Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0876/09
Data do Acordão:04/28/2010
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:RESPONSÁVEL SUBSIDIÁRIO
REVISÃO DA MATÉRIA COLECTÁVEL
RECLAMAÇÃO
IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
Sumário:Garantindo a lei ao responsável subsidiário o direito à reclamação e à impugnação judicial da matéria tributável, nos mesmos termos do devedor principal, nos termos do nº 4 deste art. 22º da LGT, e não lhe sendo possível, no caso de fixação da matéria tributável por métodos indirectos, requerer ou intervir, por se encontrar findo, no procedimento de revisão previsto no art. 91º da LGT, poderá, no entanto, reclamar ou impugnar a liquidação ou a avaliação indirecta, sem o condicionamento referido no nº 5 do art. 86º da LGT.
Nº Convencional:JSTA00066398
Nº do Documento:SA2201004280876
Data de Entrada:09/18/2009
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A... E B...
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TAF MIRANDELA PER SALTUM.
Decisão:PROVIDO.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - IMPUGN JUDICIAL.
DIR PROC FISC GRAC - MATÉRIA COLECTÁVEL.
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART97 N1 P ART117 ART44.
LGT98 ART91 N1 N2 ART22 N4 ART92 N2 ART65 ART78 ART79 ART86 N5.
CPA91 ART137 N4.
CONST76 ART268 N4.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC999/09 DE 2010/03/17.; AC STA PROC945/08 DE 2009/01/21.
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO 5ED PAG846.
LEITE DE CAMPOS E OUTROS - LEI GERAL TRIBUTÁRIA COMENTADA E ANOTADA 3ED PAG129.
ESTEVES DE OLIVEIRA E OUTROS - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO COMENTADO PAG663.
LIMA GUERREIRO - LEI GERAL TRIBUTÁRIA ANOTADA PAG390-391.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
RELATÓRIO
1.1. Da sentença proferida pelo TAF de Mirandela na impugnação contra a liquidação de IVA dos anos de 1991 e 1992 efectuada à sociedade “C…Lda.”, e que a julgou parcialmente procedente, recorrem quer os impugnantes A… e B… (que deduziram a impugnação na sequência de notificação de despacho de reversão contra eles proferido no processo executivo instaurado contra aquela sociedade originariamente ali executada) quer a Fazenda Pública.
1.2.1. No recurso interposto pela Fazenda Pública, esta termina as respectivas alegações formulando as Conclusões seguintes:
1ª - O procedimento de revisão da matéria colectável previsto no art. 91° da LGT, ocupa, na ordenação sistemática do procedimento de liquidação, o espaço que medeia entre a conclusão dos actos de Inspecção e a fixação definitiva da matéria colectável;
2ª - O prazo de 30 dias para requerer a abertura do procedimento, conta-se da data da notificação da fixação da matéria colectável e tem efeito suspensivo da liquidação do tributo.
3ª - Basta atentar na atribuição do efeito suspensivo da liquidação, para alcançar a conclusão de que o procedimento de revisão é sempre anterior à liquidação que suspende;
4ª - Esta conclusão, que decorre da natureza e da inserção sistemática do procedimento de revisão, no procedimento mais vasto de liquidação, sai reforçada pela formulação legal do prazo do exercício do direito;
5ª - Ao contrário do que acontece relativamente à reclamação graciosa e à impugnação judicial, o legislador não previu o momento adequado para o responsável subsidiário abrir o procedimento de revisão, fixando a data a partir da qual o requerimento haveria de ser apresentado;
6ª - E não o fez, acertadamente, em coerência com a solução que adoptou para os casos de reacção do responsável subsidiário contra a legalidade da liquidação subjacente à divida que lhe é exigida na execução fiscal;
7ª - O nº 4 do art. 22° da LGT ao consagrar o direito de reclamação ou impugnação da dívida, tem em vista as formas típicas de reacção contra a ilegalidade dos actos de liquidação, ou seja a reclamação graciosa e a impugnação judicial;
8ª - Nem sequer se entenderia uma solução legal que pudesse conduzir, na maior parte dos casos, à impossibilidade de nova liquidação por via da caducidade, quando se sabe que a reversão, em regra, acontece muito para além dos quatro anos contados do facto tributário ou do ano seguinte ao do facto;
9ª - O disposto no nº 5 do art. 86° da LGT e no nº 1 do art. 117° do CPPT, não obstam que se admita a impugnação judicial deduzida pelo responsável subsidiário, nos termos do nº 4 do art. 22° da LGT, mesmo na falta de intervenção da comissão de revisão;
10ª - Se o procedimento de revisão só pode ser requerido no prazo de 30 dias contados da notificação da fixação da matéria colectável por métodos indirectos e nessa data é o responsável originário que é parte no procedimento, não pode exigir-se ao responsável subsidiário o cumprimento de condição de impugnabilidade que à data, não estava na sua disponibilidade;
11ª - O despacho que indeferiu a abertura do procedimento de revisão, por extemporaneidade, não enferma de qualquer ilegalidade, nem restringe os direitos impugnatórios dos responsáveis subsidiários;
12ª - O processo de impugnação judicial, em que vigora como princípio estruturante, o princípio do inquisitório, permite a tutela judicial efectiva dos direitos dos impugnantes, uma vez que o Juiz não só pode, como deve, aceitar a produção de prova requerida pelas partes, nomeadamente a pericial e ordenar todas as diligências que considere úteis ao apuramento da verdade;
13ª - Nos casos de responsabilidade subsidiária como é o dos presentes autos, a existência de pedido de revisão da matéria colectável não é condição de procedibilidade da impugnação judicial.
