Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0255/11
Data do Acordão:09/14/2011
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:FIXAÇÃO DO VALOR PATRIMONIAL
IMPOSTO MUNICIPAL SOBRE IMÓVEIS
AVALIAÇÃO
FUNDAMENTAÇÃO
COEFICIENTE DE LOCALIZAÇÃO
Sumário:1. O dever legal de fundamentação deve responder às necessidades de esclarecimento do destinatário, informando-o do itinerário cognoscitivo e valorativo do respectivo acto e permitindo-lhe conhecer as razões, de facto e de direito que determinaram a sua prática.
2.1. O coeficiente de localização previsto no art. 42º do CIMI é um valor aprovado por Portaria do Ministro das Finanças sob proposta da CNAPU na fixação do qual se têm em consideração, nomeadamente, as características referidas no nº 3 desse normativo legal.
2.2. O zonamento (determinação das zonas homogéneas a que se aplicam os diferentes coeficientes de localização em cada município e as percentagens a que se refere o nº 2 do art. 45º do CIMI) é, igualmente, aprovado por Portaria do Ministro das Finanças sob proposta da CNAPU.
2.3. Os parâmetros Vc (Valor base dos prédios edificados) e Cv (Coeficiente de vetustez) referidos nos arts. 38º e 44º do CIMI como coeficientes que integram a fórmula de cálculo para a determinação do valor patrimonial tributário das espécies de prédios ali mencionados, reconduzem-se a parâmetros legais de fixação, ali também previstos [e o valor médio de construção é determinado de acordo com os critérios constantes do nº 2 do art. 39º e fixado anualmente por Portaria do Ministro das Finanças, sob proposta da CNAPU (arts. 60°, nº 1, al. d) e nº 3, do CIMI)].
2.4. Neste contexto, a fundamentação exigível para a aplicação destes valores apenas se pode circunscrever à identificação geográfica/física dos prédios no concelho e freguesia respectivos, à especificação do coeficiente de localização e dos restantes valores referidos e à invocação do quadro legal que lhes é aplicável.
Nº Convencional:JSTA00067145
Nº do Documento:SA2201109140255
Data de Entrada:03/17/2011
Recorrente:A..., S.A.
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF LEIRIA PER SALTUM
Decisão:PROVIMENTO PARCIAL
Área Temática 1:DIR FISCAL - IMI
Legislação Nacional:CPTA02 ART31 ART32
CPPTRIB99 ART2 ART97-A ART99 ART134 ART108 N2
CPC96 ART306 N1
DL 256-A/77 DE 1977/06/17 ART1 N1 A C
CPA91 ART124 ART125
LGT98 ART77 N1 N2
CONST76 ART268
CIMI03 ART38 ART42 ART62 ART60 ART39 ART43 ART44
PORT 982/2004 DE 2004/08/04 ART2 ART3 ART4
PORT 1426/2004 DE 2004/11/25
PORT 1022/2006 DE 2006/09/20
PORT 1119/2009 DE 2009/09/30 ART1 ART3
CCJ96 ART5 N1 ART73-A
RCPT98 ART5
DL 342/2003 DE 2003/12/27
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC1114/05 DE 2006/02/02; AC STA PROC1486/02 DE 2002/12/11; AC STA PROC600/10 DE 2010/11/30; AC STA PROC382/11 DE 2011/06/22; AC STA PROC307/11 DE 2011/07/06
Referência a Doutrina:GOMES CANOTILHO E OUTRO CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA ANOTADA 1993 PAG936
VIEIRA DE ANDRADE O DEVER DE FUNDAMENTAÇÃO EXPRESSA DOS ACTOS ADMINISTRATIVOS 1990 PAG53
JORGE DE SOUSA CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO 5ED VI PAG784-785
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
RELATÓRIO
1.1. A…, SA, com os demais sinais dos autos, recorre da sentença que, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, julgou improcedente a impugnação judicial que deduziu contra os actos de segunda avaliação dos seus prédios urbanos inscritos na matriz da freguesia de Pedreiras sob o artigo P 2595, PAV 4, PAV 1, PAV 3 e PAV 2 e artigo P 2592 PAV 1, PAV 3 e PAV 2, tendo igualmente fixado o valor da acção em 2.705.650,00€.
1.2. A recorrente termina as alegações formulando as conclusões seguintes:
A) - O valor patrimonial tributário dos prédios não configura a utilidade económica directa, concreta e determinável no processo de impugnação da fixação do valor patrimonial.
B) - A utilidade económica da impugnação das segundas avaliações apenas pode ser aferida em sede de IMI, IRS e IRC.
C) - Contudo, em sede de IMI, de IRS e de IRC, a utilidade económica do valor patrimonial tributário depende de diferentes factores e pressupostos, não sendo por isso, determinável, a referida utilidade económica.
D) - Do exposto resulta que a utilidade económica do presente processo não é de valor certo, pelo que a indicação do valor de € 20.000,00 é legal.
E) - A fórmula de determinação do valor patrimonial tributário prevista no artigo 38° do CIMI, em 2006, tinha a seguinte expressão: Vt = Vc x A x Ca x Cl x Cq x Cv.
F) - O coeficiente de afectação previsto no artigo 41° do CIMI é uniforme e único a nível nacional, apenas alterando em função do fim, conforme assim se encontra descrito na tabela anexa à citada norma.
G) - O que acaba de se referir quanto ao coeficiente de afectação, aplica-se “ipsis verbis” aos coeficientes de qualidade, vetustez e à determinação da área.
H) - Relativamente aos coeficientes de afectação, de qualidade, de vetustez e cálculo de área, nem os peritos das primeiras nem das segundas avaliações têm qualquer poder discricionário.
I) - Aliás, relativamente aos supra indicados coeficientes, nem a própria Comissão Nacional de Avaliação da Propriedade Urbana, tem qualquer poder de decisão ou de alteração.
J) - O mesmo não se verifica com o coeficiente de localização.
