Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0257/14
Data do Acordão:02/12/2015
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:INSOLVÊNCIA
REVERSÃO
CRÉDITOS VENCIDOS APÓS DECLARAÇÃO DE FALÊNCIA
Sumário:I - A declaração de insolvência da sociedade executada não obsta à instauração da execução por créditos vencidos antes da declaração de insolvência, havendo, contudo, que, logo após a instauração, proceder à respectiva sustação em conformidade com o disposto no n.º 1 do artigo 180.º do CPPT.
II - A instauração da execução fiscal por créditos vencidos anteriormente à declaração de falência, como são os créditos exequendos, encontra expresso apoio legal no disposto no n.º 1 do artigo 180.º do CPPT.
III - O acto de reversão praticado antes da entrada em vigor da Lei 64-B/2011 de 30/12 (LOE 2012), a qual aditou um nº 7 ao artº 23º da LGT é ilegal por violação do artº 180º nºs 1 e 2 do CPPT.
Nº Convencional:JSTA00069071
Nº do Documento:SA2201502120257
Data de Entrada:02/27/2014
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF PENAFIEL
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL / OPOSIÇÃO.
Legislação Nacional:LGT98 ART23 N7.
CPPTRIB99 ART153 N2 ART180 N1 N2 ART181 N2.
CIRE ART28 ART36 ART85 N2 ART88 ART230 N1 A D.
DL 53/04 DE 2004/03/18 ART11 N1.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0175/11 DE 2011/05/11.; AC STA PROC0326/11 DE 2011/09/07.
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO VOLII 5ED PAG232-233.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – RELATÓRIO

A………., NIF …………, deduziu oposição ao processo de execução fiscal nº 1759201101011880, instaurado por dívidas de IVA e de IRS, no valor global de € 12.723,00, originariamente instaurada contra “B………….., Ldª , melhor identificada nos autos.

Por sentença de 22 de novembro de 2013, o TAF de Penafiel, julgou procedente a oposição e anulou o despacho de reversão.

Reagiu a Fazenda Pública, interpondo o presente recurso, cujas alegações integram as seguintes conclusões:

“A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a oposição deduzida contra a reversão efectuada contra o aqui oponente nos autos de execução fiscal n.º 1759201101011880 e apensos, instaurado pelo serviço de finanças de Amarante para cobrança de dívidas de IVA do ano de 2006 e IRS do ano de 2011, em que é executada a devedora originária B……… Lda., NIPC ……………
B. Decidiu o Tribunal a quo pela procedência da presente oposição com fundamento na impossibilidade de ser efectuada a reversão da execução fiscal na pendência de processo de insolvência da sociedade, devedora originária, invocando para o efeito o disposto no art. 180º do CPPT.
C. Contudo, não pode a Fazenda Pública concordar com este entendimento, perfilhando a convicção que a sentença sob recurso incorre em erro de julgamento de direito, porquanto, da declaração de insolvência do devedor originário não resulta a impossibilidade de ser efectuada a reversão da execução contra os gerentes, responsáveis subsidiários.
D. A questão a decidir no presente recurso prende-se com os efeitos da declaração de insolvência na tramitação do processo de execução fiscal instaurado por dívidas vencidas anteriormente, atento ao disposto no art. 180° do CPPT.
E. O art. 180° do CPPT, por um lado, nos nºs 1 e 2 ordena a suspensão das diligencias executivas em processos executivos instaurados por dívidas vencidas anteriormente à declaração de insolvência do devedor, por outro lado, o n.º 6 determina o prosseguimento daquelas diligências executivas quando estamos perante processos executivos instaurados por dívidas vencidas após a declaração de insolvência.
F. Conforme ensina Jorge Lopes de Sousa na anotação 8 ao art. 180° do CPPT de Jorge Lopes de Sousa, in CPPT anotado e comentado, 6ª edição, 2011, a avocação dos processos de execução fiscal ao processo de insolvência tem como finalidade principal assegurar que nesses processos de execução fiscal não sejam tomadas decisões que possam ter interferência no processo de insolvência, nomeadamente, a penhora de bens já apreendidos para a massa insolvente, “se não fosse esta a finalidade principal, a sua devolução deveria ocorrer logo que não pudessem ser reclamados os créditos”.
G. Daí que, o art. 180º do CPPT deva ser interpretado à luz do que dispõe o art. 88° do CIRE, no sentido de não ser efectuada a imediata avocação dos processos de execução fiscal ao processo de insolvência, e sua consequente sustação, quando estão reunidos os requisitos para a efectivação da responsabilidade subsidiária prevista nos arts. 23° da LGT e 153° n.º 2 do CPPT.
H. Permitindo, desse modo, quando se mostrem verificados os requisitos previstos no arts. 24° da LGT e 153°, n.º 2, do CPPT, o chamamento à execução daquele que, apesar de não ter sido demandado originalmente, tem legitimidade passiva, por via da responsabilidade subsidiária, por ser já sujeito passivo de uma obrigação susceptível de cobrança coerciva nos termos do art. 18°, n.º 3, do CPPT.
I. O objectivo da avocação dos processos de execução fiscal ao processo da insolvência de impedir a tomada de diligências executivas que atinjam bens da massa insolvente não é beliscado com a efectivação da responsabilização subsidiária do art. 23° da LGT.
J. A suspensão da execução contra o revertido desde o termo do prazo para oposição até ao fim do processo de insolvência - até à completa excussão do património — ordenada pelo art. 23, n.º 3, da LGT, assegura o benefício da excussão prévia, acautelando uma eventual diminuição dos montantes dos créditos a pagar por via dos pagamentos efectuados no âmbito do processo de insolvência.
K. A correcta interpretação do art. 180° do CPPT, que se compagina com a unidade do sistema jurídico, que é o elemento primacial da interpretação jurídica (art. 9°, n.º 1, do CodCivil), é a de que a suspensão da execução aí prevista abrange, apenas, as diligências que contendam com os bens do devedor insolvente apreendidos no âmbito do processo de insolvência.
L. A esta correcta interpretação do art. 180° do CPPT não será alheia a alteração legislativa operada através da Lei n.º 64-B/2011, de 30/12 (OE 2012), ao referido art. 23° da LGT, o nº7, que prescreve “O dever de reversão previsto no n.º 3 deste artigo é extensível às situações em que seja solicitada a avocação de processos referida no n.º 2 do art. 181° do CPPT, só se procedendo ao envio dos mesmos a tribunal após despacho do órgão de execução fiscal, sem prejuízo da adopção das medidas cautelares aplicáveis.”
Termos em que, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a mesma, por verificação de erro de julgamento de direito.”

Não houve contra-alegações.

O EMMP pronunciou-se emitindo o seguinte parecer:

“1. Questões a decidir:
- se pode ser efetuada reversão contra responsável subsidiário por dívidas anteriores à insolvência da primitiva devedora, e encontrando-se ainda pendente o respetivo processo de insolvência.
Enquanto na sentença recorrida se entendeu não ser tal possível, com base no previsto no art. 180.º do C.P.P.T., no recurso interposto defende-se o contrário por aplicação do dito art. 180.º, a interpretar à luz do art. 88.º do C.I.R.E., e em termos de ser de efetuar a reversão quando se mostrem verificados os requisitos previstos nos arts. 24.º da L.G.T. e 153.º n.º 2 do C.P.P.T., argumentando-se ainda com o art. 23.º n.º 7 da L.G.T., aditado pela Lei n.º 64-B/2011, de 30/12.
2. Emitindo parecer:
Já foi oportunamente emitido parecer pelo M.º P.º no qual se alertou para o circunstancialismo temporal em que ocorreu a reversão, por citação efetuada a 14/10/2011, e numa altura em que tinha já sido declarada a insolvência da primitiva devedora.
Ora, em face do previsto no art. 180.º do C.P.P.T., resulta que quanto a dívidas anteriores à insolvência, os processos de execução fiscal são de remeter para apensação e que os mesmos só podem prosseguir posteriormente se a empresa ou os responsáveis subsidiários vierem a adquirir bens.
Já não assim quanto às dívidas vencidas posteriormente, conforme excecionado no n.º 6 do dito art. 180.º.
No art. 88.º do C.I.R.E. prevê-se semelhantemente que sejam de remeter os processos para apensação, mas que, no caso de ser declarada a insolvência, possam ser de remeter apenas certidões dos mesmos, no caso de ser possível a execução prosseguir contra responsáveis subsidiários.
É no art. 23ª. da L.G.T. que se regulam os termos a observar quanto à reversão pela qual se opera a dita responsabilidade, observados ainda os requisitos previstos no art. 24.º.
Ora, segundo o previsto nos n.º 2 do dito art. 23.º, a reversão depende da fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, “sem prejuízo do beneficio da excussão”.
É certo que, segundo o previsto no n.º 3 do dito art. 23.º, já ao tempo dos factos se encontrava previsto ser possível operar a reversão, mas apenas quando “não seja possível determinara suficiência dos bens penhorados”.
Será o caso de existir dúvida, residual, quanto ao montante a pagar pelo responsável subsidiário.
Diferente parece ser o caso ora em apreciação em que apenas pela alteração que foi introduzida pelo dito Lei n.º 64-B/2011, de 30/12, que aditou um n.º 7 do dito art. 24.º, passou a ser previsto que tal se pudesse aplicar também ao previsto no art. 181.º do C.P.P.T., disposição em que se prevê ainda em que termos opera a avocação dos ditos processos de execução fiscal, a requerimento do liquidatário.
E quanto à aplicação no tempo o S.T.A. já decidiu que “a responsabilidade subsidiária dos gerentes e administradores de sociedades de responsabilidade limitada, bem como os respectivos pressupostos de aplicação, é matéria regulada pela lei vigente à data do facto gerador dessa responsabilidade”- assim, sumário do acórdão de 11-5-11, proferido no processo 175/11, acessível em www.dgsi.pt.
3. Concluindo, não se encontrando à data dos factos como possível que se pudesse operar a reversão sem que se mostrasse findo o processo de insolvência, o que no presente caso ainda não tinha ocorrido, quer parecer que o recurso é de improceder, sendo de confirmar o decidido.”

2 – FUNDAMENTAÇÃO

O Tribunal “a quo” deu como provada a seguinte factualidade:

A) O Serviço de Finanças de Amarante instaurou contra a executada originária o PEF 1759201101011880 e apensos por dívidas de Imposto Sobre o Valor Acrescentado (IVA), do 2.º trimestre e 2006 e IRS de Março de 2011, no montante global de €12723008, discriminadas nas certidões de fls. 20 a 22, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
B) As dívidas de IVA e IRS reportam-se aos seguintes PEF, montantes, períodos e datas limite de pagamento voluntário e montantes (fls. 20 e 21);



C) Com base na informação e fls. 23, cujo teor aqui se dá por reproduzido, estes PEF foram revertidos contra o oponente pelo despacho de fls. 29, cujo teor aqui se dá por reproduzido, de 29/9/2011.
D) O oponente foi citado para o PEF pelo mandado de citação de fls. 30 e 31, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
E) Em processo instaurado em 21/2/2011 a executada originária foi declarada insolvente por sentença de 11/4/2011, transitada em julgado em 17/5/2011 (fls. 77 a 85).
F) Em 24/4/2013 o processo de insolvência ainda não se encontrava encerrado (fls. 76).