14ª - Porém, se esse não for o entendimento desse Venerando Tribunal e se considerar que a recusa de abertura do procedimento de revisão interposto pelos aqui impugnantes configura vício de forma por preterição de formalidade essencial;
15ª - Tal vício não poderá ter como consequência a anulação a liquidação nos termos da decisão sob recurso;
16ª - Ao contrário do decidido, um vício de forma por preterição de formalidade, ocorrido seis anos após o acto de liquidação impugnado, não pode projectar efeitos invalidantes sobre um acto tributário que o antecede;
17ª - A ilegalidade do acto tributário de liquidação, a existir, só poderá ser encontrada no procedimento que originou esse acto tributário e não, como resulta da sentença recorrida, em acto administrativo muito posterior e completamente distinto e exterior ao acto de liquidação;
18ª - A recusa em admitir o pedido de revisão, se ilegal, poderia e deveria ter sido objecto de recurso contencioso, nos termos da alínea p) do nº 1 do art. 97° do CPPT, por se tratar de questão tributária que não comporta apreciação da legalidade do acto de liquidação;
19ª - A sentença, na parte em que julgou procedente a impugnação com base em vício de forma por preterição de formalidade essencial, enferma de erro de julgamento, desde logo porque não se verificou a preterição de qualquer formalidade e, mesmo que assim não se entenda, a ter-se verificado, tal vício não pode ter consequências na legalidade da liquidação do IVA.
Termina pedindo que o recurso seja julgado procedente, com as legais consequências.
1.2.2. Contra-alegando, os recorridos formulam as seguintes Conclusões:
01 - Alega a Recorrente que o Tribunal a quo incorreu em erro de direito ao anular as liquidações referidas na Sentença por preterição de formalidades essenciais, assacando-lhe a errada aplicação do nº 4 do artigo 22°, do nº 5 do artigo 86º e do artigo 91° todos da Lei Geral Tributária, bem como do nº 1 do artigo 117° do Código de Processo e Procedimento Tributário.
02 - O thema decidendum do presente Recurso subsume-se a saber se os responsáveis subsidiários podem/devem na sequência da reversão da execução pedir a Revisão da matéria tributável (artigo 91° da Lei Geral Tributária) quando o imposto exequendo resulta da fixação da matéria colectável por métodos indirectos e pretendam discutir a sua quantificação ou a aplicação de tais métodos.
03 - A Recorrente pretende defender a legalidade da rejeição do procedimento de revisão oportunamente deduzido com o fundamento na “extemporaneidade” da sua apresentação, argumento que redunda no efeito prático de, liminarmente, obstar a possibilidade de o contribuinte revertido reagir graciosamente a um acto do qual não foi parte e de que, de resto, não teve in casu, conhecimento.
04 - Ainda que mascarada sob a capa da “extemporaneidade” o cerne da questão decidenda reside em saber se os responsáveis subsidiários têm ou não legitimidade para deduzir o procedimento de revisão, quando é certo é que decorre do nº 4 do artigo 22° da LGT que as faculdades de impugnação graciosa e judicial do acto tributário são as mesmas e têm de ser utilizadas nos mesmos termos que devedor principal.
05 - De acordo com a doutrina e com a jurisprudência o acesso à justiça do responsável subsidiário garante-lhe o direito de reclamação da matéria tributável nos mesmos termos do devedor principal, ou seja, não pode recusar-se ao responsável subsidiário as mesmas possibilidades de reclamação e de impugnação judicial que são atribuídas ao devedor originário, pelo que os Alegantes tinham direito a apresentar pedido de revisão da matéria tributável no prazo de 30 dias a contar da data em que for efectuada a citação, acto que equivale à notificação para efeitos do nº 1 do art. 91º da LGT.
06 - Os ora Recorridos apresentaram em tempo o Procedimento de Revisão, conquanto reagiram à determinação da matéria tributável fixada por métodos indirectos no prazo legalmente previsto, assim que dela tiveram conhecimento, i.e., dentro dos 30 dias subsequentes à citação da reversão.
07 - A Fazenda Pública interpreta de forma inconstitucional a articulação dos institutos da responsabilidade tributária e dos meios de reacção à avaliação indirecta, nomeadamente o nº 4 do artigo 22º, o nº 5 do art. 86° e o artigo 91º da LGT, bem como o nº 1 do artigo 117º do CPPT,
08 - quando é certo que o nº 3 do artigo 9º do Código Civil prescreve que “Na fixação do sentido e alcance da Lei o interprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas(…)”
09 - O Procedimento de Revisão deveria ter sido admitido e decidido, pelo que bem andou a Sentença a quo ao julgar que a sua rejeição constitui uma clara preterição de formalidade essencial, e, nos termos do artigo 99° d) do CPPT a determinar a anulação dos actos tributários.
10 - O pedido de revisão da matéria colectável previsto no art. 91º da LGT é um meio gracioso de impugnar a decisão administrativa de fixação da matéria colectável, cuja utilização é obrigatória quando a matéria colectável foi fixada através de métodos indirectos, nos termos dos arts. 87º a 90º daquela lei.
11 - Nessa conformidade, quando, como no caso dos autos, o acto de que se reage resulta da fixação da matéria colectável por métodos indirectos, o contribuinte tem de apresentar previamente o pedido de revisão da matéria colectável, e a Administração Fiscal, nada obstando nos termos do artigo 92º, tem de aceitar o mesmo e despoletar os seus ulteriores termos.
12 - Quanto à questão do efeito suspensivo da liquidação brandido pela Fazenda Pública como óbice sistemática à dedução do pedido de revisão pelos responsáveis subsidiários, comanda a lógica que a eficácia da liquidação em relação ao responsável subsidiário, designadamente para efeitos de impugnação, ficará dependente de um ulterior acto de notificação que comunique àquele a manutenção da liquidação anterior ou a efectivação de uma nova liquidação e o prazo para impugnar, como impõe, o nº 6 do art. 77° da LGT e os nºs. 1 e 2 do art. 36º do CPPT.
13 - Para além de ser condição de impugnação judicial do acto tributário, e portanto uma formalidade essencial prevista na lei, a rejeição do procedimento por parte da A.F. e a tese sufragada no recurso interposto pela F.P. significa a limitação de um direito de reacção do contribuinte legalmente previsto (art. 91° da LGT).
14 - Isto porque o procedimento de revisão previsto no artigo 91º e 92° da Lei Geral Tributária se insere no elenco das garantias dos contribuintes, as quais decorrem, desde logo, dos artigos 20° e 266° e seguintes da Constituição da República Portuguesa, bem como do princípio ao acesso à justiça tributária, prevista no artigo 9° da LGT e dos demais que, nos termos do artigo 55° dessa lei dão forma ao procedimento tributário.
