Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01089/09.2BEPRT
Data do Acordão:02/16/2022
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANABELA RUSSO
Descritores:COMPETÊNCIA HIERÁRQUICA
Sumário:I - A competência em razão da hierarquia para conhecer recurso jurisdicional de decisão dos Tribunais Tributários de 1.ª instância cabe, em regra, aos Tribunais Centrais Administrativos, dado que o Supremo Tribunal Administrativo apenas goza dessa competência quando o recurso tiver por exclusivo fundamento matéria de direito [conforme, conjugadamente, artigos 26.º, alínea b), e 38.º, alínea a), do ETAF, e art. 280.º, n.º 1, do CPPT).
II - Se no recurso a Recorrente põe em causa a valoração da prova testemunhal, invoca factos dados como não provados na sentença recorrida e questiona o juízo fáctico formulado na sentença, pretendendo, em qualquer dos casos, daí extrair relevante consequência jurídica, é de considerar que o recurso não tem por fundamento exclusivo matéria de direito.
Nº Convencional:JSTA000P28980
Nº do Documento:SA22022021601089/09
Data de Entrada:02/26/2021
Recorrente:A............... SGPS, S.A.
Recorrido 1:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
ACÓRDÃO

1. RELATÓRIO

1.1. “A……………, SGPS, S.A.”, inconformada com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou parcialmente improcedente a impugnação judicial que apresentou contra a liquidação de IRC, relativa ao exercício de 2004, e respectivos juros compensatórios, no montante global de € 580.844,30, interpôs recurso jurisdicional para este Supremo Tribunal Administrativo.

1.2. Admitido o recurso, foram juntas as respectivas alegações, encerradas com o seguinte quando conclusivo:

«A. O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial da liquidação adicional de IRC nº 2008 8310039480 relativa ao exercício de 2004 e da inerente liquidação de juros compensatórios nº 2008 00007150535.

B. Para tanto, o Tribunal a quo considerou, a propósito indispensabilidade do custo/perda, em suma que:

(i) Quando existe perda de metade do capital social de uma empresa, não é obrigatório que se realize um aumento de capital, podendo ser adotadas outras medidas, nomeadamente a dissolução da sociedade, sendo que à luz da experiência comum e do bom senso, é de estranhar que a B………….. decida aumentar o capital da C………….., que estava inativa desde 1998, no montante de EUR 19.001.250,00, para passados dois meses decidir liquidar e dissolver a C…………., apurando uma perda no valor do prévio aumento de capital;

(ii) A Recorrente não demonstrou que a intenção da B…………, com a realização do aumento do capital da C…………, era manter essa sociedade ativa;

(iii) A transferência bancária do valor do aumento de capital (EUR 19.001.250,00) da conta da B…………. para a C…………. foi seguida, passados uns minutos, da transferência do mesmo valor da conta da C…………. para a B…………, para saldar uma dívida, precludindo a ideia de que o aumento de capital serviria para manter a sociedade ativa ou para a tentar recuperar;

(iv) Não resulta provado que a dissolução da C………… se deveu à realidade económico-financeira da sociedade ou à crise do setor de atividade.

Da nulidade da sentença por omissão de pronúncia:

C. Pese embora o Tribunal a quo tenha afastado a necessidade de aplicação da cláusula geral anti-abuso para a AT empreender a correção em causa, na fundamentação da decisão recorrida perpassa a ideia de que estamos perante um “esquema”, um mecanismo artificioso de que as partes envolvidas teriam lançado mão para obter, na esfera da B…………., um qualquer benefício ou redução da carga fiscal resultante da menos-valia fiscal que veio a ser apurada.

D. Tal ideia não corresponde à realidade dos factos e ter-se-á devido, seguramente, ao facto de o Tribunal a quo não se ter pronunciado sobre uma questão fundamental levantada nos autos pela Impugnante de saber se: caso a B……….. tivesse optado por alguma das outras alternativas previstas no artigo 35º do CSC, nomeadamente pela dissolução imediata da C……….., as consequências fiscais na esfera da B……….. teriam sido diferentes?

E. Em sede de impugnação judicial, a Recorrente expôs esta situação, indicando, expressamente, na petição inicial que, ainda que a B………… tivesse optado pelas alternativas previstas no artigo 35º do CSC, entre as quais a apontada dissolução imediata da C…………., as consequências fiscais na esfera da B…………. teriam sido idênticas.

F. Esta questão não foi, inexplicavelmente, objeto de pronúncia na sentença aqui posta em crise, pois da leitura da mesma não resulta em momento algum qualquer análise ou explicação sobre quais as razões existentes para não se conhecer da questão.

G. Para além de não se ter pronunciado sobre esta questão levantada pela Recorrente na petição inicial a respeito desta matéria, o Tribunal a quo também não valorou a prova testemunhal produzida a este propósito, porquanto não estávamos perante um “facto”, mas antes, no entendimento daquele Tribunal, de meras opiniões/juízos de valor.

H. O Tribunal a quo (i) não tomou uma posição sobre a apontada questão colocada pela Impugnante; (ii) não emitiu uma decisão no sentido de dela não poder tomar conhecimento; (iii) não indicou razão – boa ou má – para justificar essa abstenção de conhecimento; e (iv) da sentença também não resulta, de forma expressa ou implícita, que esse conhecimento tenha ficado prejudicado em face da solução dada ao litígio (bem pelo contrário, pois a solução dada ao litígio impunha o seu conhecimento).

I. A sentença recorrida padece, nesta parte, de nulidade por falta ou omissão de pronúncia, nos termos do disposto no nº 1 do artigo 125º do CPPT e da alínea d) do nº 1 do artigo 615º do CPC, aplicável ex vi alínea e) do artigo 2º do CPPT, o que aqui expressamente se vem arguir, nos termos do nº 4 do mesmo artigo 615º CPC.

Do erro de julgamento: da aceitação da correção relativa à desconsideração da menos-valia decorrente da dissolução da sociedade C……….., no montante do aumento de capital:

J. No exercício de 2004, o capital próprio da C……….. era inferior a metade do capital social – cf. facto provado previsto na alínea R) da sentença aqui recorrida.

K. Em face da obrigação legalmente imposta decorrente do artigo 35º do CSC, a B………… procedeu, no dia 7 de julho de 2004, ao aumento de capital da sociedade C………… no montante de EUR 19.001.250,00 – cf. facto provado previsto na alínea S) da sentença aqui recorrida.

L. A B………… havia efetuado empréstimos à C…………. ao longos dos anos que, nesse ano de 2004, ascendiam a um total de, aproximadamente, EUR 19.000.000,00 – cf. alínea P) dos factos provados da sentença recorrida.

M. Com o aumento de capital, os empréstimos realizados à C……….. foram reembolsados, conforme evidenciado nos movimentos contabilísticos discriminados nas páginas 15 e 16 da sentença recorrida e, bem assim, conforme movimento relatado na alínea T) dos factos provados

N. O Tribunal a quo não teve em consideração o facto – que deu como provado –, de que existia uma dívida acumulada da C………… à B………… no montante de aproximadamente EUR 19.000.000,00, não tendo daí retirado a devida conclusão jurídica de que, em virtude dessa dívida e caso a mesma não fosse saldada, o cenário de dissolução, perante a situação deficitária em que a C………… se encontrava, sempre geraria um gasto equivalente fiscalmente dedutível na esfera da B……….

O. Se a B……….. tivesse optado pela dissolução imediata da C……….. sem ter realizado o aumento de capital, o ativo social da C………. não seria suficiente para satisfazer o passivo da sociedade (nomeadamente, os financiamentos de cerca de EUR 19.000.000,00 concedidos pela B……….. ao longo dos anos), pelo que o liquidatário deveria apresentar a C……… à insolvência, sendo certo que, no âmbito do processo de insolvência, os créditos de sócios sobre a sociedade são qualificados como subordinados, i.e., o seu pagamento só tem lugar depois de integralmente pagos os créditos comuns.

P. Em virtude da insuficiência do ativo social da C……….., a B………… não lograria obter o reembolso dos financiamentos efetuados ao longo dos anos à C………. que, assim, configurariam créditos incobráveis que seriam diretamente considerados custos ou perdas do exercício da B……….. na medida em resultariam de processo de insolvência.

Q. A adoção de outra medida alternativa ao aumento de capital, nomeadamente, a opção pela dissolução imediata da C………….. que o próprio Tribunal a quo aponta para fundamentar a sua decisão de indeferimento, sempre redundaria na obtenção de um custo fiscalmente dedutível na esfera da B………… de montante equivalente, em face do montante de empréstimos em dívida.

R. A decisão recorrida erra, assim, na interpretação que retira dos factos que deu como provados, nomeadamente, dos factos constantes das alíneas P) e R), ao concluir que não era inevitável ou mesmo necessário incorrer na perda em causa e que, por conseguinte, a menos-valia em questão não podia ser aceite ao abrigo do artigo 23º do Código do IRC.

S. O Tribunal a quo dá igualmente como provado que o aumento de capital de EUR 19.001.250,00 resultou do deliberado na ata da assembleia geral da sociedade C………., realizada em 5 de julho de 2004, cujo teor transcreve ao acolher o RIT – cf. alínea K) dos factos provados, página 13 da sentença aqui recorrida.

