Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0360/17
Data do Acordão:10/11/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANTÓNIO PIMPÃO
Descritores:PARQUE EÓLICO
Sumário:Nos termos do artigo 2º do CIMI os elementos constituintes e partes componentes de um parque eólico não podem, de per si, ser considerados como prédios urbanos da espécie “outros”.
Nº Convencional:JSTA000P22371
Nº do Documento:SA2201710110360
Data de Entrada:03/23/2017
Recorrente:A...., SA
Recorrido 1:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
*
1.1. A A…………….., S.A., impugnou, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, os atos de fixação do valor patrimonial, emitidos pelo Chefe de Finanças de Amarante, resultantes das segundas avaliações dos vinte e três prédios inscritos oficiosamente na matriz urbana sob os artigos P743 a P763 da freguesia 130101 Aboadela (extinta), P760 da freguesia 130103 Ansiães e P287 da freguesia 130106 Canedo (extinta), no valor de € 2.606.530,00.
*
1.2. Aquele Tribunal, por sentença de 09/12/2016 (fls.624/655), julgou improcedente a impugnação judicial.
*
1.3. A impugnante recorre dessa decisão terminando as suas alegações com o seguinte quadro conclusivo:
«A. A Recorrente censura a sentença recorrida por esta não ter considerado procedentes os vícios pela mesma invocados com referência aos actos de segunda avaliação para fixação do VPT em sede de IMI dos equipamentos, essencialmente aerogeradores, que formam o parque de aproveitamento e transformação de energia eólica localizado em Amarante e operado pela Recorrente.
B. Quanto à determinação da incidência objectiva, tendo o Tribunal a quo dado como assente que os aerogeradores são bens móveis, compostos por simples equipamentos, com sejam, as torres, as pás, o gerador, a nacelle e o rotor e que as torres, tal como os restantes equipamentos, são produzidas em fábrica, transportadas para o local e aí temporariamente ligadas às sapatas, sendo que individualmente não têm autonomia ou utilidade — cfr. Factos C), D), F) da Fundamentação de Facto da sentença —, teria o Tribunal a quo de ter julgado que os aerogeradores não poderiam ser enquadrados no conceito de prédio do artigo 2.º do Código do IMI.
C. É que, se os aerogeradores são bens móveis, a sua inclusão no conceito de prédio dependeria de se poder concluir, nos termos do n.º 2 do artigo 2.º do Código do IMI, que estes são edifícios ou construções, o que, na medida em que o Tribunal a quo considerou provados que os mesmos são apenas equipamentos, não é possível; e se, individualmente, cada um dos equipamentos que formam um aerogerador não tem autonomia ou utilidade, então não está preenchido o requisito do n.º 1 do artigo 2.º do Código do IMI de que a construção ou edifício em causa tenha valor económico próprio.
D. Sem prescindir e ademais, a Recorrente entende que a cabal apreensão do conceito de prédio em IMI implica recorrer a outras normas, vg. as constantes dos artigos 1.º, 3.º, 4.º e 6.º do mesmo Código, que acrescentando precisão e praticabilidade a este conceito, consagram, por isso, relevantes limitações à indeterminação das normas de incidência objectiva em sede de IMI.
E. Ora, na medida em que a Administração fiscal caracteriza os «prédios» em causa como prédios urbanos, então, ao contrário do que afirma o Tribunal a quo, teriam sempre estes de constituir prédios servidos por infra-estruturas urbanas que alteram e condicionam o seu valor — cfr. parecer do Prof. Carlos Lobo, junto como doc. n.º 22 em anexo à p.i. —, o que não se verifica no caso em apreço.
F. Na verdade, e sem conceder, dado que não se vislumbra nos artigos 3.º, 4.º e 6.º do Código do IMI elementos suficientes que nos permitam concluir, de forma peremptória, que, in casu, os aerogeradores se subsumem com ao conceito de prédio, entendimento nesse sentido não satisfaz o mínimo de determinabilidade da incidência dos impostos, dado que, designadamente, não é possível através de interpretação da lei, identificar fielmente qual é a realidade, eventualmente, tributável, pelo que a tributação dos aerogeradores em sede de IMI estaria ferida de manifesta inconstitucionalidade por violação do artigo 103.º, n.º 2 da CRP, inconstitucionalidade que se deixou já arguida.
G. Por outro lado, a interpretação das normas vertentes dos artigos 2.º e 6.º do Código do IMI no sentido de permitir a inscrição como prédio e a tributação de realidades como os aerogeradores, quando não o permite quanto a outras realidades em tudo semelhantes — como os placards de publicidade, as antenas de telecomunicações ou os postes de electricidade, relativamente às quais não há conhecimento que alguma vez a Administração fiscal tenha obrigado à sua inscrição matricial ou alegado uma possível incidência de IMI —, mostra-se ferida de inconstitucionalidade por violação do princípio geral de igualdade consagrado no artigo 13.º da CRP.
H. Posto isto, os actos em crise terão de ser anulados, por vício de violação de Lei, na medida em que partem do pressuposto errado da incidência de IMI, violando os artigos 2.º, 3.º, 4.º e 6.º do Código do IMI, e por se basearem em normas que não podem ser in casu aplicadas por inconstitucionalidade decorrente de violação dos princípios da legalidade e da igualdade, cabendo revogar, por violação daquelas normas e dos identificados princípios, a sentença recorrida que assim não o julgou.
I. Existe já uma tributação específica aplicável a parques de produção de energia eólica, previsto no n.º 28 do anexo II do Decreto-Lei n.º 189/88, de 27 de Maio, pelo que a incidência de IMI nestes casos envolveria uma inadmissível sobreposição de normas de incidência que visam a tributação do mesmo facto e com idêntica finalidade, pelo que se deverá eliminar a tributação em sede de IMI, pelo princípio geral do afastamento da aplicação da norma geral em favor da que reveste carácter especial.
J. No que tange à determinação da incidência subjectiva, na medida em que os aerogeradores configuram meros equipamentos insusceptíveis de ser qualificados como prédios, torna-se inútil a determinação da respectiva propriedade feita pelo Tribunal a quo, sendo, pois, necessário sublinhar que a Recorrente é tão-somente utilizadora dos terrenos baldios onde instalou os relevantes equipamentos, não estando, nestes termos e também com referência a tais realidades, sujeita à incidência de IMI por este imposto apenas incidir, ao abrigo do artigo 8.º do Código do IMI, sobre proprietários, superficiários e usufrutuários.
K. Aliás, o próprio Tribunal considera provado que a Recorrente não é titular de um qualquer direito real sobre prédio urbano no Município de Amarante — cfr. Facto 1) da matéria de facto provada.
L. Assim, os actos que procederam à avaliação e fixação do VPT dos alegados «prédios» efectuados com base no IMI — cujos pressupostos de incidência não se encontram preenchidos — devem ser anulados por padecerem do vício de violação de lei, mediante a violação do artigo 8.º do Código do IMI, cabendo, pois, anular a sentença recorrida e substituí-la por outra que considere afastada a verificação da incidência subjectiva, sob pena de violação da mesma disposição legal.