15 - A tese de recurso apresentada pela Fazenda Pública, olvida o teor literal do nº 4 do artigo 22º da LGT, e restringe de forma gravosa, arbitrária e desproporcionada as garantias do contribuinte e o princípio da proporcionalidade, sobretudo em hipóteses - como a dos autos - em que o devedor principal não lançou mão do procedimento de revisão e em que tal circunstância não pode ser oponível aos responsáveis subsidiários, o que redunda numa restrição dos direitos e garantias supra referidos que o artigo 18º da Constituição não consente.
16 - Nesta conformidade, a tese veiculada pela Fazenda Pública viola, para além dos artigos citados na Sentença a quo e que determinaram a anulação do acto, a Lei Fundamental do País.
17 - Em conclusão, a Sentença a quo não merece qualquer censura, já que andou bem ao anular a liquidação adicional em caso, quer pela ilegalidade tout court cometida pela A.F., quer pela preterição da formalidade essencial taxativamente prevista na al. d) do artigo 99º do CPPT.
Terminam pedindo a confirmação do julgado nesta parte.
1.3.1. Por sua vez, no recurso interposto pelos revertidos A… e B… (que interpõem o recurso quanto à parte em que a sentença lhes indeferiu o pedido de reconhecimento do ressarcimento de juros indemnizatórios relativos às liquidações anuladas), formulam eles as seguintes conclusões:
01 - Vem o presente recurso interposto da Douta Sentença proferida no processo 238/04.1BEMDL do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela que julgou parcialmente procedente o pedido formulado pelos impugnantes, concretamente da parte em que indeferiu o pedido de reconhecimento do ressarcimento de juros indemnizatórios relativos às liquidações anuladas.
02 - Porque as correcções de que resultou a liquidação adicional dos autos tiveram a sua origem na avaliação indirecta da matéria colectável os recorrentes deduziram o competente procedimento de revisão cujo exercício, como consta dos autos, veio a ser coarctado pela Administração Fiscal.
03 - Neste sentido, existiu um verdadeiro e próprio erro dos Serviços da Administração Fiscal que significou um vício procedimental que, como decidido na Sentença a quo, redunda na preterição de formalidade essencial com a acertada consequência da anulação dos actos tributários.
04 - Todavia, a Sentença a quo considerou serem indevidos juros indemnizatórios sobre as quantias que, ilegalmente, a A.F. arrecadou a título de imposto, por interpretar o nº 1 do artigo 43º no sentido em que a expressão “erro imputável aos serviços” constante dessa norma não abrange a preterição de formalidades essenciais por parte destes.
05 - Salvo o devido respeito, e desde logo pelo elemento literal do artigo em mérito, não poderá tal interpretação proceder, já que este é suficientemente claro para elucidar o intérprete de que o erro imputável ao serviço é qualquer um que implique o pagamento de tributos que venha a ser considerado inquinado de ilegalidade.
06 - Por outro lado também a interpretação teleológica e sistemática desse normativo tem sentido diverso do adoptado na Sentença em crise: trata-se do contraponto dos juros compensatórios devidos ao Estado e imputáveis ao contribuinte pelo atraso no pagamento dos impostos.
07 - Acresce que o artigo 43° da LGT materializa o comando previsto no artigo 22° da Constituição, prevendo um meio rápido, fácil e cómodo para os interessados obterem ressarcimento dos danos presumidos causados pela actuação da Administração.
08 - Assim, os juros indemnizatórios constituem uma prestação devida automaticamente, ex-leges, assim que declarada a ilegalidade da liquidação, a significar que o Estado Fisco, em caso de procedência (no caso parcial) da impugnação judicial, fica obrigado à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios a contar da data do pagamento até à data devolução do indevido.
09 - Ao assim não decidir, e salvo o devido respeito, o Tribunal a quo interpretou e aplicou incorrectamente ao nº 1 do artigo 43° da LGT e, paralelamente, do artigo 22° da CRP, razão pela qual deverá ser revogada e substituída por decisão que reconheça o direito aos juros indemnizatórios relativos às liquidações anuladas.
SUBSIDIARIAMENTE E SEM PRESCINDIR
10 - No caso de assim não se entender, então a Sentença a quo padece de nulidade (parcial) por omissão de pronúncia.
11 - Com efeito, na lógica da Sentença a quo, o contribuinte só terá direito a juros indemnizatórios se a anulação das liquidações provier da demonstração de «erros sobre os pressupostos de facto ou de direito que levaram a Administração Fiscal a uma ilegal indefinição da relação jurídica tributária».
12 - Neste sentido, se a Sentença anulou (e bem) as liquidações em face da preterição de formalidade essencial, andou mal, em face do pedido e das causas de pedir da impugnação ao tê-lo feito liminarmente, sem mais exame.
13 - Isto porque, o Tribunal a quo absteve-se, perante uma questão formal, de conhecer das questões substanciais que (repete-se: na lógica interna da sentença) seriam determinantes para conhecer a parte do pedido ora em recurso, i.e., deveria ter-se pronunciado sobre se, para além da preterição de formalidade essencial detectada, ficaram demonstrados os erros sobre os pressupostos de facto ou de direito da liquidação que foram alegados na p.i..
14 - Assim, porque a anulação por via da al. d) do artigo 99º do CPPT não prejudicava o conhecimento das demais questões suscitadas pelos impugnantes, e porque essas influiriam com o pedido relativo aos juros indemnizatórios, o Tribunal a quo deveria - na lógica da sentença - ter apurado a ocorrência (ou não) de um erro sobre os pressupostos de facto ou de direito.
15 - Neste enquadramento, não se tendo a Sentença pronunciado sobre o mérito dos fundamentos substanciais vertidos na p.i. está, nessa parte, ferida da nulidade a que se refere na parte final do nº 1 do artigo 125° do CPPT, o nº 2 do artigo 660º e a alínea d) do n°1 do artigo 668° do CPC.
