Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0588/09
Data do Acordão:11/18/2009
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:MIRANDA DE PACHECO
Descritores:IRC
SUJEITO PASSIVO NÃO RESIDENTE
SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA
RESPONSABILIDADE DO SUBSTITUTO TRIBUTÁRIO
Sumário:I - De harmonia com o disposto no n.º 4 do artigo 90.º e n.º 5 do artigo 90.º-A do CIRC (redacção da Lei n.º 67-A/2007, de 31/12), quando não seja efectuada até ao termo do prazo estabelecido para o pagamento do imposto a prova da verificação dos pressupostos legais da aplicação da Convenção destinada a evitar a
dupla tributação, fica o substituto obrigado a entregar a totalidade do imposto que deveria ter sido deduzido.
II - Sem prejuízo da responsabilidade contra-ordenacional, o afastamento daquela responsabilidade acontece em caso de verificação tardia dos pressupostos para a dispensa total ou parcial da retenção, sendo aplicável às situações anteriores à entrada em vigor da nova redacção dos aludidos preceitos, independentemente de já ter sido efectuada a liquidação do imposto, excepto quando tenha havido lugar ao pagamento do imposto e não esteja pendente reclamação, recurso hierárquico ou impugnação (artigo 48.º, n.º 4 da Lei n.º 67-A/2007, de 31/12.
Nº Convencional:JSTA00066117
Nº do Documento:SA200911180588
Data de Entrada:05/29/2009
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TT1INST LISBOA PER SALTUM.
Decisão:PROVIDO.
Área Temática 1:DIR FISC - IRC.
Legislação Nacional:CIRC88 NA REDACÇÃO DA L 67-A/2007 DE 2007/12/31 ART69 N2 ART75 N7 N8 ART90 N6 ART90-A N5 N6.
L 67-A/2007 DE 2007/12/31 ART48 N4.
CONST97 ART8 N4 ART18 N2.
Legislação Comunitária:DIR CONS CEE 90/435/CEE DE 1990/07/23.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1 – A A…, S.A., melhor identificada nos autos, não se conformando com a decisão do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra o indeferimento tácito de reclamação graciosa, da liquidação adicional de IRC relativa ao exercício de 1997 e respectivos juros compensatórios, dela vem interpor o presente recurso formulando as seguintes conclusões:
a) A sentença recorrida é censurável, porquanto o Tribunal a quo errou ao decidir que a ora Recorrente aplicou indevidamente a taxa reduzida de retenção na fonte de 10% aos dividendos por si pagos à sociedade italiana B…, S.a.p, no exercício de 1997, com fundamento do facto de, no momento em que tais rendimentos foram pagos, a ora Recorrente não ter efectuado prova de que estavam reunidos as condições/pressupostos previstos no artigo 69.° n.º 2 alínea e) do Código do IRC e na Directiva 90/435/CEE;
b) Salvo o devido respeito, não pode a ora Recorrente conformar-se com tal decisão, porquanto, a mesma não só assenta numa errónea aplicação das normas jurídicas que regulam o caso sub judice, como contraria a Doutrina e Jurisprudência relativa a esta matéria;
c) Sublinhe-se, primeiramente, que no âmbito do presente recurso não está em causa a demonstração do preenchimento/cumprimento das condições/requisitos previstos nos referidos normativos legais, porquanto, o Tribunal a quo reconhece que a ora Recorrente demonstrou que tais requisitos se encontravam verificados, na data em que pagou os dividendos à B…, S.a.p. — Cfr. matéria de facto provada das alíneas E), H) e I) da matéria de facto provada;
d) Contudo, o Tribunal a quo entendeu que a ora Recorrente efectuou a prova da verificação de tais condições/requisitos a posterior, isto é, depois da realização do pagamento dos dividendos à B…, S.a.p, em violação do disposto nos n.º 7 e n.º 8 do artigo 75.° do CIRC, razão pela qual não poderia aplicar a taxa reduzida de retenção aí prevista;
e) Ora, salvo o devido respeito não assiste razão ao Tribunal a quo;
f) De facto, não pode deixar de entender-se que o que releva para aplicação da taxa reduzida de retenção da fonte de 10% é a verificação material das condições/requisitos, previstos quer na Directiva Comunitária 90/435/CEE, quer na alínea c) do n.º 2 do artigo 69.° do Código do IRC, na data em que o pagamento dos dividendos é realizado, independentemente do momento em que a Recorrente efectua a respectiva prova;
g) Na verdade, a prova da verificação das referidas condições/requisitos é uma mera formalidade, e não pode ser entendida como uma condição essencial à verificação do direito de aplicação da taxa de retenção na fonte reduzida;