M. Quanto à aplicação do «método do custo», erra o Tribunal a quo ao não considerar verificada violação do princípio da igualdade, plasmado no artigo 13.º da Constituição, dado que as normas decorrentes dos n.os 1 e 2 do artigo 46.º do Código do IMI, interpretadas no sentido de permitirem à Administração fiscal decidir, de modo arbitrário, quais as realidades avaliadas sob aquele método e, à sua livre vontade, densificar os respectivos parâmetros de forma ad hoc e subjectiva — como, aliás, o faz mediante a simples emissão de ‘Manuais de Avaliação’ internos ou de Circulares — são inconstitucionais por violação daquele mesmo princípio, inconstitucionalidade que se argui.
N. Do mesmo passo, erra também o Tribunal a quo por considerar que a determinação da matéria colectável não está sujeita ao princípio da legalidade, dado que, de acordo com a doutrina versada sobre esta matéria, aquela deve ser incluída no conceito de incidência plasmado no n.º 2 do artigo 103.º da CRP.
O. Donde, a norma do artigo 46.º, n.º 2, do Código do IMI, interpretada no sentido de permitir à Administração fiscal criar e adaptar o «método do custo» caso a caso e mesmo mediante ‘Manual de Avaliação’ interno ou Circular, como acontece in casu, é manifestamente inconstitucional por violação dos artigos 103.º, n.º 2, e 165.º, n.º 1, alínea i) da Constituição, inconstitucionalidade que já se arguiu e, de novo, se invoca.
P. Ademais, resulta também que o artigo 46.º do Código do IMI, e os artigos 2.º e 8.º do mesmo Código, interpretados no sentido de permitirem a fixação de VPT em nada relacionado com os serviços urbanísticos que se visa remunerar mediante o IMI ou com o beneficio dos mesmos decorrentes, mostram-se inconstitucionais por violação do princípio constitucional da proporcionalidade, princípio a que estão sujeitos todos os actos do poder público e que se encontra nomeadamente plasmado no artigo 266.º, n.º 2, da CRP.
Q. Tudo visto, por vício de violação de Lei e por se basearem em normas que não podem ser in casu aplicadas por violação dos princípios constitucionais da igualdade, da legalidade e da proporcionalidade, os actos em apreço terão de ser anulados, resultando portanto igualmente inquinada a sentença recorrida que não deu como verificada aquela violação, devendo ser revogada e substituída por outra que determine a anulação dos actos em crise.
R. Sem prescindir, no que respeita aos erros das avaliações concretas dos alegados prédios em apreço, de novo andou mal o Tribunal a quo ao não considerar aqueles verificados, em particular:
a) a Administração fiscal não fez prova, aquando das avaliações contestadas, da impossibilidade de utilizar as regras do artigo 38.º do Código do IMI, a qual lhe competia — cfr. artigo 74.º, n.º 1, da LGT — e é exigida pela primeira parte do n.º 2 do artigo 46.º do Código do IMI;
b) nas segundas avaliações sub judice foram ilegalmente considerados os custos de uma parte dos equipamentos que a Recorrente instalou no Município de Amarante, em concreto, as torres dos aerogeradores e os postos de transformação;
c) nas avaliações em causa não deveria ter sido tido em conta a área do subsolo ocupada pela sapata do aerogerador, mas apenas a área ocupada pela sua base;
d) na determinação dos atribuídos a cada um dos aerogeradores deveria ter sido tido em conta que o fornecimento deste parque eólico foi efectuado na modalidade “chave na mão”, o que reduz o custo unitário de mercado dos elementos;
e) no que respeita ao prédio inscrito na matriz predial sob o artigo P 760 da freguesia de Aboadela não deveria ser considerada a área do terreno livre exterior ao edifício, uma vez que o mesmo não possui qualquer vedação e pode ser utilizada de forma pública.
S. Assim, os resultados da segunda avaliação dos «prédios» (ilegalmente) inscritos na matriz padecem de erro de identificação e quantificação, pelo que os actos de determinação do VPT impugnados devem ser anulados, por vício de violação de Lei, devendo ser revogada e substituída a sentença que assim não o entendeu e decidiu.
T. Finalmente, a Recorrente entende que deveria ter o Tribunal a quo considerado procedente o vício de falta de fundamentação dos actos de segunda avaliação e determinação do valor patrimonial tributário dos «prédios» impugnados.
U. É que, desde logo, o artigo 37.º do CPPT chamado à colação pelo Tribunal a quo serve para suprir deficiências da notificação e não do acto notificado, in casu dos próprios actos de segunda avaliação, sendo que as referências feitas nas fichas e termos de avaliação em apreço são absolutamente conclusivas, não esclarecendo quaisquer das questões colocadas pela Recorrente.
V. Ante o exposto, por falta de fundamentação clara, suficiente e congruente, de facto e de direito, os actos de segunda avaliação dos «prédios» em crise devem ser anulados por vício de forma, sendo igualmente de revogar a sentença que assim o não entendeu por violação do artigo 268.º, n.º 3, CRP e o artigo 77.º, n.º 1, da LGT.
W. Por fim, sob pena de violação dos artigos 6.º e 11.º do RCP e dos princípios constitucionais da proporcionalidade e do direito de acesso aos Tribunais e nos termos do n.º 7 do artigo 6.º do RCP, deve a decisão recorrida ser revogada e a substituída por outra que dispense o pagamento do remanescente da taxa de justiça, ante a simplicidade da tramitação do processo, a ausência de particular complexidade da causa e a lisura do comportamento das partes.».