L) - Assim, o n ° 1 do artigo 42° do CIMI prevê uma amplitude dos coeficientes de localização que pode variar entre 0,35 e 3.
M) - Por sua vez, o anexo I da Portaria 982/04 prevê que para o concelho de Porto de Mós o coeficiente de localização para indústria pode variar entre 0,40 e 0,70.
N) - Ou seja, não se encontra concretamente determinado na lei nem na portaria que o coeficiente de localização seja de 0,70 para o local onde se encontram os prédios da recorrente.
O) - Da matéria provada da douta sentença recorrida também não consta a concreta fundamentação para o recurso ao coeficiente de localização de 0,70.
P) - Caso nas segundas avaliações tivesse sido aplicado o coeficiente de localização de 0,40 previsto na Portaria 982/04, os valores patrimoniais teriam sido bastante inferiores.
Q) - Da página da Internet com o código www.e-financas.gov.pt não consta qualquer explicação nem justificação para ter sido fixado no zonamento dos prédios avaliados o coeficiente de 0,70, quando também teria sido possível o Cl de 0,40.
R) - Sendo possível para o zonamento onde ficam situados os prédios avaliados coeficientes de localização variáveis entre 0,40 e 0,70, não se poderá considerar fundamentada uma avaliação com a explicação que o zonamento consta de Portaria e publicada no sítio das Finanças.
S) - O entendimento em sentido diferente é retirar do controlo judicial uma componente essencial da fórmula de avaliação, sendo que a CNAPU não tem poderes discricionários para fixar os coeficientes de localização.
T) - O entendimento segundo o qual a CNAPU funciona como entidade que na fixação dos zonamentos é insindicável não tem suporte nem no artigo 42° do CIMI nem no anexo da Portaria 982/04.
U) - O custo unitário de construção dos prédios concluídos antes de 2003 não é corrigido pela aplicação do coeficiente de vetustez.
V) - O conceito de custo unitário de construção contido no artigo 39° do CIMI é de carácter aberto e susceptível de adequação consoante a antiguidade dos prédios, desde que concluídos antes de 2003.
X) A douta decisão recorrida fez incorrecta interpretação e aplicação dos artigos 39° e 42° do CIMI e violou o artigo 77° da LGT.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e em consequência ser revogada a douta sentença recorrida e ordenada a baixa do processo para ser proferida nova decisão instruída com todos os elementos oficiais com vista à fundamentação do coeficiente de localização de 0,70 e com vista à aplicação do custo unitário de construção tendo em conta a antiguidade de sessenta e cinco anos dos prédios avaliados, ou assim não se entendendo, ser revogada a douta decisão, anulando-se as segundas avaliações dos PAVs 1, 2, 3 e 4 do artigo urbano 2595 e dos PAVs 1, 2 e 3 do artigo urbano 2592, todos da freguesia de Pedreiras, concelho de Porto de Mós.
1.3. Não foram apresentadas contra-alegações.
1.4. O MP emite Parecer no sentido do provimento do recurso, nos termos seguintes:
«FUNDAMENTAÇÃO
1. Valor da acção
O valor de € 2.705.650,00, correspondente ao valor global atribuído aos prédios avaliados tem fundamento legal, na medida em que exprime a utilidade económica do pedido de anulação dos actos de avaliação (art. 306° nº 1, 2ª parte CPC; em conformidade com o actual critério constante do art. 97°-A nº 1 al. c) CPPT, aplicável apenas às acções instauradas após 20.04.2009).
2. Errónea quantificação do valor patrimonial tributário (VPT)
O VPT resulta da aplicação de uma fórmula legal que inclui como um dos parâmetros o valor base do prédio edificado (Vc), o qual corresponde ao custo médio de construção por m2 adicionado do valor do m2 do terreno de implantação, fixado em 25% daquele custo (arts. 38° nº 1 e 39° nº 1 CIMI)
O custo unitário de construção deve corresponder ao fixado na Portaria em vigor na data da avaliação (no caso concreto a Portaria nº 982/2004, 4 Agosto cf. probatório al. E)
A ponderação da antiguidade dos prédios avaliados não se exprime numa eventual redução do custo unitário de construção, por aplicação de coeficientes de correcção monetária; antes na aplicação do coeficiente de vetustez, cuja quantificação é função do número inteiro de anos decorridos desde a data de emissão da licença de utilização ou da data da conclusão das obras de edificação (art. 44° CIMI)
3. Falta de fundamentação do acto de avaliação
I. Os actos administrativos carecem de fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos (art. 268° nº 3 CRP)
O princípio constitucional foi densificado no art. 125º CPA e no art. 77º nº 1 LGT, os quais permitem a fundamentação por remissão para anteriores pareceres, informações ou propostas.
Segundo ensinamento pacífico da doutrina e da jurisprudência a fundamentação do acto administrativo há-de ser:
- expressa, traduzida na exposição sucinta dos fundamentos de facto e de direito da decisão
- clara, permitindo que pela leitura do seu teor se apreendam com precisão os factos e as normas jurídicas conducentes à decisão
- suficiente, permitindo um conhecimento concreto da motivação da decisão
- congruente, por forma a que a decisão seja a conclusão lógica e necessária dos motivos invocados como sua justificação.
Embora o conteúdo da fundamentação do acto administrativo seja variável, de acordo com o tipo de acto e as circunstâncias do caso concreto, deve cumprir uma dupla função:
- endógena, ao exigir ao decisor a expressão dos motivos e critérios determinantes da decisão, assim contribuindo para a sua ponderação e transparência
- exógena, ao permitir ao destinatário do acto uma opção esclarecida entre a conformação e a impugnação graciosa ou contenciosa.
II. No caso concreto a Portaria nº 982/2004, 4 Agosto aprovou os coeficientes de localização mínimo e máximo para edifícios destinados a indústria no concelho de Porto de Mós, fixando-os entre 0,40 e 0,70 (art. 42° nºs 1, 2 e 4 CIMI).