3 – DO DIREITO
Para se decidir pela procedência da oposição considerou o TAF de Penafiel o seguinte (destacam-se apenas os trechos da decisão com maior relevância para o presente recurso)
“1 — Relatório.
A………., contribuinte fiscal n.º ……….., casado, residente na Rua …………, n.º ………, ……….., ………, ………., ……., ………., Amarante, abreviadamente designado oponente, executado revertido no processo de execução fiscal n.º (PEF) 1759201101011880 e apenso, do Serviço de Finanças de Amarante, por dívidas de Imposto Sobre o Valor Acrescentado (IVA) e IRS, no valor global de €12.723,00, em que é executada “B…………, Ldª, pessoa colectiva n.º …….., com sede em …….., Amarante, abreviadamente designada executada originária, deduziu oposição ao processo de execução fiscal.
O oponente alega, em síntese, a ilegalidade da divida, a falta de fundamento da execução por ter impugnado judicialmente a dívida com prestação de garantia e efeito suspensivo, e a pendência do processo de insolvência da executada originária que tinha bens, pelo que não lhe é imputável a insuficiência do património da executada originária. Concluiu pedindo a procedência da oposição nos termos das alíneas a) e i) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT e a extinção do processo de execução fiscal quanto a si.
Com a petição inicial juntou dois documentos e não arrolou testemunhas.
A Fazenda Pública contestou pugnando pela improcedência da oposição.
O oponente foi notificado da contestação.
Não foi realizada a audiência contraditória.
O digno Magistrado do Ministério Público pugna pela procedência da oposição atenta a ilegalidade do despacho de reversão por ter sido proferido na pendência do processo de insolvência.
Questões que ao tribunal cumpre solucionar.
As questões a decidir nestes autos são a ilegalidade da dívida exequenda e a ilegalidade da execução, invocadas pelo oponente e a ilegalidade da reversão suscitada pelo Digno Magistrado do Ministério Público.
2 — Pressupostos processuais.
(…)
3 — Fundamentação.
3.1 — De facto.
(…)
3.2 — De direito.
A ilegalidade da reversão.
O Digno Magistrado do Ministério Público pugna pela ilegalidade do despacho de reversão por ter sido proferido na pendência do processo de insolvência.
Cumpre apreciar e decidir.
O Digno Magistrado do Ministério Público tem razão.
O art. 180.º do CPPT prevê:
“1. - Proferido o despacho judicial de prosseguimento da acção de recuperação da empresa ou declarada falência, serão sustados os processos de execução fiscal que se encontrem pendentes e todos os que de novo vierem a ser Instaurados contra a mesma empresa, logo após a sua instauração.
2 - O tribunal judicial competente evocará os processos de execução fiscal pendentes, os quais serão apensados ao processo de recuperação ou ao processo de falência, onde o Ministério Público reclamará o pagamento dos respectivos créditos pelos meios ai previstos, se não estiver constituído mandatário especial.
3 - Os processos de execução fiscal, antes de remetidos ao tribunal judicial, serão contados, fazendo-se neles o cálculo dos juros de mora devidos.
4 - Os processos de execução fiscal avocados serão devolvidos no prazo de 8 dias, quando cesse o processo de recuperação ou logo que finde ode falência.
5 - Se a empresa, o falido ou os responsáveis subsidiários vierem a adquirir bens em qualquer altura, o processo de execução fiscal prossegue para cobrança do que se mostre em dívida à Fazenda Pública, sem prejuízo das obrigações contraídas por esta no âmbito do processo de recuperação, bem como sem prejuízo da prescrição.
6 - O disposto neste artigo não se aplica aos créditos vencidos após a declaração de falência ou despacho de prosseguimento da acção de recuperação da empresa, que seguirão os termos normais até á extinção da execução.” -
Daqui resulta, em síntese, que temos de distinguir os PEF instaurados em relação a créditos vencidos antes ou depois da declaração de insolvência.
Os PEF instaurados por créditos vencidos depois da insolvência são instaurados depois da declaração da insolvência e seguem os seus trâmites independentemente do processo de insolvência (art.º 180.º, nºs 1 e 2 do CPPT).
Os PEF instaurados por créditos vencidos antes da declaração de insolvência são instaurados antes ou depois da declaração da insolvência e têm de ser sustados e avocados pelo processo de insolvência (art. 180.º, nºs 1 e 2, do CPPT). Os processos instaurados antes do processo de insolvência são sustados e avocados pelo processo de insolvência; os processos instaurados depois do processo de insolvência são sustados logo após a sua instauração.