h) Na verdade, a detenção/apresentação dos documentos comprovativos da verificação das condições/requisitos previstos na lei deve considerar-se como uma mera formalidade ad probationem
i) E, já não como uma formalidade ad substanciam, ou seja, uma formalidade cujo cumprimento é um requisito de validade do próprio acto jurídico;
j) Assim, tendo o Tribunal a quo reconhecido que, do ponto de vista material, as condições/requisitos se encontravam preenchidos, sempre deveria ter concluído pela irrelevância da apresentação pela Recorrente dos documentos comprovativos dessa mesma verificação a posteriori, na medida em que o que releva no Direito Tributário é a realidade substantiva, a qual deverá prevalecer sobre a verificação de uma mera formalidade;
k) Atento o exposto, entende a ora Recorrente que o previsto no n.º 7 do artigo 75.° do Código do IRC deve ser entendido como uma mera “prova de declaração”, cuja falta de cumprimento atempada não é susceptível de gerar a invalidade do acto jurídico praticado pela ora Recorrente;
1) E, nem de outra forma se poderia entender, sob pena da liquidação adicional sub judice funcionar como uma mera intenção sancionatória pelo cumprimento tardio de uma formalidade e não um acto tributário destinado a repor a legalidade (o que, não se verifica no presente caso, uma vez que nenhuma legalidade há a repor, porquanto não se verificou qualquer prejuízo patrimonial para a administração tributária), em violação do disposto no artigo 103. ° da Constituição da Republica Portuguesa;
m) Releve-se ainda não ser susceptível de proceder entendimento distinto do ora pugnado (segundo o qual o n.º 7 do artigo 75° deve ser entendido como uma mera prova de declaração), porquanto não é de admitir qualquer pretensão tributária do Estado Português, sempre que estejam verificados (ainda que tardiamente) os requisitos da Directiva 90/435/CEE, uma vez que tal circunstância é violadora não só desta norma comunitária, como do disposto no n.º 4 do artigo 8 da Constituição da Republica Portuguesa;
n) Por outro lado, não procede também o argumento do Tribunal a quo nos termos do qual os meios de prova e o momento da sua apresentação apresentam-se como elementos essenciais à aplicação da referida taxa, uma vez que são estes elementos que determinam, em cada caso, a aplicação da taxa prevista na CDT ou na Directiva (e respectiva legislação interna), pois que o que determina a aplicação em concreto de uma das várias taxas possíveis é apenas (e só) o cumprimento, do ponto de vista material, dos requisitos previstos em cada um dos preceitos legais.
o) Por fim, sempre se diga que qualquer entendimento contrário ao ora defendido pela Recorrente, não pode ser admitido, sob pena de restringir a possibilidade da Recorrente (e restantes contribuintes) poderem beneficiar das condições mais favoráveis previstas na mencionada Directiva;
p) No mesmo sentido defendido pela ora Recorrente, veja-se o acórdão de 12 de Junho de 2007, proferido por este Supremo Tribunal, e cuja realidade de facto e de direito é em tudo idêntica à verificada nos presentes autos e que se encontra disponível em www.dgsi.pt
q) Caso assim não se entendesse, o que não se concede e apenas se admite por mero dever de patrocínio, sempre se dirá que, ainda assim, o Tribunal a quo deveria ter considerado procedente a presente impugnação, se tivesse atentado nas alterações ao Código do IRC resultantes da entrada em vigor da Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro (Lei do Orçamento de Estado para 2008); senão vejamos,
r) Primeiramente, cumpre referir que actualmente o n.º 3 do artigo 14.° do Código do IRC (na redacção introduzida pela Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro) corresponde à alínea c) do n.º 2 do artigo 69.° do Código do IRC, em vigor à data dos factos em discussão nos presentes autos, bem como o actual n.° 4 do mesmo 14.° do Código do IRC (na redacção introduzida pela Lei n.º 32-B /2002 de 30 de Dezembro), corresponde ao anterior n.º 8 do artigo 75.° do Código do IRC;
s) Com efeito, em ambos os preceitos consagra-se a tributação dos dividendos em sede de IRC distribuídos por um entidade portuguesa a favor de uma entidade que se encontre nas condições previstas na mencionada Directiva, os quais foram regulados até 31 de Dezembro de 1999 pelos artigos 69. ° e 75.° do Código do IRC e, desde 1 de Janeiro de 2000 encontram-se regulados no artigo 14.° e 90.° do mesmo diploma.