Porém, o acto de avaliação não exprime qualquer ponderação das características legalmente atendíveis para a fixação daquele coeficiente, designadamente acessibilidades, proximidade de equipamentos sociais, serviços de transportes públicos, valor do mercado imobiliário nas zonas de implantação dos prédios avaliados, por forma a tornar inteligível o motivo pelo qual foi aplicado o coeficiente máximo e não qualquer outro (art. 42° nº 3 CIMI; probatório al. E).
Neste contexto a fundamentação do coeficiente de localização é insuficiente, na medida em que não cumpre a dupla função endógena e exógena supra assinalada, inquinando a legalidade do acto final de avaliação (no sentido propugnado, em caso semelhante cf. acórdão STA-SCT 10.03.2011 processo nº 862/l0)
CONCLUSÃO
O recurso merece provimento.
A sentença impugnada deve ser revogada e substituída por acórdão com o seguinte dispositivo:
- procedência da impugnação judicial
- consequente anulação dos actos de avaliação impugnados»
1.5. Corridos os vistos legais, cabe decidir.
FUNDAMENTOS
2. Na sentença recorrida julgaram-se provados os factos seguintes:
A) Em 05/05/2005, a impugnante requereu 2ª avaliação dos prédios inscritos na matriz da freguesia de Pedreiras sob os artigos P 2595 PAV 1, PAV2, PAV3 e PAV4, e P 2592 PAV 1, PAV 2 e PAV 3 – fls....dos p.a’s.
B) Reunidos os peritos, foram elaborados os Termo de avaliação de fls... dos p.a’s., que também se dão por integralmente reproduzido, para todos os efeitos legais.
C) A impugnante foi notificada dos actos de avaliação referidos na alínea antecedente, a coberto dos ofícios de fls. 11 a 17, datados de 06/06/2006, que também se dão por integralmente reproduzidos.
D) Em 7/07/2006, a impugnante requereu, ao abrigo do disposto no Art. 37.° do CPPT, certidão dos fundamentos de facto e de direito pelos quais foi fixado o Vc em € 600,00, o Cl em 0,70, o Cq em 0,09 e o Cv em 0,45 – fls. 18.
E) Em resposta, o serviço de finanças emitiu a certidão de fls. 19, que se dá por integralmente reproduzida, da qual se destaca o seguinte:
«(…)
Cv em C 600.00. Vc – Valor base dos prédios edificados – artº. 39 do Código do Imposto Municipal Sobre Imóveis (CIMI), custo médio de construção por metro quadrado e a vigorar para os anos de 2003 e 2004, aprovado pelo n.º 6 da Portaria 982/2004, de 4 de Agosto, foi fixado em € 480,00, que acrescido de 25% daquele custo – n.º. 1 do art.º. 39° do CIMI, perfaz os €600,00;
Cl em 0,70. Cl – Coeficiente de localização – art.º. 42°. do CIMI –, anexo I à portaria 982/2004, de 4 de Agosto, fixado para Indústria no concelho, conforme extracto do SIGIMI anexo.
Cq em 0.90. Cq – Coeficiente de qualidade e conforto – art.º., 43º. do CIMI. No caso em apreço é coeficiente minorativo pelo estado deficiente de conservação de estrutura (-0,02), cobertura (-0,04) e revestimento de pi piso, paredes e tectos deteriorados (0,04), o que totaliza 0,10.
Cv em 0,42. Cv – Coeficiente de vetustez – art.º. 44°. do CIMI, de acordo com a avaliação o prédio tem 65 anos, a que corresponde na tabela do artigo supra citado o coeficiente de 0,45.
(…)»
3. Enunciando como questões a decidir as de saber se ocorre vício de forma quer por falta de fundamentação, quer por preterição do direito de audiência prévia, bem como vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto da avaliação (na medida em que as construções remontam a anos anteriores ao da avaliação e o preço por m2 de construção considerado era o fixado para o ano de 2004), a sentença veio a concluir pela improcedência de todos estes invocados fundamentos.
4.1. Previamente, porém, a sentença apreciou uma outra questão: a atinente ao valor da acção.
E fê-lo nos termos seguintes:
A impugnante atribuiu à presente impugnação o valor de 20.000,00 Euros, mas, nela, contesta o valor global de 2.705.650,00 Euros, atribuído aos prédios avaliados.
Mas o valor indicado pela impugnante não corresponde à utilidade económica do pedido, tal como esta vem definida pelo art. 306°, nº 1, 2ª parte, do CPC (se, pela acção se pretende obter benefício diverso de uma quantia em dinheiro, o valor da causa é a quantia em dinheiro equivalente a esse beneficio).
E assim, uma vez que a toda a causa deve ser atribuído um valor certo (art. 305º, nº 1 do CPC), é adequado fixar à causa o valor correspondente ao valor da avaliação contestada, em conformidade com a regra do art. 97°-A, nº 1, al. c) do CPPT que, por força do disposto no art. 27°, nº 1 do DL nº 34/2008, de 26/2, não é aplicável a este processo.
4.2. Ora, nas Conclusões A a D a recorrente questiona, precisamente, o decidido quanto a esta matéria, sustentando que o valor patrimonial tributário dos prédios não configura a utilidade económica directa, concreta e determinável no processo de impugnação da fixação do valor patrimonial, sendo que tal utilidade económica pode ser aferida em sede de IMI, IRS e IRC, dependendo, contudo, de diferentes factores e pressupostos, não sendo por isso, determinável, pelo que a utilidade económica do presente processo não é de valor certo sendo, assim, legal a indicação do valor de 20.000,00 Euros.
Vejamos, pois, desde já esta questão.
4.3. De acordo com o disposto nos arts. 31º e 32º do CPTA, subsidiariamente aplicáveis nos termos do art. 2º do CPPT, o valor da causa na impugnação judicial será o do valor que se pretende obter ou o do valor em dinheiro equivalente ao benefício que se pretende obter; e no caso de cumulação de pedidos o valor será o correspondente à soma dos valores de todos eles (nº 7 do art. 32º do CPTA).
