Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0281/11
Data do Acordão:07/06/2011
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:VALENTE TORRÃO
Descritores:IRC
ENCARGOS FISCAIS
DESPESAS DE REPRESENTAÇÃO
AUTOMÓVEIS LIGEIROS
TAXA
RETROACTIVIDADE DA LEI FISCAL
APLICAÇÃO DA LEI FISCAL NO TEMPO
Sumário:I – A tributação autónoma sobre encargos com viaturas ligeiras de passageiros e despesas de representação incide sobre a despesa, constituindo cada acto de despesa um facto tributário autónomo, a que o contribuinte fica sujeito, venha ou não a ter rendimento tributável em IRC no fim do período respectivo.
II – Sendo assim, independentemente de a tributação autónoma ser devida com referência a um determinado período que coincide com o ano civil, a cada acto de despesa deve ser aplicada a taxa em vigor na data da sua realização.
III – Deste modo, sofre de inconstitucionalidade, por violação do princípio da não retroactividade da lei fiscal consagrado no artigo 103.°, n.º 3, da Constituição da República, a norma do artigo 5.º da Lei n.° 64/2008, de 5 de Dezembro, que determinou que o agravamento da taxa de 5% para 10% sobre despesas de representação e encargos com viaturas ligeiras de passageiros, resultante da nova redacção dada ao artigo 81.°, n.º 3, alínea a), do CIRC, produzisse efeitos a partir de 1 de Janeiro de 2008, uma vez que o facto tributário que a lei nova pretende regular já tinha produzido todos os seus efeitos ao abrigo da lei antiga, relativamente a despesas já realizadas.
IV – As novas taxas, por isso, apenas podem ser aplicadas aos actos de despesa posteriores à entrada em vigor da alteração do citado artº 81º, nº 3, alínea a) do CIRC.
Nº Convencional:JSTA00067076
Nº do Documento:SA2201107060281
Data de Entrada:03/24/2011
Recorrente:A..., LDA
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TAF SINTRA PER SALTUM.
Decisão:PROVIDO.
Área Temática 1:DIR FISC - IRC.
Área Temática 2:DIR CONST - SISTEM FINANC FISC.
Legislação Nacional:CIRC01 ART8 N9 ART81 ART83 N1 A.
CIRS88 ART68.
CONST97 ART103 N3.
L 55-B/2004 DE 2004/12/30.
L 67-A/2007 DE 2007/12/31.
L 64/2008 DE 2008/12/05 ART5 ART6.
L 11/2010 DE 2010/06/15 ART2 ART3.
L 12-A/2010 DE 2010/06/30 ART20 N1.
Jurisprudência Nacional:AC TC PROC94/83 DE 1983/10/12.; AC TC PROC39/84 DE 1984/07/03.; AC TC PROC772/07 DE 2009/03/12.; AC TC PROC523/10 DE 2010/10/27.
Referência a Doutrina:CARDOSO DA COSTA O ENQUADRAMENTO CONSTITUCIONAL DO DIREITO DOS IMPOSTOS EM PORTUGAL IN PERSPECTIVAS CONSTITUCIONAIS NOS 20 ANOS DA CONSTITUIÇÃO 1997 VII PAG418.
ALBERTO XAVIER MANUAL DE DIREITO FISCAL PAG196.
ALBERTO XAVIER O PROBLEMA DA RETROACTIVIDADE DAS LEIS SOBRE IMPOSTO DE RENDA IN TEXTOS SELECCIONADOS DE DIREITO TRIBUTÁRIO 1983 PAG77.
BRÁS CARLOS IMPOSTOS TEORIA GERAL 3ED PAG142 PAG145.
CASALTA NABAIS DIREITO FISCAL PAG147.
SÁ GOMES MANUAL DE DIREITO FISCAL VII PAG414 PAG419-420.
RUI GUERRA DA FONSECA COMENTÁRIO À CONSTITUIÇÃO PORTUGUESA VII PAG872.