t) Ora, de acordo com as alterações introduzidas pela referida Lei do Orçamento de Estado na redacção do n.º 5 e n.º 6 artigo 90.°-A do Código do IRC, o legislador veio também permitir que o substituto tributário que se encontre na situação prevista no n.º 3 e seguintes do artigo 14.° do Código do IRC - no caso em apreço a ora Recorrente - possa afastar a sua responsabilidade de entrega do imposto, sempre que apresente, ainda que posteriormente, os documentos comprovativos da verificação dos requisitos para a dispensa de retenção;
u) Ora, acresce que o legislador estabeleceu ainda o afastamento da referida responsabilidade também para as situações verificadas em data anterior à entrada em vigor da referida Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro, conforme resulta do n.° 4 do artigo 113.° do Código do IRC;
v) Pelo que, atento o referido preceito legal, sempre o Tribunal a quo deveria ter concluído pela total procedência da presente impugnação e, em consequência, ter anulado a liquidação adicional objecto de impugnação nos presentes autos;
w) Na verdade, se o referido Tribunal a quo considerou, por um lado, provado que se encontravam, materialmente, verificadas as condições/requisitos necessários à aplicação da taxa reduzida de retenção na fonte e, por outro, que a ora Recorrente apresentou todos os documentos legalmente exigidos à aplicação da referida taxa, ainda que após a realização do pagamento dos dividendos à B… S.p.a., sempre estaria obrigado a concluir, atento o disposto no n.° 4 do artigo 113.° do Código do IRC, pelo afastamento da responsabilidade de pagamento de imposto imputada à ora Recorrente e, em consequência, pela total procedência da presente impugnação;
x) Por fim, releve-se que é na perspectiva de que a apresentação das declarações/certificados comprovativos da dispensa/redução de taxa de imposto constitui tão só uma mera formalidade ad probationem que o legislador veio afastar expressamente a responsabilidade do substituto tributário, inclusive para o passado, sem prejuízo da responsabilidade contra-ordenacional que haja lugar por falta de cumprimento atempado de uma obrigação legal, pelo que também por esta razão deve sentença em apreço ser revogada;
y) Qualquer interpretação contrária à ora defendida é violadora do disposto no n.º 2 do artigo 18.° da Constituição da República (porquanto restringe os direitos, liberdades e garantias do contribuinte), pelo que não é de admitir a interpretação defendida pelo Tribunal a quo, relativamente ao previsto no n.º 7 do artigo 75.° do Código do IRC, não apenas porque faz incidir decisivamente sobre o momento da prova toda a aferição do cumprimento de uma obrigação acessória que impede sobre o substituto tributário, mas sobretudo porque determina a obrigação de suportar imposto, precludindo a possibilidade de demonstração a posteriori, da inexistência de qualquer efectiva dívida tributária.
2 – A Fazenda Publica não contra-alegou.
3 – O Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu o douto parecer nos seguintes termos:
“Objecto do recurso: sentença declaratória da improcedência de impugnação judicial deduzida contra indeferimento tácito de reclamação graciosa apresentada contra liquidação adicional de IRC (exercício de 1997) no montante de € 2 608 808,47.