Regra idêntica consta, aliás, no nº 1 do art. 306º do CPC.
Ou seja, na impugnação, o valor da causa representa a utilidade económica do pedido.
Todavia, se nos caso de impugnação da liquidação é apreensível que aquela utilidade económica corresponde ao valor do imposto impugnado, já nos casos em que se impugna o acto de avaliação ou de fixação de valor patrimonial, é duvidoso que possa fazer-se corresponder o valor contestado ao benefício (em termos de quantia ou utilidade económica) que se pretende obter com tal impugnação.
Com efeito, tal como refere o recorrente, a utilidade económica da impugnação de um acto de fixação de valor patrimonial apenas pode ser aferida em sede do imposto que possa vir a ser exigível com base nesse valor, não havendo portanto base legal para a equiparação, pura e simples, de tal valor patrimonial à utilidade económica referida no art. 306º do CPC.
E neste sentido se pronuncia, igualmente, o Cons. Jorge Lopes de Sousa (Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, volume I, 5ª ed., Lisboa, Áreas Editora, 2007, pp. 784/785 anotação 12 ao art. 108º): «Nos casos em que for impugnado um acto de avaliação ou um acto de fixação de valores patrimoniais, a utilidade económica do pedido não corresponde ao valor contestado, mas sim ao imposto que poderá vir a ser cobrado correspondente a esse valor» e «Será em situações deste tipo, em que a determinação da utilidade económica exacta do pedido depende de ulteriores actos de liquidação, que o impugnante, em vez de indicar o valor, poderá indicar a forma como pretende que ele seja determinado pela administração tributária, como se prevê no nº 2 deste art. 108°.»
É certo que, embora apenas para efeito de custas, o anterior «Regulamento das Custas dos Processos Tributários» (RCPT), aprovado pelo DL nº 29/98, de 11/2, dispunha, no seu art. 5º que o valor atendível nos processos de impugnação era, em caso de impugnação da liquidação, o da importância cuja anulação se pretende e, em caso de impugnação dos actos de fixação dos valores patrimoniais, o valor contestado (ou seja, para efeito de custas e na impugnação de actos de fixação de valor patrimonial estava afastado o critério da utilidade económica do pedido, como critério de cálculo do valor da causa).
Mas tendo o RCPT sido revogado (pelo DL nº 324/2003, de 27/12), passou (mesmo para efeito de custas) a ser aplicável o nº 1 do art. 5º do CCJ (DL 324/03, de 27/12), que manda atender ao valor resultante da aplicação da lei de processo (cfr. ainda, os nºs. 2 e 3 do art. 73º-A do mesmo CCJ - na redacção daquele DL 324/2003 – nos quais se dispõe que o processo judicial tributário, bem como os actos judiciais praticados no âmbito do procedimento tributário, estão sujeitos a custas, nos termos do CCJ e que o regime das custas administrativas e tributárias obedece às regras estabelecidas para as custas cíveis, com as devidas adaptações; e cfr., igualmente, o disposto no nº 1 do art. 73º-D do CCJ, onde se dispõe que se atende para efeitos de custas judiciais ao valor resultante da aplicação do CPTA e, subsidiariamente, ao resultante do disposto no título I).
Ou seja, com a revogação do RCPT, o critério da utilidade económica do pedido não só se manteve, para efeito de custas, como critério regra para aferição do valor da causa no caso de impugnação da liquidação, como também se alargou a aplicação desse critério aos casos de impugnação de actos de fixação de valores patrimoniais.
E só posteriormente, com a entrada em vigor do DL nº 34/2008, de 26/2, que aditou ao CPPT o seu actual art. 97º-A, o legislador voltou a considerar que, em termos de valor da causa (e agora quer para efeito de custas quer para efeitos processuais), na impugnação dos actos de fixação do valores patrimoniais, o valor da causa atendível é o do valor contestado [sendo que este, como se disse, não corresponde ao benefício (em termos de quantia ou utilidade económica) que se pretende obter com tal impugnação].
Com efeito, o referido art. 97º-A do CPPT, aditado pelo DL nº 34/2008, de 26/2, dispõe o seguinte, sob a epígrafe «Valor da causa»:
«1 - Os valores atendíveis, para efeitos de custas ou outros previstos na lei, para as acções que decorram nos tribunais tributários, são os seguintes:
a) Quando seja impugnada a liquidação, o da importância cuja anulação se pretende;
b) Quando se impugne o acto de fixação da matéria colectável, o valor contestado;
c) Quando se impugne o acto de fixação dos valores patrimoniais, o valor contestado;
(…)
3 - Quando haja apensação de impugnações ou execuções, o valor é o correspondente à soma dos pedidos.»
Ora, no caso dos autos, tal alteração não é aplicável (dado que a impugnação deu entrada em 11/9/2006 - cfr. fls. 2) como aliás reconhece e afirma a sentença recorrida.
Assim, à data da presente impugnação, o valor da causa deve reportar-se, de acordo com a lei então aplicável, mesmo no caso de impugnação de actos de fixação do valor patrimonial, ao valor correspondente à utilidade económica referida nos arts. 32º do CPTA e 306º do CPC.
Mas como essa utilidade económica do pedido não corresponde, como acima se disse, ao valor contestado, mas antes ao imposto que poderá vir a ser cobrado correspondente a esse valor, a sentença, ao concluir que o valor patrimonial resultante da avaliação (o valor contestado) correspondente à utilidade económica referida no art. 306º do CPC, enferma do erro de interpretação alegado pela recorrente.
O valor da impugnação, que será o correspondente ao imposto que poderá vir a ser cobrado, deve, portanto, ser determinado pelos serviços competentes da AT, nos termos do nº 2 do citado art. 108º do CPPT, pois que também o valor de 20.000,00 Euros indicado pela recorrente não é o equivalente àquela utilidade económica.