PAZ FERREIRA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA ANOTADA TOMOII PAG223.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1. “A…, Ldª”, com os demais sinais nos autos, veio recorrer da decisão do Mmº Juiz do TAF de Sintra que julgou improcedente a impugnação judicial por si deduzida contra a liquidação de IRC do exercício de 2008, apresentando, para o efeito, alegações nas quais conclui:
Iª) - A sentença recorrida julgou improcedente a impugnação judicial deduzida pela ora Recorrente contra a autoliquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) do exercício de 2008, por entender que a norma plasmada no artigo 5º, nº 1 da Lei nº 64/2008, de 5 de Dezembro, na medida em que determinou a produção de efeitos desde 1 de Janeiro de 2008 do disposto no artigo 1°-A da mesma lei, o qual alterou o artigo 81.° do Código do IRC (actual artigo 88º) agravando de 5% para 10% a taxa de tributação autónoma incidente sobre os encargos com viaturas ligeiras de passageiros e despesas de representação, consubstancia um caso de retroactividade mínima não sendo violadora da proibição da retroactividade da lei fiscal;
IIª) - O Tribunal recorrido incorreu, assim, em erro de julgamento ao não relevar, na sua decisão, o disposto no artigo 103°, n.º 3, da CRP, o qual consagra a proibição da retroactividade da lei fiscal, apoiando a sua decisão em doutrina e jurisprudência anteriores à Revisão Constitucional de 1997, que introduziu aquele preceito no texto constitucional;
IIIª) - Com efeito, o Tribunal recorrido considerou que o juízo de desconformidade constitucional da norma em apreço não se basta com a constatação da sua natureza retroactiva, sendo necessário verificar se daquela não resultaria uma violação do princípio da segurança jurídica e da tutela da confiança, juízo este que era feito anteriormente à Revisão Constitucional de 1997, sendo certo, porém, que à luz da actual redacção da CRP verificando-se que a norma controvertida contempla um caso de retroactividade não há que averiguar circunstâncias adicionais;
IVª)- Ora, atento o teor literal da norma em análise, que expressamente manifesta a intenção do legislador de reportar os efeitos da redacção do nº 3 do artigo 81º do Código do IRC a uma data anterior à da sua publicação e início de vigência e portanto a factos tributários passados, não existem quaisquer dúvidas de que se trata de uma norma retroactiva, sendo manifesta a sua desconformidade como disposto no n.º 3 do artigo 103.° da CRP;
Vª) - Incorreu ainda o Tribunal a quo num outro erro de julgamento, encontrando-se viciada a sentença recorrida na apreciação que faz da data da verificação dos factos tributários em apreço determinante para aferir se a norma em análise é retroactiva;
VIª) - Com efeito, não podia o Tribunal recorrido ter-se limitado a invocar o disposto no artigo 8.° do Código do IRC sem atender ao momento da verificação do facto tributário e sem se dar conta que não estamos face a um imposto sobre o rendimento, mas na presença de uma figura diametralmente distinta que é a tributação autónoma, sendo que os factos sujeitos a tributação autónoma são distintos dos que se encontram sujeitos a IRC stricto sensu;
VIIª) - De facto, as tributações autónomas tributam despesa e não rendimento, são impostos indirectos e não directos, que penalizam determinados encargos incorridos pela empresa e apuram-se de forma totalmente independente do IRC e Derrama devidos no exercício, não se relacionando sequer com a obtenção de um resultado positivo. Em boa verdade, as tributações autónomas constantes do Código do IRC poderiam estar inscritas num outro código ou em diploma autónomo;
VIIIª) - Por outro lado, enquanto que o lucro tributável sujeito a IRC é de formação sucessiva, as despesas sobre as quais incide a tributação autónoma constituem factos tributários instantâneos ou de obrigação única;
IXª) - Note-se ainda que o facto de a tributação autónoma ser devida com referência a um determinado período que coincide com o ano civil tão pouco afasta a natureza de facto tributário instantâneo, tal como ninguém discute que o IVA é um imposto de obrigação única e não um imposto periódico apesar de a respectiva liquidação ser feita com referência a um determinado período de tributação mensal ou trimestral;
Xª) - Constatando-se, assim, verificado o facto tributário no momento em que se incorre nas despesas sujeitas a tributação autónoma, conclui-se, contrariamente ao que entendeu o tribunal recorrido, que não pode deixar de ser considerado materialmente inconstitucional, por violação do n.º 3 do artigo 103° da CRP, o artigo 5º, n.º 1, da Lei n.º 64/2008, de 5 de Dezembro, na parte em que atribui eficácia retroactiva à redacção conferida por aquela mesma lei ao n.º 3 do artigo 81º do Código do IRC, na medida em que se aplica a factos integralmente ocorridos antes da sua entrada em vigor;
XIª)- Ainda que as despesas sujeitas a tributação autónoma consubstanciassem factos tributários de formação sucessiva, o que apenas por hipótese de raciocínio se equaciona, sempre a norma sub judice configuraria uma norma retroactiva e, em consequência, inconstitucional, porquanto se aplica a factos parcialmente ocorridos antes da sua entrada em vigor, devendo neste caso proceder-se à divisão do período de tributação pro rata temporis, caso em que aquela norma se aplicaria apenas às despesas realizadas após a data da sua entrada em vigor, tal como peticionou a Recorrente na reclamação da autoliquidação que apresentou;
XIIª) - De resto, de outro modo se não poderia concluir, bastando para tal atentar no artigo 12º, n.º 2 da LGT, o qual tendo sido ignorado pelo Tribunal recorrido, determina que “Se o facto tributário for de formação sucessiva, a lei nova só se aplica ao período decorrido a partir da sua entrada em vigor”.