T. É a própria decisão do primeiro aumento de capital, reproduzida na alínea K) dos factos provados, que refere – de forma direta e transparente – que: ou se realiza um novo aumento de capital no prazo de 90 dias de modo a viabilizar a C……… ou se dissolve e liquida a empresa até ao final desse ano de 2004.

U. Igualmente, o Tribunal a quo mais acolhe, na alínea K) dos factos provados, em linha com o apurado no RIT, que, na ata de dissolução, ficou patente que a C…………registava “capitais próprios negativos na ordem de € 26.842.366,00” e verificou-se “a indisponibilidade financeira e estratégica da accionista para suprir o défice financeiro da sociedade e para a dotar dos meios necessários ao desenvolvimento da sua actividade operacional”, pelo que foi proposta a dissolução da C……….

V. Tendo o primeiro aumento de capital servido para reembolsar os empréstimos realizados à C……….., necessariamente aliviou ou diminuiu o passivo desta empresa – no montante aproximado de EUR 19.000.000,00 (sendo medianamente claro que uma diminuição do passivo é um passo que contribui para a viabilização de qualquer sociedade).

W. Acresce que a B………… sempre registaria uma perda fiscalmente aceite por referência ao valor desses empréstimos, se não tivesse sido realizado o aumento de capital que os permitiu reembolsar.

X. Erra o Tribunal a quo na interpretação dos factos apurados no RIT e reproduzidos na alínea K) da matéria assente da sentença recorrida, ao parecer concluir que o aumento de capital e decisão de dissolução da C………… teriam tido outro propósito que não o propósito empresarial (business purpose test) da B…………

Y. O artigo 23º do Código do IRC, na redação em vigor à data dos factos, considerava como custos ou perdas para efeitos fiscais os que comprovadamente fossem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.

Z. Decorre pacífica e reiteradamente da doutrina e da jurisprudência que, para que um gasto seja considerado dedutível, é bastante que seja uma despesa com fim empresarial, o que não quer dizer uma despesa que tenha um fim imediata e diretamente lucrativo, sendo, contudo, indispensável que tenha, na sua origem, e na sua causa o interesse específico da empresa (business purpose test).

AA. Resulta igualmente da doutrina e da jurisprudência que a AT não pode sindicar a bondade das decisões de gestão dos contribuintes para aferir da dedutibilidade de um custo para efeitos fiscais.

BB. Reservando a B……….., desde logo, ab initio, para momento subsequente a decisão quanto à realização de novo aumento de capital ou à dissolução da C……….., e tendo concluído em momento ulterior que, atendendo à sua indisponibilidade financeira para realizar novo aumento de capital e, bem assim, aos seus objetivos estratégicos, seria de avançar para a dissolução da C…………. (ao invés de realizar um novo aumento de capital), tal decisão configura, inequivocamente, uma decisão de gestão imbuída de claro propósito empresarial.

CC. Não se vislumbra como é que a AT (e o Tribunal a quo), a pretexto de aferirem da dedutibilidade fiscal de uma menos-valia, podem sindicar a bondade das opções de gestão de uma sociedade que, numa primeira fase, perante uma situação de perda de metade do capital social de uma participada, efetua um aumento de capital inicial, permitindo o reembolso de empréstimos realizados e o inerente desoneração de passivo, postergando, conforme deliberado em Assembleia Geral, a decisão sobre novo aumento de capital social ou sobre a dissolução da participada para momento posterior, e nesse momento subsequente, ponderada a sua indisponibilidade financeira e os seus objetivos estratégicos, conforme também resulta de deliberação da Assembleia Geral, opta, de entre as duas opções previamente consideradas, pela dissolução da sociedade participada.

DD. A AT (e o Tribunal a quo, ao apreciar a correção efetuada) não estão autorizados a analisar a conveniência da opção pelo aumento de capital tomada pela B………… face às restantes opções previstas no artigo 35º do CSC.

EE. Ao fazer passar pelo crivo do artigo 23º do Código do IRC a opção prosseguida pela B…………. com o aumento de capital da C……….. e ao apontarem a opção pela dissolução imediata como alternativa a seguir, a AT (e o Tribunal de primeira instância) avaliam e imiscuem-se na gestão empresarial da B……….. e a oportunidade do negócio, intrometendo-se na liberdade e autonomia de gestão desta empresa, conduta que não é legalmente admitida para efeitos de afastar a dedutibilidade fiscal desta menos-valia.

FF. É a opção de realização de um aumento de capital, reembolso dos empréstimos e ulterior dissolução da sociedade que é questionada pela AT, e não a indispensabilidade da menos-valia emergente da extinção daquela participada.

GG. Ilustrativo disto mesmo é o facto de a AT não ter questionado a dedutibilidade fiscal da totalidade da menos-valia em causa, mas somente a parte da menos-valia que correspondeu ao aumento de capital - cf. alíneas K) e V) da matéria assente em 1.ª instância.

HH. Unanimemente, não pode a AT num juízo a posteriori, avaliar se o negócio ou decisão em questão foi bom ou mau, ou adiantar as hipóteses de rumo que se perfilhavam na altura em que ocorreu a dissolução e afastar o escolhido pela Recorrente, desconsiderando o gasto contabilizado, a coberto do artigo 23º do Código do IRC – Cf. Ac. STA 8.06.2017, proc. 627/16.

II. Se a AT tinha algum motivo para suspeitar que o aumento de capital foi realizado com o intuito de manipular ilegitimamente a matéria tributária da B…………, deveria ter escolhido outro caminho que não o da desconsideração, parcial (ou seja, na parte correspondente ao aumento de capital), da menos-valia, com fundamento na falta de verificação da indispensabilidade exigida pelo artigo 23º do Código do IRC. Para o efeito, se assim entendia, deveria ter aplicado a norma geral anti-abuso já então prevista no artigo 38º da LGT, o que determinaria a abertura de um procedimento próprio para o efeito, nos termos do artigo 63º do CPPT então em vigor, o que não sucedeu.

JJ. A sindicância da opção de gestão assumida pela B…………, para efeitos de aferir da indispensabilidade de uma menos-valia por si realizada e correspondente dedutibilidade fiscal ao abrigo do artigo 23º do Código do IRC, constitui uma inaceitável ingerência nas opções de gestão tomadas pela B…………, sobretudo quando a alternativa proposta de dissolução imediata sempre teria a mesma consequência fiscal.

KK. Ao decidir que a correção relativa à desconsideração da menos-valia como gasto fiscal assim realizada no valor do aumento do capital não merecia censura, a sentença aqui recorrida violou, precisamente, o disposto no artigo 23º do Código do IRC e o critério da indispensabilidade aí previsto, devendo ser revogada em conformidade, com todas as consequências legais, o que se requer.

Da decisão quanto a custas: dispensa do pagamento do remanescente de taxa de justiça:

LL. Tendo em consideração que (i) a decisão da causa foi proferida, na parte relativa aos encargos financeiros, tendo por base jurisprudência anterior que aí vem citada e, na parte relativa à desconsideração da menos-valia, de forma extremamente simples, (ii) em contraponto com o elevado valor da ação, no montante de EUR 580.844,30, dúvidas não poderão restar que o remanescente da taxa de justiça devida no processo pelas partes ascende a um montante que não reflete a complexidade da causa, sendo largamente superior.

MM. Devendo, deste modo, adequar-se o valor da taxa de justiça dos presentes autos aos custos aproximados em concreto, por forma a salvaguardar os valores da proporcionalidade e da justiça distributiva na responsabilização/pagamento das custas processuais, nos termos da segunda parte do nº 7 do artigo 6º do Regulamento das Custas Processuais, requerendo-se que, ao abrigo do nº 3 do artigo 616º do CPC, ex vi alínea e) do artigo 2º do CPPT, aqui seja declarada a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça nos autos por referência à primeira instância, e, bem assim, relativamente também à presente instância de recurso.

1.3 A Autoridade Tributária e Aduaneira, não obstante ter sido notificada da interposição e admissão do recurso não apresentou contra-alegações.

1.4 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo e feita a sua apresentação, com “termo de vista”, à Excelentíssima Procuradora-Geral-Adjunta, foi por esta emitido douto parecer no qual - após rigorosa delimitação legal das competências atribuídas a esta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo e considerando as conclusões de recurso jurisdicional, particularmente as vertidas nas conclusões “N.”, “R.” e “X.” - promove que os autos sejam remetidos ao Tribunal Central Administrativo Norte por ser o competente para conhecer e discutir questões de facto.

1.5. Ordenada a notificação às partes do parecer do Ministério Público e para, querendo, se pronunciarem sobre a questão de incompetência suscitada, apenas a Recorrente o veio fazer, defendendo que as conclusões N., R. e X. das alegações deste recurso traduzem tão só uma interpretação jurídica distinta da factualidade que foi dada como provada nos pontos P), R) e K) da sentença recorrida, constituindo essa “dissonância de interpretação” matéria de direito a apreciar e dirimir pelo STA», mais requerendo, para o caso de assim se não entender, a remessa dos autos ao Tribunal Central Administrativo Norte.