Terminam pedindo que seja revogada a sentença na parte em que indeferiu o pedido relativo aos juros indemnizatórios e substituída por outra que os reconheça e, subsidiariamente, que a sentença seja declarada nula por omissão de pronúncia, com as legais consequências.
1.3.2. Não foram apresentadas contra alegações, quanto a este recurso.
1.4 O MP emite Parecer no sentido da improcedência de ambos os recursos, fundamentando-se no seguinte:
«1. Recurso da Fazenda Pública (485 e segs.): a questão objecto do recurso da Fazenda Pública consiste em saber se os responsáveis subsidiários (ora recorridos) podiam requerer a revisão da matéria tributável apurada através de métodos indiciários na sequência da sua citação e, em caso afirmativo, se a preterição de tal possibilidade tinha relevância na legalidade da liquidação.
Alega a entidade recorrente que, ao contrário do que acontece relativamente à reclamação graciosa e à impugnação judicial, o legislador não previu o momento adequado para o responsável subsidiário abrir o procedimento de revisão, fixando a data a partir da qual o requerimento haveria de ser apresentado;
E que o nº 4 do art. 22° da LGT ao consagrar o direito de reclamação ou impugnação da dívida, tem em vista as formas típicas de reacção contra a ilegalidade dos actos de liquidação, ou seja a reclamação graciosa e a impugnação judicial.
Concluindo que o despacho que indeferiu a abertura do procedimento de revisão, por extemporaneidade, não enferma de qualquer ilegalidade, nem restringe os direitos impugnatórios dos responsáveis subsidiários.
Subsidiariamente, e sem prejuízo, argumenta que se se considerar que a recusa de abertura do procedimento de revisão interposto pelos aqui impugnantes configura vício de forma por preterição de formalidade essencial, tal vício não poderá ter como consequência a anulação a liquidação nos termos da decisão sob recurso.
Afigura-se-nos que não lhe assiste razão.
A questão é efectivamente controversa, por falta de previsão expressa quer da Lei Geral Tributária quer do CPPT, e tanto quanto sabemos, não há jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo sobre a matéria.
Ora a decisão recorrida entendeu que da norma do art. 22 nº 4 da Lei Geral Tributária decorre que o responsável subsidiário pode reclamar e impugnar nos mesmos termos do devedor principal.
E daí concluiu que, se a lei impõe ao devedor principal, como pressuposto da impugnação, o pedido de revisão da matéria tributável, então também o responsável subsidiário, o tem de fazer nos mesmos termos.
Também se nos afigura ser esta a interpretação mais correcta da lei.
Como refere o Cons. Jorge Lopes de Sousa, no seu Código de Procedimento e Processo Tributário, 5ª edição, Vol. 1 pág. 846 «não podendo recusar-se ao responsável subsidiário ou solidário as mesmas possibilidades de reclamação e de impugnação judicial que são atribuídas ao devedor originário, parece que aquele poderá apresentar o pedido de revisão da matéria tributável no prazo de 30 dias a partir da data em que for efectuada a citação, acto que equivale à notificação para efeitos do nº 1 do art. 91º da Lei Geral Tributária».
Por outro lado, como também sublinha aquele autor, decorre do art. 91º, nº 2 da Lei Geral Tributária que a apresentação deste pedido de revisão da matéria tributável tem efeito suspensivo da liquidação, «efeito este que, como ela já foi efectuada (pois serviu de base à instauração do processo de execução fiscal), tem de se reportar à sua eficácia».
Deverá improceder pois, também, a argumentação da Fazenda Pública o sentido de que a recusa de abertura do procedimento de revisão da matéria tributável não poderá ter como consequência a anulação da liquidação.
2. Recurso de A… e B… (fls. 494 e segs.).
A questão objecto do recurso de A… e B… prende-se com a interpretação do conceito de «erro imputável aos serviços» ínsito no art. 43, nº 1 da Lei Geral Tributária, nomeadamente saber se, tal como decidiu a sentença recorrida, se reconduz a um erro sobre os pressupostos de facto ou de direito subjacentes à definição do acto tributário stricto sensu, ou seja à própria liquidação.
Alegam os recorrentes que o erro imputável ao serviço é qualquer um que implique o pagamento de tributos que venha a ser considerado inquinado de ilegalidade.
A nosso ver carecem de razão.
Como se disse no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 09.09.2009, recurso 369/09, a expressão erro imputável aos serviços refere-se a “erro” e não a “vício”, o que inculca que quer relevar os erros sobre os pressupostos de facto ou de direito que levaram a Administração a uma ilegal definição da relação jurídica tributária do contribuinte, não considerando os vícios formais ou procedimentais que, ferindo, embora, de ilegalidade o acto, não implicam, necessariamente, uma errónea definição daquela relação (cf. ainda neste sentido os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 27.06.2007, recurso 80/07, de 21.01.2009 recurso 945/08, e de 1.10.2008, recurso 244/08, todos in www.dgsi.pt e ainda Jorge Lopes de Sousa no seu CPPT anotado, 4 edição, pág. 293).
Esta é, aliás, como refere Jorge Lopes de Sousa, ob. citada a fls. 295 «uma restrição que se compreende. Na verdade, a existência de vícios de forma ou incompetência significa que houve uma violação de direitos procedimentais dos administrados e por isso, justifica-se a anulação do acto por estar afectado de ilegalidade.
Mas, o reconhecimento judicial de um vício daqueles tipos não implica a existência de qualquer vício na relação jurídica tributária, isto é, qualquer juízo sobre o carácter indevido da prestação pecuniária cobrada pela administração tributária com base no acto anulado, limitando-se a exprimir a desconformidade com a lei do procedimento adoptado para a declarar ou cobrar ou a falta de competência da autoridade que a exigiu.
Ora, é inquestionável que, quando se detecta um vício respeitante à relação jurídica tributária, se impõe a atribuição de uma indemnização ao contribuinte, pois a existência desse vício implica a lesão de uma situação jurídica subjectiva, consubstanciada na imposição ao contribuinte da efectivação de uma prestação patrimonial contrária ao direito.