XIIIª) - E nem sequer se invoque, como faz a sentença recorrida, o disposto no artigo 8º, nº 9, do Código do IRC para afirmar que no momento da entrada em vigor da norma sub judice ainda se não havia verificado por completo o facto tributário, desde logo porque verificando-se o facto tributário no momento da realização das despesas sobre as quais incide a tributação autónoma, não releva para este concreto efeito a referida norma;
XIVª) - Contudo, ainda que assim não se entendesse, o que por mera cautela de patrocínio se equaciona, refira-se que também quanto ao IRC stricto sensu o n.º 9 do artigo 8° daquele Código não determina o momento de verificação do facto tributário, contrariamente ao que se invoca na sentença recorrida, consagrando uma mera autorização de cobrança do imposto por parte do Estado, fixando o momento a partir do qual aquele se toma exigível;
XVª) - Em face do exposto, conclui-se que mesmo quanto aos rendimentos obtidos no período de tributação não é o disposto no artigo 8°, n.º 9, do Código do IRC que é determinante para apurar o momento da verificação do facto tributário, pelo que, por maioria de razão, também não autoriza que se “ficcione”, para efeitos de aplicação da lei no tempo, a ocorrência dos factos tributários sujeitos a tributação autónoma em data diversa daquela em que efectivamente ocorreram;
XVIª) - E mesmo que se entendesse que a lei cuja constitucionalidade se contesta não contende com a proibição expressa de retroactividade em matéria fiscal sempre seria atentatória do princípio da confiança e da segurança jurídica, corolário do princípio do Estado de Direito democrático, plasmado no artigo 2.° da CRP, porquanto ao duplicar a carga fiscal relativa à tributação autónoma frustra as expectativas dos contribuintes, afectando-as de forma inadmissível, arbitrária e excessivamente onerosa, na medida em que o contribuinte não podia com ela contar, ao que acresce não se vislumbrar qualquer interesse protegido prevalecente que justificasse a afectação das expectativas legitimamente fundadas. Pelo contrário, a norma em análise foi enxertada num diploma que se apelidava anti-cíclico e que introduzia desagravamentos fiscais;
XVIIª) - Note-se que sempre seria possível medida menos onerosa, uma vez que era perfeitamente praticável a aplicação do princípio pro rata temporis no caso em apreço, bastando que o sujeito passivo pudesse inscrever o valor da tributação autónoma calculada de acordo com aquele princípio no campo 365 do Quadro 10 da Declaração Modelo 22;
XVIIIª) - Atentos os fundamentos acima descritos, resulta inequívoco que o nº 1 do artigo 5° da Lei n.º 64/2008, de 5 de Dezembro, na parte em que determina a eficácia retroactiva da alteração do nº 3 do artigo 81.° do Código do IRC, enferma de inconstitucionalidade material por violação dos artigos 103°, n.º 3 e 2.° da CRP, impondo-se a sua desaplicação, bem como a anulação da decisão recorrida e, por conseguinte, da autoliquidação sub judice, devendo a Recorrente ser reembolsada do montante de tributação autónoma pago em excesso.
Por todo o exposto, e o mais que o ilustrado juízo desse Tribunal suprirá, deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, com a consequente revogação da sentença recorrida e, nessa medida, a correcção do acto tributário em crise nos termos peticionados, assim se cumprindo com o DIREITO e a JUSTIÇA!
2. Não houve contra alegações.
3. O MP não emitiu parecer.
4. Colhidos os vistos legais, cabe decidir.
5. Com interesse para a decisão foram dados como provados em 1ª instância os seguintes factos:
a) A impugnante procedeu à autoliquidação de IRC do exercício de 2008, com base na apresentação da declaração periódica de rendimentos Modelo 22, em 29.05.09, na qual indicou o montante de € 364.024,67 referente a tributação autónoma, a qual foi corrigida para um valor de € 363.469,70, através de uma declaração de substituição entregue em 22.06.09, não considerada na liquidação de imposto para esse ano - cfr. D.P. de fls. 35 a 38, dos autos e “Prints Informáticos” de fls. 39 a 42, do P.A. apenso.
b) O acto tributário referido supra foi objecto de reclamação graciosa, com fundamento na não consideração do valor corrigido através da declaração de substituição e da aplicação indevida da taxa de 10%, sobre os encargos com viaturas ligeiras e despesas de representação, a qual foi deferida parcialmente quanto aos valores corrigidos e indeferida quanto à tributação daqueles encargos, por despacho de 29.01.2010, emitido pela D.J. Adm., cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido, devidamente notificada ao interessado. – cfr. fls. 28 a 33, dos autos e fls. 4 a 33, do Proc Recl. Graciosa apenso.