1.6. Cumpre decidir.

2. OBJECTO DO RECURSO

2.1 Como é sabido, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é o teor das conclusões com que a Recorrente finaliza as suas alegações que determina o âmbito de intervenção do tribunal de recurso [artigo 635.º do Código de Processo Civil (CPC)].

Essa delimitação do objecto do recurso jurisdicional, numa vertente negativa, permite concluir se o recurso abrange tudo o que na sentença foi desfavorável ao Recorrente ou se este, expressa ou tacitamente, se conformou com parte das decisões de mérito proferidas quanto a questões por si suscitadas (artigos 635.º, n.º 3 e 4 do CPC), desta forma impedindo que voltem a ser reapreciadas por este Tribunal de recurso. Numa vertente positiva, a delimitação do objecto do recurso, especialmente nas situações de recurso directo para o Supremo Tribunal Administrativo, como é o caso, constitui ainda o suporte necessário à fixação da sua própria competência, nos termos em que esta surge definida pelos artigos 26.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF) e 280.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).

2.2. No caso concreto, tendo por referência o que ficou dito, são três as questões a decidir:

- Da nulidade da sentença por omissão de pronúncia, por não ter conhecido de questão submetida à sua apreciação na petição inicial e traduzida em saber se, caso a Recorrente tivesse optado por qualquer outra das alternativas consagradas no artigo 35.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC), nomeadamente pela dissolução imediata da «C…………» as consequências fiscais na esfera jurídica da «B………..», questão e solução que, per si, afastaria a ideia, não expressamente assumida como fundamento da correcção impugnada, de que a dissolução constituiu um “esquema” para obter um benefício fiscal ou redução da carga fiscal resultante da menos-valia apurada (conclusões C. a F. e H. e I. das alegações de recurso);

- Do erro de julgamento de facto, por o Tribunal não ter valorado a prova testemunhal (depoimentos de duas testemunhas que identificou no copo das alegações) produzida pela Recorrente relativamente aos factos alegados para sustentar a questão identificada anteriormente (conclusão G. das alegações de recurso);

- Do erro de julgamento de facto por na decisão recorrida o Tribunal não ter dado o devido relevo a factos que deu como provados e não provados, de cuja consideração devia ter extraído conclusões de facto distintas das que por ele foram extraídas [conclusões B., (ii) e (iv) e N. a X. alegações de recurso);

- Do erro de julgamento de direito por o Tribunal a quo, ao julgar que a correcção relativa à desconsideração da menos-valia como gasto fiscal realizada no valor do aumento do capital nos termos em que foi realizado não merecia censura, violou o disposto no artigo 23º do Código do IRC e o critério da indispensabilidade aí previsto (conclusões Y. a KK. alegações de recurso);

- Da dispensa do remanescente da taxa de justiça, nos termos do n.º 7, do artigo 6.º do Regulamento das Custas processuais, atento o valor da acção e o comportamento processual da Recorrente (alíneas LL. A MM. alegações de recurso).

3. FUNDAMENTAÇÃO

3.1. Fundamentação de facto

A sentença efectuou o julgamento da matéria de facto nos seguintes termos:

«Factos Provados

I) A Impugnante é a sociedade dominante do “Grupo A…………”, tributado pelo R.E.T.G.S..

Acordo das partes e Relatório da inspecção a fls 46 a 51.

J) Foi efectuada uma acção de inspecção tributária ao exercício de 2004 na esfera individual da Impugnante, tendo sido emitido Relatório da inspecção em 08/05/2008 com o seguinte teor:

1 - Introdução

Em cumprimento da OI200605720, procedeu-se à análise interna da declaração de rendimentos modelo 22 de IRC e declaração anual de informação contabilística e fiscal do ano de 2004, apresentada pelo contribuinte supracitado, da qual resultou o apuramento que consta do ponto 5 (direito de audição) em resultado das correcções propostas nos pontos 2 e 3 que vieram a ser alteradas na sequência da prática do princípio da colaboração e da participação previstos nos artigos 59° e 60° da Lei Geral Tributária.

2 - Correcção proposta

Correcções à matéria tributável de IRC

Da análise à declaração de rendimentos de IRC verificamos que o sujeito passivo, no apuramento do Lucro Tributável (quadro 07 da respectiva declaração), não procedeu a qualquer acréscimo referente a encargos financeiros suportados com as aquisições de partes de capital, contrariando o disposto na 2ª parte do n.° 2 do art° 31° do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF).

De acordo com o estabelecido no n.° 2 do art° 31° do EBF, “as mais-valias e as menos-valias realizadas pelas SGPS e pelas SCR mediante a transmissão onerosa, qualquer que seja o titulo por que se opere, de partes de capital de que sejam titulares, desde que detidas por período não inferior a um ano, e, bem assim os encargos financeiros suportados com a sua aquisição, não concorrem para a formação do lucro tributável destas sociedades", Redacção dada pela Lei n.° 32-B/2002, de 30 de Dezembro (Lei do OE para 2003).

No que concerne ao regime fiscal aplicável aos encargos financeiros previsto no artigo acima citado, a Circular 7/2004, de 30 de Março, da Direcção de Serviços de IRC, vem sancionar o seguinte entendimento:

> Âmbito de aplicação temporal (ponto 5) - "é aplicável aos encargos financeiros suportados nos períodos de tributação iniciados após 1 de Janeiro de 2003, ainda que sejam relativos a financiamentos contraídos antes daquela data.”

> Exercício em que deverão ser feitas as correcções fiscais dos encargos financeiros (ponto 6): Os encargos financeiros deverão ser desconsiderados como custos, para efeitos fiscais, no exercício a que os mesmos disserem respeito, isto é, dever-se-á proceder à correcção fiscal dos que tiverem sido suportados com a aquisição de participações que sejam susceptíveis de virem a beneficiar do regime especial estabelecido no n.° 2 do art.° 31.° do EBF, independentemente de se encontrarem já reunidas todas as condições para a aplicação do regime especial de tributação das mais-valias. Caso se conclua, no momento da alienação das participações, que não se verificam todos os requisitos para aplicação daquele regime, proceder-se-á, nesse exercício, à consideração como custo fiscal dos encargos financeiros que não foram considerados como custo em exercícios anteriores.

> Método a utilizar para efeitos de afectacão dos encargos financeiros às participações sociais (ponto 7) “(…) dada a extrema dificuldade de utilização, nesta matéria, de um método de afectação directa ou específica e à possibilidade de manipulação que o mesmo permitiria, deverá essa imputação ser efectuada com base numa fórmula que atenda ao seguinte:"

1º Imputar os passivos remunerados das SGPS aos empréstimos remunerados por estas concedidos às empresas participadas e aos outros investimentos geradores de Juros;

2º Afectar o remanescente aos restantes activos, nomeadamente participações sociais, proporcionalmente ao respectivo custo de aquisição.

Utilizando a referida fórmula elaborámos os cálculos a seguir apresentados no sentido de calcular o valor de encargos financeiros suportados pela A………… - SGPS com a aquisição de partes de capital.

Activos
Valor
Notas Explicativas
Total do Activo liquido
39.488.235,60
(1)
Activos remunerados
160,896,60
(2)
Partes de capital (Custo do aquisição)
33.117.150,17
(3)
Equivalência Patrimonial
0,00
(4)
Outros activos
6.210.191,91
    (5)=(1)-(2)-(3)-(4)
Activos não remunerados
39.327,342,08
(6)=(3)+(5)

(1) Informação extraída do Balanço constante do Anexo A da Declaração Anual de Informação Contabilístico Fiscal entregue pelo sujeito passivo,

(2) Informação dada pelo sujeito passivo,

(3) Informação dada pelo sujeito passivo.

(4) Partes de Capital (valor líquido - custo de aquisição).

(5) Outros Activos = Total do Activo - Activos remunerados - Custo de aquisição das partes de capital - Equivalência Patrimonial

(6) Activos não Remunerados = Outros Activos + Custo de aquisição das partes de capital

Passivos
Valor
Notas
Explicativas
Empréstimos obtidos remunerados (Passivos Remunerados)
6,172.914,05
(7)
Passivos remunerados Imputáveis aos empréstimo concedidos remunerados
160.896,60
(8=(2))
Passivos remunerados Imputáveis aos restantes activos
6.012.017,45
    (9)=(7)-(8)
Passivos remunerados Imputáveis às partes de capital
5.062,658,04
10=(9)*((3)/(6)


(7) Informação dada pelo sujeito passivo.
(8) De acordo com a Circular 7/2004 o 1º passo do método a utilizar para efeitos de afectação dos encargos financeiros às participações sociais é Imputar os passivos remunerados das SGPS aos empréstimos remunerados por estas concedidos às empresas participadas e aos outros investimentos geradores de juros, pelo que no caso em análise os passivos remunerados imputáveis aos empréstimos concedidos remunerados são 811.538,60 €

(9) O valor dos passivos remunerados imputáveis aos activos não remunerados obtém-se por subtracção ao total dos passivos remunerados do valor imputado anteriormente aos activos remunerados.

