Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0859/16
Data do Acordão:07/12/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANTÓNIO PIMPÃO
Descritores:CONVENÇÃO PARA EVITAR A DUPLA TRIBUTAÇÃO
ESTADO DE RESIDENCIA
Sumário:O nº 1 do artigo 22º da Convenção Entre A República Portuguesa e o Reino de Espanha Para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento atribui ao estado de residência a tributação exclusiva dos rendimentos provenientes de pensão de alimentos.
Nº Convencional:JSTA00070286
Nº do Documento:SA2201707120859
Data de Entrada:07/04/2016
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF LOULÉ
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR FISC - IRC.
DIR PROC TRIBUT CONT - IMPUGN JUDICIAL.
Legislação Nacional:CONST05 ART8 N2.
LGT98 ART13.
CPPTRIB99 ART125.
CIRS01 ART11 N1 A ART13 N1 ART18 N1 L ART53 ART71 N4 N5 ART83-A ART99 N1.
CPC13 ART615 N1 B C.
L 82-E/14 DE 2014/12/31.
L 12-A/10 DE 2010/06/30.
L 3-B/10 DE 2010/04/28.
Legislação Comunitária:TCE ART12 ART56 ART58 N3.
Legislação Estrangeira:LEY 35/06 DE 2006/11/28 ART56 ART75.
Referências Internacionais:CONV PARA EVITAR A DUPLA TRIBUTAÇÃO E PREVENIR A EVASÃO FISCAL EM MATÉRIA DE IMPOSTOS SOBRE O RENDIMENTO CELEBRADA COM O REINO DE ESPANHA IN DR IS DE 1995/01/28 ART18 ART22 N1 ART23 N1 A.
Jurisprudência Nacional:AC STJ PROC418/11.3GAACB.C1.S1 DE 2015/03/12.
Referência a Doutrina:FREITAS PEREIRA - FISCALIDADE 2005 PAG203.
ALBERTO XAVIER - DIREITO TRIBUTÁRIO INTERNACIONAL 2ED PAG231.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
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1.1. A…………. deduziu impugnação judicial, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, contra as liquidações de retenção na fonte de IRS, relativas aos anos de 2010, 2011 e 2012, no valor de € 15.964,49.
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1.2. Aquele Tribunal, por sentença de 28/04/2016 (fls. 83/99), julgou improcedente a impugnação judicial.
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1.3. Interpôs o impugnante recurso para o Tribunal Central Administrativo Sul terminando as suas alegações com seguinte quadro conclusivo:
«A – O presente recurso, ao contrário do decidido pelo Tribunal a quo, tem efeito suspensivo.
B – A sentença recorrida é nula por violação do disposto no Artigo 615.º, n.º 1, alíneas b) e c) do Código de Processo Civil porquanto a decisão em crise se encontra em manifesta oposição com os respectivos fundamentos, enfermando de uma manifesta ambiguidade que a torna ininteligível.
C – As conclusões jurídicas vertidas na sentença recorrida estão em frontal oposição com a fundamentação de facto e de direito da própria decisão judicial.
D – A interpretação do Artigo 18.º da CONVENÇÃO perfilhada na sentença recorrida expressa na seguinte afirmação a fls. 11 “E não se argumente como faz o Impugnante, no sentido de que, nos termos da Convenção celebrada entre Portugal e Espanha para Evitar a Dupla Tributação (CDT), só o Estado da residência do beneficiário dos rendimentos tem competência para tributar, uma vez que tal reserva absoluta apenas se verifica quanto às pensões resultantes do anterior exercício de funções públicas.” não é correcta.
E – Nas Convenções para evitar a Dupla Tributação que seguem o modelo OCDE, como é o caso da CONVENÇÃO, salvo no que respeita às “pensões públicas” o Estado da Residência é o único com competência para tributar o rendimento proveniente de pensões.
F – O Estado Português, ao contrário do entendido na sentença recorrida nos termos do disposto no Artigo 18.º da CONVENÇÃO não tem competência para tributar as pensões de alimentos em apreço.
G – A interpretação sufragada pelo Tribunal a quo dos Artigos do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, designadamente, dos Artigos 71.º, n.º 4, 83.º-A e 99.º n.º 1, e reflectida na decisão recorrida configura uma clara e objectiva violação do disposto no Artigo 18.º do CONVENÇÃO.
H – Interpretação e Decisão Judiciais que serão inconstitucionais por violação do Artigo 8.º n.º 2 da Constituição da República Portuguesa.
- As pensões de alimentos em apreço estão isentas de tributação no Reino de Espanha conforme dispõem os Artigos 56.º e seguintes e Artigo 75.º da Ley n.º 35/2006, de 28 de Novembro.
J – A referida isenção espanhola inviabiliza a aplicação do mecanismo do crédito de imposto (Artigo 23.º da CONVENÇÃO), ao contrário do entendido na sentença recorrida.
K – Pelo que a interpretação dos Artigos 71.º, n.º 4, 83.º-A e 99.º n.º 1 do CIRS e respectivo entendimento explanado na Decisão recorrida configurará igualmente uma violação do disposto nos Artigos 12.º, 56.º e 58.º n.º 3 do Tratado da CEE».
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1.4. Não foram apresentadas contra-alegações.
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1.5. No Despacho de sustentação (fls. 153/155) foi defendido que a decisão recorrida não padece do alegado vício de nulidade que lhe foi imputado pelo recorrente.