*
1.4. A FP contra-alegou tendo formulado as seguintes conclusões:
«A) As torres eólicas objeto das avaliações aqui impugnadas são realidades que devem ser qualificadas como prédios nos termos do CIMI;
B) Para tal qualificação é irrelevante que aquelas torres eólicas possam ser desmontadas e montadas noutro local, uma vez provado o seu carater de permanência e a afetação a fins não transitários;
C) O conjunto formado pelas torres eólicas e pelas sapatas, cujas avaliações foram postas em causa através da presente impugnação judicial, possuem todos os requisitos legais para serem qualificadas prédios nos termos do CIMI (estrutura física, valor económico e patrimonialidade);
D) O facto, daquelas construções estarem implantadas em terrenos baldios arrendados não constitui impedimento à sua qualificação como prédios para efeitos fiscais, assim como não obsta a essa qualificação o facto de um hotel estar implantado em terrenos do domínio público (Cfr. Acórdãos do STA proferidos, nos processos n.º 027/10, n.º 0355/11 e n.º 0280/12, respetivamente em 02-06-2010, 19-11-2011 e 14-01-2015);
E) Não se verifica a alegada violação do artigo 13.º, da CRP, resultante da qualificação como prédios das referidas construções, pois realidades diferentes não são comparáveis;
F) As construções em causa nos presentes autos devem ser qualificadas como prédios urbanos, uma vez que que não possuem as caraterísticas legais para serem qualificadas, como prédios rústicos, ou como prédios mistos;
G) Os prédios urbanos que integram o Parque Eólico de ………….. não se destinam a fins habitacionais, comerciais, industriais, ou para serviços;
H) In casu, estamos perante prédios urbanos da espécie “Outros”, pelo que se mostra correta e legal a decisão do Chefe do Serviço de Finanças de Amarante ao determinar a sua inscrição matricial e subsequente avaliação como tal;
I) O método do custo adicionado do valor do terreno, previsto no artigo 46.º n.º 2, do CIMI, é o método que melhor se adapta à avaliação desta espécie de prédios urbanos que possuem características substancialmente diversas (quer pelos materiais utilizados, quer pelos métodos de construção, quer pela própria arquitetura) das que possuem os prédios urbanos que se destinam à habitação, ao comércio, à indústria, ou aos serviços;
J) O método do custo, enquanto método de avaliação predial, é tão objetivo quanto é a avaliação predial segundo a fórmula prevista no artigo 38.º, do CMI, e revela-se, claramente, o método mais eficaz para a fixação de um VPT o mais aproximado possível do valor intrínseco deste tipo de prédios urbanos;
K) O custo efetivo desta espécie de prédios urbanos, cujo valor não é influenciado por fatores extrínsecos e intrínsecos comuns aos demais prédios, será a tradução mais fiel do seu verdadeiro valor de mercado que é o objetivo de toda e qualquer avaliação efetuada nos termos do CMI;
L) A impossibilidade de aplicar na avaliação de torres eólicas, mesmo que adaptadas, as regras gerais dos artigos 38.º e seguintes do CMI, resulta da própria lei;
M) A avaliação de acordo com o disposto no artigo 46.º n.º 1, do CMI, apenas deve efetuar-se quando estejam em causa edifícios e não construções como é o caso do conjunto formado pelas torres eólicas e pelas sapatas;
N) Os valores patrimoniais tributários fixados nas avaliações sub judice, aos referidos prédios, são legais e foram corretamente calculados;
O) A impugnante não fez prova de que os valores patrimoniais tributários fixados àqueles prédios são excessivos e desproporcionais;
P) A fundamentação constante das notificações do resultado das avaliações remetidas à impugnante e dos termos de avaliação, permitiu à ora impugnante apreender as razões porque foram utilizados os valores em causa e não quaisquer outros;
Q) Os termos de avaliação explicam cabalmente, de facto e de direito, de forma expressa, clara, congruente e compreensível, os motivos da aplicação do método de avaliação previsto no artigo 46.º, n.º 2, do CMI, a impossibilidade de utilização das regras do artigo 38.º daquele mesmo código, o motivo por que não foram avaliadas a cabine, as pás e o posto de transformação inseridos nas torres, a forma de determinação dos preços aplicados na avaliação;
R) Os atos de fixação dos valores patrimoniais tributários, objeto da presente impugnação judicial, estão devidamente fundamentados e respeitam integralmente o estabelecido nos artigos 77º, n.os 1 e 2, 84.º n.º 3, da LGT, 124.º e 125.º, do CPA (na redação à data) e 268º, n.º 3 da CRP;
S) O facto da impugnante ser arrendatária dos terrenos baldios onde instalou o referido parque eólico não constitui obstáculo à tributação dos prédios que o integram em sede de IMI, pois detém sobre eles um direito de uso privativo;
T) Possuindo a impugnante o estatuto de proprietária das construções que erigiu no exercício do direito de uso privativo dos terrenos baldios que arrendou, deve ser ela o sujeito passivo do IMI, nos termos do disposto no n.º 1, do artigo 8.º, do CMI;
U) O arrendamento dos terrenos baldios onde a impugnante instalou os prédios em causa, não teve como propósito o exercício da pastorícia ou de uma qualquer atividade agrícola ou silvícola;
V) A tributação predial dos parques eólicos não pode realizar-se através da renda prevista no n.º 28, do anexo I do Decreto-Lei n.º 189/88, de 27 de maio, uma vez que através desta se tributa o rendimento e é através do IMl que se tributa a detenção de património imobiliário;
W) Não se verifica a alegada violação do princípio da equivalência, pois a impugnante para aceder e utilizar os seus prédios usa inúmeros meios e serviços prestados pelo município;
X) Nas avaliações impugnadas não se verifica qualquer contradição entre a atuação do Serviço de Finanças de Amarante e as instruções da própria AT;
Y) Não se verificam também os alegados erros de avaliação relativos á subestação (artigo 760 da freguesia de Aboadela) pois a área de terreno considerada, ao incluir a área de implantação, a área ocupada pelo alpendre e a área do logradouro contíguo necessário ao normal e regular funcionamento daquela infraestrutura está correta;
Z) Os atos de inscrição oficiosa na matriz predial e fixação de VPT impugnados, não padecem de nenhum dos alegados vícios que lhe foram imputados na presente impugnação judicial, pelo que, bem decidiu o Meritíssimo Juiz do Tribunal “a quo” ao julga-la totalmente improcedente.».
*
1.5. No Despacho de sustentação (fls.841/842) o Juiz do TAF de Penafiel sustentou que a decisão recorrida não padecia de qualquer nulidade e determinou a subida dos autos a este Supremo Tribunal.
*
1.6. Recebidos os autos foi dada vista ao Ministério Público que emitiu a seguinte pronúncia:
«Recorre a A……………., SA da sentença do TAF de Penafiel de 9.12.2016 que julgou totalmente improcedente a impugnação da decisão de fixação do valor patrimonial das segundas avaliações dos 23 prédios inscritos oficiosamente na matriz predial urbana dos artigos P743 a P763 da extinta freguesia de Aboadela, P760 da freguesia de Ansiães e P287 da extinta freguesia de Canadelo, do concelho de Amarante.
Sustenta, para além do mais, o erro de julgamento pelo facto da avaliação e fixação do VTP dos «prédios» em causa ter sido efectuada com base no IMI, cujos pressupostos de incidência não se encontram preenchidos, violando o disposto nos arts. 2.º, 3.º, 4.º e 6.º do CIMI (cfr., nomeadamente, as Conclusões H e L).
A questão não é nova, existindo recente jurisprudência deste STA e do TCA SuI que, apreciando situações similares à dos presentes autos, inquestionavelmente sufragam o entendimento expresso pela impugnante, ora recorrente, no sentido de que os elementos constitutivos de um parque eólico não se subsumem ao conceito fiscal de “prédio”, tal como vem definido nos arts. 2.º, 3.º, 4.º e 6.º do CIMI (cfr. os doutos acs. de 15.03.2017 e de 26.01.2017, proferidos nos Recs. n.os 0140/15 e 516/15.4BELLE, respectivamente).