(10) Após obter o valor dos passivos remunerados imputáveis aos restantes activos (Activos não remunerados) apuramos de forma proporcional o valor dos passivos remunerados Imputáveis às Partes de Capital (Custo de Aquisição).
Afectação dos encargos financeiros
Enc.Financeiros
Imputáveis
Notas Explicativas
Passivos remunerados totais
(7)6.172.914,05
    457.768,69
(11)
Passivos remunerados imputáveis às partes de capital
5.062.668,04
375.434,73
(12)=((10)/(7)))*‘(11)

(11) Informação dada pelo sujeito passivo,

(12) Imputação proporcional dos encargos financeiros aos passivos remunerados imputáveis às Partes de Capital (Custo de aquisição)

Face ao exposto, o contribuinte suportou no exercício a título de encargos financeiros com a aquisição de participações o valor de € 375.434,73. De acordo com o estabelecido no n.º 2 do art.° 31° do EBF os mesmos não concorrem para a formação do lucro tributável, pelo que deverão ser desconsiderados como custos.

3. Conclusão

Foi indevidamente considerado como custo fiscal o montante de € 375.434,73, relativo a encargos financeiros com a aquisição de partes de capital. No quadro seguinte sintetiza-se o apuramento do lucro tributável corrigido:

Quadro 07 Campos
APURAMENTO DO LUCRO TRIBUTÁVEL
Descrição
Valores
declarados
    Correcções
Valores
corrigidos
201
Resultado Líquido do Exercício
8.361.339,79
-
8.361.339,79
205 a 225
A acrescer
19.365,26
375.434,73
394.799,99
227 a 238
A deduzir
8.776.372,23
-
8.776.372,23
Prejuízo para efeitos fiscais
- 395,667,18
+ 376.434,73
-20.232,45

(…)

6. - Direito da Audição

No exercício do direito de audição o contribuinte vem expor em particular:

1 - Nos pontos 5 a 24 descreve o processo de reestruturação e concentração de participações, por que passou o grupo de empresas liderado pela exponente, ocorrido no exercício de 2004, referindo no ponto 19 que todas as operações da referida reestruturação produziram os seus efeitos contabilísticos e fiscais a 31/12/2004.

2 - Nos pontos 28 a 40 vem o sujeito passivo manifestar a sua discordância com o método utilizado para efeitos da afectação dos encargos financeiros suportados à aquisição de participações sociais (isto é, com a aplicação da Circular 7/2004, de 30/03, da Direcção de Serviços de IRC), e com os valores utilizados nos cálculos, apesar de os mesmos terem resultado da informação dada pelo contribuinte, como sejam:

“activos remunerados”---€ 160.896,60

"partes de capital" --- €33.117.150,17

"empréstimos obtidos remunerados" --- € 6.172.914,05

"passivos remunerados totais" --- € 6.172.914,05

3 - Nos pontos 41 a 71 o sujeito passivo vem propor valores que entende serem os que evidenciam a realidade ocorrida no ano de 2004 até à data da reestruturação.

4 - Analisados os argumentos constantes no direito de audição, nomeadamente dos pontos 41 ao 71, concluiu-se que os valores agora propostos não resultam da análise ao balanço e à demonstração de resultados apresentada pelo sujeito passivo à data de 31/12/2004. Assim, dado que o balanço apresentado nessa data reflecte todo um processo de reestruturação e da concentração de participações por que passou o grupo de empresas liderado pelo sujeito passivo, foi-lhe solicitado o balanço e a demonstração de resultados à data anterior aos movimentos de reestruturação, que veio a ser-nos apresentado, reportando-se à data de 30 de Dezembro de 2004.

Atendendo a que a determinação da matéria colectável é feita com base nos elementos declarados pelo sujeito passivo e extraídos da contabilidade, e que a empresa no balanço de 31/12/2004 releva as alterações ocorridas com a reestruturação, o que implica que algumas realidades económicas ocorridas ao longo do ano se dissipem no referido balanço, vamos considerar, para efeitos do cálculo dos encargos financeiros a não serem considerados como custo, os valores de balanço anteriores aos efeitos do processo de reestruturação, pelo que, para apurar o valor dos encargos financeiros imputáveis às partes de capital, serão reformulados os cálculos com base nos valores constantes da contabilidade (balanço e demonstração de resultados) que vieram a ser fornecidos pelo contribuinte (com data reportada a 30/12/2004):

Assim - reformulados os cálculos com base nos valores constantes das peças contabilísticas à data de 30/12/2004, seguindo o método (vinculativo) determinado na Circular -, resulta:

Descrição
Valor
    Notas Explicativas
Valores Activos: (30/12/2004)
Total do activo líquido a 30/12/2004
41,197.058
(1)
Activos remunerados
811.538
(2)
Partes de capital - Valor de aquisição
22,883.829
(3)
Equivalência Patrimonial
1.505.318
(4)
Outros activos
15.996.373
    (5)=(1)-(2)-(3)-(4)
Total dos Activos não remunerados
33.880.202
(6)=(3)+(5)

(1) Informação extraída do Balanço fornecido pelo contribuinte à data de 30/12/2004,

(2) Informação extraída do Balanço de 30/12/2004 (650.642 + 160.896) e apontada pelo contribuinte no ponto 48 do Direito de Audição,

(3) Custo de aquisição fornecido pelo contribuinte no direito de audição.

(4) Equivalência patrimonial reflectida na Activo do Balanço de 30/12/2004 [(24.285.348+103.799)- 22.883.829].

(5) Outros Activos - Total do Activo - Activos remunerados - Custo de aquisição das partes de capital - Equivalência Patrimonial

(6) Activos não Remunerados = Outros Activos + Custo de aquisição das partes de capital
Valores Passivos; (30/12/2004)
Valor
Notas
explicativas
Empréstimos obtidos remunerados /Passivos Remunerados)
14.889.267
(7)
Passivos remunerados imputáveis aos empréstimos concedidos remunerados
811.538
(8)=(2)
Passivos remunerados imputáveis aos restantes activos
14.057.729
(9)=(7)-(8)
Passivos remunerados Imputáveis às partes de capital
8.273,997
(10)=(9)*((3)/(6))

(7) Valor extraído do Balanço de 30/12/2004 (1.077.523 € + 13.791.744 €).

(8) De acordo com a Circular 7/2004 o 1º passo do método a utilizar para efeitos de afectação dos encargos financeiros às participações sociais é imputar os passivos remunerados das SGPS aos empréstimos remunerados por estas concedidos às empresas participadas e aos outros investimentos geradores de juros, pelo que no caso em análise os passivos remunerados Imputáveis aos empréstimos concedidos remuneradas são 811.538€.

(9) O valor dos passivos remunerados imputáveis aos activos não remunerados obtém-se por subtracção ao total dos passivos remunerados do valor imputado anteriormente aos activos remunerados.

(10) Após obter o valor dos passivos remunerados imputáveis aos restantes activos (Activos não remunerados) apuramos de forma proporcional o valor dos passivos remunerados imputáveis às Partes de Capital (Custo de Aquisição),
Afetação dos Encargos Financeiros: (30/12/2004)
Enc.
Financeiros
Imputáveis
Notas
explicativas
Passivos remunerados totais 4.869.287
476.063,00
(11)
Passivos remunerados imputáveis às partes de capital 8.273.997
280.197,73
(12) =
((10)/(9))*(11)

(11) Valor extraído do balanço de 30/12/2004.

(12) Imputação proporcional dos encargos financeiros aos passivos remunerados imputáveis às Partes de Capital (Custo de aquisição).

Em resultado dos cálculos efectuados com base nos novos elementos apresentados pelo sujeito passivo, apurámos uma correcção à matéria colectável no montante de 280.197,73€.

No quadro seguinte sintetiza-se o apuramento do lucro tributável corrigido Fls 87 a 95 (85 a 94 do P.A.)
Quadro 07 Campos
APURAMENTO DO LUCRO TRIBUTÁVEL
Descrição
Valores
declarados
Correcções
Valores
corrigidos
201
Resultado Líquido do Exercido
8.361.339,79
8.361.339,79
205 a 225
A acrescer
19.365,26
54.725,18
280.197,73 €.
274.090,41
299.662,99
227 a 238
A deduzir
8.776.372,23
-
8.776.372,23
Prejuízo para efeitos fiscais
-396.667,18
+280.197,73 €.
-115.469,45

K) Foi efectuada uma acção de inspecção tributária ao exercício de 2004 da sociedade “A’………… , S.A.”, tendo sido emitido Relatório da inspecção em 25/06/2008, com o seguinte teor:

(...)

A) Credencial e período em que decorreu a acção

A acção inspectiva decorre do superiormente determinado pela Ordem de Serviço n.º OI200802216, de 29/05/2008 (Código PNAIT 22139).

As diligências foram efectuadas no período compreendido entre 15 de Abril e 4 de Junho de 2008.