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1.6. O TCA Sul, por acórdão de 31/05/2016 (fls.170/180), julgou-se «incompetente em razão da hierarquia para conhecer do presente recurso e competente, para o efeito, a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.».
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1.6. Neste Tribunal o MP emitiu a seguinte pronúncia:
«1. O presente recurso vem interposto da sentença do TAF de Loulé exarada a fls. 83 e seguintes dos autos, que julgou improcedente a ação de impugnação judicial intentada contra as liquidações oficiosas relativas a falta de retenções na fonte de IRS, no valor global de € 15.964,49 euros.
Invoca a Recorrente que a decisão recorrida padece do vício de nulidade por frontal oposição entre as conclusões e a respetiva fundamentação, e do vício de violação de lei, por violação do disposto no artigo 18º da Convenção para evitar a Dupla Tributação celebrada entre a República Portuguesa e o Reino de Espanha.
Mais entende que a interpretação e aplicação que o tribunal recorrido fez do disposto nos artigos 71º, nº 4, 83º-A e 99º, nº 1, do CIRS, é inconstitucional, por violadora do disposto no artigo 8º da Constituição, que dá primazia às normas convencionais internacionais.
Considera ainda que estando tais rendimentos isentos em Espanha — artigos 56° e 75° da Ley n° 35/2006, de 28 de Novembro ( Disponível em www.boe.es) não se coloca a questão da aplicação do disposto no artigo 23º da Convenção como forma de evitar a dupla tributação, “já que só haveria crédito de imposto se as pensões fossem tributadas em Espanha.
E termina pedindo a revogação da sentença.
2. Na sentença recorrida deu-se como assente que na sequência de ação inspetiva realizada ao impugnante, a AT considerou que nos anos de 2010, 2011 e 2012, o sujeito passivo devia ter efetuado a retenção na fonte a título definitivo, à taxa liberatória em vigor naquele período, sobre as pensões de alimentos pagas aos seus filhos, com domicílio em Espanha, ao abrigo do disposto nos artigos 18º, nº 1, alínea l), e 71º, nº 4, alínea c), ambos do CIRS, motivo pelo qual foram emitidas liquidações oficiosas, acrescidas de juros compensatórios, no valor global de € 15.964,49 euros.
Mais se deu como assente que em 12/03/2015 foram entregues no Serviço de Finanças de Faro declarações Mod. 21-RFI, datadas de 12/08/2010, onde os beneficiários das pensões de alimentos supra referidas declaram ser residentes em Espanha.
Para se decidir pela improcedência da ação considerou o tribunal recorrido que as pensões de alimentos estão sujeitas a tributação, nos termos da alínea a) do nº 1 do artigo 11º do CIRS, e que estando em causa beneficiários residentes no estrangeiro, tais rendimentos estão sujeitos a retenção na fonte, nos termos dos artigos 83º-A e 71º, nº 4, do mesmo Código. E que para efeitos de evitar a dupla tributação os beneficiários residentes em Espanha têm mecanismo que lhe permite deduzir o imposto pago em Portugal, ao abrigo do disposto no artigo 23º, nº 1, alínea a) da CDT celebrada entre Portugal e Espanha.
3. O Recorrente assaca à sentença dois vícios: o de nulidade, por frontal oposição entre as conclusões e a respetiva fundamentação; e o de violação de lei, por violação do disposto no artigo 18º da Convenção para evitar a Dupla Tributação celebrada entre a República Portuguesa e o Reino de Espanha.
3.1 No que respeita ao vício de nulidade é manifesta a falta de razão do Recorrente.
Nos termos da alínea c) do nº 1 do artigo 615º do CPC, e nº 1 do artigo 125º do CPPT, é nula a sentença se os fundamentos estiverem em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
Como se deixou exarado no acórdão do STJ de 12/03/2015 (proc. 418/11.3GAACB.C1.S1), «o vício da contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão verifica-se quando no texto da decisão constem posições antagónicas ou inconciliáveis, que se excluam mutuamente ou não possam ser compreendidas simultaneamente dentro da perspectiva de lógica interna da decisão, tanto na coordenação possível dos factos e respectivas consequências, como nos pressupostos de uma solução de direito».
No caso concreto da sentença recorrida não se vislumbra esse antagonismo entre a parte fundamentadora e a decisão, nem o Recorrente identifica essa situação. De facto, é facilmente percetível que a decisão assenta no entendimento de que os rendimentos da pensão de alimentos pagos a não residentes estão sujeitos a tributação e que impende sobre o devedor dessa pensão a obrigação de retenção do imposto. O que o Recorrente contesta é o entendimento sufragado na sentença, por entender que em face das normas legais aplicáveis, designadamente da CDT, outra decisão devia ter sido proferida. Extrair desse facto a conclusão de que a parte dispositiva da sentença está em conflito com a parte fundamentadora é errado, pois quando muito apenas podemos estar perante erro de julgamento, por errónea interpretação e aplicação da lei.
Entendemos, assim, que não se verifica a invocada nulidade da sentença.
3.2 No que respeita ao vício de violação de lei entende o Recorrente que em face da CDT celebrada entre Portugal e Espanha a regra é a de que as pensões sejam tributadas no estado contratante onde reside o beneficiário, no caso o Reino de Espanha. E nessa medida não impendia sobre o Recorrente a obrigação de retenção na fonte.