FUNDAMENTAÇÃO
1.A aplicação da taxa reduzida de 10%, por retenção na fonte, sobre os lucros colocados à disposição de uma entidade com sede num Estado membro das Comunidades Europeias por outra entidade, com sede em território português, depende da prova, perante a entidade devedora dos rendimentos, anteriormente à data “colocação à disposição do respectivo titular, das condições estabelecidas no artº 2º Directiva nº 90/435/CEE, 23 Julho 1990 e de uma participação no capital da entidade devedora dos rendimentos não inferior a 25% durante dois anos consecutivos ou desde a constituição da entidade participada, desde que mantida durante aquele período (arts 69º n° 2 al. c) e 75° n° 7 CIRC redacção vigente em 1997).
A comprovação exigida constitui formalidade ad substanciam (e não meramente ad substanciam (e não meramente ad probationem), como claramente inculca:
a) o termo final do prazo para a apresentação da prova, explicitamente estabelecido pelo legislador (antes da colocação dos lucros à disposição do titular)
b) o facto de o seu cumprimento ser essencial à verificação das condições de que depende a aplicação da taxa reduzida do imposto.
A anterioridade da prova em relação à colocação dos rendimentos à disposição entidade não residente é indispensável à aplicação pela entidade devedora da correcta, por retenção na fonte
2.No caso sob análise:
a) a declaração emitida em Setembro 1997 foi apresentada para aplicação do fiscal previsto na CDT celebrada entre Portugal e Itália (taxa de 15%),sendo distinta declaração e da relação modelo nº 130 exigíveis para prova das condições de aplicação da taxa de 10% prevista no CIRC (art.75° n° 8 CIRC) (PAT fls. 126 e sgs.)
b) apenas em 2001 e 2002 foi produzida prova documental da verificação daquelas condições:
-detenção pela B… Spa de 100% do capital da A… SA
-caracterização da B… Spa como sociedade por acções sujeita, sem possibilidade de isenção, a imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (probatório als. H) e I)
3.O actual regime legal constante do art. 90°-A n°6 CIRC (redacção da Lei nº 67-A /2007, 31 Dezembro OGE 2008,) aplicável às situações anteriores à sua entrada em vigor nos termos do art. 113° n°4 CIRC, não determina a invalidade superveniente das liquidações efectuadas com aplicação de taxa de 15%, de acordo com a (ausência) prova produzida, apenas permitindo ao substituto tributário formular o pedido de restituição do excesso de imposto eventualmente entregue à administração tributária, após comprovação da verificação dos pressupostos de aplicação da taxa reduzida (10%)”.
Conclusão
O recurso não merece provimento.
A sentença impugnada deve ser confirmada.”
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
5 – A sentença recorrida fixou a seguinte matéria de facto:
A) A impugnante foi sujeita a uma acção de inspecção, na sequência da Ordem de Serviço n.º 11272, de 27/03/01, relativa ao exercício de 1997, destinada à análise de supostas inexactidões/omissões nos modelos 130 - rendimentos pagos a não residentes, no seguimento da qual foi elaborado o relatório contendo as conclusões finais da inspecção à impugnante - cfr. relatório de fls. 59 a 150 do PAT.
B) Nos termos do citado relatório final, foi apurado, relativamente ao exercício em causa, imposto em falta (IRC não retido) no montante total de 351.160.566$00, sendo 155.660.566$00 respeitantes à retenção na fonte devida pelo pagamento de royalties a beneficiário residente nos EUA e 195.500.000$00 relativos à retenção na fonte incidente sobre dividendos distribuídos pela impugnante à sociedade italiana B…, S.p.a - cfr. relatório de fls. 59 a 150 do PAT.
C) O valor corrigido de 155.660.566$00 foi objecto de anulação, por parte da Direcção de Serviços dos Benefícios Fiscais, conforme doc. 3 junto à p.i.
D) De acordo com o citado relatório (cfr. ponto III.I), o apuramento das retenções na fonte em falta, respeitantes aos dividendos, foi efectuado com os fundamentos que seguidamente se transcrevem:
“(...) A… em Setembro de 1997 pagou dividendos no valor de Esc. 3.910.000.000$ ao seu accionista B… SPA, empresa com sede em Itália.
