as execuções n° 3565200901046403, nº 3565201001031511, n° 3565201001033263 e n° 3565201001041746) [invocando, no essencial, como fundamento de oposição, quer a responsabilidade do TOC da sociedade devedora originária, quer a sua própria (do oponente) ilegitimidade, por inexistência dos pressupostos de responsabilidade subsidiária, nomeadamente, por não estar provada no despacho de reversão a culpa do oponente na posterior insuficiência do património da sociedade originariamente executada para a satisfação da dívida, nem a falta de pagamento dessa dívida lhe poder ser imputada].
É certo, porém, que sendo legalmente permitida a apensação de processos de execução, nos termos do art. 179º do CPPT (desde que corram contra o mesmo executado e se encontrem na mesma fase), a decisão de apensação se inscreve na competência do órgão da execução fiscal, ao qual compete, não obstante a natureza judicial do processo de execução fiscal (nº 1 do art. 103º da LGT), praticar neste processo os actos de natureza não jurisdicional, designadamente os relativos à apensação de execuções fiscais (arts. 151º e 179º do CPPT), apreciando a conveniência e oportunidade da apensação e devendo fazê-lo se as execuções se encontrarem na mesma fase (nºs. 1 e 2 do art. 179° do CPPT).
Como é, igualmente, certo que a verificação da apontada excepção determina a absolvição da instância da Fazenda Pública (arts. 576° e 577° do CPC, correspondentes aos anteriores arts. 493°/1 e 494°), sendo que, nestes casos, o recorrente não fica desprotegido na defesa dos seus direitos, pois sempre poderá prevalecer-se do disposto no art. 279°/2 ou 590° e 560° do CPC (correspondentes aos anteriores arts. 289°/2 e 234°-A e 476°), no caso de absolvição da instância ou indeferimento liminar, respectivamente.
No caso, como resulta do Probatório, os dois mencionados processos de execução não estão apensados.
Mas, como acima se referiu, o recorrente, sustenta que a AT vem tramitando todas execuções como se, de facto, estivessem apensadas, tanto assim que, atentando nos documentos que constituem fls. 245/267 (juntos com o requerimento de fls. 243/44) e não impugnados pela Fazenda Pública, deles se constata que o recorrente, citado por via do «Formulaire Uniformisé pour la Notification» (dado que tal citação foi operada pelos Serviços da Administração Fiscal da Bélgica, para a morada do recorrente, em Bruxelas), foi citado para todas as execuções, através do mesmo acto de citação, pois que de tal documento consta o montante exequendo de 126.810,89 Euros que, sem dúvida, engloba o montante exequendo em cobrança coerciva no PEF 35652200901037358.
Ora, como bem sublinha o MP, o STA pode tomar conhecimento dos actos processuais e emitir juízos sobre eles, independentemente de não terem sido relevados pela decisão recorrida, pois são actos do próprio tribunal ou praticados perante ele.(Cfr, entre outros, o ac. do STA, de 20/6/2001, proc. n° 026033.)
Considerando, pois, que não estando o PEF 3565200901037358 apensado aos PEF 3190200901045440 e apensos, se impunha, necessariamente, que fosse feita uma citação para cada um desses processos, no caso concreto é de concluir, em concordância com o entendimento sustentado pelo recorrente e pelo MP, que, tendo a AT procedido à citação do recorrente para todos os processos executivos, através de um único acto de citação, somando os montantes em dívida em todas as execuções fiscais, então, apesar de não ter havido um acto expresso e formal do OEF a determinar a apensação das duas execuções em causa, estas se devem ter como apensadas, pois que o dito acto de citação único é assimilador de todas as demais citações e exterioriza para um declaratário normal, pelo menos, uma apensação implícita das execuções ali contempladas.
Daí que, perante os termos da citação feita ao recorrente, conforme decorre do dito documento junto a fls. 303, aquele só poderia, como fez, apresentar uma única oposição para todas as execuções, afigurando-se assim ilegítimo concluir, perante tais circunstâncias, que ocorre cumulação ilegal de oposições, com consequente absolvição da instância da Fazenda Pública e obrigando o recorrente a deduzir duas novas oposições, nos termos do disposto no art. 279° do CPC.
Procedem, portanto, nesta base, as pertinentes Conclusões do recurso.

DECISÃO
Nestes termos, acorda-se em dar provimento ao recurso e, revogando a sentença recorrida, ordenar a baixa do processo ao Tribunal a quo, para prosseguimento da oposição, se a tanto nada mais obstar.
Custas pela recorrida.
Lisboa, 21 de Junho de 2017. – Casimiro Gonçalves (relator) – Isabel Marques da Silva – Pedro Delgado.