A questão que se coloca consiste em saber se as pensões de alimentos pagas pelo Recorrente aos seus filhos, os quais são dados como residentes em Espanha estão ou não sujeitas a tributação em Portugal, e no caso afirmativo se impendia sobre o Recorrente a obrigação de retenção na fonte a título definitivo.
O tribunal recorrido deu resposta afirmativa, confirmando desse modo a legalidade das liquidações oficiosas emitidas pela ATA. Para o efeito conclui-se, para além do mais, não se mostrar aplicável ao caso concreto o disposto nos artigos 18º e 22º da CDT celebrada entre a República Portuguesa e o Reino de Espanha.
Por seu lado o Recorrente contesta tal entendimento, alicerçando a sua posição no articulado da Convenção sobre Dupla Tributação, celebrada entre a República Portuguesa e o Reino de Espanha, que assegura ter sido incorretamente interpretada e aplicada.
Parece não oferecer dúvidas que em face do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 11º do CIRS, as pensões de alimentos estão sujeitas a tributação em sede de IRS. E que nos termos da alínea c) do nº 4 do artigo 71º do mesmo Código, impende sobre quem paga rendimentos relativos a pensões a não residente, a obrigação de retenção na fonte a título definitivo.
A questão que se coloca consiste em saber se tal norma colide com as disposições da Convenção para evitar a dupla tributação e evasão fiscal celebrada entre Portugal e Espanha, como defende o Recorrente.
Pese embora as normas supra citadas do CIRS prevejam a tributação de pensões, incluindo a pensão de alimentos, não podemos descurar que na prática caso se esteja perante um beneficiário cujos rendimentos se restrinjam a essa pensão, em regra não haverá lugar a liquidação de qualquer imposto. Tal facto, conjugado com razões de simplicidade, justifica a razão pela qual se dispensa o pagador de tal pensão da obrigação de retenção na fonte - artigo 99º, nº1, do CIRS.
Ora, no âmbito do modelo de convenção fiscal sobre o rendimento e o património foram acolhidas preocupações subjacentes à tributação de pensões, no sentido e citando os comentários do Comité dos Assuntos Fiscais da OCDE (Versão condensada, cadernos de Ciência e Técnica Fiscal n.º 197.) ao artigo 18º da Convenção, de defesa do “princípio segundo o qual o direito de tributação deste tipo de pensão e de outras remunerações similares deve ser conferido ao Estado de residência”, por este “estar em melhor posição do que qualquer outro Estado para apurar a capacidade contributiva global da pessoa em causa, que depende, fundamentalmente, dos seus rendimentos universais e das circunstâncias pessoais...”.
Como decorre do artigo 18º da CDT celebrada entre Portugal e Espanha, este respeita a, «... pensões e remunerações similares pagas a um residente de um Estado Contratante em consequência de um emprego anterior ...». Ora, a pensão de alimentos não é paga em consequência de uma atividade remunerada anterior, pelo que o citado normativo não se mostra aplicável ao caso concreto, como se entendeu na sentença recorrida. Todavia já outro tanto não ocorre com a previsão do artigo 22º, nº 1, da CDT, que se refere aos rendimentos não previstos especificamente em qualquer outro preceito da CDT e consagra igualmente o critério da fixação da tributação no Estado da residência do beneficiário da pensão («1.- Os elementos do rendimento de um residente de um Estado Contratante e donde quer que provenham não tratados nos artigos anteriores desta Convenção só podem ser tributados nesse Estado».). Atento o caracter abrangente da referida norma, na sua previsão incluem-se os rendimentos de pensão de alimentos, tal como ocorre no caso concreto dos autos. Subsunção esta que não é afastada pelo disposto no nº 2 do mesmo articulado, como se concluiu na sentença recorrida, ao entender-se, aparentemente, que a previsão do nº 1 é circunscrita aos rendimentos de bens imobiliários. Com efeito e salvo melhor opinião, no nº 2 do artigo 22º da CDT pretendeu-se apenas afastar a regra da tributação no estado da residência, prevista no nº1, nos casos em que “o residente de um estado contratante exerce no outro estado contratante uma atividade industrial ou comercial, por meio de um estabelecimento estável nele situado ou que exerce nesse outro estado uma profissão independente, através de uma instalação fixa nele situada, estando o direito ou a propriedade, em relação ao qual o rendimento é pago, efetivamente ligado com esse estabelecimento estável ou instalação fixa. Ou seja, a primeira parte do segmento da norma não pode ser lida e interpretada isoladamente, como aparentemente fez o tribunal recorrido.
Afigura-se-nos, assim, que o nº 1 do artigo 22º da CDT atribui ao estado de residência a tributação exclusiva dos rendimentos provenientes de pensão de alimentos. Por outro lado, não resulta da referida CDT qualquer limitação ou restrição a esse princípio por parte do estado português que permita a tributação no estado da fonte (e o próprio modelo de convenção sugere alternativas neste particular que os estados contratantes podiam ter adotado). O que permite concluir que a norma do artigo 22º da CDT prevalece sobre as normas do CIRS, afastando, assim, a sua aplicação, em razão do disposto no nº 2 do artigo 8º da Constituição da República.
Aliás, a entender-se doutra forma incorrer-se-ia numa situação de grave injustiça, pois o beneficiário da pensão de alimentos ficaria sujeito a uma ablação dessa pensão que não lograria recuperar, pois em regra tal tipo de rendimentos fica isento de tributação e no caso concreto a legislação tributária de Espanha consagra uma isenção para tais rendimentos — artigo 7°, alínea k) da Ley del Impuesto sobre la Renta de las Personas Físicas (Artículo 7.