B) Motivo, âmbito e incidência temporal

A Ordem de Serviço cm causa foi emitida na sequência das diligências efectuadas ao abrigo dos Despachos externos n.° DI200800443 e DI200800510, emitidos em nome das empresas A’………., S.A. (ex-B……………, S.A.), NIPC: ………., e C…………. S.A., NIPC: ………., respectivamente, sendo que dos procedimentos efectuados se detectaram factos susceptíveis de correcção tributária.

Em conformidade com os pressupostos que determinaram a emissão da presente Ordem de Serviço, a acção inspectiva teve carácter parcial de IRC, para o exercício de 2004.

C) Outras situações

C. 1 - Actividade e Enquadramento do Sujeito Passivo

O Sujeito Passivo em análise encontra-se enquadrado no Regime Normal de IVA, periodicidade mensal, exercendo a actividade de Fabricação de Massas Alimentícias (CAE 15850), desde 17/12/1919.

A empresa A’…………, S.A. (NIPC: ………..), resultada da fusão das empresas B………….., S.A. e D………….., S.A. (NIPC: ……….), efectuada em 30.12.2004, tendo a A’……….. mantido o NIPC da empresa B………… e a D………….. cessado a sua actividade.

Em termos de IRC, o Sujeito Passivo, está enquadrado no regime especial de tributação de grupos de sociedades, sendo a sociedade dominante a empresa A…………. S.G.P.S., S.A, (NIPC: ……….). Deste grupo de empresas, também fazem parte as seguintes sociedades:

- A’’…………. , S.A. (NIPC: ……….)

- A’’’………….. …….. - ……………, S.A. (NIPC: ………)

- Soc. E…………. (NIC: ……….)

Como já foi referido, a empresa dedica-se essencialmente à fabricação de massas alimentícias, e à sua posterior comercialização, representando estes produtos cerca de 90% da sua facturação global. Também produz e comercializa bolachas e cereais de pequeno-almoço, dedicando-se igualmente à comercialização de “frescos” (pizzas, lasanhas, massas), adquiridos em Espanha e Itália.

(...)

III - DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL

Das diligências efectuadas detectaram-se os seguintes factos susceptíveis de correcção tributária:

1. Valores declarados

Em 2004, o Sujeito Passivo apurou um Resultado Líquido do Exercício positivo, no montante de 7.044.852,05€.

De forma a apurar o Lucro Tributável de 2004, nos termos do artigo 17º do Código do IRC (CIRC), ao valor do Resultado Líquido do Exercício, foi acrescido o montante de 19.665.069,02€, e deduzido o valor de 43.667.207,93€, conforme valores declarados pelo contribuinte no Quadro 07 da Declaração Modelo 22, pelo que para o ano em causa foi apurado um prejuízo fiscal de 16.957.286,86€.

Da análise dos valores declarados pelo Sujeito Passivo no Quadro 07, verificou-se que este acresceu no campo 215, relativo a menos-valias contabilísticas, o valor de 19.478.205,95€, tendo deduzido no campo 230, referente a menos-valias fiscais, o montante de 19.479.739,36€.

2. Menos-valias fiscais resultantes da liquidação da C………..

De acordo com os elementos apresentados pela empresa, parte significativa dos valores das menos-valias contabilísticas e fiscais em causa resultam da liquidação e dissolução da sociedade C………….., S,A. (cujo capital era detido, à data da análise, a 100% pela empresa B…………..), que de acordo com os montantes constantes no mapa das mais e menos-valias do Imobilizado Financeiro, e com os valores contabilizados na conta 6945 - Perdas em Imobilizações - Abates, se traduziu numa perda para a B………… no montante de 19.476.508,40€.

A actividade da C…………. consistia na fabricação de rações (produtos para a alimentação animal), mas desde 1998 que não exerce actividade efectiva que desse origem à obtenção de proveitos, sendo que também desde essa data que a empresa não possui qualquer imobilizado.

A empresa apresentava em 2004, um saldo negativo na conta de Resultados Transitados no montante de 30.853.010,13€. Quase a totalidade dos prejuízos em causa tiveram origem nos exercícios em que a C………… exercia actividade efectiva, sendo por isso anteriores a 1998.

No início do exercício de 2004, o capital social da C………….. era de 623.750,00€, detido a 100% pela empresa B…………., sendo o Conselho de Administração, da C……….., constituído por administradores da B………….

3. Aumento de capital da C………….. (07/07/2004)

De acordo com a escritura realizada em 7 de Julho de 2004, o capital social da C…………. foi aumentado nessa data para o montante de 19.625.000,00€, sendo o valor do aumento de 19.001.250,00€, integralmente subscrito e realizado em numerário pela accionista única B……………, sem emissão de novas acções, tendo o valor nominal das acções passado dos 4,99€ para 157,00€.

O aumento de capital de 19.001,250.00€ resulta do deliberado em assembleia geral da sociedade C…………., realizada em 5 de Julho de 2004, a que respeita a acta n.° 40.

Aí é referido que o aumento do capital da C………… foi realizado para "dar cumprimento ao disposto no artigo trinta e cinco do Código das Sociedades Comerciais, mas não dispondo presentemente dos meios financeiros necessários ao aumento de capital proposto pelo Conselho de Administração, a sua representada procederá de imediato ao aumento de capital da empresa, através de entradas em dinheiro e na modalidade de aumento do valor nominal das suas acções, no montante de dezanove milhões mil duzentos e cinquenta euros, com o aumento do valor nominal de cada acção para cento e cinquenta e sete euros, comprometendo-se a, no prazo de noventa dias, realizar novo aumento de capital de modo a atingir o valor proposto pelo Conselho de Administração ou a dissolver e liquidar a empresa até ao final do exercício de dois mil e quatro ”.

O artigo 35º do Código das Sociedades Comerciais invocado na acta em causa, é o que regula as situações em se verifica a perda de metade do capital social da empresa (quando o capital próprio constante do balanço do exercício é inferior a metade do capital social), podendo tal situação ser suprida pela sua dissolução, pela redução do seu capital, através de entradas dos seus sócios ou pela adopção de medidas concretas tendentes a manter pelo menos em dois terços a cobertura do capital social, conforme o disposto no artigo em causa, cujo articulado a seguir se transcreve, com a redacção em vigor à data dos factos (Decreto- Lei n.° 162/2002, de 11 de Julho):


Artigo 35º Perda de metade do capital

1 - Os membros da administração que, pelas contas do exercício, verifiquem estar perdida metade do capital social devem mencionar expressamente tal facto no relatório de gestão e propor aos sócios uma ou mais das seguintes medidas:

a) A dissolução da sociedade;

b) A redução do capital social;

c) A realização de entradas em dinheiro que mantenham pelo menos em dois terços a cobertura do capital social;

d) A adopção de medidas concretas tendentes a manter pelo menos em dois terços a cobertura do capital social.

2 - Considera-se estar perdida metade do capital social quando o capital próprio constante do balanço do exercício for inferior a metade do capital social.

3 - Os membros da administração devem apresentar a proposta prevista no n.° 1 na assembleia geral que apreciar as contas do exercício, ou em assembleia convocada para os 90 dias seguintes à data do início da assembleia, ou à aprovação judicial, nos casos previstos no artigo 67°.

4 - Mantendo-se a situação de perda de metade do capital social no final do exercício seguinte àquele a que se refere o n.° 1, considera-se a sociedade imediatamente dissolvida, desde a aprovação das contas daquele exercício, assumindo os administradores, a partir desse momento, as competências de liquidatários, nos termos do artigo 151º.

Verifica-se assim que o aumento de capital da C…………. em 7 de Julho de 2004 não era obrigatório para a empresa dar cumprimento ao disposto no artigo 35° do CSC, existindo outras possibilidades legais atendendo à sua situação de inactividade desde 1998, a que acresce o facto de não terem sido apresentados quaisquer projectos de recuperação ou reestruturação da sociedade C………….. que tivessem como objectivo a sua viabilidade económica à data do aumento de capital, pelo que a dissolução da C………… efectuada em 20 de Setembro de 2004 (nos termos apresentados posteriormente), poderia ter sido logo efectuada em 7 de Julho de 2004, sem se verificar qualquer aumento de capital.

4. Movimentos financeiros efectuados em resultado do aumento de capital da C…………

O montante relativo ao aumento de capital (19.001.250,00€), foi transferido da conta bancária n.° ………., no Banco BPI, em nome da B………….., para a conta n.º ………., no Banco BPI, em nome da C…………., mas nesse mesmo dia esse valor foi transferido da C…………. para a conta do BPI da B…………., pelo que esta operação não teve qualquer consequência efectiva em termos de fluxos financeiros, nem para a B…………. nem para a C………….

Para demonstrar a artificialidade da operação em causa, da análise dos documentos bancários de suporte às transferências bancárias, verificou-se, de acordo com a sequência temporal em que foram efectuadas, que primeiro foi efectuada a transferência dos 19.001.250,00€ da C…………. para a B………… (às 9 horas e 26 minutos do dia 7 de Julho de 2004), e só depois é que esse valor foi transferido da B…………. para a C………….. (às 9 horas e 28 minutos do dia 7 de Julho de 2004).