Por isso, justifica-se que, nestas situações, não havendo dúvidas em que a exigência patrimonial feita ao contribuinte implica para ele um prejuízo não admitido pelas normas fiscais substantivas, se dê como assente a sua existência e se presuma o montante desse prejuízo, fazendo-se a sua avaliação antecipada através da fixação de juros indemnizatórios a favor daquele.
Porém, nos casos em que o vício que leva à anulação do acto é relativo a uma norma que regula a actividade da Administração, aquela nada revela sobre a relação jurídica fiscal e sobre o carácter indevido da prestação, à face das normas fiscais substantivas».
O erro imputável aos serviços deve, pois, ser entendido como erro relativo ao apuramento da situação tributária do contribuinte não abrangendo os vícios formais ou procedimentais.
Mas os recorrentes invocam, ainda, subsidiariamente, nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia.
Alegam que o Tribunal a quo se absteve, perante uma questão formal, de conhecer das questões substanciais que seriam determinantes para conhecer a parte do pedido em recurso, e deveria ter-se pronunciado sobre se, para além da preterição de formalidade essencial detectada, ficaram demonstrados os erros sobre os pressupostos de facto ou de direito da liquidação que foram alegados na petição inicial.
Também aqui não deverá proceder a argumentação dos recorrentes.
Com efeito, nos termos do art. 660º do Código de Processo Civil, que versa sobre os deveres de cognição do Tribunal, o juiz tem o dever de conhecer de todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
Dispõe por outro lado o nº 2 do mesmo normativo que o juiz «não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras».
Só ocorre, pois, omissão de pronúncia susceptível de demandar a nulidade de sentença ou acórdão, nos termos dos arts. 660º nº 2 e 668º nº 1 al. d) do CPC, quando o Tribunal deixe de se pronunciar sobre questão submetida pelas partes à sua apreciação e decisão e que se não mostre prejudicada pelo conhecimento e decisão porventura dado a outras.
O que não é o caso dos autos pois que, tendo a sentença recorrida julgado verificar-se preterição de formalidade legal que determinava a anulação da liquidação, ficava prejudicada, por razões de ordem lógica que impunham o conhecimento prioritário de tal vício, a análise dos demais argumentos aduzidos na petição inicial, nomeadamente os relativos a um hipotético erro no apuramento do imposto com base na extrapolação para 1991 do volume de negócios fixado relativamente a 1992.
Improcederá, pois, a arguida nulidade.
Termos em que somos de parecer que devem ambos os recursos ser julgados improcedentes, confirmando-se o julgado recorrido.»
1.5. Colhidos os vistos legais cumpre decidir.
FUNDAMENTOS
2. Na sentença recorrida julgaram-se provados os factos seguintes:
1. Na sequência do despacho de reversão, os ora impugnantes, citados em 07-12-2001 e 11-12-2001, requereram, em 07-01-2002 (fls. 454 dos autos), a revisão da matéria colectável, pedido que foi indeferido por despacho do Sr. Director de Finanças da Direcção de Finanças de Vila Real, datado de 29-01-2002, com o teor que se transcreve:
«Nos termos do n°1 do Art. 91° da LGT, o pedido de revisão da fixação da matéria colectável por métodos indirectos deve ser apresentado no prazo de 30 dias, contados da data da notificação da decisão. No caso concreto, essa notificação foi emitida em 08/05/1996 e a apresentação do pedido de revisão somente em 07/01/2002.
O prazo para requerer, previsto no Art. 91° em causa, é peremptório e de caducidade, vertendo directamente da lei, razão pela qual é improrrogável, fazendo o seu decurso precludir o direito de reclamar, sendo a apresentação extemporânea de reconhecimento oficioso, até à decisão final.
Acresce referir, que os responsáveis subsidiários A… e B…, somente poderão defender-se da fixação (por a devedora principal C…, Lda. o não ter feito antes), pelo accionamento dos mecanismos da reclamação graciosa e ou impugnação judicial contra a liquidação por força da declaração da reversão prevista no art. 159° do C.P.P.T., como decorre da apreciação conjunta do nº 4 do art. 22° e nº 5 do art. 86°, ambos da L.G.T. e alínea c) do art. 102° do C.P.P.T.
Nestes termos, cumpre-me, na qualidade de órgão da administração tributária referido no nº 1 do Art. 91º da LGT reconhecer o pedido em causa foi apresentado para além do prazo legalmente estabelecido no mesmo dispositivo legal, razão pela qual não se encontram reunidos os requisitos legais para a sua apreciação, pelo que, consequentemente, mando arquivar o presente processo sem qualquer decisão, mantendo-se para todos os efeitos a fixação da matéria colectável por métodos indirectos antes efectuada.» - fls. 459.
2. Esta decisão foi notificada aos ora impugnantes em 07-02-2002 - fls. 461 dos autos - por ofício datado de 01-02-2002, com o seguinte teor:
«Ficam V Exas. notificados do despacho de indeferimento de 02/01/29, (...), relativamente ao pedido de revisão de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas e Imposto sobre o Valor Acrescentado do ano de 1991, nos termos do nº 1 do art. 91° da L.G.T., por ter sido considerado que houve apresentação extemporânea do pedido.
Esta decisão não é susceptível de impugnação judicial autónoma, nem de recurso hierárquico, sem prejuízo do direito de reclamação ou impugnação do acto tributário da liquidação, nos termos e fundamentos previstos no Código de Procedimento e de Processo Tributário.» - fls. 633 dos autos.
3. O Imposto sobre o Valor Acrescentado liquidado nos períodos em causa nos autos – 3º e 4º trimestre de 1991 e 1º, 2º e 3º trimestres de 1992 – resultou: a) da fixação de volume de negócios para o ano de 1992; b) da extrapolação para o ano de 1991 do volume de negócios fixado para o ano de 1992; c) não consideração do Imposto sobre o Valor Acrescentado deduzido nas D.P. relativamente a 1991 e 1992 por não terem sido exibidos os documentos de suporte do respectivo imposto.
