Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 01362/14 |
Data do Acordão: | 03/18/2015 |
Tribunal: | 2 SECÇÃO |
Relator: | FONSECA CARVALHO |
Descritores: | HERANÇA LEGITIMIDADE HERDEIRO |
Sumário: | I – A recorrente como herdeira do executado tem interesse em ver reconhecida a prescrição da dívida exequenda. II – Mas sendo a oposição à execução fiscal um incidente processual que tem a natureza de uma contestação, desde que citado o cabeça de casal em representação da herança indivisa, qualquer herdeiro não pode deixar de ser considerado como terceiro na oposição em curso. III – Todavia porque o conhecimento da prescrição da dívida exequenda constituí fundamento de oposição e é até de conhecimento oficioso não sendo invocada pelo cabeça do casal, o seu não conhecimento pode afectar e lesar os direitos do herdeiro na medida em que afectará o montante da sua quota hereditária. IV – Daí que o herdeiro tenha legitimidade para suscitar esta excepção junto do órgão da execução fiscal, pelo que a petição de oposição deve ser convolada para requerimento dirigido ao órgão da execução fiscal exequente. |
Nº Convencional: | JSTA00069120 |
Nº do Documento: | SA22015031801362 |
Data de Entrada: | 11/20/2014 |
Recorrente: | A......... |
Recorrido 1: | FAZENDA PÚBLICA |
Votação: | UNANIMIDADE |
Meio Processual: | REC JURISDICIONAL |
Objecto: | SENT TT1INST LISBOA |
Decisão: | PROVIDO |
Área Temática 1: | DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL |
Legislação Nacional: | CPC13 ART30. CCIV66 ART2050 ART2074 ART2079. CPPTRIB99 ART105 ART154 ART155 ART166 N1 B ART168 ART204 N1 D ART175 ART98 N4. LGT98 ART16 N3 ART97 N3. |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo I. Relatório 1. A……, identificada nos autos, opôs-se à execução fiscal nº. 3905199501006959 no Tribunal Tributário de Lisboa, invocando a sua legitimidade como responsável subsidiária, apesar de o cabeça-de-casal da herança aberta por óbito do seu pai, o seu irmão, B………., ter sido notificado, ou citado, para pagar contribuições autárquicas reportadas aos anos de 1993 a 1998, em 23 de Março de 2012, e nada ter feito, pedindo a extinção da execução por prescrição das dívidas. Naquele Tribunal decidiu-se julgar procedente a excepção da ilegitimidade da oponente, suscitada pelo Ministério Público, absolvendo da instância a Fazenda Pública. 2. Não se conformando, a oponente interpôs recurso para o TCA Sul, que se julgou incompetente em razão da hierarquia, para conhecer do presente recurso, pelo que a recorrente veio, então, recorrer para este Supremo Tribunal, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: 1 - A recorrente tem interesse directo e legítimo na apreciação da prescrição das dívidas fiscais que impendem sobre a herança de que é herdeira; 2 - Sendo certo que a prescrição só pode ser conhecida desde que invocada; 3 - Não a invocando ela deixa de ser conhecida e é prejudicado o direito da recorrente a defender-se das dívidas que impendem sobre o seu quinhão hereditário; 4 - Ao não conhecer do mérito da questão o Tribunal recorrido denegou justiça à recorrente, violando o disposto no artigo 156 n°1 do CPC; 5 - E violou o princípio da decisão plasmado nos artigos 158 do CPC, artigo 9 do CPTA; 6 - Além de violar ostensivamente o princípio da celeridade e economia processuais pois sendo o Tribunal recorrido chamado a conhecer de uma questão delega para outra fase processual esse conhecimento que pode desde já merecer pronúncia; Normas Jurídicas Violadas: Não foram correctamente aplicadas as disposições dos artigos: 7 - Artigo 156 n.° 1 do CPC na medida em que se o Tribunal recorrido não apreciou a questão que lhe foi colocada escudando-se em critério formais; 8 - Do mesmo modo foi violada a disposição dos artigos 156 e 158 porque não sendo agora apreciada a questão colocada ela terá que o ser posteriormente com as demoras e custos que tal trará ao Estado e às partes; 9 - Violado os artigos 26 do CPC e 159 do CPPT quanto á legitimidade porque possuindo-a a recorrente ela lhe foi negada; 10 - Nestes termos e nos melhores de Direito, requer-se a Vossa Excelência se digne admitir a presente Oposição Judicial, julgando-a procedente e em consequência ordenar a extinção da execução. 3. Não foram produzidas contra-alegações. 4. O magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal, a fls. 141 v., louvou-se no parecer de fls. 117 e segs. que no que respeita à questão de fundo, pugna pela improcedência do recurso. 5. Cumpre apreciar e decidir. II. FUNDAMENTAÇÃO: De Facto: Dá-se aqui por reproduzido o teor da sentença de folhas 47 a 49 De direito: O Mº juiz “ a quo” absolveu a Fazenda Publica da instância por entender que a oponente não tinha legitimidade para deduzir oposição à execução fiscal que corre termos contra C……… por sendo eventualmente responsável solidária ou subsidiária ainda não ter contra ela sido revertida a execução. A oponente não se conforma com esta decisão e como se vê do ter das suas conclusões de recurso entende que tem interesse directo na apreciação da prescrição das dívidas em cobrança pelo que ao não conhecer de mérito o Tribunal “ a quo” denegou justiça á recorrente, bem como violou princípio da decisão e os da celeridade e economia processuais como resulta do artigo 27 do CPC Cumpre decidir A legitimidade é um pressuposto processual que tem a ver com o interesse em demandar e se afere pela utilidade derivada do processo artigo como refere o artigo 30 do CPC que se transcreve: 1 - O autor é parte legítima quando tem interesse direito em demandar; o réu é parte legítima quando tem interesse direito em contradizer. 