Verificou-se também o valor total dos empréstimos efectuados pela B…………. à C…………, até à data do aumento de capital, se cifrava em 18.994.508,40€ (de acordo com os valores da contabilidade da C…………), montante próximo do valor do aumento do capital realizado.

Também é de referir que a parte mais significativa do valor desses empréstimos, no montante de 18.918.224,93€, foi realizada antes de 1997.

5. Registos contabilísticos efectuados na sequência do aumento de capital da C……………

Em termos contabilísticos, as operações anteriores tiveram os seguintes registos:

- Registos na C…………..:

- Entrada do numerário na conta bancária da C…………. (Doc. 1- OD)

[Imagem]

- Registos na B…………./A………….:

- Entrada do numerário na conta bancária da C…………/Aumento de capital (Doc. 2070086)

[Imagem]

6. Dissolução da C………….. (20/09/2004)

Em 20 de Setembro de 2004, ocorreu a dissolução da C………….., de acordo com o deliberado em assembleia geral de 1 de Setembro de 2004 que conforme acta n.° 41, resulta da "situação financeira deficitária em que se encontra a sociedade, evidenciada nos seus capitais próprios negativos na ordem de € 26.842.366" e por se ter verificado "a indisponibilidade financeira e estratégica da accionista única para suprir o défice financeiro da sociedade e para a dotar dos meios necessários ao desenvolvimento da sua actividade operacional”, pelo que foi proposto que a sociedade fosse dissolvida.

Como a sociedade C………….. já não dispunha de qualquer bem susceptível de liquidação, a sua dissolução originou uma menos-valia para a B…………./A………….. correspondente ao montante constante na conta de 411199- Investimentos Financeiros, relativa à C………….., que correspondia ao valor de 19.476.508,40€, sendo que desse valor, o aumento de capital da C………….. efectuado em 2004, gerou uma menos-valia de 19.001.250,00€.

7. Resumo dos factos expostos

Em resumo:

- A empresa C………….. era detida a 100% pela sociedade B…………. e comungava dos mesmos administradores.

- A C………….. já não exercia actividade efectiva desde 1998 e não possuía qualquer imobilizado.

- A B………….. registou contabilisticamente empréstimos à C…………. no valor total de 18.992.763,20€, até à data do aumento de capital, de acordo com o saldo das suas contas 252199 e 2529199.

- Em Julho de 2004, foi efectuado um aumento do seu capital social no montante de 19.001.250,00€, com a justificação deste aumento ser realizado de forma a dar cumprimento ao disposto no artigo 35° do CSC (perda de metade do capital), sendo que no entanto, esse mesmo artigo prevê outras possibilidades legais de forma a este ser cumprido.

- O aumento do capital foi integralmente realizado em numerário, tendo como base fundos financeiros com origem na B……….., que deram saída da sua conta bancária do BPI, em 07/07/2004, e que nesse mesmo dia e hora regressaram à conta em causa, através de transferência bancária da C………….. para a B…………..

- Em Setembro de 2004, a sociedade C…………. foi dissolvida, pelo que o aumento de capital no montante de 19.001.250,00€, efectuado dois meses antes, gerou uma menos-valia para a B…………. no valor desse aumento, para além dos 475.258,40€, que já faziam parte da conta Investimentos Financeiros (C…………), em exercícios anteriores.

8. Enquadramento tributário dos factos em causa

Enquadrando os factos anteriores com a legislação tributária, nomeadamente o disposto no Código do IRC, temos que:

- O IRC visa tributar o lucro de uma entidade, o acréscimo patrimonial obtido durante o período tributário (artigo 17º n.° 1 e artigo 3° n.° 1 a) e n.° 2 do Código do IRC), pelo que custos fiscais, em regra, são os gastos derivados da actividade da empresa que apresentem uma conexão fáctica ou económica com a entidade, que não consubstanciem uma diminuição patrimonial.

- O corpo do n.° 1 do artigo 23° do CIRC, apenas considera como custos ou perdas os que, comprovadamente, forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos ao imposto ou para a manutenção da fonte produtora.

- Em suma, a relevância fiscal de um custo depende da prova da sua necessidade, adequação, normalidade ou da produção do resultado (ligado a um negócio lucrativo).

9. Conclusões

Dos factos expostos, verificou-se que a B…………. obteve uma menos-valia, custo nomeado na alínea i) do artigo 23° CIRC, no valor total de 19.476.508,40€, relativo a perdas obtidas em Investimentos Financeiros, em resultado da dissolução da sociedade C…………

No entanto, das diligências efectuadas, concluiu-se que do valor da menos-valia, no total de 19.476.508,40€, 19.001.250,00€ diziam respeito a Investimentos Financeiros apenas efectuados em 2004.

Dos factos apresentados, concluímos que o referido investimento de 19.001.250,00€ efectuado pela B………….. na C…………., através do aumento do capital social dessa empresa, numa sociedade inactiva desde 1998 e que foi dissolvida dois meses depois, não tinha como subjacente o obrigatório cumprimento de qualquer obrigação legal ou a realização de qualquer projecto de reabilitação económica e financeira por parte da C………….. e que consequentemente pudesse gerar proveitos futuros para a B…………..

Efectivamente, não foram apurados factos concretos que revelassem a existência duma estratégia por parte da acionista única, à data do aumento de capital da C…………., que tivesse como objectivo o desenvolvimento da actividade operacional da sociedade, como se comprova com o facto do montante do aumento de capital da C………….. ter sido retirado da sua conta bancária, no próprio dia em que a operação foi efectuada.

Como é óbvio, a actividade de uma empresa, para além da obtenção do lucro associado a vendas e prestações de serviços directamente relacionados com o seu objecto social, pode passar por outro tipo de investimentos, nomeadamente os financeiros, através de aquisições ou participações em outras empresas.

No entanto, no caso em apreço, o "investimento financeiro” efectuado pela B…………. na C…………., em 2004, de acordo com toda a matéria de facto apresentada, nomeadamente no que diz respeito à situação financeira da C…………., e à descrição das operações inerentes ao aumento de capital e posterior dissolução desta sociedade, não decorre da normal actividade exercida por uma empresa, nos termos definidos no CIRC, cujo objectivo visa a obtenção de lucro.

Assim, a menos-valia associada à dissolução da C…………., em resultado do aumento de capital efectuado em 7 de Julho de 2004, no montante de 19.001.250,00€. não no de ser aceite fiscalmente face ao disposto no artigo 23° do CIRC, por não estar demonstrada a existência de qualquer nexo causal entre os custos incorridos em causa e os proveitos obtidos pela B…………., não se mostrando indispensável à realização de proveitos e à manutenção da fonte produtora.

(...)

VIIl - DIREITO DE AUDIÇÃO - FUNDAMENTAÇÃO

O Sujeito Passivo foi notificado, através de carta registada de 05/06/2008, remetida para a sede da empresa, para exercer o direito de audição, previsto nos artigos 60° da Lei Geral Tributária e 60° do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária, não tendo, contudo, no prazo fixado para o efeito, exercido esse direito.

(...)

Fls 225 a 235.

L) Em 10/11/2008, foi elaborado "Relatório”, com o seguinte teor:

1 - Introdução

O sujeito passivo é tributado pelo Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades previsto no artigo 63° do Código do IRC, sendo o grupo constituído pelo contribuinte em análise, como sociedade dominante, e por cinco sociedades dominadas como abaixo se indica:
DESIGNAÇÃO
NIPC
Grupo
A………….. SGPS
500020540
Dominante
A’’…………, S A
500068070
Dominada
A’……….…, S A
500068860
Dominada
Soc. D……….., SA
500267049
Dominada
A’’’…………….., SA
504186051
Dominada
D………….., S A
504186078
Dominada

Em resultado de acções inspectivas na esfera individual, foram apuradas correcções nos seus lucros tributáveis como passamos a indicar no ponto seguinte, tendo como consequência a correcção do lucro tributável do grupo, calculado na sociedade dominante, através da soma algébrica dos lucros tributáveis e dos prejuízos fiscais apurados na esfera individual.

De referir que as correcções que passamos a indicar foram objecto de notificação do Projecto de Relatório para o exercício do direito de audição (artigos 60º da Lei Geral Tributária e 60° do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária) e das Conclusões da Acção Inspectiva (artigos 77° da Lei Geral Tributária e 62° do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária).

2 - Correcções na esfera individual das empresas do Grupo

2.1 - Dominante

- A………….SGPS SA

Em consequência do procedimento interno de inspecção efectuado no âmbito da credencial OI200605720, foram efetuadas correcções relativas aos encargos financeiros que o sujeito passivo suportou com a aquisição de partes de capital e que foram indevidamente considerados como custo fiscal no montante de 280.197,73 € , dado que, de acordo com o estabelecido no n.° 2 do art.° 31° do EBF, "as mais-valias e as menos-valias realizadas pelas SGPS e pelas SCR mediante a transmissão onerosa, qualquer que seja o título por que se opere, de partes de capital de que sejam titulares, desde que detidas por período não inferior a um ano, e, bem assim os encargos financeiros suportados com a sua aquisição, não concorrem para a formação do lucro tributável destas sociedades". Redacção dada pela Lei n.° 32- B/2002, de 30 de Dezembro (Lei do OE para 2003).