3. A sentença recorrida, julgando parcialmente procedente a impugnação deduzida, por um lado, anulou a liquidação de IVA do ano de 1991 e, por outro, julgou-a improcedente quanto ao pedido de juros indemnizatórios aos impugnantes.
Para tanto e em síntese, entendeu-se na sentença que, na parte em que vinha impugnada a liquidação, foi preterida formalidade essencial, dado que a AT não poderia ter recusado o pedido de revisão da matéria colectável deduzido pelos ora recorrentes/recorridos, com fundamento na respectiva extemporaneidade, sendo que tal prazo se conta a partir da notificação do devedor principal e que, na parte relativa à questão dos juros indemnizatórios, os vícios decorrentes da violação de formalidades essenciais não se encontrariam abrangidos no conceito de erro imputável aos serviços, pelo que os juros pedidos não são devidos.
Do assim decidido discordam, como se viu, quer a Fazenda Pública, quer os impugnantes.
Vejamos.
A - Do recurso interposto pela Fazenda Pública
4.1. Questão prévia
Na Conclusão 18ª a Fazenda alega que a «recusa em admitir o pedido de revisão, se ilegal, poderia e deveria ter sido objecto de recurso contencioso, nos termos da alínea p) do nº 1 do art. 97° do CPPT, por se tratar de questão tributária que não comporta apreciação da legalidade do acto de liquidação».
Poderia, à primeira vista, considerar-se que estamos perante invocação de questão atinente a erro na forma de processo.
Todavia, não é assim.
Com efeito, a Fazenda não está a afirmar que, no presente caso, se impugnou o acto que recusou o pedido de revisão, por extemporaneidade do mesmo e que, por isso, este deveria ter sido sindicado judicialmente através do competente recurso contencioso (actualmente, de acção administrativa especial). Conjugando, aliás, esta alegação com a também constante da anterior Conclusão 17ª, o que resulta, se bem as interpretamos, é que a Fazenda Pública apenas pretende reforçar o seu entendimento no sentido de que «A ilegalidade do acto tributário» ora invocada, a existir, só poderia ser encontrada no procedimento que originou esse acto tributário e não no acto administrativo posterior e completamente distinto e exterior ao acto de liquidação, e que, se fosse esse o acto administrativo sindicado, a forma adequada para esse efeito seria, então o referido recurso contencioso.
Ou seja, não vem posto em causa que o acto atacado nesta impugnação seja o próprio acto da liquidação do IVA de 1991.
E também da petição inicial resulta claro que é esta liquidação que os impugnantes pretendem sindicar através do presente meio processual, pois que pedem, no que aqui interessa, a anulação «do acto de liquidação do IVA do 3º e 4º trimestres de 1991 e 1º, 2º e 3º trimestres de 1992 e pois que, em termos de causa de pedir, apesar de se referirem à rejeição do pedido de procedimento de revisão, o fazem com a alegação de que tal recusa constitui preterição de formalidade essencial, alegando, igualmente, que houve erro no apuramento do IVA por errada extrapolação para o ano de 1991, dos valores fixados relativamente a 1992 e por não ter sido aceite o IVA dedutível constante das declarações apresentadas pela sociedade devedora originária.
Do exposto resulta, pois, que nem a Fazenda Pública suscita qualquer questão atinente a eventual erro na forma de processo, nem, por outro lado, tal erro se verifica, já que o acto que os impugnantes pretendem ver apreciado judicialmente é o acto tributário da liquidação e com base na invocação de fundamentos próprios da impugnação.
4.2. Quanto ao mérito do recurso
4.2.1. A questão essencial deste recurso é a de saber se os responsáveis subsidiários podem requerer, na sequência da respectiva citação no processo executivo, a revisão da matéria colectável apurada através de métodos indiciários, bem como a data a partir da qual se deve contar o prazo para esse pedido ser formulado.
Trata-se de questão controversa, sobre a qual se pronunciou o recente ac. desta secção do STA, de 17/3/2010, proc. nº 999/09 (processo em que, sendo, aliás, intervenientes as mesmas partes, estava em causa a liquidação de IRC de 1991, também liquidada na mesma data da presente liquidação do IVA) e onde se afirmou que a lei confere aos responsáveis subsidiários tal possibilidade: de requererem a revisão da matéria colectável apurada através de métodos indiciários.
Com efeito, referenciando o Cons. Lopes de Sousa sobre esta matéria (na anotação 13 ao art. 117º do CPPT, anotado e comentado, 5.ª edição, pag. 846) ali se diz que «A resposta a essa questão deve ser afirmativa, sendo que o prazo de 30 dias contar-se-á a partir da data em que foi efectuada a citação, acto esse que equivalerá à notificação para efeitos do n.º 1 do artigo 91.º da LGT, pese embora a ausência de regulamentação expressa tanto na LGT como no CPPT.»
Trata-se, contudo, de solução que não acompanhamos.
4.2.2. O nº 4 do art. 22º da LGT dispõe que «As pessoas solidária ou subsidiariamente responsáveis poderão reclamar ou impugnar a dívida cuja responsabilidade lhes for atribuída nos mesmos termos do devedor principal, devendo, para o efeito, a notificação ou citação conter os elementos essenciais da sua liquidação, incluindo a fundamentação nos termos legais.»
E os nºs 1 e 2 do art. 91º do mesmo diploma dispõem:
«1. O sujeito passivo pode, salvo nos casos de aplicação de regime simplificado de tributação em que não sejam efectuadas correcções com base noutro método indirecto, solicitar a revisão da matéria tributável fixada por métodos indirectos em requerimento fundamentado dirigido ao órgão da administração tributária da área do seu domicílio fiscal, a apresentar no prazo de 30 dias contados a partir da data da notificação da decisão e contendo a indicação do perito que o representa.
2. O pedido referido no número anterior tem efeito suspensivo da liquidação do tributo.»
Ora, é certo que, assegurando a lei aos responsáveis subsidiários o direito de poderem reclamar ou impugnar judicialmente a dívida cuja responsabilidade lhes foi atribuída nos mesmos termos do devedor principal (nº 4 do art. 22º, acima transcrito), então também não poderá deixar de lhes ser assegurado «o direito de impugnação quando pretendam discutir a quantificação da matéria tributável ou a verificação dos pressupostos da sua determinação por métodos indirectos».