Aí se considerou, designadamente, doutrina da qual não se vê razão para divergir, que os elementos constitutivos de um parque eólico, como é o caso dos aerogeradores, não se subsumem à figura de “prédio” de acordo com a definição constante no CIMI, atenta a falta de valor económico próprio, sendo no próprio parque eólico que se encontra a manifestação de capacidade contributiva que revela a existência de tal valor.
Assim, assentando a avaliação dos elementos em causa no pressuposto errado de que os mesmos se subsumem ao conceito fiscal de prédio e, como tal, sujeitos a IMl, procederá com esse fundamento o presente recurso ficando prejudicado o conhecimento dos demais fundamentos invocados.
Nesta conformidade, concedendo-se provimento ao presente recurso deverá ser revogada a sentença recorrida, procedendo em consequência a impugnação, com a anulação do acto sindicado.».
*
1.7. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
*
2. A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:
«A) A Impugnante gere nos Municípios de Amarante e Vila Real um conjunto de vinte e três aerogeradores (i.e., também vulgarmente designadas postes ou moinhos de vento) e uma subestação/sala de comandos, que formam o denominado Parque Eólico de ………….., de que é dona e que entrou em funcionamento em 1998, tendo sido ampliado no ano de 2005 (planta de localização do parque de produção de energia eólica em causa junta como doc. n.º 3 em anexo à petição inicial e documento de fIs. 241 a 245).
B) No Município de Amarante encontram-se vinte e dois aerogeradores, do primeiro ao vigésimo primeiro e o vigésimo terceiro e a subestação (doc. n.º 3 em anexo à petição inicial, fls. 241 a 245, 272, 368 a 379, em particular fls. 371 e 377 a 379 e 505 e fichas de avaliação juntas ao PA).
C) Aqueles aerogeradores são, para efeitos civis, bens móveis, posto que se desmontam e montam noutro local, se tal se mostrar útil para a atividade da impugnante, sem prejuízo para o seu funcionamento (facto assente e não contestado).
D) Aqueles aerogeradores foram adquiridos ao respetivo fabricante, em estado de novo, e são constituídos pelos seguintes equipamentos: nacelle, torre, gerador, rotor eólico (composto pelo cubo e três pás), módulo elétrico (composto pelos inversores e posto de transformação) e sistema de controlo (declaração do fabricante dos aerogeradores colocados em Amarante junta como doc. n.º 4 em anexo à petição inicial).
E) Cada aerogerador foi fornecido de forma integrada, incluindo todos aqueles equipamentos, os quais foram transportados para o local e aí montados (doc. n.º 4 em anexo à petição inicial).
F) Individualmente, cada um dos equipamentos que formam um aerogerador — como seja a torre, a nacelle ou as pás — não tem autonomia ou utilidade, sendo apenas em conjunto que cumprem a sua função, in casu a produção de energia elétrica (facto assente e não contestado).
G) Os aerogeradores colocados no Município de Amarante encontram-se, na sua totalidade, instalados em parcela de terrenos baldios, cuja utilização pela impugnante é titulada por dois contratos de arrendamento (um deles promessa), a saber, um celebrado com o Conselho Diretivo dos Baldios da Freguesia de Ansiães e um segundo celebrado com a Junta de freguesia da Aboadela (contratos de arrendamento juntos como doc. n.º 5 em anexo à petição inicial).
H) Os referidos contratos permitem à Impugnante apenas usar uma parcela dos aludidos terrenos baldios, com vista à colocação dos equipamentos necessários à produção de energia eólica, essencialmente, os denominados postes de vento (aerogeradores) (doc. n.º 5 anexo à petição inicial).
I) Nestes termos, no que concerne ao parque de produção de energia eólica em apreço, a impugnante não é proprietária, ou sequer titular de algum direito real, relativamente a qualquer prédio urbano no Município de Amarante (doc. n.º 5 anexo à petição inicial).
J) A impugnante não apresentou declaração com vista à inscrição de qualquer prédio urbano na matriz predial (facto assente e não contestado).
K) A impugnante foi notificada — em 25 de Outubro de 2012, em 30 de Outubro de 2012 e em 4 de Janeiro de 2013 — da avaliação e atribuição do valor patrimonial tributário de vinte e três prédios urbanos, sitos no Município de Amarante, freguesias de Aboadela (vinte e um prédios), Ansiães (um prédio) e Canadelo (um prédio), dos quais era titular (notificações do resultado da primeira avaliação dos 23 alegadas prédios juntos como doc. n.º 6 em anexo à petição inicial).
L) A impugnante não pediu a inscrição na matriz predial urbana de qualquer prédio no referido Município (facto assente e não contestado).
M) A impugnante foi notificada, através do Oficio n.º 4802, de 2012-08-08, do Serviço de Finanças de Amarante, para apresentar a Declaração Modelo 1 de IMI, relativa aos prédios urbanos do tipo “Outros” que constituem o parque eólico em causa nos presentes autos e a que respeitam as notificações referidas em J) (PA e facto não impugnado pela impugnante).
N) Em 3 de outubro de 2012, o Senhor Chefe do Serviço de Finanças de Amarante apresentou oficiosamente as declarações Modelo 1 de IMl que deram origem aos prédios referidos em K), uma vez que a ora impugnante o não fez, tal como lhe havia sido solicitado pelo ofício supra mencionado (PA e facto não impugnado pela impugnante).
O) As declarações Modelo 1 de IMl apresentas oficiosamente pelo Senhor Chefe do Serviço de Finanças de Amarante deram origem à inscrição oficiosa na matriz predial urbana dos artigos P743 a P763 da freguesia 130101 Aboadela, P760 da freguesia 130103 Ansiães e P287 da freguesia 130106 Canadelo, Município de Amarante, dos prédios do tipo “outros” a favor da ora impugnante (facto assente e não contestado).
P) Em 15, 24 e 25 de outubro de 2012 e 29 de dezembro de 2012, foram efetuadas oficiosamente as avaliações dos prédios que integram o referido parque eólico (1.ª avaliação), que foram notificadas à impugnante nas datas referidas em K) (PA e facto não impugnado pela impugnante).
Q) A impugnante apresentou, junto do Serviço de Finanças de Amarante, requerimento para segunda avaliação dos referidos prédios urbanos (cópia do pedido de segunda avaliação junta como doc. n.º 10 em anexo à petição inicial).
R) Em 18 de Novembro de 2013, a impugnante recebeu as notificações do resultado das segundas avaliações, das quais resultou a atribuição o valor patrimonial tributário de €118.510,00 a vinte prédios, €130.850,00 a um prédio e de €192.780,00 a dois prédios (notificações juntas como doc. n.º 16 em anexo à petição inicial).