A avocação do PEF é realizada pelo processo de insolvência. Porém, a jurisprudência tem vindo a entender que sendo o processo de insolvência conhecido do órgão de execução fiscal, este deve remeter o PEF para avocação independentemente do pedido de avocação.
Daqui resulta, que mesmo que o processo de insolvência não avoque o PEF, este deve ser remetido ao processo de insolvência para avocação, o que determina, necessariamente, a sustação do PEF até findar o processo de insolvência. E mesmo que ele não tenha sido avocado pelo processo de insolvência o órgão de execução fiscal deve sustar o PEF ate findar o processo de insolvência, que pode determinar ou não a extinção do PEF caso venha a ser reclamado e pago o crédito fiscal. Se o crédito fiscal não for pago no processo de insolvência, o órgão de execução fiscal prossegue com o PEF logo que finde o de insolvência.
No caso em apreço, o PEF não terá sido avocado pelo processo de insolvência porquanto o processo de execução fiscal estava pendente no Serviço de Finanças conforme resulta da informação de fls. 32.
Todavia, a pendência do processo de insolvência é do conhecimento da administração tributária pelo menos desde 24/6/2011, conforme resulta da informação de fls. 23.
Logo, o órgão de execução fiscal deveria ter sustado e remetido o PEF para o processo de insolvência nos termos do art. 180.º nºs 1 e 2, do CPPT, porquanto os créditos exequendos venceram-se antes da data da declaração de insolvência, já que a data limite de pagamento voluntário das dívidas revertidas ocorreu em 31/3/2011 e 24/4/2011 e a sentença de declaração de insolvência transitou em julgado em 17/5/2011.
Acresce que em 24/4/2013 o processo de insolvência ainda não estava encerrado pelo que órgão de execução fiscal não podia prosseguir com o PEF que deveria estar suspenso desde a declaração e insolvência.
Assim, o despacho de reversão do PEF contra o oponente é ilegal, porquanto foi proferido quando o PEF deveria estar sustado e avocado pelo processo de insolvência, nos termos do art. 180°, nºs 1 e 2, do CPPT.
O PEF só pode prosseguir os seus termos quando for devolvido ao Serviço de Finanças nos termos do n.º 4 do art. 180.º do CPPT. Até lá e até cessar o processo de insolvência o PEF tem de estar sustado.
Logo, o despacho de reversão só pode ser proferido quando o processo de insolvência for devolvido ao Serviço de Finanças nos termos do n.º 4 do art. 180.° do CPPT.
O despacho de reversão proferido antes disso é ilegal por violar o art. 180°, n.º 4, do CPPT.
Nesta parte, o Digno Magistrado do Ministério Público tem razão pelo que sendo ilegal, o despacho de reversão contra o oponente tem de ser anulado por violação de lei (e. 135.º do CPA). A oposição tem, por isso, de proceder nos termos do art. 204°, n.º 1, alínea i), do CPPT.
No entanto, a oposição não deve ser julgada extinta por inutilidade superveniente (arts. 277º, alíneas e), do CPC, e 2.º, alínea e), do CPPT), mas procedente determinando-se a anulação do despacho de reversão porquanto à semelhança da situação a falta de fundamentação do despacho de reversão (citando-se a título exemplificado o douto Acórdão do colendo Supremo Tribunal Administrativo (STA) de 10/10/2012, processo n.º 726/12, in www.dgsi.pt), no caso em apreço o tribunal acaba por não apreciar o mérito da matéria controvertida — da extinção da execução, efeito próprio do processo de oposição — porquanto a ilegalidade do despacho de reversão resulta apenas da questão formal da falta de sustação do PEF.
O facto desta oposição proceder e de anular-se o despacho de reversão, não obsta a que o órgão de execução fiscal venha a prosseguir com o PEF contra o oponente, com nova reversão, depois cessar o processo de insolvência e caso não seja aí pago o crédito exequendo ou na parte em que não for.
Assim, fica prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas (art. 660°, 1° 2, do CPC).
4 - Decisão.
Pelo exposto, julga-se procedente a oposição e anula-se o despacho de reversão (art. 204°, nº1 alíneas i), do CPPT).
Condena-se a Fazenda Pública nas custas do processo (arts. 527°, nºs 1 e 2, do CPC, 1.º, 2°, 7º nº 2, e Tabela II - A, do Regulamento das custas Processuais (RCP) e 8° da Lei n.º 7/2012, de 13 de Fevereiro).
Fixa-se o valor da causa para efeitos de custas e outros previstos na lei em €12.723,00 (arts. 97°-A, n.º 1, alínea e), do CPPT e 315° do CPC).
Registe e notifique.

