Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0711/12
Data do Acordão:03/06/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:DULCE NETO
Descritores:RESPONSÁVEL SUBSIDIÁRIO
PAGAMENTO DA DÍVIDA EXEQUENDA
OPOSIÇÃO FISCAL
Sumário:I - A inutilidade superveniente da lide de oposição à execução fiscal só pode ocorrer nas situações em que seja o devedor originário a pagar a dívida exequenda, e não já naquelas em que a oposição é o único meio processual que os oponentes/revertidos dispõem para atacar a ilegalidade do despacho de reversão por violação do disposto nos artigos 23.º e 24.º da LGT e 153.º do CPPT, devendo o artigo 9.º nº 3 da LGT ser interpretado no sentido de incluir a oposição como forma de atacar a ilegalidade do acto de reversão.
II - Sendo o pagamento da dívida efectuado pelo responsável subsidiário para beneficiar da isenção de custas e multa nos termos do artigo 23.º n.º 5 da LGT, esse pagamento, que nem sequer implica a extinção da execução fiscal (n.º 6 do art.º 23º da LGT), não provoca a preclusão do seu direito de impugnar o despacho de reversão, não podendo extinguir-se a oposição com fundamento em inutilidade superveniente da lide.
Nº Convencional:JSTA00068159
Nº do Documento:SA2201303060711
Data de Entrada:06/25/2012
Recorrente:A......
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF PORTO
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL - OPOSIÇÃO
Legislação Nacional:LGT98 ART23 N5 ART9 N3 ART22 N1 ART24 ART23 N6
CPPTRIB99 ART151 ART204 N1 B ART153
CPC96 ART287 E
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0714/09 DE 2009/10/07; AC STA PROC0985/08 DE 2009/03/25; AC STA PROC024/10 DE 2010/05/26; AC STA PROC0421/12 DE 2011/09/07
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO 5ED VOLII PAG89.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:


1. A………, com os demais sinais dos autos, recorre da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que, no âmbito de processo de oposição à execução fiscal contra si revertida para cobrança de dívidas provenientes de IRC, IRS e IMI liquidadas à sociedade B………, Ldª, julgou extinta a oposição por inutilidade superveniente da lide face ao pagamento da dívida exequenda pelo Oponente dentro do prazo para deduzir esta oposição.

Terminou a sua alegação enunciando as seguintes conclusões:
1. O Recorrente não se conforma com extinção da instância por inutilidade superveniente da lide porquanto o Tribunal a quo, salvo o devido respeito, aplicou erradamente o direito.
2. Na sequência da reversão da execução fiscal o único meio processual adequado para o revertido impugnar contenciosamente o despacho que ordena a reversão é o processo de oposição à execução com os fundamentos previstos no artigo 204º do CPPT.
3. Paralelamente, o pagamento voluntário da dívida, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 176º do CPPT, consubstancia uma causa de extinção da execução.
4. Não obstante, de acordo n.º 5 do artigo 23º em conjugação com o n.º 3 do artigo 9.º, ambos da LGT, o pagamento efectuado pelo responsável subsidiário - ut Recorrente — para beneficiar da isenção de custas e multa não implica a preclusão do seu direito de impugnar o acto de liquidação.
5. Neste contexto, considerando que o pagamento da dívida exequenda, no caso sub judice, se verificou no prazo de que o responsável subsidiário, ora Recorrente, dispunha para deduzir oposição à execução fiscal, beneficiando, assim, da isenção de custas e acrescido, o mesmo não tem a virtualidade de precludir o seu direito de ver apreciada a oposição oportunamente deduzida que pretende pôr em causa o despacho de reversão.
6. Neste enquadramento, andou mal o Tribunal a quo ao determinar a extinção da instância com fundamento na inutilidade superveniente da lide em virtude do pagamento voluntário da dívida por parte do responsável subsidiário, ora Recorrente, violando o direito legítimo deste de acesso à justiça tributária.
7. A sentença recorrida violou, assim, o disposto nos n.º 5 do artigo 23º e n.º 3 do artigo 9° da LGT.

Nestes termos, assinalada a ilegalidade da decisão em recurso, não poderá deixar de se reparar a decisão proferida pelo Tribunal a quo, concluindo-se pela revogação da sentença que declarou extinta a presente instância e ordenar a descida dos presentes autos ao Tribunal de 1ª Instância para assim conhecer do mérito da oposição à execução fiscal deduzida pelo ora Recorrente.

Termos em que deverá o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser revogada a Sentença a quo ordenando-se a descida dos presentes autos à 1ª Instância para ser conhecido o mérito da oposição oportunamente deduzida pelo Recorrente. Com o que V. Exas. farão a habitual Justiça.

1.2. A Fazenda Pública (Recorrida) não apresentou contra-alegações.

1.3. O Exmo. Procurador-Geral-Adjunto emitiu douto parecer no sentido de que devia ser concedido provimento ao recurso, na medida em que «(...) parece ser de entender que o recorrente com a oposição que apresentou a 10/5/2010, após a citação efectuada, manifestou ainda pretender impugnar acto que o lesava, designadamente, com base m ilegalidade da reversão por inexistência de fundamentos para aquela.
Sendo então a oposição o tipo de processo adequado para reagir contra aquele acto, o pagamento veio a ser efectuado, parece não implicar a preclusão do direito de impugnar a inexistência dos pressupostos que legitimam a reversão, direito que apenas por aquele meio de oposição podia ser exercido — arts. 151º e 204º n.º 1 al. b) do C.P.P.T., Jorge Lopes de Sousa, in C.P.P.T. anotado e comentado, II volume, 5 .º edição, págs. 455 e ss. e acórdãos de 7/10/2009, processo n2 714/09, de 25/03/2009, processo n2 985/08 e de 4-5-/2011, processo n.2 0982/10.».