Rentas exentas
Estarán exentas las siguientes rentas:
(…)
k) Las anualidades por alimentos percibidas de los padres en virtud de decisión judicial.).
Por outro lado verificar-se-ia uma manifesta discriminação entre beneficiários residentes e não residentes, já que os residentes sempre beneficiam da dedução específica que isenta tais rendimentos até um certo montante — art°s 53º e 71º nº 5 do CIRS.
Em face do exposto, afigura-se-nos que a sentença recorrida padece do vício de violação de lei que lhe é assacado pelo Recorrente, por violação do disposto no artigo 22º, nº 1, da CDT celebrada entre a República Portuguesa e o Reino de Espanha, motivo pelo qual se impõe a sua revogação e substituição por decisão que julgue procedente a ação de impugnação judicial e determine a anulação das liquidações oficiosas.».
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1.7. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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2. A sentença recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:
“A) Nas declarações de rendimentos modelo 3 de IRS referentes aos anos de 2010, 2011 e 2012, o Impugnante declarou, no Anexo H, ter pago pensões de alimentos aos seus filhos B………. e C………., com domicílio fiscal em Espanha, conforme a seguir se indica:

- cfr. fls. 64, 65 e 68 a 91 do processo instrutor apenso.
B) Relativamente aos montantes identificados em A) o Impugnante não efetuou retenção da fonte – cfr. 68 a 91 do processo instrutor apenso e por acordo.
C) Em 14.11.2013 foi emitido pelo Serviço de Finanças de Portimão o oficio n.º 11932, endereçado ao ora Impugnante para a morada Urb. ………, ………., Ed. …………, Lt. …. – …..B, em Portimão, para notificação do despacho de 04.11.2013, com vista à regularização de «retenções na fonte de IRS, dos anos de 2009 a 2012, referentes às pensões de alimentos» — cfr. fls. 102 a 104 do processo instrutor apenso que aqui se dão por reproduzidas.
D) O ofício que antecede foi devolvido ao remetente com a indicação “Objeto não reclamado” — cfr. fls. 105 a 107 do processo instrutor apenso.
E) Em 02.12.2013 e na sequência de mandados de notificação emitidos em 29.11.2013, foi o ora Impugnante notificado para os efeitos mencionados em C)
- cfr. fls. 108 a 112 do processo instrutor apenso.
F) Em 03.04.2012 o ora Impugnante requereu, conforme fls. 113 a 119 do processo instrutor apenso que aqui se dão por reproduzidas, a anulação do determinado nos mandados de notificação que antecedem por entender, em síntese ser impossível efetuar a retenção na fonte sobre quantias que já foram pagas e violação do disposto no art.º 17.º-A do CIRS e 22.º, n.º 1, da Convenção celebrada entre Portugal e Espanha para Evitar a Dupla Tributação – cfr. fls. 113 a 119 do processo instrutor apenso que aqui se dão por reproduzidas.
G) Em 14.07.2014 foi o Impugnante notificado para, no prazo de 30 dias efetuar o pagamento voluntário das quantias relativas a retenções a título definitivo, referentes aos anos de 2010 a 2012, à taxa liberatória de 21,5%, e respetivos juros compensatórios, quanto aos pagamentos das pensões de alimentos identificados em A) – cfr. fls. 126, 133 e 139 do processo instrutor apenso que aqui se dão por reproduzidas.
H) Com início em 02.10.2014, e a coberto das ordens de serviço n.°s O1201401368, O1201401369 e O1201401370, de 22.09.2014, o ora Impugnante foi objeto de uma ação de inspeção parcial (Retenções na Fonte) em relação aos anos de 2010, 2011 e 2012 – cfr. fls. 186 a 188 do processo instrutor apenso.
I) Por ofícios n.º 17666 de 07.10.2014 e n.º 18698 de 22.10.2014, foi dirigida ao Impugnante, para a morada Urb. ………., ………, Ed. …….., Lt. ….. – ….B, em Portimão, o projeto de relatório para efeitos de audição prévia, tendo ambos sido devolvidos ao remetente com a indicação “Objeto não reclamado” – cfr. fls. 201 a 217 do processo instrutor apenso.
J) Por ofício n.º 19798 de 10.11.2014 foi enviado para a mesma morada que antecede o Relatório Final elaborado em 04.11.2014, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e de que se realça, em síntese o seguinte:
«[…]
III Descrição dos factos e das correções meramente aritméticas à matéria coletável O sujeito passivo A…………, NIF ……….; entregou as declarações de rendimentos modelo 3 de IRS, referentes aos anos de 2010, 2011 e 2012, tendo declarado, no seu Anexo H, ter pago pensões de alimentos nos montantes a seguir indicados, aos seus filhos B…………, NIF ………, e C………., NIF ……….., os quais são não residentes, com domicílio fiscal em Espanha:


Nos termos da alínea l) do n.º 1 do artigo 18º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIR.5’), os referidos rendimentos de pensões consideram-se obtidos em Portugal
Nestes termos, o sujeito passivo A………… (devedor dos rendimentos de pensões a não residentes) deveria ter efetuado a retenção na fonte a título definitivo, à taxa liberatória em vigor à data dos factos, conforme determina a alínea c) do n.º 4 do artigo 71° do CIRS, devendo as quantias retidas serem entregues até ao dia 20 do mês seguinte aquele em que foram deduzidas, nos termos do n.º 3 do artigo 98.º do CIRS.