6. A única questão a conhecer no presente recurso é a de saber se a norma contida no artº 5º, nº 1 da Lei nº 64/2008, de 5 de Dezembro, que determinou a produção de efeitos desde 1 de Janeiro de 2008 do disposto no artº 1º-A da mesma Lei, o qual alterou o artº 81º do CIRC, agravando de 5% para 10% a taxa de tributação autónoma incidente sobre os encargos com viaturas ligeiras de passageiros e despesas de representação, consubstancia um caso de retroactividade fiscal, com ofensa do disposto no artº 103º, nºs 2 e 3 da CRP.
A decisão recorrida entendeu que tal norma não era inconstitucional uma vez que “tendo apenas determinado um agravamento da taxa aplicada autonomamente sobre o encargo, o que não resulta qualquer lesão inaceitável da segurança jurídica por esse facto, já que não é a circunstância de se verificar aquele agravamento fiscal de tais encargos que determina de per si, um certo comportamento dos sujeitos passivos e no sentido de o mesmo ser condição para a decisão de efectuar aquelas despesas inerentes à actividade da sociedade”.
Já a recorrente entende que sendo intenção do legislador reportar os efeitos da redacção do nº 3 do artigo 81º do Código do IRC a uma data anterior à da sua publicação e início de vigência e portanto a factos tributários passados, esta é uma norma retroactiva, sendo manifesta a sua desconformidade como disposto no n.º 3 do artigo 103.° da CRP;
Por outro lado, não podia o Tribunal recorrido ter-se limitado a invocar o disposto no artigo 8.° do Código do IRC sem atender ao momento da verificação do facto tributário e sem se dar conta que não estamos face a um imposto sobre o rendimento, mas na presença de uma figura diametralmente distinta que é a tributação autónoma, sendo que os factos sujeitos a tributação autónoma são distintos dos que se encontram sujeitos a IRC stricto sensu;
De facto, as tributações autónomas tributam despesa e não rendimento, são impostos indirectos e não directos, que penalizam determinados encargos incorridos pela empresa e apuram-se de forma totalmente independente do IRC e Derrama devidos no exercício, não se relacionando sequer com a obtenção de um resultado positivo
Por outro lado, enquanto que o lucro tributável sujeito a IRC é de formação sucessiva, as despesas sobre as quais incide a tributação autónoma constituem factos tributários instantâneos ou de obrigação única;
O facto de a tributação autónoma ser devida com referência a um determinado período que coincide com o ano civil tão pouco afasta a natureza de facto tributário instantâneo.
Assim, o facto tributário verifica-se no momento em que se incorre nas despesas sujeitas a tributação autónoma, pelo que se conclui que, contrariamente ao que entendeu o tribunal recorrido, não pode deixar de ser considerado materialmente inconstitucional, por violação do n.º 3 do artigo 103° da CRP, o artigo 5º, n.º 1, da Lei n.º 64/2008, de 5 de Dezembro, na parte em que atribui eficácia retroactiva à redacção conferida por aquela mesma lei ao n.º 3 do artigo 81º do Código do IRC, na medida em que se aplica a factos integralmente ocorridos antes da sua entrada em vigor;
Ainda que as despesas sujeitas a tributação autónoma consubstanciassem factos tributários de formação sucessiva, configuraria uma norma retroactiva e, em consequência, inconstitucional, porquanto se aplica a factos parcialmente ocorridos antes da sua entrada em vigor, devendo neste caso proceder-se à divisão do período de tributação pro rata temporis, caso em que aquela norma se aplicaria apenas às despesas realizadas após a data da sua entrada em vigor, de acordo, aliás, com o artigo 12º, n.º 2 da LGT, o qual determina que “Se o facto tributário for de formação sucessiva, a lei nova só se aplica ao período decorrido a partir da sua entrada em vigor”.
Mas, mesmo que se entendesse que a lei cuja constitucionalidade se contesta não contende com a proibição expressa de retroactividade em matéria fiscal sempre seria atentatória do princípio da confiança e da segurança jurídica, corolário do princípio do Estado de Direito democrático, plasmado no artigo 2.° da CRP, porquanto ao duplicar a carga fiscal relativa à tributação autónoma frustra as expectativas dos contribuintes, afectando-as de forma inadmissível, arbitrária e excessivamente onerosa, na medida em que o contribuinte não podia com ela contar, ao que acresce não se vislumbrar qualquer interesse protegido prevalecente que justificasse a afectação das expectativas legitimamente fundadas. Pelo contrário, a norma em análise foi enxertada num diploma que se apelidava anti-cíclico e que introduzia desagravamentos fiscais.