1.4. Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Conselheiros Adjuntos, cumpre decidir.

2. A questão que se coloca no presente recurso jurisdicional é a de saber se a decisão recorrida incorreu em erro ao julgar que se verificava a inutilidade superveniente da lide de oposição à execução fiscal revertida contra o Oponente em face do pagamento voluntária da dívida exequenda, efectuado em 14/04/2010, isto é, dentro do prazo legal de que este dispunha para deduzir oposição a essa execução fiscal.

O Meritíssimo Juiz do Tribunal “a quo” julgou que «Resulta dos autos que o processo executivo n.º (...) em causa nos presentes autos, encontra-se extinto relativamente ao revertido, e aqui oponente, desde 20/05/2010, devido ao pagamento da divida exequenda - cf. informação oficial de fls. 18 e documentos de fls. 63 e 65 dos autos.
Ora, estando a execução fiscal já extinta torna-se inútil a prossecução e o conhecimento da lide.
Veja-se a este propósito o douto Acórdão do STA, n.º 638/07, de 05/12/2007. "Efectuado o pagamento da divida exequenda e do acrescido, a execução fiscal extingue-se (arts 264º, n.º 1, e 269º do CPPT). Na verdade, a finalidade da oposição à execução fiscal é apurar se a execução deve ou não prosseguir contra o oponente e, no caso de não poder prosseguir, extinguir ou suspender a execução; extinta a execução fiscal, fica definitivamente assente que a execução não prossegue contra o oponente, pelo que está concretizado o objectivo da oposição.
(...)».
Consequentemente julgo extinta a instância por inutilidade superveniente da lide: art. 287º al. e) do Código de Processo Civil (CPC), ex vi do art. 2° al. e) do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).

Ora, da informação oficial de fls. 18 e dos documentos de fls. 63 e 65, citados na decisão recorrida, não consta que a execução fiscal tenha sido totalmente extinta, mas que, face ao pagamento efectuado pelo Oponente antes da instauração da oposição, a execução se extinguiu somente contra este revertido, tendo o processo executivo sido posteriormente declarado em falhas. O que significa que a execução terá prosseguido para a cobrança dos juros de mora ainda em dívida e das custas processuais, tal como, aliás, é imposto pela norma contida no n.º 6 do art.º 23º da LGT.
A decisão incorreu, pois, em erro ao julgar que ocorrera a extinção da execução fiscal e ao concluir, com base nesse pressuposto, que a oposição se tornara inútil.
Por outro lado, embora o pagamento voluntário da dívida possa acarretar a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, o certo é que, como esclarece JORGE LOPES DE SOUSA, no “Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado”, 5ª Ed., II vol., pág. 89, e tem sido confirmado pela jurisprudência que entretanto se consolidou neste Supremo Tribunal (Cfr., entre outros, os acórdãos proferidos em 7/10/2009, em 25/03/2009, em 26/05/2010, e em 7/09/2011, nos Processo nºs 714/09, 985/08, 24/10 e 421/12.), o pagamento efectuado pelo responsável subsidiário, dentro do prazo de oposição, para beneficiar da isenção de custas e multa nos termos do artigo 23.º, n.º 5 da LGT, não implica a preclusão do seu direito de impugnar o acto de liquidação e de reversão, nos termos do n.º 3 do artigo 9.º da LGT, que expressamente estabelece que «o pagamento do imposto nos termos da lei que atribua benefícios ou vantagens no conjunto de certos encargos ou condições não preclude o direito de reclamação, impugnação ou recurso, não obstante a possibilidade de renúncia expressa, nos termos da lei». O pagamento efectuado pelo responsável subsidiário dentro do prazo da oposição enquadra-se na previsão desta norma, já que a isenção de juros de mora e custas que o artigo 22.º, n.º 1, da LGT inclui no âmbito da responsabilidade subsidiária constitui, como qualquer isenção, um benefício.
Por conseguinte, a inutilidade da lide só faz sentido nas situações em que seja o devedor originário a pagar a dívida, mas não já naquelas em que, como no caso dos autos, o processo de oposição é o único meio processual que os oponentes/revertidos dispõem para atacar a ilegalidade do despacho de reversão, por violação do disposto nos artigos 23.º e 24.º da LGT e 153.º do CPPT, devendo o artigo 9.º nº 3 da LGT ser interpretado no sentido de incluir a própria oposição à execução como forma de atacar a ilegalidade do acto que ordenou a reversão contra os legais representantes da sociedade executada a título principal.
Em suma, o pagamento efectuado pelo Oponente para beneficiar de isenção de custas e acrescido não tem a virtualidade de precludir o seu direito de ver apreciada a oposição, não podendo manter-se a decisão recorrida que assim não entendeu.

3. Face ao exposto, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do STA em conceder provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida e ordenar a baixa dos autos à 1ª instância para, após fixação da matéria de facto pertinente, conhecimento das questões suscitadas na oposição.
Sem custas.
Lisboa, 6 de Março de 2013. - Dulce Manuel Neto (relatora) - Isabel Marques da Silva - Lino Ribeiro.