Também neste sentido se pronunciam Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa (Lei Geral Tributária, Comentada e Anotada, 3ª edição, Nota 7 ao art. 22º, pag. 129) quando escrevem: «7 - As reclamações a que se reporta o nº 4 deste artigo são a reclamação graciosa (regulada nos arts. 68° a 77° do CPPT), o pedido de revisão do acto tributário (previsto no art. 78° desta Lei) e o pedido de revisão da matéria colectável, regulado nos arts. 91° e 92° desta Lei. (…) Estas faculdades de impugnação graciosa e judicial do acto tributário e de oposição à execução fiscal podem ser usadas cumulativamente, de modo autónomo, com invocação dos fundamentos próprios de cada um desses meios processuais. O pedido de revisão da matéria colectável que se referiu, é um meio gracioso de impugnar a decisão administrativa de fixação da matéria colectável, cuja utilização é obrigatória quando a matéria colectável foi fixada através de métodos indirectos, nos termos dos arts. 87° a 90° desta Lei, e o sujeito passivo pretende impugnar judicialmente um acto tributário com fundamento em erro na quantificação da matéria colectável ou nos pressupostos da utilização de métodos indirectos de avaliação desta (art. 86°, nº 5, desta Lei)».
Para o Cons. Jorge Lopes de Sousa, a lei também confere aos responsáveis subsidiários a possibilidade de requererem a revisão da matéria colectável apurada através de métodos indiciários, no prazo de 30 contados da data em que for efectuada a citação, acto que equivale à notificação para efeitos do nº 1 do artigo 91º da LGT.
Segundo este autor, «Nos casos em que a impugnação judicial depende de prévio pedido de revisão do acto tributável, não é efectuada, antes da citação, qualquer outra notificação ao responsável subsidiário ou solidário que possa constituir o termo inicial do prazo para a apresentação do pedido. Por isso, não podendo recusar-se ao responsável subsidiário ou solidário as mesmas possibilidades de reclamação ou impugnação judicial que são atribuídas ao devedor originário, parece que aquele poderá apresentar pedido de revisão da matéria colectável no prazo de trinta dias a contar da data em que for efectuada a citação, acto que equivale à notificação para efeitos do nº 1 do artigo 91º da LGT. A apresentação deste pedido de revisão da matéria colectável tem efeito suspensivo da liquidação (artigo 92º, nº 2 da LGT, efeito este que, como ela já foi efectuada (pois serviu de base à instauração do processo de execução fiscal) tem de se reportar à sua eficácia.» (Lopes de Sousa, CPPT, loc. cit.)
E é nesta mesma senda que segue o supra referido acórdão do STA, de 17/3/2010, no proc. nº 999/09, onde se conclui que, admitindo-se «o pedido de revisão nestas circunstâncias temporais, a respectiva ilegítima rejeição por parte da Administração Tributária não pode deixar de consequenciar a ineficácia da liquidação, não obstante o vício verificado decorra de uma objectiva preterição de formalidade essencial que a deveria anteceder procedimentalmente, mas que “in casu” cronologicamente se lhe seguiu.
Por outra parte, o princípio da impugnação unitária estatuído no artigo 54º do CPPT determina que os actos interlocutórios de procedimento não são susceptíveis de impugnação contenciosa, salvo no caso de serem imediatamente lesivos dos direitos dos contribuintes e na ausência de disposição expressa em sentido diferente, sendo certo que na notificação que lhes foi feita do indeferimento do pedido de revisão, os responsáveis solidários logo foram advertidos de que essa decisão não era susceptível de impugnação judicial autónoma».
4.2.3. Todavia, este entendimento configura, como se disse, uma solução que não acompanhamos, à luz das normas legais em questão.
Na verdade, do que decorre do nº 4 do art. 22º da LGT, é que as pessoas responsáveis solidária ou subsidiariamente podem reclamar ou impugnar a dívida que lhes é atribuída, nos mesmos termos em que o poderia fazer o devedor principal. Ou seja, poderão reclamar ou impugnar o acto de liquidação que origina essa dívida, nos mesmos termos em que o poderia fazer o sujeito passivo respectivo.
E sendo certo que o art. 65º da LGT consagra um conceito amplo de legitimidade no procedimento tributário, onde cabe a intervenção do próprio responsável subsidiário, é, desde logo, duvidoso que (contrariamente ao alegado pelos recorridos na Conclusão 15ª das suas contra-alegações deste recurso) numa interpretação consentânea com a letra e o espírito do normativo em causa (nº 4 do art. 22º da LGT) tal intervenção esteja contemplada relativamente ao próprio procedimento de revisão, já que este procedimento não tem por objecto o acto de liquidação stricto sensu (a revisão tem características periciais e destina-se à apreciação da correcção da aplicação dos critérios de base técnico-científica em que deve assentar a avaliação da matéria tributável).