Neste caso a anomalia detectada pela Direcção de Serviços dos Benefícios Fiscais foi o facto de no Modelo 130 respeitante aos rendimentos acima nomeados constar uma taxa de retenção de 10%, correspondente à alínea c) do n°2 do artigo 69° do Código do IRC, sem no entanto ter sido entregue a declaração a que se refere o n°7 e 8 do artigo 75°do Código do IRC.
A distribuição de lucros, está sujeita a tributação em Portugal pelo método de retenção na fonte nos termos do artigo 75° do Código do IRC, podendo ser utilizadas uma de três normas determinadoras da taxa a aplicar para efeito de retenção na fonte:
- Corpo do n° 2 do artigo 69°do Código de IRC com taxa de 25%;
- Alínea c) do n° 2 do artigo 69° do Código do IRC com taxa de 10% para o exercício em causa;
- O artigo 10° de uma convenção para evitar a dupla tributação internacional celebrada entre Portugal e o Estado de residência do beneficiário dos rendimentos;
A opção por um dos normativos cabe ao beneficiário dos rendimentos, uma vez que terá que efectuar a prova de que estão cumpridos os requisitos que levam à aplicação de um ou outro dos normativos.
No caso em análise, o sujeito passivo quer beneficiar do taxa revista na alínea c) do n° 2 do artigo 69° do Código do IRC logo tem de efectuar a prova de que reúne as condições previstas na directiva nº 90/435/CEE bem como que detém o capital social ali previsto, tal como preceitua o nº 7 do artigo 75° do Código do IRC, prova essa que deve ser efectuada anteriormente à data da colocação à disposição dos rendimentos relativamente àquela entidade beneficiária.
O documento destinado a comprovar esta situação devem obedecer aos requisitos constantes do nº 8 do artigo 75° do Código do IRC ou seja de uma declaração emitida ou autenticada pelas Autoridades Fiscais do Estado de residência do beneficiário dos rendimentos, declarando que o mesmo reúne as condições do artigo 2° da Directiva nº 90/4351CEE, a saber:
- a residência fiscal do beneficiário
- a sujeição a tributação
- que a sociedade revista uma das formas previstas no anexo da directiva.
Quanto aos restantes pressupostos que é necessário comprovar, ou seja quanto à detenção da participação no capital social e do respectivo período de detenção de tal capital, como a A… é uma sociedade anónima, pode ser feito mediante a apresentação de uma declaração emitida pela entidade depositária das acções, ou então, no caso de as mesmas estarem sujeitas a registo, da entidade registadora das mesmas.
Como não foram efectuadas as provas acima enumeradas, considera-se que a empresa fez uso indevido da taxa da Directiva, infringindo a alínea a), do n° 2 do artigo 69° do Código do IRC conjugado com a Directiva 90/435/CEE.
No entanto estão preenchidos os requisitos para a utilização da taxa constante do artigo 10º da Convenção para evitar a dupla tributação internacional celebrada entre Portugal e Itália (...), ou seja, 15%.
A retenção em falta é no valor de 195.500.000$00, sendo a data limite de entrega 20/10/97 (...)
Em consequência do exercício do direito de audição prévia, foi no relatório final acrescentado o seguinte:
“(...) Quanto à questão dos dividendos esta é tratada no âmbito do Código do IRC no artigo 75º nº 7 e 8, que regula a forma de fazer a prova da verificação dos pressupostos legais para a retenção a taxa mais favorável nos casos de lucros colocados por uma entidade residente à disposição de uma outra entidade residente noutro Estado membro da CE.
Como o artigo supra também refere, essa prova deve ser obtida anteriormente à colocação à disposição do rendimento de respectivo titular através de uma declaração confirmada ou autenticada pelas autoridades fiscais competentes, ou seja, estes requisitos não se consideram válidos mesmo se obtidas a posteriori(...)”.
