Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01600/17.5BEBRG
Data do Acordão:12/16/2021
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:TERESA DE SOUSA
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
REVISTA
AJUDAS COMUNITÁRIAS
PROGRAMA
PRESCRIÇÃO
Sumário:Não é de admitir revista se as questões suscitadas nesta sede não foram submetidas à apreciação do Tribunal recorrido, apenas se visando no presente recurso questões nunca antes submetidas à apreciação do Tribunal de 2ª instância, sendo, portanto, questões novas, pelo que a revista agora interposta é inviável.
Nº Convencional:JSTA000P28723
Nº do Documento:SA12021121601600/17
Data de Entrada:11/22/2021
Recorrente:INSTITUTO DE FINANCIAMENTO DA AGRICULTURA E PESCAS, I.P. – IFAP
Recorrido 1:A...........
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal Administrativo


1. Relatório
Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas, IP (IFAP), vem interpor recurso de revista, nos termos do art. 150º do CPTA, do acórdão proferido pelo TCA Norte, em 02.07.2021, que negou provimento ao recurso que interpusera da sentença do TAF de Braga que julgou procedente a acção interposta por A………………, contra o aqui Recorrente, impugnando o acto de rescisão contratual e o pedido de reposição de quantia.
Alega que a revista é necessária para uma melhor aplicação do direito.

Não foram apresentadas contra-alegações.

2. Os Factos
Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

3. O Direito
O art. 150º, nº 1 do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo “quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de uma importância fundamental” ou “quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”.
Como resulta do próprio texto legal, e a jurisprudência deste STA tem repetidamente sublinhado, trata-se de um recurso excepcional, como, aliás, o legislador sublinhou na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando o preceito como uma “válvula de segurança do sistema”, que só deve ter lugar, naqueles precisos termos.

O Autor intentou a presente acção administrativa contra o IFAP, aqui Recorrente, impugnando o acto de rescisão do contrato celebrado entre ambos, no âmbito do PROMAR – Investimentos a Bordo e Seletividade – Equipamentos e Trabalhos de Modernização, no qual se candidatou a um subsídio para a modernização da embarcação de pesca local, que foi aprovado pelo Réu, dando lugar à celebração daquele contrato de financiamento, tendo como despesa elegível a totalidade da despesa apresentada, concedendo ao A. o financiamento de €13.130,00.

O TAF de Braga por sentença de 30.04.2019, julgou acção procedente, por ter entendido que dívida resultante do reembolso exigido estava prescrita. E por o Réu ter concluído, liminarmente e sem mais averiguações, que os valores declarados pelo Autor, para efeitos de financiamento não foram os reais, determinando-lhe a devolução da totalidade do montante pago.