[…]
IX. Direito de Audição
Através do ofício n.º 17666, de 2014-10-07, […] foi o sujeito passivo notificado por via de carta registada, para, no prazo 15 dias, e nos termos previstos nos artigo 60.º da LGT e artigo 60.º do RCPIT exercer o direito de audição sobre o Projeto de Relatório de Inspeção Tributária, tendo a carta sido devolvida com a indicação “Objeto não reclamado”. Nos termos do nº 5 do artigo 39.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), foi enviada segunda notificação, através do ofício n.º 18698, de 2014-10-22, por via de carta registada com aviso de receção, tendo vindo igualmente devolvida coma indicação “Objeto não reclamado”. Deste modo presume-se notificado o sujeito passivo, considerando-se que o Direito de Audição não foi exercido.» - n cfr. fls. 177 a 191 do processo instrutor apenso.
K) Atos impugnados: Na sequência das correções resultantes do Relatório de Inspeção que antecede, foram emitidas as seguintes liquidações de retenções na fonte:
i. Em 25.11.2014 a liquidação n.º 2014 6410001084, relativa ao ano de 2010, no valor total de € 5.326,79, sendo € 4.586,58 de imposto e € 740,21 de juros compensatórios, com data limite de pagamento em 31.12.2014;
ii. Em 19.12.2014 a liquidação n.º 2014 6410001181, relativa ao ano de 2011, no valor total de € 5.358,77, sendo € 4.820,47 de imposto e € 538,30 de juros compensatórios, com data limite de pagamento em 28.01.2015, e
iii. Em 19.12.2014 a liquidação n.º 2014 6410001182, relativa ao ano de 2012, no valor total de €5.278,93, sendo €4.926,90 de imposto e €352,03 de juros compensatórios, com data limite de pagamento em 28.01.2015
- cfr. docs. 1, 2 e 3 juntos com a petição inicial.
L) Em 27.01.2015 foi instaurado no Serviço de Finanças de Portimão processo de execução fiscal (PEF) para cobrança coerciva das quantias a que se referem as liquidações identificadas em K) — cfr. fls. 150 a 156 do processo instrutor apenso.
M) Em 04.03.2015, no âmbito do PEF que antecede, o ora Impugnante prestou garantia bancária no valor de € 21.018,52, tendo o mesmo sido suspenso – cfr. fls. 160 a 163 do processo instrutor apenso.
N) As pensões de alimentos identificadas em A) foram decretadas pelo Tribunal de Sevilha no âmbito do processo de divórcio que correu termos sob o n° 32/08-C – cfr. docs. 4 e 5 juntos com a petição inicial.
O) Em 12.03.2015 foram entregues no Serviço de Finanças de Faro as declarações Mod. 21-RFI, datadas de 12.08.2010, em nome de B………… e C……….. relativos aos rendimentos de pensões de alimentos por si recebidos, onde declaram ser residentes em Espanha – cfr. docs. 6 e 7 juntos com a petição inicial.
P) Nos referidos Mod. 21-RFI não se mostra preenchido o quadro III relativo à “Certificação das autoridades fiscais competentes do estado de residência do beneficiário efetivo” – cfr. docs. 6 e 7 juntos com a petição inicial.
Q) Entre 12.08.2010 e 29.06.2015 o Impugnante teve domicílio fiscal na Urb. …….., ………, Ed. ………, Lt. …. – …..B, em Portimão, tendo depois alterado para Rua …………., lote ………, em Portimão – cfr. doc. 1 junto com a contestação.».
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3.1. A sentença recorrida entendeu não ocorrer vício de violação de lei, não ocorrer violação do direito de audiência e encontrar-se a liquidação impugnada fundamentada.
Sustenta o recorrente a nulidade da sentença imputando-lhe, ainda, erro de julgamento.
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3.2.Com efeito nas conclusões das suas alegações defende o recorrente a nulidade da sentença por violação do disposto no Artigo 615.º, n.º 1, alíneas b) e c) do Código de Processo Civil porquanto a decisão em crise se encontra em manifesta oposição com os respetivos fundamentos, enfermando de uma manifesta ambiguidade que a torna ininteligível.
Ainda segundo o recorrente as conclusões jurídicas vertidas na sentença recorrida estão em frontal oposição com a fundamentação de facto e de direito da própria decisão judicial.
Da matéria factual fixada na sentença em apreciação resulta que na sequência de ação inspetiva realizada ao impugnante, a AT considerou que nos anos de 2010, 2011 e 2012, o sujeito passivo devia ter efetuado a retenção na fonte a título definitivo, à taxa liberatória em vigor naquele período, sobre as pensões de alimentos pagas aos seus filhos, com domicílio em Espanha, ao abrigo do disposto nos artigos 18º, nº 1, alínea l), e 71º, nº 4, alínea c), ambos do CIRS, motivo pelo qual foram emitidas liquidações oficiosas, acrescidas de juros compensatórios, no valor global de € 15.964,49 euros.
Resulta, ainda, da matéria factual fixada que, em 12/03/2015, foram entregues no Serviço de Finanças de Faro declarações Mod. 21-RFI, datadas de 12/08/2010, onde os beneficiários das pensões de alimentos supra referidas declaram ser residentes em Espanha.