Procedem, deste modo, as Conclusões A a D do recurso.
5. Nas Conclusões E a X a recorrente questiona o mais decidido, sustentando, em síntese, que a sentença sofre de erro de julgamento por fazer incorrecta interpretação e aplicação dos arts. 39° e 42° do CIMI e por violar o disposto no art. 77° da LGT, pois que os valores fixados nas avaliações questionadas se não encontram devidamente justificados.
A questão a decidir neste âmbito é, portanto, a de saber se os questionados actos de avaliação se encontram fundamentados nos termos legais e se ocorre errónea quantificação do valor patrimonial tributário encontrado.
Vejamos.
5.1. O direito à fundamentação, relativamente aos actos que afectem direitos ou interesses legalmente protegidos, decorria já do art. 1°, nº 1, als. a) e c) do DL nº 256-A/77, de 17/6 e tem hoje consagração constitucional de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias consagrados no Título II da parte 1ª da CRP (art. 268º) - vejam-se a abundante jurisprudência do STA atinente a esta matéria, bem como Gomes Canotilho e Vital Moreira, «Constituição da República Portuguesa Anotada», 1993, pp. 936 e Vieira de Andrade, «O Dever de Fundamentação Expressa dos Actos Administrativos», 1990, pp. 53 e ss., tendo o respectivo princípio constitucional sido densificado nos arts. 124º e 125° do CPA e no art. 77° nºs. 1 e 2 da LGT (acto administrativo tributário).
E dado que este dever legal de fundamentação tem, «a par de uma função exógena - dar conhecimento ao administrado das razões da decisão, permitindo-lhe optar pela aceitação do acto ou pela sua impugnação -, uma função endógena consistente na própria ponderação do ente administrador, de forma cuidada, séria e isenta.» (ac. deste STA, de 2/2/06, rec. nº 1114/05), então, essa fundamentação deve ser contextual e integrada no próprio acto (ainda que o possa ser de forma remissiva), expressa e acessível (através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão), clara (de modo a permitir que, através dos seus termos, se apreendam com precisão os factos e o direito com base nos quais se decide), suficiente (permitindo ao destinatário do acto um conhecimento concreto da motivação deste) e congruente (a decisão deverá constituir a conclusão lógica e necessária dos motivos invocados como sua justificação), equivalendo à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto.
E caso a fundamentação seja feita por forma remissiva (por adesão ou remissão para anterior parecer, informação ou proposta), estes constituirão parte integrante do respectivo acto administrativo: este acto integra, então, nele próprio, o parecer, informação ou proposta para os quais se remete e estes terão, assim, em termos de legalidade, que satisfazer os mesmos requisitos da fundamentação autónoma.
Assim, utilizando a linguagem da jurisprudência, o acto só está fundamentado se um destinatário normalmente diligente ou razoável - uma pessoa normal - colocado na situação concreta expressada pela declaração fundamentadora e perante o concreto acto administrativo (que determinará consoante a sua diversa natureza ou tipo uma maior ou menor exigência da densidade dos elementos de fundamentação) fica em condições de conhecer o itinerário funcional (não psicológico) cognoscitivo e valorativo do autor do acto, sendo, portanto, essencial que o discurso contextual lhe dê a conhecer todo o percurso da apreensão e valoração dos pressupostos de facto e de direito que suportam a decisão ou os motivos por que se decidiu num determinado sentido e não em qualquer outro. Ela visa «esclarecer concretamente as razões que determinaram a decisão tomada e não encontrar a base substancial que porventura a legitime, já que o dever formal de fundamentação se cumpre “pela apresentação de pressupostos possíveis ou de motivos coerentes e credíveis, enquanto a fundamentação substancial exige a existência de pressupostos reais e de motivos correctos susceptíveis de suportarem uma decisão legítima quanto ao fundo”. O discurso fundamentador tem de ser capaz de esclarecer as razões determinantes do acto, para o que há-de ser um discurso claro e racional; mas, na medida em que a sua falta ou insuficiência acarreta um vício formal, não está em causa, para avaliar da correcção formal do acto, a valia substancial dos fundamentos aduzidos, mas só a sua existência, suficiência e coerência, em termos de dar a conhecer as razões da decisão.» (cfr. Vieira de Andrade – ob. cit. pag. 239, na citação do ac. do STA, de 11/12/2002, rec. 01486/02).
5.2. Especificamente, também a decisão em matéria de procedimento tributário exige sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo essa fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os integrantes do relatório da fiscalização tributária, e devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo (cfr. o art. 77° da LGT). Ou seja, o dever legal de fundamentação deve, em suma, cumprindo as referidas funções endógena e exógena, responder às necessidades de esclarecimento do destinatário (do contribuinte, no presente caso), informando-o do itinerário cognoscitivo e valorativo do respectivo acto e permitindo-lhe conhecer as razões, de facto e de direito, que determinaram a sua prática. E a violação destes requisitos da decisão implica a respectiva ilegalidade, fundamento de subsequente anulação, em sede de impugnação judicial da correspondente liquidação (ou do acto de fixação do valor patrimonial tributário dos prédios em questão - 2ª avaliação -, como sucede no caso dos autos) - cfr. os arts. 99º e 134º do CPPT e cfr., ainda, entre outros, o ac. desta Secção do STA, de 30/11/2010, rec. nº 0600/10, bem como os demais aí referenciados).
5.3. No presente caso, tendo deduzido impugnação dos actos de 2ª avaliação dos prédios questionados, invocando, além do mais, a falta de fundamentação desses actos, e tendo a sentença decidido pela não verificação de tal vício, a recorrente continua a sustentar, como se viu, que a decisão faz incorrecta interpretação e aplicação dos arts. 39° e 42° do CIMI e viola o disposto no art. 77° da LGT, pois que os valores fixados nas avaliações questionadas se não encontram devidamente justificados.
Vejamos, pois.