E) Anteriormente à elaboração do relatório contendo as conclusões finais da inspecção, a impugnante exerceu o direito de audição, contestando as correcções efectuadas e juntando, para o que aqui importa, três documentos, a saber: certificação de residência fiscal, sujeição a tributação e forma jurídica da B… SPA., emitida pelas autoridades fiscais italianas (impresso datado de Setembro de 1997, correspondente à declaração para limitação do imposto a pagar em Portugal no âmbito da Convenção para evitar a dupla tributação entre Portugal e Itália), a declaração Mod. 130 apresentada pela impugnante relativa ao mês de Setembro de 1997 e, ainda, a declaração da entidade registadora das acções - cfr. 118 a 150 do PAT;
F) Em consequência das correcções efectuadas, relativa aos dividendos pagos à sociedade italiana B… e, bem assim, a royalties (já anulada), foi emitida, em 20/02/02, a liquidação adicional nº 6420000339, no montante total de € 2.608.808,47, o que inclui o valor de € 857.226,95 de juros compensatórios - cfr. fls. 17 dos autos;
G) Um dos documentos juntos ao direito de audição, a que se aludiu, corresponde a impresso datado e autenticado pelas autoridades fiscais italianas, de Setembro de 1997, respeitante à declaração para limitação do imposto a pagar em Portugal no âmbito da Convenção para evitar a dupla tributação entre Portugal e Itália, constando do mesmo, além do mais, a designação da sociedade italiana (B… SPA), a data de colocação à disposição dos rendimentos (Setembro de 1997), o seu montante (3.910.000.000 Escudos) e natureza, o número e valor nominal de cada acção (3.000.000 e 1.000), a residência em Itália da sociedade e a sujeição a imposto nesse país. Mais consta o pedido formulado de que os rendimentos sejam pagos com a limitação do imposto português prevista nos termos da convenção sobre Dupla Tributação - cfr. fls. 126 a 129 do PAT;
H) Com o direito de audição foi igualmente apresentada uma declaração datada de 31/10/01, emitida pela A… SA, segundo a qual as suas acções são detidas na sua totalidade pela B… , spa, desde 30/03/95, à qual foi junta cópia autenticada do registo de acções desde a data indicada - cfr. fls. 133 a 140 dos autos;
I) Em 24/01/02, as autoridades fiscais italianas, em concreto,. a Agenzia delle Entrate, Ufficio Lolale di Milano 3, através do seu director, certificou que a sociedade B… SPA (anteriormente …) é uma sociedade por acções, residente em Itália para efeitos fiscais e está sujeita, sem possibilidade de isenção, a imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas - cfr. fls. 53;
j) O montante de imposto adicionalmente liquidado, relativo aos dividendos pagos à sociedade italiana, no valor de 195.500.000$00, corresponde, como decorre do relatório de inspecção, à diferença entre o valor resultante da aplicação da taxa de retenção de 15% aos rendimentos, prevista no artigo 10º da CDT, e o valor retido e entregue pela impugnante à taxa de 10% por aplicação do disposto na al. c) do n° 2 do artigo 69° do CIRC - cfr. relatório de inspecção.
L) Os dividendos pagos pela impugnante em Setembro de 1997 à sociedade italiana B… SPA foram sujeitos a retenção na fonte de 10%, conforme declaração Mod. 130, junta a fls. 131 e 132 dos autos, por aplicação da taxa prevista no artigo 69°, n° 2, al. e) do CIRC.
6- A sentença recorrida julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra o indeferimento tácito de reclamação graciosa da liquidação adicional de IRC n.º 6420000339 relativa ao exercício de 1997 e respectivos juros compensatórios.
Para tanto, em síntese, ponderou-se na decisão que a recorrente aplicara indevidamente a taxa reduzida de retenção na fonte de 10% aos dividendos por si pagos à sociedade italiana B…, S.a.p., sem que no momento em que colocara os rendimentos à disposição do titular tivesse demonstrado nos termos dos n.ºs 7 e 8 do artigo 75.º do CIRC que estivessem reunidas as condições para a aplicação da aludida taxa de 10% prevista no artigo 69.º n.º 2 ainda deste último diploma legal.
Na sua alegação de recurso, a recorrente vem defender, no fundamental, que a detenção/apresentação dos documentos comprovativos das condições/requisitos previstos na lei deve ser considerada uma mera formalidade ad probationem e não ad substanciam, sob pena de violação da Directiva n.º 90/435/CEE e do disposto nos artigos 8.º, n.º 4 e 18.º, n.º 2 da CRP, pugnando ainda pela aplicação retroactiva do disposto no artigo 90.º, n.º 6 do CIRC (redacção da Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro).