Por um lado, admitindo-se a possibilidade de o responsável subsidiário deduzir pedido de revisão da matéria tributável, com o consequente efeito suspensivo da liquidação já efectuada (nº 2 do art. 91º da LGT) e, certamente, já em fase de execução (em regra a responsabilidade subsidiária opera-se com a reversão da execução contra este) estar-se-á, na prática, através da reabertura e prolongamento de um procedimento já findo, a permitir que se esgotem prazos de caducidade do direito à liquidação e a permitir que, mesmo em situações em que o sujeito passivo originário não tenha impugnado um acto de natureza destacável se tivesse então de aceitar que o responsável subsidiário possa ainda impugná-lo depois de citado para pagar o imposto que resultou de um acto firmado na ordem jurídica como caso resolvido, já que, por outro lado, não se vê que uma outra eventual liquidação que venha a operar-se no seguimento da decisão deste pedido de revisão, possa ter-se como liquidação correctiva daqueloutra inicialmente efectuada. Na verdade, embora as als. c) e d) do nº 1 do art. 44º do CPPT e os arts. 78º e 79º da LGT, se refiram à revisão e reforma dos actos tributários ou quaisquer outros actos administrativos em matéria tributária, a liquidação que eventualmente surgisse do procedimento de revisão da matéria tributável apresentado pelo responsável subsidiário, não poderia, face às próprias condições de realização deste procedimento (novos elementos aportados, outros prazos, outros intervenientes, etc.) considerar-se como consubstanciando o mesmo acto de liquidação inicial e apenas depurado, agora, das eventuais imperfeições e vícios que afectassem aquele [a liquidação correctiva opera a sanação por reforma da liquidação inicial, retroagindo os seus efeitos à data do acto reformado (art. 137º, nº 4 do CPA), sendo que «em vez de se revogar o acto que está ferido de ilegalidade, ele é depurado das suas imperfeições iniciais e mantido (total ou parcialmente) na ordem jurídica, técnica que deve ser considerada como manifestação do princípio do aproveitamento do acto administrativo» (Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e Pacheco Amorim, Código de Procedimento Administrativo comentado, pág. 663)].
4.2.4. De todo o modo, ainda que se possa admitir que a lei contempla tal intervenção do responsável subsidiário mesmo relativamente ao procedimento de revisão, esta só se compreenderá se e enquanto o procedimento se encontrar a decorrer e a matéria tributável não se encontrar definitivamente fixada, e com aceitação da fase em que o procedimento se encontrar no momento da intervenção.
Julgamos, todavia, que, como aponta o Dr. Lima Guerreiro (Lei Geral Tributária, Anotada, Nota 13ª ao art. 91º, pags. 390/391) embora o acesso à justiça por parte do responsável subsidiário lhe garanta o direito à reclamação da matéria tributável, nos mesmos termos do devedor principal, esse direito tem que ser exercido com as adaptações necessárias aos casos em que tal aplicação se opere, nos termos do citado nº 4 deste art. 22º da LGT: «caso tivesse aptidão para iniciar a realização do debate instrutório previsto no presente artigo, o requerimento desse debate não poderia ter por natureza efeitos suspensivos de liquidação, uma vez que esta já foi efectuada. Alternativamente (…) (e é essa a solução que mais adere à letra da lei), o responsável subsidiário deve poder reclamar ou impugnar a liquidação com base na errónea aplicação e quantificação da matéria tributável por métodos indirectos, apesar de o devedor principal não ter solicitado o procedimento de revisão previsto na presente lei.»
Assim, face, por um lado, ao disposto no nº 5 do art. 86° da LGT e no nº 1 do art. 117° do CPPT (que condicionam, no processo de impugnação deduzido contra o acto de liquidação, a discussão da quantificação e dos pressupostos da determinação indirecta da matéria tributável à prévia revisão dessa matéria) e face, por outro lado, à necessidade de garantir a impugnação dos actos tributários lesivos de direitos ou interesses legalmente protegidos (cfr. o art. 268º, nº 4, da CRP), entende-se que, tal como a recorrente Fazenda Pública invoca (cfr. as conclusões 9ª, 10ª e 13ª do respectivo recurso) numa interpretação consentânea com as disposições das normas legais aqui em causa e que, sem ofender o regime legal aplicável, é a que melhor se coaduna com direito à obtenção de tutela jurisdicional efectiva dos direitos legalmente protegidos dos cidadãos, os responsáveis subsidiários não podiam, no caso, deduzir o pedido de revisão da matéria tributável, embora pudessem ser admitidos a reclamar ou impugnar a dívida sem aquele condicionamento.
E, neste sentido, porque não existe obstáculo a que o responsável subsidiário reclame ou impugne judicialmente a liquidação, mesmo quando invoque errónea aplicação e quantificação da matéria tributável por métodos indirectos, apesar de o devedor principal não ter solicitado o procedimento de revisão, improcedem também as Conclusões das contra-alegações dos recorridos.
4.2.5. A esta luz e retornando agora ao caso dos autos, logo resulta que, independentemente de o pedido de revisão da matéria tributável ter sido apresentado dentro dos 30 dias a contar da citação dos revertidos (ora impugnantes) – foram citados em 7/12/2001 e 11/12/2001 e deduziram o pedido de revisão em 7/1/2002 (cfr. nº 1 do Probatório) – o despacho que não admitiu tal pedido, por o considerar extemporâneo, aplicou correctamente a lei, não ocorrendo, portanto, a preterição da formalidade essencial em que a sentença fez assentar a decisão de anulação da liquidação de IVA de 1991.
A sentença incorre, assim, no erro de julgamento que lhe é imputado pela recorrente Fazenda Pública, determinante da respectiva revogação nesta parte.
Porém, uma vez que na petição inicial os impugnantes também suscitaram, como fundamento da impugnação, as questões atinentes ao erro no apuramento do IVA por errada extrapolação para o ano de 1991, dos valores fixados relativamente a 1992 e por não ter sido aceite o IVA dedutível constante das declarações apresentadas pela sociedade devedora originária, e tais questões não foram apreciadas (por implicitamente prejudicadas face à procedência da questão atinente à alegada preterição da formalidade essencial), impõe-se a baixa dos autos à instância para que as mesmas ali sejam apreciadas, face, até, à insuficiência factual do Probatório a este respeito.
5. E pela procedência deste recurso fica necessariamente prejudicada a apreciação do recurso ora também interposto pelos recorrentes A… e B…, relativamente a todas as questões nele formuladas.
DECISÃO
Nestes termos acorda-se:
- Em dar provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública e, consequentemente, revogar a sentença recorrida.
- Em ordenar a baixa dos autos à 1ª instância para apreciação dos restantes fundamentos da impugnação.
- Em não tomar conhecimento do recurso interposto pelos recorrentes A… e B…, por ter ficado necessariamente prejudicado em face da procedência do recurso interposto pela Fazenda.
Custas pelos recorrentes A… e B…, por terem contra-alegado, com procuradoria de 1/6.
Lisboa, 28 de Abril de 2010. - Casimiro Gonçalves (relator) - Dulce Neto - Alfredo Madureira.