DECIDINDO NESTE STA

A questão suscitada perante este STA consiste em saber se pode ser efectuada reversão contra responsável subsidiário por dívidas anteriores à declaração de insolvência da primitiva devedora, na pendência do respectivo processo de insolvência.
A resposta não pode deixar de ser negativa, em consonância confirmativa com o decidido na sentença recorrida, em obediência à estatuição do artigo 180º nº 1 do CPPT o qual dispõe que: “ Proferido o despacho judicial de prosseguimento da acção de recuperação da empresa ou declarada falência serão sustados os processos de execução fiscal que se encontrem pendentes e todos os que de novo vierem a ser instaurados contra a mesma empresa, logo após a instauração.”
A conjugação deste preceito com o artigo 88º do CIRE, a nosso ver, não conduz à interpretação proposta pela recorrente de que o art. 180º do CPPT deve ser interpretado no sentido de não ser efectuada a imediata avocação dos processos de execução fiscal ao processo de insolvência, e sua consequente sustação, quando estão reunidos os requisitos para a efectivação da responsabilidade subsidiária prevista nos arts. 23° da LGT e 153° n.º 2 do CPPT para que se permita o chamamento à execução do responsável subsidiário.
Vejamos:
O artº 88º do CIRE dispõe:

Acções executivas
1 - A declaração de insolvência determina a suspensão de quaisquer diligências executivas ou providências requeridas pelos credores da insolvência que atinjam os bens integrantes da massa insolvente e obsta à instauração ou ao prosseguimento de qualquer acção executiva intentada pelos credores da insolvência; porém, se houver outros executados, a execução prossegue contra estes.
2 - Tratando-se de execuções que prossigam contra outros executados e não hajam de ser apensadas ao processo nos termos do n.º 2 do artigo 85.º, é apenas extraído, e remetido para apensação, traslado do processado relativo ao insolvente.
3 - As ações executivas suspensas nos termos do n.º 1 extinguem-se, quanto ao executado insolvente, logo que o processo de insolvência seja encerrado nos termos previstos nas alíneas a) e d) do n.º 1 do artigo 230.º, salvo para efeitos do exercício do direito de reversão legalmente previsto.
4 - Compete ao administrador da insolvência comunicar por escrito e, preferencialmente, por meios eletrónicos, aos agentes de execução designados nas execuções afetadas pela declaração de insolvência, que sejam do seu conhecimento, ou ao tribunal, quando as diligências de execução sejam promovidas por oficial de justiça, a ocorrência dos factos descritos no número anterior.

Ou seja, este preceito reforça, ainda mais, a ideia de sustação absoluta das acções executivas ao expressar no seu número 1 que, “obsta à instauração ou ao prosseguimento de qualquer acção executiva intentada pelos credores da insolvência”.

É certo que como alegado pela recorrente a Lei 64-B/2011 de 30/12 aditou o nº 7 ao artº 23 da LGT com o seguinte teor:

(…) O dever de reversão previsto no n.º 3 deste artigo é extensível às situações em que seja solicitada a avocação de processos referida no n.º 2 do artigo 181.º do CPPT, só se procedendo ao envio dos mesmos a tribunal após despacho do órgão da execução fiscal, sem prejuízo da adopção das medidas cautelares aplicáveis.

Com esta alteração legislativa, através do referido aditamento, parece de facto ter sido querido pelo legislador, que doravante possa/deva efectuar-se a reversão antes de se proceder ao envio do processo de execução ao tribunal onde corre a insolvência.