Vejamos então.
6.1. “O artigo 81.º do CIRC, sob a epígrafe «Taxas de tributação autónoma», na redacção dada pela Lei nº 55-B/2004, de 30 de Dezembro, entretanto alterada pela Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro, determinava, na parte relevante, o seguinte:
1 — As despesas não documentadas são tributadas autonomamente, à taxa de 50 %, sem prejuízo da sua não consideração como custo nos termos do artigo 23.º
2 – A taxa referida no número anterior é elevada para 70% nos casos em que tais despesas sejam efectuadas por sujeitos passivos total ou parcialmente isentos, ou que não exerçam, a título principal, actividades de natureza comercial, industrial ou agrícola.
3 – São tributados autonomamente, à taxa de 5% os encargos dedutíveis relativos a despesas de representação e os relacionados com viaturas ligeiras ou mistas, motos ou motociclos, efectuados ou suportados por sujeitos passivos não isentos subjectivamente e que exerçam, a título principal, actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola.
4 – São tributados autonomamente, à taxa de 15 %, os encargos dedutíveis respeitantes a viaturas ligeiras de passageiros ou mistas cujo custo de aquisição seja superior a € 40 000, quando suportados pelos sujeitos passivos mencionados no número anterior que apresentem prejuízos fiscais nos dois exercícios anteriores àquele a que os referidos encargos digam respeito.(…)
Após a redacção introduzida pela Lei n.º 64/2008, de 5 de Dezembro, os n.ºs 3 e 4 do mesmo preceito passaram a determinar o seguinte:
3 – São tributados autonomamente, excluindo os veículos movidos exclusivamente a energia eléctrica:
a) À taxa de 10 %, os encargos dedutíveis relativos a despesas de representação e os relacionados com viaturas ligeiras de passageiros ou mistas, motos ou motociclos, efectuados ou suportados por sujeitos passivos não isentos subjectivamente e que exerçam, a título principal, actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola;
b) À taxa de 5 %, os encargos dedutíveis, suportados pelos sujeitos passivos mencionados no número anterior, respeitantes a viaturas ligeiras de passageiros ou mistas cujos níveis homologados de emissão de CO2 sejam inferiores a 120 g/km, no caso de serem movidos a gasolina, e inferiores a 90 g/km, no caso de serem movidos a gasóleo, desde que, em ambos os casos, tenha sido emitido certificado de conformidade.
4 – São tributados autonomamente, à taxa de 20 %, os encargos dedutíveis, suportados pelos sujeitos passivos mencionados no número anterior, respeitantes a viaturas ligeiras de passageiros ou mistas cujo custo de aquisição seja superior a € 40 000, quando os sujeitos passivos apresentem prejuízos fiscais nos dois exercícios anteriores àquele a que os referidos encargos digam respeito.
A Lei n.º 64/2008 entrou em vigor no dia seguinte ao da sua publicação, conforme prevê o seu artigo 6º, mas a produção de efeitos retroage a 1 de Janeiro de 2008, em função do que estabelece o artigo 5º do mesmo diploma.
Deste modo, a Lei n.º 64/2008, através da nova redacção dada à alínea a) do n.º 3 do artigo 81.º do CIRC, operou um agravamento da taxa de tributação aplicável aos encargos mencionados no anterior n.º 3 dessa disposição, que se torna aplicável, por virtude da retroacção de efeitos, aos encargos e despesas já realizados pelos contribuintes no decurso do ano de 2008 e até à data em que a lei iniciou a sua vigência.
6.2. O tribunal recorrido considerou que esta norma (artº 5º da citada Lei) não viola o princípio da proibição da retroactividade fiscal consagrado no artigo 103.º, n.º 3, da Constituição, que dispõe: «ninguém pode ser obrigado a pagar impostos que não hajam sido criados nos termos da Constituição, que tenham natureza retroactiva ou cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da lei»
Outro entendimento, como resulta das conclusões das alegações, tem e recorrente, uma vez que se pretende a aplicação de uma lei fiscal a factos passados (conclusão IVª).
Cabe então apurar se estamos perante um caso de retroactividade da lei fiscal ofensivo do disposto no artº 103º, nº 3 da CRP. (Seguiremos aqui o Acórdão nº 399/2010 do Tribunal Constitucional)
6.4. O artigo 103.º, n.º 3, da CRP, introduzido no texto constitucional na revisão de 1997, estabelece o seguinte:
"Ninguém pode ser obrigado a pagar impostos que não hajam sido criados nos termos da Constituição, que tenham natureza retroactiva ou cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da lei".