5.3.1. O art. 38º do CIMI estabelece a fórmula (Vt = Vc x A x Ca x Cl x Cq x Cv) de determinação do valor patrimonial tributário dos prédios urbanos para habitação, comércio, indústria e serviços, em que Vt equivale ao valor patrimonial tributário, Vc ao valor base dos prédios edificados, A à área bruta de construção mais a área excedente à área de implantação, Ca ao coeficiente de afectação, Cl ao coeficiente de localização, Cq ao coeficiente de qualidade e conforto e Cv ao coeficiente de vetustez.
Estes índices que integram a referida fórmula são explicitados nos arts. 39º e sgts. do mesmo CIMI.
Nomeadamente, no que interessa ao caso dos autos, a determinação do valor base dos prédios edificados é explicitada (no art. 39º), por correspondência com o valor médio de construção, o qual, por sua vez, é determinado de acordo com os critérios constante do nº 2 deste mesmo normativo; e o coeficiente de localização é explicitado (no art. 42º), nos termos seguintes:
«1 - O coeficiente de localização (Cl) varia entre 0,4 e 2, podendo, em situações de habitação dispersa em meio rural, ser reduzido para 0,35 e em zonas de elevado valor de mercado imobiliário ser elevado até 3.
2 - Os coeficientes a aplicar em cada zona homogénea do município podem variar conforme se trate de edifícios destinados a habitação, comércio, indústria ou serviços.
3 - Na fixação do coeficiente de localização têm-se em consideração, nomeadamente, as seguintes características:
a) Acessibilidades, considerando-se como tais a qualidade e variedade das vias rodoviárias, ferroviárias, fluviais e marítimas;
b) Proximidade de equipamentos sociais, designadamente escolas, serviços públicos e comércio;
c) Serviços de transportes públicos;
d) Localização em zonas de elevado valor de mercado imobiliário.
4 - O zonamento consiste na determinação das zonas homogéneas a que se aplicam os diferentes coeficientes de localização do município e as percentagens a que se refere o nº 2 do artigo 45º.»
5.3.2. Já no art. 62º do CIMI dispõe-se:
«1 - Compete à CNAPU:
a) Propor trienalmente, até 31 de Outubro, os coeficientes de localização mínimos e máximos a aplicar em cada município, com base designadamente em elementos fornecidos pelos peritos locais e regionais e pelas entidades representadas na CNAPU, para vigorarem nos três anos seguintes;
b) Propor trienalmente, até 31 de Outubro, o zonamento e respectivos coeficientes de localização, as percentagens a que se refere o nº 2 do artigo 45º e as áreas da sua aplicação, bem como os coeficientes majorativos aplicáveis às moradias unifamiliares, com base em propostas dos peritos locais e regionais, para vigorarem nos três anos seguintes em cada município;
c) Propor as directrizes relativas à apreciação da qualidade construtiva, da localização excepcional, do estado deficiente de conservação e da localização e operacionalidade relativas;
d) Propor anualmente, até 30 de Novembro, para vigorar no ano seguinte, o valor médio de construção por metro quadrado, ouvidas as entidades oficiais e as associações privadas do sector imobiliário urbano;
e) Propor à Direcção-Geral dos Impostos as medidas que entender convenientes no sentido do aperfeiçoamento das operações de avaliação.
2 - Tratando-se de conjuntos ou empreendimentos urbanísticos implantados em áreas cujo zonamento não tenha ainda sido aprovado ou, tendo-o sido, se encontre desactualizado, as propostas referidas nas alíneas a) e b) do nº 1 são apresentadas anualmente.
3 - As propostas a que se referem as alíneas a) a d) do nº 1 e o número anterior são aprovadas por portaria do Ministro das Finanças.»
5.3.3. Por sua vez, a Portaria nº 982/2004, de 4/8, aprovou e deu publicidade aos coeficientes a fixar dentro dos limites estabelecidos no citado CIMI, estabelecendo-se no seu nº 7 que «o zonamento, os coeficientes de localização, as percentagens e os coeficientes majorativos referidos, respectivamente, nos nºs. 2º, 3º e 4º da presente portaria são publicados no sítio www.e-financas.gov.pt, podendo ser consultados por qualquer interessado, e estão ainda disponíveis em qualquer serviço de finanças».
Posteriormente, a Portaria nº 1426/2004, de 25/11, revogou o nº 1º da Portaria nº 982/2004 e aprovou novos coeficientes de localização mínimos e máximos a aplicar em cada município.
E também posteriormente, a Portaria nº 1022/2006, de 20/9, procedeu à primeira revisão do zonamento e dos coeficientes de localização, seguindo-se a Portaria nº 1119/2009, de 30/9 (cfr. os seus nºs. 1 e 3).
5.4.1. Considerando este quadro legal, e relembrando que, como se disse, o grau de fundamentação há-de ser o adequado ao tipo concreto do acto e das circunstâncias em que o mesmo foi praticado (cfr. ac. deste STA, de 11/12/2007, rec nº 615/04), vemos que, no caso presente, conforme consta da sentença recorrida, a fundamentação das avaliações impugnadas é a que resulta da fórmula e do critério legal.
E os peritos não poderiam ter alterado os coeficientes legalmente fixados.
Com efeito, quer o coeficiente de localização (Cl) aplicado (0,70), quer o coeficiente de qualidade e conforto (Cq) aplicado (0,90), quer o valor base do prédio edificado (€ 600,00) são elementos precisos, objectivos e pré-determinados por lei, em função dos diversos elementos nela constantes, designadamente da localização e do destino do prédio em causa e, por isso, indisponíveis para as partes no procedimento de avaliação.