Concluiu a mesma sentença que as pensões de alimentos estão sujeitas a tributação, nos termos da alínea a) do nº 1 do artigo 11º do CIRS, e que estando em causa beneficiários residentes no estrangeiro, tais rendimentos estão sujeitos a retenção na fonte, nos termos dos artigos 83º-A e 71º, nº 4, do mesmo Código.
Ainda, segundo a mesma sentença, para evitarem a dupla tributação os beneficiários, residentes em Espanha, têm mecanismos que lhe permitem deduzir o imposto pago em Portugal, ao abrigo do disposto no artigo 23º, nº 1, alínea a) da CDT celebrada entre Portugal e Espanha.
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3.3. Não ocorre a nulidade da sentença por oposição entre as conclusões e a respetiva fundamentação como não enferma de uma ambiguidade que a torna ininteligível.
Com efeito nos termos da alínea c) do nº 1 do artigo 615º do CPC, e nº 1 do artigo 125º do CPPT, é nula a sentença se os fundamentos estiverem em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
Como refere o MP, citando o acórdão do STJ de 12/03/2015 (proc. 418/11.3 GAACB.C1.S1), «o vício da contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão verifica-se quando no texto da decisão constem posições antagónicas ou inconciliáveis, que se excluam mutuamente ou não possam ser compreendidas simultaneamente dentro da perspectiva de lógica interna da decisão, tanto na coordenação possível dos factos e respectivas consequências, como nos pressupostos de uma solução de direito».
No caso dos autos não se descortina tal antagonismo entre a parte fundamentadora e a decisão.
Como refere o MP é facilmente percetível que a decisão assenta no entendimento de que os rendimentos da pensão de alimentos pagos a não residentes estão sujeitos a tributação e que impende sobre o devedor dessa pensão a obrigação de retenção do imposto.
O recorrente contesta é o entendimento da sentença, por entender que em face das normas legais aplicáveis, designadamente da CDT, outra deveria ser a conclusão.
Tal situação poderá integrar erro de julgamento por errónea interpretação e aplicação da lei mas não a mencionada nulidade da sentença.
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3.4. Resta apreciar se ocorre o invocado vício de violação do disposto no artigo 18º da Convenção para evitar a Dupla Tributação celebrada entre a República Portuguesa e o Reino de Espanha.
Segundo o recorrente nas convenções para evitar a dupla tributação que seguem o modelo OCDE, como é o caso da referida, salvo no que respeita às “pensões públicas” o Estado da Residência é o único com competência para tributar o rendimento proveniente de pensões pelo que o Estado Português, ao contrário do entendido na sentença recorrida nos termos do disposto no artigo 18.º, não tem competência para tributar as pensões de alimentos em apreço.
Acrescenta que a interpretação da sentença recorrida seria inconstitucional por violação do artigo 8.º n.º 2 da Constituição da República Portuguesa pois as pensões de alimentos em apreço estão isentas de tributação no Reino de Espanha, conforme dispõem os Artigos 56.º e seguintes e Artigo 75.º da Ley n.º 35/2006, de 28 de Novembro e a referida isenção espanhola inviabiliza a aplicação do mecanismo do crédito de imposto (artigo 23.º da CONVENÇÃO), ao contrário do entendido na sentença recorrida.
Afirma, ainda, que a interpretação dos artigos 71.º, n.º 4, 83.º-A e 99.º n.º 1 do CIRS da sentença recorrida configura igualmente uma violação do disposto nos Artigos 12.º, 56.º e 58.º n.º 3 do Tratado da CEE.
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3.5. Segundo a sentença recorrida, no caso dos autos, as pensões estão previstas no Código do IRS, como facto tributário, no art.º 11.º, cuja aI. a) do n.º 1, esclarece que nelas se incluem as pensões de alimentos: As prestações devidas a título de pensões de aposentação ou de reforma, velhice, invalidez ou sobrevivência, bem como outras de idêntica natureza, incluindo os rendimentos referidos no n.º 2 do artigo 2.º-A, e ainda as pensões de alimentos (sublinhado nosso).
Estando-se perante um facto tributário, resta aferir, em função das circunstâncias do caso concreto, em que termos tais rendimentos, pagos pelo Impugnante aos seus filhos, são tributados, maxime se estão sujeitos a tributação em Portugal à taxa liberatória prevista, para este tipo de rendimentos, no art.º 71.º do CIRS.
A evolução dos sistemas tributários, com reflexos nas normas de aplicação da lei tributária no espaço, ditou a concetualização do princípio da territorialidade, presentemente consagrado no art.º 13.º da LGT, em aceções que importam, designadamente, na consideração de elementos de conexão pessoal e real (cfr. MANUEL HENRIQUE DE FREITAS PEREIRA, Fiscalidade, Almedina, 2005, pág. 203 e seg.; ALBERTO XAVIER, Direito Tributário Internacional, 2ª. edição atualizada, Almedina, março de 2007, pág. 231 e seg.), cujo n.º 1 estabelece que [f]icam sujeitas a IRS as pessoas singulares que residam em território português e as que nele não residindo, aqui obtenham rendimentos.
Ou seja, em face das concretas circunstâncias do caso, existe um facto tributário – o pagamento de pensões de alimentos efetuado pelo Impugnante aos seus filhos – que, em abstrato, de acordo com o princípio da territorialidade previsto no art.º 13.º, n.º 1, do CIRS, é suscetível de ser tributado em território nacional, através do mecanismo da substituição tributária, ou seja, através de retenção.