S) A impugnante impugnou judicialmente o resultado das segundas avaliações, tendo o respetivo processo corrido termos sob o n.º 116/14.6BEPNF, primeiro neste douto Tribunal e depois no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto (facto assente e não contestado).
T) No âmbito deste processo a administração fiscal veio a reconhecer que os atos de segunda avaliação não se encontravam suficientemente fundamentados, tendo os mesmos sido anulados (sentença proferida neste processo, junta como doc. n,º 2 em anexo à petição inicial).
U) No final de 2015, a Administração fiscal promoveu novas segundas avaliações aos referidos prédios, que foi realizada em reunião da Comissão de avaliação nos dias 6 e 22 de outubro e 5 e 13 de novembro de 2015 (facto assente e não contestado e PA designadamente de fls. 36 a 40 do PA).
V) Na nova segunda avaliação o perito nomeado pela impugnante manifestou de novo a sua discordância com inscrição dos mesmos e salientou os erros na identificação (ficha e termo de avaliação atinente ao prédio inscrito na matriz predial sob o artigo P760 da freguesia de Ansiães, ficha e termo de avaliação atinente ao prédio inscrito na matriz predial sob o artigo P760 da freguesia de Aboadela, ficha e termo de avaliação atinente ao prédio inscrito na matriz predial sob o artigo P763 da freguesia de Aboadela, ficha e termo de avaliação atinente ao prédio inscrito na matriz predial sob o artigo P287 da freguesia de Canadelo e ficha de avaliação atinente ao prédio inscrito na matriz predial sob o artigo P743 e termo de avaliação respeitante aos prédios inscritos na matriz predial sob os artigos P743 a P762 da freguesia de Aboadela, todos contendo o entendimento do perito designado pela impugnante, juntos como documentos n°s 17 a 21 em anexo à petição inicial, de fIs. 334 a 391 dos autos, e cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido).
W) A segunda avaliação dos prédios dos artigos P743 a P762, da freguesia de Aboadela, tem, com as devidas adaptações, o teor da avaliação que consta do documento n.º 21, junto pela impugnante à petição inicial, que está junta de fls. 380 a 391 dos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
X) A segunda avaliação do prédio do artigo P760, da freguesia de Ansiães, tem o teor da avaliação que consta do documento n.º 17, junto pela impugnante à petição inicial, que está junta de fls. 334 a 345 dos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
Y) A segunda avaliação do prédio do artigo P760, da freguesia de Aboadela, tem o teor da avaliação que consta do documento n.º 18, junto pela impugnante à petição inicial, que está junta de fls. 346 a 355 dos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
Z) A segunda avaliação do prédio do artigo P763, da freguesia de Aboadela, tem o teor da avaliação que consta do documento n.º 19, junto pela impugnante à petição inicial, que está junta de fls. 356 a 367 dos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
AA) A segunda avaliação do prédio do artigo P287, da freguesia de Canadelo, tem o teor da avaliação que consta do documento n.º 20, junto pela impugnante à petição inicial, que está junta de fls. 368 a 379 dos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
BB) Em 19 de Novembro de 2015, a Impugnante recebeu as notificações do resultado das segundas avaliações, das quais resultou a atribuição o valor patrimonial tributário de €94.870,00 a dezanove alegados prédios, €94.880,00 a um suposto prédio, €122.540,00 a um alegado prédio e de €293.290,00 a dois supostos prédios (doc. n.º 1 em anexo à petição inicial).
CC) Os prédios dos artigos 743 a 759, 761 e 762, da freguesia de Aboadela, foram avaliados, cada um deles, em €94.870,00, tendo a notificação das segundas avaliações o teor do documento de fls. 137, cujo teor aqui se dá por reproduzido, com as devidas adaptações (fls. 137 a 170 e 173 a 176).
DD) O prédio do artigo 760, da freguesia de Aboadela, foi avaliado em €122.540,00, tendo a notificação da segunda avaliação o teor do documento de fls. 171, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
EE) O prédio do artigo 763, da freguesia de Aboadela, foi avaliado em €293.290,00, tendo a notificação da segunda avaliação o teor do documento de fls. 177, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
FF) O prédio do artigo 760, da freguesia de Ansiães, foi avaliado em €94.880,00, tendo a notificação da segunda avaliação o teor do documento de fls. 179, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
GG) O prédio do artigo 287, da freguesia de Canadelo, foi avaliado em €293.290,00, tendo a notificação da segunda avaliação o teor do documento de fls. 181, cujo teor aqui se dá por reproduzido.».
*
3.1. A sentença recorrida entendeu, em síntese, que não ocorre o vício de forma por falta de fundamentação, que as segundas avaliações estão cabalmente fundamentadas, que a notificação das segundas avaliações é válida e que não ocorre insuficiência ou incongruência da fundamentação.
Que não ocorre ilegalidade das segundas avaliações dos prédios em causa, que os mesmos são prédios, existe incidência subjetiva e objetiva em IMI, que os parques eólicos não são já tributados e não existe erro na determinação do valor patrimonial tributário.
Que as construções que fazem parte dos prédios urbanos em causa nestes autos consubstanciam um prédio urbano, da espécie “outros” e que como tal foram oficiosa e legalmente inscritos na matriz predial urbana pelo chefe de finanças do Serviço de Finanças de Amarante, por não terem sido inscritos pela própria impugnante.
Que a decisão de inscrição na matriz predial urbana dos referidos aerogeradores e subestação como prédios urbanos, da espécie “outros”, e a sua subsequente avaliação não padecem de qualquer ilegalidade.
Que a qualificação das referidas construções como prédios não viola o artigo 13.º da CRP, quando comparada com a situação das antenas de telemóveis nem consubstancia uma limitação intolerável do direito de propriedade.
Que os prédios em causa foram avaliados por critérios legais e objetivos pelo que não padecem de qualquer ilegalidade.
Terminou a sentença recorrida indeferindo o pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça.
*
3.2. O presente recurso vem interposto da sentença do TAF de Penafiel de 9.12.2016 que julgou improcedente a impugnação da decisão de fixação do valor patrimonial das segundas avaliações dos 23 prédios inscritos oficiosamente na matriz predial urbana dos artigos P743 a P763 da extinta freguesia de Aboadela, P760 da freguesia de Ansiães e P287 da extinta freguesia de Canadelo, do concelho de Amarante.
Entende a recorrente ocorrer erro de julgamento uma vez que a avaliação e fixação do VTP dos «prédios» foi efetuada com base no IMI, cujos pressupostos de incidência não se encontram preenchidos pelo que teria sido violando o disposto nos artigos 2.º, 3.º, 4.º e 6.º do CIMI.
Conforme refere o MP a questão não é nova, existindo recente jurisprudência deste STA e do TCAS que, apreciando situações similares à dos presentes autos, sufragam o entendimento expresso pela impugnante, ora recorrente, no sentido de que os elementos constitutivos de um parque eólico não se subsumem ao conceito fiscal de “prédio”, tal como vem definido nos artigos 2.º, 3.º, 4.º e 6.º do CIMI o que pode confirmar-se nos acórdãos de 15.03.2017 e de 26.01.2017, proferidos nos processos 0140/15 e 516/15, respetivamente.