Antes dessa revisão constitucional, porém, a Comissão Constitucional (cfr. Parecer n.º 25/81, Acórdão n.º 444, Parecer n.º 14/82) e, posteriormente, o Tribunal Constitucional (cfr. Acórdão n.º 11/83 e Acórdãos n.º 66/84 e n.º 141/85) decidiram que, apesar de não se poder retirar da Constituição uma proibição radical de impostos retroactivos, tal deveria considerar-se constitucionalmente vedado quando essa retroactividade fosse «arbitrária e opressiva» e violasse «de forma intolerável a segurança jurídica e a confiança que as pessoas têm obrigação (e também o direito) de depositar na ordem jurídica que as rege». «A retroactividade tributária terá o beneplácito constitucional» se a confiança dos destinatários da norma for «materialmente injustificada» ou se ocorrerem «razões de interesse geral que a reclamem e o encargo para o contribuinte não se mostrar desproporcionado» (cfr. Parecer n.º 14/82).
Também na doutrina J. M. Cardoso da Costa - "O Enquadramento Constitucional do Direito dos Impostos em Portugal", in Perspectivas Constitucionais nos 20 anos da Constituição, Vol. II, Coimbra, 1997, p. 418).- considerava que “[a] linha demarcadora do âmbito da retroactividade fiscal constitucionalmente admissível passará, desde logo, pela distinção entre situações tributárias «permanentes» e «periódicas» e «factos» cuja eficácia fiscal se esgota ou se firma «instantaneamente», para cada um deles «de per si» (maxime, pela distinção entre «impostos periódicos» e «impostos de obrigação única»), e passará provavelmente, depois, no que concerne àquele primeiro tipo de situações, pela distância temporal que já tiver mediado entre o período de produção dos rendimentos e a criação (ou modificação) do correspondente imposto. Isto, de todo o modo, sem prejuízo do relevo de outras circunstâncias, cujo possível peso não poderá ignorar-se.”
Recentemente, no acórdão n.º 128/2009, o Tribunal Constitucional considerou que a natureza necessariamente fluida dos critérios utilizados levou a que, “em diversos arestos, o Tribunal viesse dar como boas leis fiscais retroactivas. Foi o que sucedeu, por exemplo, nos Acórdãos n.º 11/83 e 66/84 (este último em Acórdãos, 4.º Vol. p. 35) e ainda nos Acórdãos n.ºs 67/91, 1006/96, 1204/96 e 416/02.). Noutros casos, ao invés, o Tribunal entendeu que, por inexistirem razões de interesse público que prevalecessem sobre o valor da segurança jurídica, as normas retroactivas seriam intoleráveis e, consequentemente, constitucionalmente ilegítimas (Cfr., por exemplo, os Acórdão ns.º 409/89, 216/90, 410/95 e 185/2000, também disponíveis no mesmo lugar).”
6.5. Após a revisão constitucional de 1997, houve consagração expressa do princípio da proibição da retroactividade da lei fiscal, mas o seu sentido não é unívoco.
Como sustenta Alberto Xavier, não basta afirmar que a lei fiscal não pode ser retroactiva, pois a concretização deste princípio envolve sérias dificuldades, atendendo a que se podem descortinar dentro dele diversos graus, sendo que, do ponto de vista constitucional, alguns são mais gravemente desvalorados do que outros (Alberto Xavier, Manual de Direito Fiscal, Lisboa 1974, p. 196 e segs; idem, "O problema da retroactividade das leis sobre imposto de renda", in Textos Seleccionados de Direito Tributário, coord. de Sampaio Dória, São Paulo, 1983, p. 77 e segs. Mais recentemente, cfr. Américo Fernando Brás Carlos, Impostos – Teoria Geral, 3ª ed., Coimbra, 2010, p. 142 e segs).
Assim, um caso em que o facto tributário que a lei nova pretende regular já tenha produzido todos os seus efeitos ao abrigo da lei antiga e um outro caso em que o facto tributário tenha ocorrido ao abrigo da lei antiga, mas os seus efeitos, designadamente os relativos à liquidação e pagamento, ainda não estejam totalmente esgotados não terão necessariamente o mesmo desvalor constitucional, uma vez que a primeira situação é do ponto de vista da eventual afectação da situação jurídica do contribuinte mais grave que a segunda. E estes dois casos diferenciam-se também de um terceiro em que o facto tributário que a lei nova pretende regular na sua totalidade não ocorreu totalmente ao abrigo da lei antiga, antes se continua formando na vigência da lei nova, como acontece nos presentes autos.