É verdade que, como alega o Impugnante, o n.º 1 do art.º 99.º do CIRS excluía do dever de retenção na fonte as pensões de alimentos. Ali se expunha, na redação vigente à data dos factos, idêntica à al. b) do n.º 1 da atual redação, resultante da republicação do CIRS pela Lei n.º 82-E/2014, de 31 de dezembro], e no que ao caso releva, que:
1 - As entidades devedoras de rendimentos de pensões, com exceção das de alimentos são obrigadas a reter o imposto no momento do seu pagamento ou colocação à disposição dos respectivos titulares.
Sucede, no entanto, que, nos casos previstos no art.º 83.º-A do CIRS e estando em causa beneficiários residentes no estrangeiro, por força do princípio da territorialidade, é aplicável o disposto no art.º 71.º, n.º 4, do CIRS. Ou seja, estão sujeitos a retenção na fonte a título definitivo, os rendimentos de pensões obtidos em território português por não residentes, às taxas liberatórias de 20% até junho de 2010 (redação dada pela Lei n.º 3-B/2010 - 28/04) e de 21,5% de julho a dezembro de 2012 (Lei n.º 12-A/2010, de 30/06, e Lei n.º 12-A/2010 - 30/06), sendo certo que, como vimos acima, os rendimentos de pensões abrangem as pensões de alimentos, conforme resulta da parte final da al. a) do n.º 1 do art.º 11.º, do CIRS.
E não se argumente, como o faz o Impugnante, no sentido de que, nos termos da Convenção celebrada entre Portugal e Espanha para Evitar a Dupla Tributação (CDT) só o Estado da residência do beneficiário dos rendimentos tem competência para os tributar, uma vez que tal reserva absoluta apenas se verifica quanto às pensões resultantes do anterior exercício de funções públicas (cfr. art.º 18.º da CDT. Por outro lado, o n.º 1 do art.º 22.º da CDT, como resulta do n.º 2, não se aplica ao rendimento que não seja rendimento de bens imobiliários […] (realce nosso).
Relevante, em termos da Convenção celebrada entre Portugal e Espanha para evitar a Dupla Tributação e prevenir a Evasão Fiscal em matéria de imposto sobre o rendimento é o art.º 23.º, n.º 1, alínea a), onde se dispõe que, no caso de um residente em Espanha, a dupla tributação será evitada, de acordo com as disposições aplicáveis da legislação espanhola, do seguinte modo: “Quando um residente de Espanha obtiver rendimentos que, de acordo com o disposto nesta Convenção, possam ser tributados em Portugal, a Espanha deduzirá do imposto sobre o rendimento desse residente uma importância igual ao imposto efetivamente pago em Portugal […] (cfr. a al. a).
Do exposto resulta que os beneficiários dos rendimentos de pensões pagos pelo ora Impugnante, no respetivo Estado da residência, dispõem, querendo beneficiar dessa prerrogativa, do direito a um crédito de imposto calculado nos termos mencionados na segunda parte da mencionada al. a) do n.º 1 do art.º 23.º da CDT, sem que tal regime colida, antes assim se compatibilizando, com aquele que decorre da lei fiscal portuguesa, maxime dos art.ºs 11.º, n.º 1, al. a), 13.º, n.º 1, 83.º-A e 71.º, n.º 4, todos do Código do IRS.
Pelo exposto, sem necessidade de outras considerações, conclui-se que bem andou a Administração Tributária ao convidar o sujeito passivo (por substituição tributária através da figura da retenção na fonte) a regularizar as retenções em falta quanto às pensões pagas em 2010, 2011 e 2012 e, na falta de cumprimento de tal obrigação, a proceder às respetivas liquidações.
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3.5. Afirma a sentença recorrida que, contrariamente ao sustentado pelo impugnante, nos termos da Convenção celebrada entre Portugal e Espanha para Evitar a Dupla Tributação (CDT), nem só o Estado da residência do beneficiário dos rendimentos tem competência para os tributar, uma vez que tal reserva absoluta apenas se verifica quanto às pensões resultantes do anterior exercício de funções públicas (cfr. art.º 18.º da CDT) e que, por outro lado, o n.º 1 do art.º 22.º da CDT, como resulta do n.º 2, não se aplica ao rendimento que não seja rendimento de bens imobiliários.
Continua a defender o recorrente que em face da CDT celebrada entre Portugal e Espanha a regra é a de que as pensões sejam tributadas no estado contratante onde reside o beneficiário, no caso o Reino de Espanha. E nessa medida não impendia sobre o Recorrente a obrigação de retenção na fonte.
Importa, por isso, determinar se as pensões de alimentos pagas pelo recorrente aos seus filhos, residentes em Espanha estão ou não sujeitas a tributação em Portugal, e no caso afirmativo se o impugnante tinha a obrigação de retenção na fonte a título definitivo.
A sentença recorrida entendeu não ser aplicável ao caso dos autos o artigo 18º e 22º da CDT.
É incontroverso que, nos termos da alínea a) do nº 1 do artigo 11º do CIRS, as pensões de alimentos estão sujeitas a tributação em sede de IRS.
E, igualmente, não se questiona que, nos termos da alínea c) do nº 4 do artigo 71º do CIRS, impende sobre quem paga rendimentos relativos a pensões a não residente, a obrigação de retenção na fonte a título definitivo.