Acrescenta, ainda, o MP que aí se considerou, designadamente, doutrina da qual não se vê razão para divergir, que os elementos constitutivos de um parque eólico, como é o caso dos aerogeradores, não se subsumem à figura de “prédio” de acordo com a definição constante no CIMI, atenta a falta de valor económico próprio, sendo no próprio parque eólico que se encontra a manifestação de capacidade contributiva que revela a existência de tal valor.
Que uma vez que assentou a avaliação dos elementos em causa no pressuposto errado de que os mesmos se subsumem ao conceito fiscal de prédio e, como tal, sujeitos a IMl, procede, com esse fundamento o presente recurso ficando prejudicado o conhecimento dos demais fundamentos invocados.
*
3.3. Inexistindo motivos para divergir do caminho percorrido por este STA, em 15-03-2017, no proc. 140, acompanha-se o mesmo transcrevendo as partes que se reputam compatíveis com a situação factual, em tudo semelhantes às dos presentes autos.
“…
A impugnação judicial teve por fundamento e causa de pedir a ilegalidade imputada quer à inscrição oficiosa dessa realidade física na matriz como um prédio urbano, quer à sua avaliação, quer à própria tributação, no entendimento de que os parques eólicos não se enquadram no conceito de “prédio” consagrado no Código do IMI, nem este Código contém qualquer regra de incidência subjetiva que permita que a entidade exploradora seja responsabilizada pelo pagamento deste imposto, como não contém, igualmente, um critério que permita a avaliação de tal tipo de “prédio”. Além de que, na ótica da impugnante, a tributação em IMI redundaria numa dupla tributação, por já existir um imposto municipal que incide sobre os rendimentos da exploração dos parques eólicos, o que gera uma tributação dupla, desigual e desproporcionada, ofensiva das normas constitucionais contidas nos artigos 103º, nº 2, e 104º, nº 3, da Constituição da República Portuguesa.
Com efeito, na petição inicial a impugnante advoga que não é juridicamente sustentável a tributação em IMI dos parques eólicos (no todo ou em parte), porquanto:
(a) os elementos constitutivos de um parque eólico (aerogeradores, elementos de ligação, edifícios de comando e da subestação, etc.) não se subsumem à figura de “prédio” à luz da definição constante no Código do IMI; e as normas de interpretação extensiva não permitem considerar esses elementos, ainda que organizados numa rede virtual coesa, como um único “prédio urbano” para efeitos de IMI;
(b) o Código do IMI não faz qualquer referência que permita concluir que os parques eólicos estão abrangidos pelas regras de incidência tributária de natureza objectiva ou subjectiva, não sendo admissível a integração de lacunas em normas de incidência tributária com recurso à analogia (art.º 11º, nº 4, da LGT);
(c) o Código do IMI também não prevê um método de avaliação dos parques eólicos que se mostre capaz de traduzir o valor económico dos mesmos;
(d) os parques eólicos já são objecto de tributação incidente sobre os rendimentos resultantes da sua exploração, da qual beneficiam os municípios em que se encontrem instalados, pelo que ocorre um dupla e ilegal tributação.

Nessa sequência, foi proferida a sentença ora recorrida, que julgou totalmente improcedente a impugnação judicial, no entendimento de que não ocorria qualquer uma das ilegalidades invocadas pela impugnante.
E é contra essa decisão que se insurge a impugnante, ora recorrente, que continua a insistir que: (i) a tributação dos parques eólicos em IMI escapa às regras de incidência objectiva e subjectiva previstas no CIMI; (ii) a lei não prevê nem define critérios que possibilitem a sua avaliação em sede de IMI; (iii) o acto de avaliação realizado não se encontra devidamente fundamentado; (iv) a tributação em IMI configura uma dupla tributação face ao pagamento da renda prevista no Dec.Lei nº 189/88, de 27 de Maio.

3.1. Do imputado erro de julgamento no que toca aos pressupostos de incidência objectiva de IMI.
A primeira questão que importa analisar é a de saber se um parque eólico (e, em particular, um dos seus subparques) pode subsumir-se à figura de “prédio”, tendo em conta que, como se viu, os serviços de finanças consideraram como tal o Subparque da ………….., que faz parte integrante do Parque Eólico do …………(e não cada um dos seus aerogeradores, como passou a ser prática dos serviços da administração tributária após a Circular nº 8/2013 da Direção de Serviços do Imposto Municipal sobre Imóveis).
Segundo o entendimento vertido na sentença, o conceito fiscal de “prédio”, para efeitos de incidência do IMI, afasta-se da noção civilística contida no art.º 204º do Código Civil, corporizando um conceito mais amplo, «porquanto prevê a existência de um elemento de natureza física (o território, o qual deve ser autónomo e ter um carácter de permanência); um elemento de natureza jurídica (resultante da necessidade do prédio fazer parte do património de uma pessoa física ou jurídica) e um elemento de natureza económica (traduzido na exigência de possuir um valor económico em circunstâncias normais), sendo «que só com a confluência dos três elementos podemos qualificar determinada realidade como prédio para efeitos de enquadramento em sede de IMI».
Entendimento que se mostra correto, na medida em que o art.º 2º do CIMI define o conceito de prédio do seguinte modo:
«1 - Para efeitos do presente Código, prédio é toda a fracção de território, abrangendo as águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes, com carácter de permanência, desde que faça parte do património de uma pessoa singular ou colectiva e, em circunstâncias normais, tenha valor económico, bem como as águas, plantações, edifícios ou construções, nas circunstâncias anteriores, dotados de autonomia económica em relação ao terreno onde se encontrem implantados, embora situados numa fracção de território que constitua parte integrante de um património diverso ou não tenha natureza patrimonial.
2 - Os edifícios ou construções, ainda que móveis por natureza, são havidos como tendo carácter de permanência quando afectos a fins não transitórios.
3 - Presume-se o carácter de permanência quando os edifícios ou construções estiverem assentes no mesmo local por um período superior a um ano.».
Temos, assim, que para efeitos deste imposto, “prédio” é toda a fracção de território (elemento físico), abrangendo águas, plantações, edifícios e construções de qualquer natureza nela incorporados ou assentes com carácter de permanência, que faça parte do património de pessoa singular ou coletiva (elemento jurídico) e que em circunstâncias normais tenha valor económico (elemento económico).
Posto isto, e vista a importância vital do elemento de natureza económica, traduzido na necessidade de a fracção de território em causa possuir, por si só, valor económico para poder ser qualificado como “prédio” para efeitos de incidência objectiva de IMI, a problemática reside, desde logo, em saber se, à luz desta norma, um “parque eólico” pode ser classificado como “prédio” nos termos e para os efeitos da inscrição na matriz predial e consequente avaliação e tributação neste imposto municipal sobre o património imobiliário.