2.2. Sociedades Dominadas

2.2.1 – A’………….., S A

Em consequência do procedimento externo de inspecção efectuado no âmbito da credencial OI200802216, foram efectuadas correcções à matéria tributável no montante de 19.001.250,00 €, valor este respeitante a deduções indevidas à matéria tributável alegadamente respeitante a "menos-valias fiscais" associadas a uma operação de aumento de capital (19.001.250,00 €) da C………… seguido de dissolução e liquidação desta sociedade, conforme relatório que se junta em anexo 1. Assim, o referido valor não pode ser aceite fiscalmente face ao disposto no artigo 23° do Código do IRC.

2.2.2 – D………….., S A

Em consequência do procedimento interno de inspecção efectuado no âmbito da credencial OI200704662, foram efectuadas correcções no montante de 2.351,58 € relativas a reintegrações não aceites como custo fiscal (alínea c) do nº 1 do artigo 33° do CIRC), dado o sujeito passivo ter utilizado taxas de reintegração superiores às fixadas no artigo 5º do Decreto Regulamentar nº 2/90, de 12 de Janeiro, conforme relatório que se junta em anexo 2.

3 - Correcções na declaração do grupo

Analisada a declaração do grupo constata-se que o sujeito passivo menciona no campo 382 o valor de -16.459.049,86, No entanto, a soma algébrica dos resultados fiscais individuais é -16.441.696,27, existindo assim uma diferença de 17.353,59 que se deve ao facto de a sociedade dominada ter regularizado voluntariamente, mediante entrega de uma declaração de substituição, uma correcção que se mostrava devida naquele montante, sem que a declaração do grupo tivesse sido substituída para dar expressão à regularização voluntária da dominada..

4. - Conclusão

Face ao exposto nos pontos 2 e 3, as correcções ao lucro tributável do grupo ascendem a 19.301.152,90 € pelo que os resultados fiscais constantes na declaração modelo 22 do grupo carecem de correcção, passando de -16.459.049,86 € declarado para 2.842.103,04 € corrigido.

No quadro seguinte sintetiza-se o apuramento do lucro tributável corrigido:

[Imagem]

(…)

5. - Direito de Audição

A empresa foi notificada através do ofício n° 71532/0510 de 2008/10/13 nos termos do artigo 60° da LGT e 60º do RCPIT, para no prazo de quinze dias exercer, o direito de audição, sobre o Projecto de Relatório de Inspecção Tributária.

Decorrido o prazo concedido para a sociedade dominante se pronunciar e não tendo esta apresentado qualquer resposta, mantêm-se as correcções constantes do referido Projecto Relatório, em resultado das quais tanto a colecta como a derrama sofrerão os correlativos ajustamentos em função de:

1-° Valor líquido apurado para os resultados fiscais do grupo (€ 2.842.103,04);

2.° Valor dos prejuízos fiscais dedutíveis (exercício de 2003, € 718.723,29 - valor disponível constante na base de dados da DGCI);

3.° Valor apurado da colecta de IRC,

Como o quadro abaixo evidencia/demonstra:

[Imagem]

Fls 46 a 51 (64 a 69 do P.A.).

M) Foi emitida, em nome da Impugnante, enquanto sociedade dominante do R.E.T.G.S., a liquidação adicional de I.R.C. n.º 2008 8310039480, de 11/12/2008 e respectivos juros compensatórios, a que corresponde a demonstração de compensação n.º 2008 7150535, de 15/12/2008 e a demonstração de acerto de contas n.º 2008 00001524668, com o montante total a pagar de € 580.844,30.

Fls 42 a 44.

N) Desde 1992 e ao longo dos anos o “Grupo A…………...” passou por um processo de reestruturações societárias e de concentração de participações, tendo sido efectuadas várias operações como aquisições, cisões e fusões com destaque de participações sociais e posterior incorporação e transferência de património.

Fls 96 a 211 e depoimentos das testemunhas.

O) Em 2004, a sociedade “C…………., S.A.” (em diante “C………..”) era detida em 100% pela “B……………, S.A. ”(posteriormente denominada “A’………….., S.A.”) (em diante “B…………”).

Relatório da inspecção, referido na alínea K) e depoimentos das testemunhas.

P) Ao longo dos anos, a “B………….” efectuou empréstimos à “C………..” que, em 2004, ascendiam a cerca de € 18.994.508,40.

Relatório da inspecção, referido na alínea K) e depoimentos das testemunhas.

Q) A “C………….” dedicava-se ao fabrico de rações e estava inactiva desde 1998.

Relatório da inspecção, referido na alínea K) e depoimentos das testemunhas.

R) Em 2004, o capital próprio da “C………….” era inferior a metade do capital social.

Relatório da inspecção, referido na alínea K) e depoimentos das testemunhas.

S) Em 07/07/2004 a “B…………” efectuou um aumento do capital social da “C…………”, no montante de € 19.001.250,00.

Relatório da inspecção, referido na alínea K) e depoimentos das testemunhas.

T) Em 07/07/2004, o valor do aumento de capital – € 19.001.250,00 – foi transferido da conta bancária da “B………..” para a conta bancária da “C…………” e, com uma diferença de minutos, o mesmo valor foi transferido da conta da “C………….” para a conta da “B………..”.

Relatório da inspecção, referido na alínea K) e depoimento da testemunha F……………

U) Em Setembro de 2004, a “B…………..” iniciou o processo de dissolução da “C………….”, que foi efectivada em 20/09/2004.

Relatório da inspecção, referido na alínea K) e depoimentos das testemunhas.

V) A dissolução da “C………….” originou uma menos-valia para a “B…………” no montante de € 19.476.508,40, sendo € 19.001.250,00 relativo ao aumento de capital referido na alínea S).

Relatório da inspecção, referido na alínea K) e depoimentos das testemunhas.

W) No Serviço de Finanças da Maia 1 foi instaurado o P.E.F. n.º 1805200901014307 para cobrança da liquidação impugnada, tendo a Impugnante prestado garantia bancária em 27/04/2009, incorrendo em despesas bancárias e comissões, no período de 27/04/2009 a 28/10/2013, no montante de € 31.655,18.

Fls 451 a 464.

X) Em 17/12/2013, a Impugnante efectuou o pagamento de € 514.840,57, ao abrigo do “Regime Excepcional de Regularização de Dívidas”.

Fls 450.

Factos não provados

1. O aumento do capital social da “C…………” pela “B…………” foi uma tentativa de manter a “C………..” activa, assumindo a “B…………” o compromisso de adoptar novas medidas adequadas à realidade da sociedade.

Facto alegado nos artigos 186.º, 188.º e 206.º da P.I.

2. A realidade económica e financeira da “C…………”, assim como a crise galopante do sector motivaram a decisão de dissolução da “C…………..”.

Facto alegado no artigo 189.º da P.I.

Motivação da decisão da matéria de facto

O acervo de factos provados baseou-se no exame do teor dos documentos constantes dos autos e do P.A., que não foram impugnados e nos depoimentos prestados pelas testemunhas, conforme referido, em concreto, em cada uma das alíneas do probatório.

Os factos não provados resultaram da ausência de prova que os sustente, pois:

- não foi carreada para os autos prova documental susceptível de sustentar que a “B………….” realizou o aumento de capital por estar a ponderar manter ou recuperar a “C………..”, nomeadamente, não foram apresentados quaisquer projectos de recuperação da sociedade, planos estratégicos ou estudos de viabilidade da empresa; e

- as testemunhas também não lograram convencer o Tribunal da motivação alegada para o aumento de capital e nem das razões que determinaram a dissolução da “C…………”, revelando hesitações e um discurso, nessa parte, claramente comprometido com a posição da impetrante.

Foram prestados depoimentos pelas testemunhas G…………… e F…………..

G………….., director financeiro do Grupo A………… há 33 anos, descreveu como se processou a reestruturação do grupo a partir de 1992 até 2004, referindo a realização de operações de aquisições, cisões e fusões, salientando ainda que praticamente não existiu financiamento bancário mas sim auto financiamento.

Confrontado com o mapa que consta a fls 212 (documento n.º 10 junto à P.I.) explicou os valores que constam do mesmo, afirmando que existem financiamentos no valor de € 7.220.558 anteriores a 01/01/2003, que o valor de empréstimos de € 7.831.788 foram directamente afectos ao investimento em imobilizado corpóreo, que os meios libertos líquidos da sociedade permitiram suportar o único investimento que houve entre 2003 e 2004 em participações financeiras de € 1.371.515, que os meios libertos líquidos ainda serviram para suportar uma parte do investimento em imobilizado corpóreo e que em 2003 e 2004 não houve necessidade de financiamento externo para aquisição de participações financeiras, pois o financiamento foi para imobilizado corpóreo e não para a compra de participações.

No que concerne à correcção relativa à menos-valia associada à dissolução da “C………….”, asseverou que a “C…………” era detida pela “B………..” que, ao longo do tempo, efectuou suprimentos àquela sociedade e que em 2004 a “C………….” tinha uma situação financeira líquida negativa e de acordo com o artigo 35.º do C.S.C. tinha de ser encontrada uma solução.