É já controvertido, nos presentes autos, saber se esta norma é ou não compatível com a indicada Convenção para evitar a dupla tributação e evasão fiscal celebrada entre Portugal e Espanha, como sustenta o recorrente.

Como afirma o MP, que iremos acompanhar, pese embora as normas do CIRS prevejam a tributação de pensões, incluindo a pensão de alimentos, não podemos descurar que, na prática, caso se esteja perante um beneficiário cujos rendimentos se restrinjam a essa pensão, em regra não haverá lugar a liquidação de qualquer imposto, pelo que tal facto, conjugado com razões de simplicidade, justifica a razão pela qual se dispensa o pagador da pensão de alimentos de tal obrigação de retenção na fonte, nos termos do artigo 99º 1 do CIRS.
No âmbito do modelo de convenção fiscal sobre o rendimento e o património foram acolhidas preocupações subjacentes à tributação de pensões, no sentido e citando os comentários do Comité dos Assuntos Fiscais da OCDE (versão condensada, cadernos de Ciência e Técnica Fiscal n.º 197) ao artigo 18º da Convenção, de defesa do “princípio segundo o qual o direito de tributação deste tipo de pensão e de outras remunerações similares deve ser conferido ao Estado de residência”, por este “estar em melhor posição do que qualquer outro Estado para apurar a capacidade contributiva global da pessoa em causa, que depende, fundamentalmente, dos seus rendimentos universais e das circunstâncias pessoais...”.
Como decorre do artigo 18º da CDT celebrada entre Portugal e Espanha, este princípio respeita a «pensões e remunerações similares pagas a um residente de um Estado Contratante em consequência de um emprego anterior». Ora, a pensão de alimentos não é paga em consequência de uma atividade remunerada anterior, pelo que o citado normativo não se mostra aplicável ao caso concreto, contrariamente ao que se entendeu na sentença recorrida.
O artigo 22º, nº 1, da CDT, refere-se aos rendimentos não previstos especificamente em qualquer outro preceito da CDT e consagra igualmente o critério da fixação da tributação no Estado da residência do beneficiário da pensão segundo o qual “os elementos do rendimento de um residente de um Estado Contratante e donde quer que provenham não tratados nos artigos anteriores desta Convenção só podem ser tributados nesse Estado”.
Por força da amplitude desta norma, na sua previsão incluem-se os rendimentos de pensão de alimentos, tal como ocorre no caso concreto dos autos. Subsunção esta que não é afastada pelo disposto no nº 2 do mesmo articulado, como se concluiu na sentença recorrida, ao entender-se, aparentemente, que a previsão do nº 1 é circunscrita aos rendimentos de bens imobiliários.
No nº 2 do artigo 22º da CDT pretendeu-se apenas afastar a regra da tributação no estado da residência, prevista no nº1, nos casos em que “o residente de um estado contratante exerce no outro estado contratante uma atividade industrial ou comercial, por meio de um estabelecimento estável nele situado ou que exerce nesse outro estado uma profissão independente, através de uma instalação fixa nele situada, estando o direito ou a propriedade, em relação ao qual o rendimento é pago, efetivamente ligado com esse estabelecimento estável ou instalação fixa. Ou seja, a primeira parte do segmento da norma não pode ser lida e interpretada isoladamente, como aparentemente fez o tribunal recorrido.
O nº 1 do artigo 22º da CDT atribui ao estado de residência a tributação exclusiva dos rendimentos provenientes de pensão de alimentos.
Não resulta da CDT qualquer limitação ou restrição a esse princípio por parte do estado português que permita a tributação no estado da fonte (e o próprio modelo de convenção sugere alternativas neste particular que os estados contratantes podiam ter adotado).
A norma do artigo 22º da CDT prevalece sobre as normas do CIRS, afastando, assim, a sua aplicação, em razão do disposto no nº 2 do artigo 8º da Constituição da República.
Ainda conforme refere o MP a entender-se de outra forma incorrer-se-ia numa situação de grave injustiça, pois o beneficiário da pensão de alimentos ficaria sujeito a uma ablação dessa pensão que não lograria recuperar, pois em regra tal tipo de rendimentos fica isento de tributação e no caso concreto a legislação tributária de Espanha consagra uma isenção para tais rendimentos — artigo 7°, alínea k) da Ley del Impuesto sobre la Renta de las Personas Físicas (Artículo 7. Rentas exentas - Estarán exentas las siguientes rentas: (…) k) Las anualidades por alimentos percibidas de los padres en virtud de decisión judicial). Por outro lado verificar-se-ia uma manifesta discriminação entre beneficiários residentes e não residentes, já que os residentes sempre beneficiam da dedução específica que isenta tais rendimentos até um certo montante — art°s 53º e 71º nº 5 do CIRS.
Conclui-se que a sentença recorrida sofre do vício de violação de lei que lhe é atribuído, por violação do disposto no artigo 22º, nº 1, da CDT, celebrada entre a República Portuguesa e o Reino de Espanha.
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O nº 1 do artigo 22º da Convenção Entre A República Portuguesa e o Reino de Espanha Para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre o Rendimento atribui ao estado de residência a tributação exclusiva dos rendimentos provenientes de pensão de alimentos.
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4. Termos em que acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e anular a liquidação impugnada.
Custas pela FP na 1ª instância e sem custas neste STA, uma vez que não apresentou contra alegações.
Lisboa, 12 de julho de 2017. – António Pimpão (relator) – Isabel Marques da Silva – Dulce Neto.