O que passa, necessariamente, por saber o que é um parque eólico.
Da leitura de obras técnicas da especialidade (Cfr., entre outras, a dissertação de mestrado de YESMARY CAROLINA DA SILVA GOUVEIA, no Instituto Superior de Engenharia de Lisboa - Área Departamental de Engenharia Civil, intitulado “Construção de um Parque Eólico Industrial” e bibliografia aí citada.) decorre, de forma clara, que o objetivo final de um parque eólico consiste no aproveitamento da velocidade do vento para a produção de energia elétrica, sendo que, para que tal aconteça, é necessário que o parque seja constituído por alguns elementos essenciais, nomeadamente por um conjunto de aerogeradores que são interligados por cabos de média tensão e cabos de comunicação ligados a uma subestação e a um edifício de comando, que se liga a uma (habitualmente aérea) rede elétrica de transporte.
Deste modo, um parque eólico é constituído por um conjunto obrigatório e interligado de bens, equipamentos e infraestruturas – aerogeradores (Cada um composto por uma sapata de betão ou “fundação”, uma estrutura metálica ou “torre”, uma naceile, um rotor, e três pás.), postos de transformação, edifícios de comando e de subestação, rede elétrica de cabos subterrâneos com ligação entre os aerogeradores e o edifício de comando/subestação e, no caso de existência de várias subestações, linhas elétricas de ligação destas, bem como caminhos de acesso - tudo com vista a converter a energia cinética do vento em energia elétrica e a injetá-la no sistema eléctrico de potência, sendo que os grandes parques eólicos exigem a construção de várias subestações e de linhas de transmissão para a conexão ao sistema elétrico de potência, sendo esta injeção ou conexão ao sistema elétrico um dos principais parâmetros de um parque eólico.
Em suma, um parque eólico é uma fracção de território (terrestre ou marítimo) organizado e estruturado com variados e interligados elementos constituintes e partes componentes – onde se destacam os aerogeradores conectados em paralelo (no mínimo cinco), um ou mais edifícios onde se localizam a(s) subestação(ões) e o centro de operação e manutenção – com ligação ao solo e com carácter de permanência, sendo todo esse conjunto de bens e equipamentos imprescindível à atividade económica em questão: atividade de transformação da energia eólica em energia elétrica, sua injeção no sistema elétrico de potência e consequente venda desta eletricidade à rede elétrica de acordo com a tarifa regulada em Portugal para o sector eólico em geral.
O que significa que cada um desses elementos constituintes e partes componentes de um parque eólico não pode, de per si, ser considerado um prédio urbano (“outros”), na medida em que não constitui uma parte economicamente independente, isto é, não tem aptidão suficiente para, por si só, desenvolver a aludida atividade económica (A mesma razão leva a que não possam ser considerados como “prédios” (nem a AT ousa considerá-los como tal) os diversos elementos e estruturas que integram um estádio de futebol (as balizas, as bancadas, a estrutura coberta, os balneários, etc.) ou que integram um campo de golfe (o green, o tee, o fairway, os obstáculos, o edifício de atendimento, etc.), já que cada uma dessas estruturas e elementos, que se encontram interligados e conexionados com vista ao mesmo objetivo e finalidade económica, não possuem autonomia económica em relação à fração de território ocupada, pese embora seja incontroverso que tanto o estádio de futebol como o campo de golfe constituem, à luz do mencionado preceito do CIMI, prédios urbanos para efeitos de incidência objetiva de IMI.)
Por conseguinte, e em suma, caracterizando-se como elementos ad integrandum domum, sem autonomia económica relativamente ao todo de que fazem parte, fica afastada a possibilidade de classificar como “prédios” autónomos cada um dos diversos elementos constituintes e partes componentes de um parque eólico, não só porque o seu destino normal não é diferente de todo o prédio, como, também, porque não é possível avaliá-los separadamente, na medida em que não são partes economicamente independentes.
Razão por que consideramos inteiramente correta a posição expressa pelo Tribunal Central Administrativo Sul em 26/02/2017, no acórdão prolatado no processo nº 516/15 (onde se discutia a legalidade da inscrição e avaliação como prédio urbano de um aerogerador), segundo o qual «Em circunstâncias normais, um aerogerador integrado num parque eólico destinado à injecção de energia eléctrica na rede pública, não tem valor económico próprio. Pelo contrário, é no próprio parque eólico que se encontra a manifestação de capacidade contributiva que revela a existência de tal valor, motivo pelo qual é o parque eólico, que não o aerogerador, que é remunerado (…).
Pelo que à míngua do terceiro pressuposto, não se pode concluir que um aerogerador pertencente a um parque eólico destinado à injecção de energia eléctrica na rede pública seja um prédio para efeitos de I.M.I., uma vez que o requisito da existência, em circunstâncias normais, do valor económico, não se verifica em relação a cada um dos aerogeradores ou de qualquer outro elemento que compõe o parque eólico (porque individualmente nenhum deles é, por si só, em circunstâncias normais, idóneo para produzir e injectar a energia na rede pública), mas apenas em relação a este (o parque eólico), na sua unidade, atenta a sua finalidade.».
Assiste, pois, razão à impugnante, ora recorrente, quando advoga que os elementos constitutivos de um parque eólico (os aerogeradores, os elementos de ligação, a estação de comando e a subestação) não se subsumem à figura de “prédio” de acordo com a definição constante no CIMI, atenta a falta de valor económico próprio.
O que faz soçobrar o entendimento vertido pela Direção de Serviços do Imposto Municipal sobre Imóveis na Circular nº 8/2013, onde se veiculou o entendimento de que cada aerogerador e cada subestação são unidades independentes em termos funcionais, devendo, por isso, ser considerados como prédios autónomos e qualificados como prédios urbanos do tipo "outros".
Posto isto, e apesar de se poder concluir que se deteta, em princípio, na porção de território ocupada por todo o parque eólico não só a presença do apontado elemento físico como, também, do elemento económico, razão por que o Parque Eólico do ………… poderá constituir um único prédio afeto ao mesmo fim e atividade económica, há que atender ao caso em análise, onde se constata que um dos seus subparques (o da …………….) foi qualificado pelos serviços da administração tributária como um prédio autónomo, inscrito na matriz predial como prédio urbano (tipo “outros”) e ao qual foi atribuído o artigo matricial P- 571.
…”.
Resulta do probatório que a impugnante gere nos Municípios de Amarante e Vila Real um conjunto de vinte e três aerogeradores (i.e., também vulgarmente designadas postes ou moinhos de vento) e uma subestação/sala de comandos, que formam o denominado Parque Eólico de ……………., de que é dona e que entrou em funcionamento em 1998, tendo sido ampliado no ano de 2005 (A).
Que no Município de Amarante se encontram vinte e dois aerogeradores, do primeiro ao vigésimo primeiro e o vigésimo terceiro e a subestação (B).