Questionado sobre o motivo para a “B………….” ter decidido aumentar o capital em 19 milhões de euros e, passados poucos meses, decidir pela dissolução da “C…………”, referiu, com hesitações e incertezas (usando, por várias vezes, as expressões ”penso eu”, “se calhar”) que, em Julho, a Administração da “B………….” ainda não sabia muito bem qual seria o futuro da “C…………”, ponderando se a ia utilizar para escoar determinados sub produtos que podiam integrar as rações de animais e, em Setembro, viu afinal que não existia futuro e optou pela dissolução. Revelou hesitação, como se estivesse a tentar adivinhar os objectivos da Administração, não logrando convencer o Tribunal que um Grupo organizado como o “Grupo A………….” não possua um plano estratégico traçado e decida, em Julho, manter e recuperar a “C………….”, que estava inactiva desde 1998, nela injectando 19 milhões de euros para, passados apenas dois meses, decidir dissolvê-la.

Defendeu ainda que, se a dívida da “C………….” à “B………..” no valor de cerca de 19 milhões de euros fosse executada, o efeito fiscal seria o mesmo porque existiria uma perda financeira. Trata-se de uma mera opinião/juízo de valor e não de um facto, pelo que não foi considerado pelo Tribunal.

F………….., afirmou ser adjunto do director financeiro do grupo A………….. desde há cerca de 3 anos mas já era o seu apoio há 12 anos.

Tal como a primeira testemunha, descreveu as operações de reestruturação do grupo ocorridas ao longo dos anos, referindo que o financiamento ocorria por via de transferências/destaques de património imobiliário, não se recorrendo a capitais externos e que já em 1999 o endividamento que existia na SGPS era essencialmente para o investimento em imóveis.

Afirmou que em 2004 deu-se uma grande alteração no grupo em termos de negócio, e aquisição de participação, com desembolso de capital, por € 1.371.515, asseverando que essa foi a única aquisição de participação com desembolso de capital.

Referiu que o aumento do endividamento de 2002 para 2004 (de € 7.220.558 para € 14.869.267) foi para aquisição de imóveis: uma fábrica de massas e um armazém automático, salientando que a empresa conseguia gerar meios líquidos que também foram usados para investimentos em imobiliário corpóreo.

Relativamente à desconsideração da menos-valia mencionou que a “C…………” era detida a 100% pela “B………….” e a sua actividade desenvolvia-se no ramo das rações para animais, estando inactiva há vários anos.

Salientou que ao longo dos anos, a “B…………” fez várias entradas de suprimentos nessa empresa, existindo, em 2004, um crédito da “B………..” sobre a “C………” de cerca de 19 milhões de euros.

Afirmou que em 2004 tinha de ser definido o destino dessa empresa e que acha que nessa altura a Administração ponderava se podia haver uma extensão do negócio do grupo, que produzia subprodutos que davam para rações, usando essa empresa, mas depois, passados uns meses, decidiram dissolvê-la. Demonstrou hesitação, referindo “julgo que terá sido isto que esteve na mente da Administração” e tal como a primeira testemunha, revelou um depoimento, nesta parte, claramente comprometido com a posição da Impugnante, não logrando convencer o Tribunal da intenção subjacente ao aumento de capital, seguido, passados uns escassos dois meses, da dissolução da “C………..”.

Confrontado com a realização do aumento de capital através de transferência bancária da conta da “B…………” para a “C………..” seguida, passados escassos minutos, da transferência em sentido contrário, confirmou que foi assim que sucedeu mas que tal não era estranho, uma vez que a “C……….” tinha uma dívida a pagar à “B…………” no valor de cerca de 19 milhões de euros. Ora, essa situação coloca em causa a tese de que o aumento de capital pretendia manter a “C………..” activa, com vista ao aproveitamento da sua actividade de fabricação de rações, pois o valor do aumento de capital saiu logo da “C…………”.

Tal como a primeira testemunha, afirmou que, se a dívida da “C………….” à “B………..”, no valor de cerca de 19 milhões de euros, fosse executada, o efeito fiscal seria o mesmo porque existiria uma perda financeira e tal só não foi efectuado por uma questão de protecção da imagem do grupo para o exterior. Trata-se de uma mera opinião/juízo de valor e não de um facto, pelo que não foi considerado pelo Tribunal».

3.2. Fundamentação de direito

3.2.1. Cumpre, antes de mais, apreciar a questão da incompetência hierárquica, que, embora no caso concreto tenha sido suscitada pelo Exmo. Procurador-Geral Adjunto no seu douto parecer, sempre se imporia apreciar por se tratar de questão de ordem pública, prioritária em relação a qualquer outra, de conhecimento oficioso e susceptível de ser arguida até ao trânsito em julgado da decisão final [cfr. artigos 13.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) e 16.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT)].

3.2.2. Nesse sentido começamos por realçar que, nos termos do disposto nos artigos 26.º, alínea b), e 38.º, alínea a), do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF) e 280.º, n.º 1, do CPPT, a competência para conhecer dos recursos das decisões dos tribunais tributários de 1.ª instância em matéria de contencioso tributário, pertence à Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo quando os recursos tenham por exclusivo fundamento matéria de direito, constituindo uma excepção à competência generalizada dos tribunais centrais administrativos, aos quais cabe conhecer «dos recursos de decisões dos Tribunais Tributários, salvo o disposto na alínea b) do artigo 26.º» [art. 38.º, alínea a), do ETAF].

3.2.3. Como vimos reiteradamente sublinhando, para aferir da competência em razão da hierarquia deste Supremo Tribunal Administrativo há que olhar para as conclusões da alegação do recurso e verificar se, em face das mesmas, as questões controvertidas se resolvem mediante uma exclusiva actividade de aplicação e interpretação de normas jurídicas, ou, pelo contrário, implicam a necessidade de dirimir questões de facto - seja por insuficiência, excesso ou erro no apuramento da factualidade que foi dada por provada na decisão recorrida, quer por se entender que foram esquecidos factos tidos por relevantes, quer por se sustentar que a prova produzida foi incorrectamente apreciada ou por se divergir das ilações de facto retiradas da factualidade apurada.

3.2.4. Ora, como ressalta com clareza das conclusões de recurso e é salientado no parecer do Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto, quer do teor das conclusões de recurso quer do conteúdo das alegações que as sustentam resulta manifesto que a Recorrente não está apenas inconformada com as ilações “jurídicas” e com o julgamento de direito que ficou vertido na sentença sobre as questões suscitadas.

3.2.5. De facto, resulta claramente do teor das conclusões das alegações que ficaram evidenciadas na delimitação do objecto do recurso (ponto 2. do presente acórdão), que a Recorrente, para além de não concordar com o julgamento de direito, particularmente com a interpretação do artigo 35.º do CSC e 23.º do CIRC, dissente com o julgamento de facto ao nível da valoração da prova produzida (depoimentos de duas testemunhas), dissente da irrelevância que foi dada a factos que não se apuraram ou não foram devidamente valorados e que, per se, segundo a Recorrente, deviam ter determinado que o Tribunal tivesse chegado a conclusões de facto e decisão de direito distintas, dissente da interpretação e ilações que o Juiz a quo extraiu de um conjunto de factos que deu expressamente como apurados, alguns, em seu entender, contraditórios entre si, e que, também estes, devidamente valorados deviam ter conduzido a conclusões de facto distintas e a conclusões jurídicas opostas.

3.2.6. Aliás, a conclusão a que chegamos face ao teor das conclusões das alegações de recurso, que não suscita dúvidas, sai também reforçada pela análise do corpo das alegações, particularmente de fls. 5 a 7, que este Tribunal não podia deixar de atentar para afastar qualquer dúvida, e das quais também emerge claramente que não são, definitivamente, apenas questões de direito que a coloca no recurso que nos dirigiu.

3.2.7. Em suma, a Recorrente dissente da valoração da prova produzida, dissente das ilações extraídas pela Meritíssima Juíza a quo dos factos apurados e invoca factualidade que não foi sequer levada ao probatório e que reputa essencial para a decisão do pleito, o que é suficiente para concluir que o presente recurso jurisdicional não tem por exclusivo fundamento matéria de direito. E, consequentemente, que a competência em razão da hierarquia para conhecer dele pertence, não a este Supremo Tribunal Administrativo, mas ao Tribunal Central Administrativo Norte, para onde os autos serão remetidos nos termos do artigo 18.º do CPPT.

4. DECISÃO

Termos em que, acordam os Juízes que integram esta Secção de Contencioso Tributário do supremo Tribunal Administrativo, em conferência, julgar verificada a sua incompetência para conhecer o mérito do presente recurso e declarar, para esse efeito, competente o Tribunal Central Administrativo Norte.

Custas pela Recorrente.

Registe, notifique e, após trânsito, remeta os autos ao Tribunal Central Administrativo Norte.

Lisboa, 16 de Fevereiro de 2022 - Anabela Ferreira Alves e Russo (relatora) - José Gomes Correia - Aníbal Augusto Ruivo Ferraz.