Aliás, sobre a questão da fundamentação relativamente ao coeficiente de localização, se debruçou já, em vários acórdãos recentes, a jurisprudência desta Secção do STA. E se no acórdão proferido em 10/3/2011, no rec. nº 862/10 (citado pelo MP em apoio do sentido da procedência do presente recurso) o Tribunal concluiu pela inexistência de falta de fundamentação do acto de 2ª avaliação, já nos acórdãos proferidos em 1/7/2009, rec. nº 239/09; 18/11/2009, rec. nº 765/09; 14/7/2010, rec. nº 377/10; 6/10/2010, rec. nº 510/10; 17/3/2011, rec. nº 964/2010; 25/5/2011, rec. nº 239/11; 22/6/2011, rec. nº 382/11); e 6/7/2011, rec. nº 307/11, o Tribunal concluiu pela suficiência da fundamentação, em termos com os quais concordamos inteiramente (tendo, aliás, relatado o aresto no citado rec. nº 307/11 e subscrito, na qualidade de 1º adjunto, os arestos nos também citados recs. nºs. 239/11 e 382/11, e), exarando-se ali o seguinte:
«Como se pode ler no preâmbulo do CIMI, aprovado pelo DL 287/2003, de 12 de Novembro, com a reforma da tributação do património levada a cabo por este diploma, operou-se “uma profunda reforma do sistema de avaliação da propriedade, em especial da propriedade urbana. (…) o sistema fiscal passa a ser dotado de um quadro legal de avaliações totalmente assente em factores objectivos, de grande simplicidade e coerência interna, e sem espaço para a subjectividade e discricionariedade do avaliador.”.
O procedimento de avaliação, configurado nos artigos 38º e seguintes do CIMI, caracteriza-se, assim, agora por uma elevada objectividade, com uma curtíssima margem de ponderação ou valoração por parte dos peritos intervenientes, pretendendo-se que a avaliação assente no máximo de dados objectivos.
Desde logo, o coeficiente de localização previsto no artigo 42º do CIMI é um valor aprovado por Portaria do Ministro das Finanças sob proposta da CNAPU na fixação do qual se têm em consideração, nomeadamente, as seguintes características: acessibilidades, proximidade de equipamentos sociais, serviços de transportes públicos e localização em zonas de elevado valor de mercado imobiliário.
Por outro lado, o nº 4 do mesmo preceito legal prevê ainda o zonamento que consiste na determinação das zonas homogéneas a que se aplicam os diferentes coeficientes de localização em cada município e as percentagens a que se refere o nº 2 do artigo 45º do CIMI.
Trata-se, pois, de parâmetros legais de fixação do valor patrimonial com base em critérios objectivos e claros e, por isso, facilmente sindicáveis, bastando a indicação da localização dos prédios e a referência do quadro legal aplicável para que se compreenda como foi determinado o referido coeficiente.
Ou seja, encontramo-nos no domínio de zonas e coeficientes predefinidos e, portanto, indisponíveis para qualquer ponderação ou alteração por parte dos peritos intervenientes no procedimento de avaliação, e isto independentemente de se tratar de primeira ou segunda avaliação, pois não é o facto de se realizar uma inspecção directa ao imóvel a avaliar que pode levar ao desrespeito dos coeficientes predefinidos, mas antes serve essa inspecção para comprovar a justeza dos coeficientes a aplicar.
Neste contexto, a fundamentação exigível para a aplicação do coeficiente de localização apenas se podia circunscrever à identificação geográfica/física dos prédios no concelho e freguesia de Pombal, ao estabelecimento do coeficiente de localização aplicável e à invocação do quadro legal que lhe era aplicável.
Por outro lado, é a própria lei que manda ter em consideração na fixação da percentagem do valor do terreno de implantação as mesmas características que se têm em consideração na fixação do coeficiente de localização (v. nº 3 do artigo 45º do CIMI).».
Ou seja, neste novo sistema de avaliações, assente em factores objectivos, não há espaço para a subjectividade e discricionariedade do avaliador, sendo coordenado por uma comissão cuja composição garante a representatividade dos agentes económicos e das entidades públicas ligadas ao sector.
«O coeficiente de localização é, assim, fixado de acordo com regras predefinidas, que têm a ver com o exacto local onde se encontra o imóvel a avaliar e têm em conta os elementos a que se refere o artigo 42º do CIMI.
Também o mesmo se passa com o zonamento que consiste na determinação das zonas homogéneas a que se aplicam os diferentes coeficientes de localização em cada município e as percentagens a que se refere o nº 2 do artigo 45º do CIMI e é aprovado por portaria do Ministro das Finanças sob proposta da CNAPU.
A determinação dos valores de zonamento é efectuada em cada município em assembleia camarária cuja materialização corresponde aos mapas informáticos de valor, por zona.
Assim, não é correcto alegar-se que a lei fixa um mínimo e um máximo e que dentro dessa moldura o avaliador tinha que fundamentar a razão por que atendeu ao coeficiente máximo e não ao mínimo.»
Deste modo, aderindo a esta jurisprudência (que, como supra referimos, já subscrevemos nos apontados arestos de 25/5/2011, 22/6/2011 e 6/7/2011), temos de concluir que, como se exara na sentença recorrida, a fundamentação exigível para a aplicação do coeficiente de localização apenas se podia circunscrever à identificação geográfica/física do prédio no concelho e na freguesia aqui em causa, ao estabelecimento do coeficiente de localização aplicável e à invocação do quadro legal aplicável.
Elementos estes que, como se vê de fls. 19 a 21 e do apenso administrativo junto aos autos, constam das respectivas fichas de avaliação (cfr. também a al. E) do Probatório).
Como igualmente se refere no citado aresto do STA, «… a intenção do legislador foi subtrair da subjectividade e da relatividade apreciativa do avaliador os critérios relevantes da avaliação dos prédios urbanos, para efeitos de incidência real tributária, e fê-lo para efeitos de combater a fraude e a evasão fiscal, através de avaliações subjectivas, sujeitas a pressões de especuladores e a outros interesses de subvalorização da propriedade urbana, sendo que foi todo esse circunstancialismo que levou o legislador a estabelecer critérios objectivos fixados por lei.
Além de que a existência de erros ou anomalias sempre poderá ser corrigida na medida em que os valores dos coeficientes de localização e zonamento são propostos pela CNAPU trienalmente.»