Que a impugnante não apresentou declaração com vista à inscrição de qualquer prédio urbano na matriz predial (J).
Que a impugnante foi notificada — em 25 de Outubro de 2012, em 30 de Outubro de 2012 e em 4 de Janeiro de 2013 — da avaliação e atribuição do valor patrimonial tributário de vinte e três prédios urbanos, sitos no Município de Amarante, freguesias de Aboadela (vinte e um prédios), Ansiães (um prédio) e Canadelo (um prédio), dos quais era titular (notificações do resultado da primeira avaliação dos 23 alegados prédios juntos como doc. n.º 6 em anexo à petição inicial) (K).
Que a impugnante não pediu a inscrição na matriz predial urbana de qualquer prédio no referido Município (L).
De tudo o exposto resulta que os referidos vinte e três prédios urbanos não podem ser considerados como prédios autónomos à luz do conceito enunciado no art.º 2º do Código do IMI.
Inexistindo a referida falta de autonomia económica, não é aceitável a inscrição oficiosa desta realidade física na matriz predial como um prédio urbano, nem, por consequência, a sua avaliação como tal, o que determina, por ilegais, a anulação desses atos.
Assim sendo fica prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas, designadamente a de saber se o Código do IMI prevê ou não um método de avaliação dos parques eólicos que se mostre capaz de traduzir o respetivo valor económico.
*
3.4. Entende a recorrente que deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que dispense o pagamento do remanescente da taxa de justiça.
Com efeito sustenta a recorrente que, sob pena de violação dos artigos 6.º e 11.º do RCP e dos princípios constitucionais da proporcionalidade e do direito de acesso aos Tribunais e nos termos do n.º 7 do artigo 6.º do RCP, deve a decisão recorrida ser revogada e a substituída por outra que dispense o pagamento do remanescente da taxa de justiça, ante a simplicidade da tramitação do processo, a ausência de particular complexidade da causa e a lisura do comportamento das partes (conclusão W).
Sobre esta questão entendeu a sentença recorrida o seguinte:
“…
A impugnante e a Fazenda Pública pediram a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do art. 6.º, n.º 7, do RCP.
O art. 6.º, n.º 7, do RCP prevê: “nas causas de valor superior a (euro) 275 000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta afinal, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento”.
A dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça é a exceção e não a regra. Caso contrário, a lei em vez de prever a dispensa estipularia a obrigatoriedade do pagamento.
Por isso, “Deve considerar-se que o remanescente não será devido não quando as causas não tenham especial complexidade mas quando a sua dificuldade seja inferior à normal ou média - que terá sido a ponderada pelo legislador quando desenhou o sistema vertido no Regulamento das Custas Processuais; - Se assim não fosse, antes aquele legislador teria fixado que o pagamento do remanescente só se justificaria nos casos de particular dificuldade — eventualmente a definir pelo julgador — sendo, então, o regime de liquidação do remanescente excepcional e não regra como emerge, presentemente, do Regulamento das Custas Processuais ao permitir-se a sua dispensa apenas mediante despacho devidamente fundamentado, explicativo, patenteando a singularidade ou carácter atípico da situação concreta; - Na ponderação da dificuldade de uma acção, deve atender-se à dimensão dos articulados e alegações das partes, à natureza das questões a analisar e ao «peso» temporal e material da instrução.” (Acórdão do Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, de 14/01/2016, processo n.º 7973-08.3TCLRS-A.L1-6, disponível em www.dgsi.pt).
Neste sentido também não pode deixar de ponderar-se que “Não se justifica a dispensa do remanescente da taxa de justiça devida pelo recurso, ao abrigo do disposto no n.º 7 do art. 6.º do RCP, se o montante da taxa de justiça devida não se afigura desproporcionado em face do concreto serviço prestado, por a questão decidenda no recurso não se afigurar de complexidade inferior à comum e a conduta processual das partes se limitar ao que lhes é exigível e legalmente devido.” (Acórdão do colendo Supremo Administrativo, de 15/02/2011, processo n.º 04255/10, disponível em www.dgsi.pt).
No caso em apreço, a conduta processual das partes limita-se ao que é legalmente exigível, mas não pode deixar de invocar-se a relativa extensão dos articulados e alegações, o número de questões suscitadas e sobretudo que as questões a decidir revelam relevante complexidade jurídica, não sendo seguramente uma questão simples de decidir, relevando a especial densidade na apreciação e julgamento dos factos e a sua subsunção jurídica às inúmeras e complexas questões suscitadas.
Por isso, não podendo dizer-se que se trata de uma causa simples o Tribunal não pode deixar de indeferir o pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida, nos termos do art. 6.º, n.º 7, do CPC.
Tanto mais que não sendo uma causa evidentemente simples a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça também poderia constituir uma interpretação violadora dos princípios constitucionais da igualdade e da proporcionalidade, na medida em que estava a prejudicar-se todas as partes que recorreram aos Tribunais e cujas ações tinham um valor igual a €275.000,00, porquanto estavam a suportar os mesmos encargos que as partes dos presentes autos, cuja utilidade económica do pedido é substancialmente diversa da daqueles processos.”.
Entende-se que a sentença recorrida, que neste sentido se pronunciou, não é de manter.
Com efeito concorda-se com a sentença recorrida quando afirma que a conduta processual das partes limita-se ao que é legalmente exigível, não podendo deixar de invocar-se a relativa extensão dos articulados e alegações, o número de questões suscitadas e que as questões a decidir revelam relevante complexidade jurídica, não sendo seguramente uma questão simples de decidir, relevando a especial densidade na apreciação e julgamento dos factos e a sua subsunção jurídica às inúmeras e complexas questões suscitadas.
Contudo não pode deixar de se atender ao elevado valor da causa e à consequente elevada taxa de justiça a que conduzirá a não dispensa, ainda que parcial, do remanescente.
Daí que se entenda que deve ser dispensado o pagamento parcial da taxa de justiça em 1ª instância na proporção de 50%.
Pelos mesmos motivos entende-se que deve ser dispensado o pagamento parcial da taxa de justiça neste STA na proporção de 75%.
*
Nos termos do artigo 2º do CIMI os elementos constituintes e partes componentes de um parque eólico não podem, de per si, ser considerados como prédios urbanos da espécie “outros”.
*
4. Termos em que acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida também no que respeita ao pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça em que se dispensa o pagamento de 50% do remanescente da taxa de justiça em 1ª instância.
Acorda-se, ainda, em dispensar o pagamento parcial da taxa de justiça neste STA na proporção de 75%.

Custas pela Fazenda Pública e pela recorrente na 1ª instância e neste STA na proporção de 19/20 e 1/20, respetivamente.

Lisboa, 11 de Outubro de 2017. – António Pimpão (relator) – Ascensão Lopes – Ana Paula Lobo.