A questão relativa à aplicação retroactiva do disposto no n.º 6 do artigo 90 do CIRC (redacção da Lei n.º 67-A/2007) será objecto de conhecimento em primeiro lugar, uma vez que uma resposta afirmativa a essa questão prejudica o conhecimento das restantes que também são suscitadas no recurso.
Vejamos, então.
Defende a recorrente a aplicação ao presente caso do regime de afastamento da responsabilidade do substituto tributário previsto na actual redacção do artigo 90.º-A, n.º 6 do CIRC (introduzida pela Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro), alegando para tanto que, ainda que posteriormente, apresentara os documentos comprovativos da verificação dos requisitos para a dispensa de retenção (t) das conclusões da alegação).
Dispõem os n.°s 5 e 6 do artigo 90.°-A do CIRC (redacção da Lei n.° 67- A/2007, de 31 de Dezembro) o seguinte:
Artigo 90.°-A
…………………………………………………………………
- Sem prejuízo do disposto no número seguinte, quando não seja efectuada a prova até ao termo do prazo estabelecido para a entrega do imposto, e, bem assim, nos casos previstos nos n° 3 e seguintes do artigo 14°, fica o substituto tributário obrigado a entregar a totalidade do imposto que deveria ter sido deduzido nos termos da lei.
6 - Sem prejuízo da responsabilidade contra-ordenacional, a responsabilidade estabelecida no número anterior pode ser afastada sempre que o substituto tributário comprove com o documento a que se refere o n.° 2 do presente artigo e os n.°s 3 e seguintes do artigo 14.°, consoante o caso, a verificação dos pressupostos para a dispensa total ou parcial de retenção.
……………………………………………………………
Prevê, por outra parte, o n.° 4 do artigo 48.° da Lei n.° 67-A/2007, de 31 de Dezembro:
Artigo 48.°
4 - O afastamento da responsabilidade prevista no n.° 4 do artigo 90.° e no n.° 6 do artigo 90°-A do Código do IRC, na redacção que lhes foi dada pela presente lei, é aplicável às situações anteriores à entrada em vigor da mesma, independentemente de já ter sido efectuada a liquidação do imposto, excepto quando tenha havido lugar ao pagamento do imposto e não esteja pendente reclamação, recurso hierárquico ou impugnação.
Ora, acontece que no caso “sub judicio”, alcança-se das alíneas E), G), H) e I) do probatório que se encontra provado que a impugnante apresentou, em sede de exercício do direito de audição, junto da AT certificação da residência fiscal, sujeita a tributação e forma jurídica, da B…, SPA, emitida pelas autoridades fiscais italianas, a declaração Mod. 130 relativa ao mês de Setembro de 1997 e, ainda, declaração da entidade reguladora das acções, o que dá satisfação, embora tardia, à exigência dos requisitos constantes do n.º 8 do artigo 75.º do CIRC, sendo ainda certo que o imposto liquidado não foi pago (cfr. probatório).
Isto significa que a recorrente, como defende, reúne os requisitos previstos nos citados incisos normativos para afastar a sua responsabilidade, enquanto substituto tributário, pela entrega da totalidade do imposto que deveria ter deduzido nos termos legais.
Como assim, em razão de estatuição normativa superveniente, desaparece da ordem jurídica o pressuposto de responsabilidade jurídico-tributária que conferiu legalidade à liquidação adicional impugnada, pelo que se impõe a respectiva anulação (cfr. acórdão de 21/01/09, no rec. n.º 810/08).
Em face do exposto, fica prejudicado o conhecimento das restantes questões suscitadas no recurso.
Termos em que se acorda conceder provimento ao recurso, revogando-se a sentença recorrida e assim se julgando procedente a impugnação, anula-se, em consequência a liquidação adicional de IRC n.º 6420000339, relativa ao exercício de 1997.
Sem custas.
Lisboa, 18 de Novembro de 2009. – Miranda de Pacheco (relator) – Brandão de Pinho – Jorge Lino.