A qualificação que a doutrina atribui a cada uma destas situações não é de todo convergente, verificando-se, todavia, um certo consenso em considerar a primeira situação descrita como retroactividade autêntica (cfr. Casalta Nabais, Direito Fiscal, p. 147; Américo Fernando Brás Carlos, Impostos, p. 145 e segs.; Nuno Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, Vol. II, Lisboa, 1996, p. 414 e segs.). Em relação aos segundo e terceiro casos enunciados, há quem considere que ambas as situações se enquadram na retroactividade inautêntica, enquanto outros apenas incluem a segunda situação nesta categoria, defendendo que o terceiro caso já não se integra em qualquer tipo de retroactividade, mas sim na retrospectividade (cfr. Américo Fernando Brás Carlos, Impostos, p. 145 e segs.; Nuno Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, Vol. II, Lisboa, 1996, p. 419 e 420).
6.6. Independentemente dos graus de “retroactividade” que a doutrina consagra, os trabalhos preparatórios da IV Revisão Constitucional elucidam-nos sobre o espírito do nº 3 do artº 103º citado. (V. discussão na reunião da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional, de 9 de Outubro de 1996 (cfr. DAR, II Série, RC, n.º 36, de 10 de Outubro de 1996, p. 1081).
Assim, de acordo com a proposta apresentada pelo PS: «A lei fiscal não pode ser aplicada retroactivamente, sem prejuízo de as normas respeitantes a impostos directos poderem incidir sobre os rendimentos do ano anterior».
Segundo a proposta apresentada pelo PCP: «A lei que criar ou aumentar impostos não pode ter efeito retroactivo, sendo vedada a tributação relativa a factos geradores ocorridos antes da respectiva lei».
Finalmente a proposta apresentada pelo PSD foi a seguinte «Ninguém poder ser obrigado a pagar impostos que não hajam sido criados nos termos da Constituição, que tenham natureza retroactiva ou cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da lei».
Parece então resultar daqui que o legislador apenas pretendeu incluir, no n.º 3 do artigo 103.º da CRP, a proibição da retroactividade autêntica, própria ou perfeita da lei fiscal, o que não é contrariado pela letra do preceito, uma vez que o texto constitucional apenas se refere à natureza retroactiva tout court. Por outro lado, resulta igualmente dos trabalhos preparatórios, de forma cristalina, que não se pretenderam integrar no preceito as situações em que o facto tributário que a lei nova pretende regular não ocorreu totalmente ao abrigo da lei antiga, antes continuando a formar-se na vigência da lei nova, pelo menos, quando estão em causa impostos directos relativos ao rendimento (como é claramente o caso dos presentes autos).
6.7. Também o Tribunal Constitucional, na sua mais recente jurisprudência em matéria fiscal, designadamente nos acórdãos n.os 128/2009 e 85/2010, considerou que a retroactividade consagrada no artigo 103.º, n.º 3, CRP é somente a autêntica. Disse-se no primeiro acórdão:
Decorre deste preceito constitucional que qualquer norma fiscal desfavorável (não se entrando aqui na questão de saber se normas fiscais favoráveis podem, e em que medida, ser retroactivas) será constitucionalmente censurada quando assuma natureza retroactiva, sendo a expressão «retroactividade» usada, aqui, em sentido próprio ou autêntico: proíbe-se a aplicação de uma lei fiscal nova, desvantajosa, a um facto tributário ocorrido no âmbito da vigência da lei fiscal revogada (a lei antiga) e mais favorável.”
E mais adiante:
“A retroactividade proibida no n.º 3 do artigo 103.º da Constituição é a retroactividade própria ou autêntica. Ou seja, proíbe-se a retroactividade que se traduz na aplicação de lei nova a factos (no caso, factos tributários) antigos (anteriores, portanto, à entrada em vigor da lei nova).”
Na doutrina, e defendendo a retroactividade autêntica e não a imprópria ou "inautêntica" V. Casalta Nabais, Direito Fiscal, p. 147; Rui Guerra da Fonseca, Comentário à Constituição Portuguesa, II volume, coordenação de Paulo Otero, pp. 872 e segs., Américo Fernando Brás Carlos, Impostos, p. 145 e segs.); em sentido contrário V. Paz Ferreira - Constituição da República Portuguesa Anotada, org. Jorge Miranda e Rui Medeiros, Tomo II, Coimbra, 2006, p. 223, seguindo a posição de Diogo e Mónica Leite de Campos e Jorge Bacelar Gouveia.
6.8. Aqui chegados importa então apurar se o artº 5º da Lei nº 64/2008, de 5 de Dezembro pode aplicar-se retroactivamente à tributação autónoma prevista no artº 83º, nº 1, alínea a) do CIRC.