Em suma, tendo, no caso, sido aplicado o Cl (coeficiente de localização) de 0.70, e sendo esse o coeficiente que, efectivamente, resulta dos ditos parâmetros acima mencionados, os elementos constantes dos termos da impugnada avaliação são bastantes para o acto se considerar fundamentado, nos termos exigidos pela lei para o caso (art. 77º da LGT).
5.4.2. E o mesmo sucede no que respeita aos parâmetros Vc (Valor base dos prédios edificados), Cq (Coeficiente de qualidade e conforto) e Cv (Coeficiente de vetustez), pois que também neste âmbito estamos perante parâmetros legais de fixação com base em critérios objectivos e claros, bastando a indicação dos respectivos coeficientes legais, bem como a referência do quadro legal aplicável e da forma e motivo pelos quais são concretamente aplicados, para que se compreenda como foram determinados tais coeficientes.
- Na verdade, relativamente ao parâmetro Vc (valor base dos prédios edificados), corresponde ele ao valor médio de construção, por metro quadrado, adicionado do valor do metro quadrado do terreno de implantação fixado em 25% daquele valor (nº 1 do art. 39º do CIMI), sendo o valor médio de construção determinado de acordo com os critérios constantes do nº 2 deste mesmo normativo e fixado anualmente por Portaria do Ministro das Finanças, sob proposta da CNAPU (cfr. arts. 60°, nº 1, al. d) e nº 3, do CIMI),
Ora, nos termos da Portaria nº 982/2004, de 4/8, o valor de construção por metro quadrado, para efeitos deste art. 39° do CIMI e para os anos de 2003 e 2004 para os prédios urbanos é de e 480,00.
Pelo que, adicionando a este valor (480,00) os 25% (120,00) correspondentes ao valor do metro quadrado do terreno de implantação, temos o Vc de 600,00, que, no caso, foi efectivamente o atribuído, de acordo com os parâmetros legais (cfr. als. B) e E) do Probatório).
- E que respeita ao coeficiente de qualidade e conforto (Cq) também ele foi aplicado ao valor base do prédio edificado e obtido através da subtracção à unidade dos coeficientes minorativos indicados e que constam da tabela II (que é a aplicável aos prédios destinados a comércio, indústria ou serviços), mencionada no nº 1 do art. 43° do CIMI (cfr. al. E) do Probatório).
5.4.3. É certo que, relativamente ao coeficiente de vetustez (Cv) a recorrente sustenta, nas Conclusões U e V, que o custo unitário de construção dos prédios concluídos antes de 2003 não é corrigido pela aplicação deste coeficiente de vetustez e que o conceito de custo unitário de construção contido no artigo 39° do CIMI é de carácter aberto e susceptível de adequação consoante a antiguidade dos prédios, desde que concluídos antes de 2003.
Carece, porém, de razão legal.
Com efeito, como se viu, quer o valor base do prédio edificado (Vc), quer a antiguidade do prédio (Cv), constituem parâmetros que, através da aplicação dos coeficientes constantes dos arts. 38º e 44º do CIMI, integram a fórmula de cálculo do valor patrimonial tributário do prédio (cfr. arts. 38º a 44º do CIMI), sendo que, por um lado, a forma de cálculo do valor base dos prédios construídos também se encontra legalmente fixada (no referido art. 39º do CIMI), não tendo os peritos qualquer margem de ponderação na fixação desse valor e, por outro lado e como se diz na sentença, a efectuar-se a pretendida correcção monetária, os prédios seriam duplamente desvalorizados (pela consideração da sua vetustez e pela correcção monetária do preço de construção por metro quadrado) – consequência que o legislador não terá pretendido. E, como aponta o MP, aquela ponderação da antiguidade dos prédios avaliados não se exprime numa eventual redução do custo unitário de construção, por aplicação de coeficientes de correcção monetária, mas, antes, na aplicação daquele coeficiente de vetustez (cuja quantificação é função do número inteiro de anos decorridos desde a data de emissão da licença de utilização ou da data da conclusão das obras de edificação).
Assim, também não se verifica este invocado erro de quantificação que afecte os actos de avaliação aqui em causa.
6. Neste contexto, a fundamentação exigível para a aplicação do coeficiente de localização (Cl), do valor base dos prédios edificados (Vc) e do coeficiente de vetustez (Cv) apenas se podia circunscrever à identificação geográfica/física dos prédios no concelho e freguesia respectivos, à especificação do coeficiente de localização e à indicação dos coeficientes aplicáveis (quer à determinação do valor base de prédio edificado e dos coeficientes majorativos ou minorativos especificados na Tabela II do art. 43º do CIMI, quer à determinação dos citados coeficientes de vetustez) bem como à invocação do quadro legal que lhes é aplicável.
E é isso que, no caso, se verifica.
E não invocando a recorrente, por outro lado, qualquer erro na identificação geográfica, nem se verifica, no caso e relativamente aos actos de avaliação impugnados, falta absoluta de fundamentação na adopção desses coeficientes, nem ocorrem os invocados erros de julgamento por parte da sentença, alegadamente substanciados na inadequada aplicação dos arts. 39° e 42° do CIMI e 77° da LGT.
Improcedem, assim, as conclusões E a X do recurso.
DECISÃO
Nestes termos, acorda-se em:
a) Dar provimento ao recurso na parte em que a sentença fixou o valor da acção em 2.705.650,00 Euros, revogando-a nessa medida e ordenando que, oportunamente, os autos baixem aos serviços competentes da AT a fim de aí ser determinado o imposto que poderá vir a ser cobrado correspondente àquele, de acordo com o segmento final do nº 2 do art. 108º do CPPT.
b) Negar, no mais, provimento ao recurso e confirmar, nessa medida, a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
Lisboa, 14 de Setembro de 2011. - Casimiro Gonçalves (relator) - António Calhau - Isabel Marques da Silva.