2 - O interesse em demandar exprime-se pela utilidade derivada da procedência da ação e o interesse em contradizer pelo prejuízo que dessa procedência advenha. 3 - Na falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor cfr Neste sentido o interesse e direito da ora recorrente não pode ser discutida pois a mesma como herdeira do executado tem interesse em ver reconhecida a prescrição da dívida exequenda. Mas como decorre do artigo 105 do CPPT a oposição à execução fiscal é um incidente processual e tem a natureza de uma contestação. E sendo certo que o recorrente é sucessor do executado o certo é que o objecto da execução é a herança indivisa representada na execução pela cabeça de casal nos termos do artigo 16/3 da LGT. Efectivamente e no que aos sucessores respeita e em relação a uma execução fiscal por morte do executado há que distinguir no que concerne á legitimidade entre legitimidade activa e passiva Na legitimidade passiva há que ter em atenção o preceituado nos artigos 154 e 155 do CPPT – Assim: Se o sujeito passivo falecer no decurso de um processo de execução fiscal para cobrança coerciva da obrigação tributária e no qual ocupava a posição de executado, devem os seus sucessores ser habilitados nos termos dos arts. 155.º, 166.º, n.º 1, alínea b) e 168.º, todos do CPPT, os quais asseguram a legitimidade passiva destes para intervenção no processo de execução. Estipula o art. 155.º do CPPT, a) tendo-se verificado a partilha da herança, cada herdeiro será citado para pagar o que proporcionalmente lhe competir na dívida exequenda; b) se não se tiver efectuado ainda a referida partilha, citar-se-á, qualquer dos herdeiros para pagar toda a dívida, sob cominação de penhora em quaisquer bens da herança. E na situação de sujeitos passivos como sucessores da divida em cobrança poderão caso não haja partilha invocar a sua ilegitimidade desde que não respeitado o condicionalismo prescrito no referido normativo. Porém no caso da legitimidade activa tendo havido aceitação da herança e não havendo ainda partilha ocorrendo execução fiscal que onera a herança, qualquer sucessor está legitimado independentemente da partilha e de não ser o cabeça de casal para defender os interesses da herança e reflexamente os seus? O artigo 2050 do CC prescreve que os direitos e posse da herança se adquirem pela aceitação independentemente da sua apreensão e que tais efeitos se retrotraem ao momento da abertura da sucessão. E o artigo 2074 do CC dispõe também que o sucessor em relação à herança e até sua liquidação e partilha tem todos os direitos e obrigações do de cujus. Todavia o artigo 2079 do CC dispõe que a administração da herança até á sua liquidação e partilha pertencem à cabeça de casal até porque a herança enquanto subsiste é uma “universitas júris”. Sendo assim como é e não tendo o recorrente a qualidade de executado ou de responsável solidário ou subsidiário, mas sendo manifesto o interesse do recorrente o mesmo terá no que respeita à oposição de ser considerado terceiro. No caso em análise a recorrente pretende opor-se à execução fiscal em curso por entender que as dívidas em cobrança se encontram prescritas O seu interesse em agir é manifesto e o fundamento invocado é a prescrição da dívida exequenda que sendo um dos previstos no artigo 204 nº 1 al. d) do CPPT é também facto de conhecimento oficioso nos termos do disposto no artigo 175 do CPPT quer do órgão de execução fiscal, quer do juiz se o órgão de execução fiscal o não tiver feito De qualquer forma a execução em relação a este recorrente que consideramos terceiro no processo de execução em causa não deixa de afectar o seu direito e interesse por a cobrança da dívida se reflectir necessariamente no montante da sua quota hereditária. E sendo assim o recorrente tem legitimidade para requerer ao órgão de execução fiscal que conheça da invocada prescrição. Nestes termos a dedução de oposição pelo recorrente enferma de erro na forma do processo por se tratar de um desvio do formalismo processual em relação ao que a lei prescreve como o adequado. Ora o erro na forma do processo judicial é passível de correcção face ao disposto no nº 3 do artigo 97 da LGT o que implica a sua convolação para a forma do processo adequado nos termos do preceituado no artigo 98 /4 do CPPT, assim se garantindo a tutela judicial efectiva do direito do recorrente. DECISÃO: Face ao exposto acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e ordenar a baixa dos autos para que a oposição do recorrente seja convolada em requerimento para o órgão da execução fiscal para pronúncia sobre a invocada prescrição. Sem custas. Lisboa, 18 de Março de 2015. – Fonseca Carvalho (relator) – Isabel Marques da Silva – Pedro Delgado. |