Adoptando o entendimento de que artigo 103.º, n.º 3, da CRP apenas pretendeu consagrar a proibição da retroactividade autêntica, ou própria, da lei fiscal, abrangendo apenas os casos em que o facto tributário que a lei nova pretende regular já tenha produzido todos os seus efeitos ao abrigo da lei antiga, excluindo do seu âmbito aplicativo as situações de retrospectividade ou de retroactividade imprópria, ou seja, aquelas situações em que a lei é aplicada a factos passados mas cujos efeitos ainda perduram no presente, como sucede quando a lei é aprovada até ao final do ano a que corresponde o imposto, a situação dos autos não é idêntica à tratada no Acórdão 399/2010 do Tribunal Constitucional, tal como se escreveu Acórdão 18/11, de 12 de Janeiro de 2011, do Tribunal Constitucional, proferido no Processo nº 204/2010.
É que, no caso dos presentes autos não está em causa imposto sobre o rendimento (como sucedia no citado acórdão 399/2010), mas sim tributação autónoma sobre a despesa. Como bem refere a recorrente “as tributações autónomas tributam despesa e não rendimento, são impostos indirectos e não directos, que penalizam determinados encargos incorridos pela empresa e apuram-se de forma totalmente independente do IRC e Derrama devidos no exercício, não se relacionando sequer com a obtenção de um resultado positivo. Em boa verdade, as tributações autónomas constantes do Código do IRC poderiam estar inscritas num outro código ou em diploma autónomo” (Conclusão VIIª das alegações).
Por outras palavras, como salienta o srº Conselheiro Vítor Gomes no seu voto de vencido, aposto no citado acórdão nº 204/2010, “Embora formalmente inserida no CIRC e o montante que permita arrecadar seja liquidado no seu âmbito e a título de IRC, a norma em causa respeita a uma imposição fiscal que é materialmente distinta da tributação nesta cédula, pelo que não podem ser invocados argumentos semelhantes àqueles que naquele segundo acórdão foram mobilizados no sentido de não se configurar um caso de retroactividade proibida pelo n.º 3 do artigo 103.º da Constituição. Com efeito, estamos perante uma tributação autónoma, como diz a própria letra do preceito. E isso faz toda a diferença. Não se trata de tributar um rendimento no fim do período tributário, mas determinado tipo de despesas em si mesmas, pelas compreensíveis razões de política fiscal que o acórdão aponta”.
Deste modo, o facto revelador de capacidade tributária que se pretende alcançar é a simples realização dessa despesa, num determinado momento. Cada despesa é, para este efeito, um facto tributário autónomo, a que o contribuinte fica sujeito, venha ou não a ter rendimento tributável em IRC no fim do período, sendo irrelevante que esta parcela de imposto só venha a ser liquidada num momento posterior e conjuntamente com o IRC.
Sendo assim a taxa a aplicar a cada despesa é a que vigorar à data da sua realização, uma vez que o facto tributário se verifica no momento em que se incorre nas despesas sujeitas a tributação autónoma.
Em resumo e concluindo como no voto de vencido acima referido, “O facto gerador de imposto em IRC determina-se por relação ao fim do período de tributação (n.º 9 do artigo 8.º do CIRC), mas a tributação autónoma agora em causa não comunga desse pressuposto, porque não atinge o rendimento (artigo 1.º do CIRC) mas a despesa enquanto tal”.
Por isso, as novas taxas introduzidas pela Lei nº 64/2008, de 5 de Dezembro, só são aplicáveis às despesas realizadas após a sua entrada em vigor, uma vez que não estamos perante rendimento reportado a determinado período e norma publicada nessa fase final do período de tributação, à semelhança do decidido relativamente ao n.° 1 do artigo 68° do Código do IRS, na redacção que lhe foi dada pelo artigo 1° da Lei n.° 11/2010, de 15 de Junho, quando conjugada com o disposto nos artigos 2.º e 3.º da mesma Lei e, também, do mesmo n.° 1 do artigo 68° do Código do IRS, na redacção que lhe foi dada pelo artigo 1° da Lei n.° 12-A/2010, de 30 de Junho, quando conjugada com o disposto no n.° 1 do artigo 20° da mesma Lei. (Acórdão 399/2010).
Assim sendo, estamos perante retroactividade autêntica ou própria da lei fiscal, proibida pelo nº 3 do artº 103º da CRP, uma vez que o facto tributário que a lei nova pretende regular já tinha produzido todos os seus efeitos ao abrigo da lei antiga, relativamente a despesas já realizadas.
O recurso, merece, por isso provimento.
7. Nestes termos e pelo exposto concede-se provimento ao recurso, revogando-se a decisão recorrida e julgando-se procedente a impugnação judicial, com a consequente anulação da liquidação no respeitante à tributação autónoma em causa.
Custas pela recorrida Fazenda Pública apenas em 1ª instância.
Lisboa, 6 de Julho de 2011. – Valente Torrão (relator) – Dulce Neto – Casimiro Gonçalves.