O TCA confirmou esta decisão, negando provimento ao recurso do aqui Recorrente.
O Recorrente na apelação invocou, no que respeita à prescrição, o regime do Regulamento (CE EURATOM) nº 2988/95 – art. 3º, nº 1 -, alegando que as regras gerais naquele preceito consagradas, comportam excepções, nomeadamente, quando se está perante programa plurianual, em que o prazo de prescrição do procedimento corre “…até ao encerramento definitivo do programa”. Além de que existiram actos que interromperam a contagem do prazo de prescrição do procedimento. Razões pelas quais não teria ocorrido a prescrição
A este propósito disse-se no acórdão o seguinte: “(…), a circunstância de ser um projeto plurianual em nada altera a conclusão tomada quanto à prescrição, porquanto o que decorre do artigo 3º do Regulamento CE nº 2988/95 é que o prazo, nestes casos, corre até ao encerramento do projeto (ou seja, caso este prazo seja maior que os quatro anos de prazo de prescrição regra – o que aqui não sucede pois o encerramento ocorreu em 31 de dezembro de 2013).
Por outro lado, como resulta da matéria provada, a primeira vez que o Autor teve efetivo conhecimento do que estava em causa, não foi quando foi agendada a visita de fiscalização, nem quando houve a efetiva visita, mas apenas quando o Autor foi notificado do facto provado n.º 3 (ofício de 30.09.2016, que notificou o Recorrido, da intenção de se lhe determinar a reposição do subsídio).
Assim, ao contrário do que conclui o Recorrente [cfr. conclusão S)], basta compulsar a matéria de facto para constatar que não existem atos notificados ao Recorrido, visando instruir e instaurar procedimento por irregularidade, que tenham interrompido a contagem do prazo de prescrição do procedimento.
Quanto às conclusões T) e U) onde o Recorrente tenta aplicar in casu um prazo de prescrição de 8 anos, também improcedem.
O Recorrente baseia-se na norma do artigo 3º do Regulamento CE n.º 2988/95 que estabelece que “(…) a prescrição tem lugar o mais tardar na data em que termina um prazo igual ao dobro do prazo de prescrição sem que a autoridade competente tenha aplicado uma sanção”. E no facto de, na situação em apreço, se constar que entre 23.10.2013 (data da celebração do contrato) e 19.05.2017 (data em que foi proferida a decisão final) não decorreram 8 anos.
Mas não tem razão. (…)
O que a norma em causa pretende significar é que, pese embora as interrupções que possam ocorrer, os prazos de prescrição que se iniciem em função destas, não podem ultrapassar a data em que termina um prazo igual ao dobro do prazo inicial de prescrição.
Não tem, portanto, aplicação no caso concreto.
No caso, não resulta da matéria de facto que o Recorrido tenha sido notificado de qualquer ato suscetível de ter interrompido a prescrição durante os 4 anos que se seguiram à irregularidade eventualmente cometida.
Tendo a eventual irregularidade ocorrido entre 03.09.2011 e 03.11.2011, à data do ofício de 30.09.216, que notificou o Recorrido da intenção de se lhe determinar a reposição do subsídio, já o procedimento estava prescrito, sendo inexigível a reposição do subsídio.
Estando já ultrapassado o prazo de prescrição para a reposição de ajuda decorrente de financiamento, o ato impugnado é anulável, não sendo devida a devolução da quantia referida.
Fica prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas no recurso.

Na sua revista o recorrente, pese embora, alegar que o acórdão recorrido fez uma incorrecta interpretação dos factos e do direito aplicável, nenhum erro imputa ao concretamente decidido no acórdão. O que alega é que haveria que ter em conta o prazo de 5 anos previsto agora no nº 4 do art. 168º do CPA/2015 e que estaríamos perante irregularidades repetidas e continuadas que nunca foram sanadas.
O recurso é o meio de impugnação das decisões judiciais, destinando-se a permitir que o tribunal superior proceda à reponderação das decisões recorridas. O que pressupõe que a questão objecto do recurso já foi apreciada na decisão recorrida (salvo em matérias de conhecimento oficioso), visando o recurso apreciar a sua manutenção, alteração ou revogação, devendo a parte que recorre impugnar os fundamentos da decisão recorrida, dizendo em que medida a apreciação que foi feita das questões a dirimir padece de erro (cfr. arts. 627º, nº 1, 635º, nºs 2, 3 e 4 e 639º, todos do CPC, aplicável ex vi do art. 140º, nº 3 do CPC).
Ora, a questão da aplicação do Regulamento (CE EURATOM) nº 2988/95, no que se refere à existência irregularidades repetidas ou continuadas não foi suscitada pelo Recorrente na sua apelação, pelo que o Tribunal a quo não pode apreciá-la. E muito menos o foi a aplicação do art. 168º, nº 4 do CPA/2015 ao caso em presença.
Assim sendo, uma vez que as questões suscitadas em sede de revista não foram submetidas à apreciação do Tribunal recorrido, apenas se visando no presente recurso questões nunca antes submetidas à apreciação do Tribunal de 2ª instância, sendo, portanto, questões novas, a revista agora interposta é inviável, não devendo ser admitida.
Nestes termos, tendo o acórdão recorrido decidido, ao que tudo indica de forma correcta, as questões submetidas à sua apreciação no recurso de apelação, não se justifica a intervenção deste STA, com postergação da regra da excepcionalidade da revista.

4. Decisão
Pelo exposto, acordam em não admitir a revista.
Custas pelo Recorrente.

Lisboa, 16 de Dezembro de 2021. – Teresa de Sousa (relatora) – Carlos Carvalho - José Veloso.