No entanto dúvidas não temos de que esta alteração legislativa só opera para futuro uma vez que o inovador aditamento em causa não tem natureza interpretativa, devendo considerar-se que a matéria sobre responsabilidade subsidiária dos gerentes e respectivos pressupostos é matéria regulada pela lei vigente à data do facto gerador dessa responsabilidade (neste sentido o acórdão deste STA de 11/05/2011 tirado no recurso nº 175/1 disponível no site da DGSI).

E, porque do probatório resulta que a própria reversão ocorreu em data anterior ao referido aditamento legislativo entendemos que o mesmo não é de considerar para o caso dos presentes autos.

Consequentemente está correcta a asserção contida na sentença recorrida de que, no caso dos autos, o órgão de execução fiscal deveria ter sustado e remetido o PEF para o processo de insolvência nos termos do art. 180.º nºs 1 e 2, do CPPT, porquanto os créditos exequendos venceram-se antes da data da declaração de insolvência, já que a data limite de pagamento voluntário das dívidas revertidas ocorreu em 31/3/2011 e 24/4/2011 e a sentença de declaração de insolvência transitou em julgado em 17/5/2011.

A título complementar cumpre assinalar que, já no acórdão deste STA de 07/09/2011 tirado no recurso nº 0326/11 se havia considerado que a declaração de insolvência da sociedade executada não obsta à instauração da execução por créditos vencidos antes da declaração de insolvência, havendo contudo que, logo após a instauração, proceder à respectiva sustação em conformidade com o disposto no nº1 do artigo 180º do CPPT (destaque nosso).
Neste aresto que abordou a questão (distinta) de saber se era possível a instauração de execução fiscal por créditos vencidos posteriormente à declaração de falência foi abordada a melhor interpretação a fazer do disposto no artº 180º do CPPT com a qual concordamos e que por isso, com a devida vénia aqui nos permitimos citar:
A alegada inaplicabilidade do disposto no artigo 180.º do CPPT ao processo de insolvência apenas poderia resultar do facto de este preceito legal se haver de ter como tacitamente revogado (pois que o não foi expressamente) aquando da entrada em vigor do CIRE (em 15 de Setembro de 2004, nos termos do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 200/2004, de 18 de Agosto), por incompatibilidade do disposto neste Código com o prescrito no artigo 180.º do CPPT.
Não o entendemos assim, contudo, antes se entende, com JORGE LOPES DE SOUSA (Código de Procedimento e de Processo Tributário: Anotado e Comentado, II volume, 5.ª ed., Lisboa, Áreas Editora, 2007, pp. 232/233, nota 7 ao art. 180.º do CPPT), estar-se perante um regime especial para os processos de execução fiscal, pois que só pode entender-se que uma lei geral revoga uma lei especial quando for detectável uma intenção inequívoca do legislador nesse sentido, como impõe o n.º 3 do artigo 7.º do Código Civil, o que não sucede neste caso.
Ora, estando o artigo 180.º do CPPT em vigor e tendo ele por objecto específico os processos de execução fiscal pendentes ou que venham a ser instaurados contra a mesma empresa (n.º 1) e bem assim (n.º 6) os créditos vencidos após a declaração de falência ou despacho de prosseguimento da acção de recuperação (ou, no âmbito do CIRE, da declaração de insolvência a que se referem os artigos 28.º e 36.º do CIRE, ex vi do disposto no n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de Março), é este preceito legal aplicável, e, ao abrigo do que nele se dispõe, há-de reconhecer-se que a instauração da execução fiscal é legalmente possível, embora as respeitantes a créditos vencidos antes da declaração de insolvência tenham de ser sustadas logo após a instauração (cfr. o n.º 1 do artigo 180.º), prescrevendo-se que as relativas a créditos vencidos posteriormente à declaração de insolvência seguirão os termos normais até à extinção da execução (cfr. o n.º 6 do artigo 180.º do CPPT)(…) ».

Uma vez que a sentença recorrida adoptou o entendimento, supra expresso, que entendemos adequado e conforme à lei em vigor na altura, temos de concluir pela sua confirmação e consequentemente pela improcedência do recurso.

4- Decisão -
Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.

Lisboa, 12 de Fevereiro de 2015. - Ascensão Lopes (relator) - Dulce Neto - Francisco Rothes.