Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01089/09
Data do Acordão:10/20/2010
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:DULCE NETO
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO
EXECUÇÃO FISCAL
FUNDAMENTO DA OPOSIÇÃO
NOTIFICAÇÃO
LIQUIDAÇÃO
IMPOSTO MUNICIPAL SOBRE IMÓVEIS
CONTRIBUIÇÃO AUTÁRQUICA
Sumário:I - Em processo de oposição apenas pode ser discutida a falta de notificação ou a falta de notificação tempestiva (no prazo de caducidade) da liquidação dos tributos que constituem a dívida exequenda, na medida em que essas situações são susceptíveis de retirar eficácia ao acto notificado e impedir, desse modo, a exigibilidade da correspondente dívida. Já a discussão da caducidade do direito à liquidação em si, na medida em que constitui matéria que contende com a legalidade desse concreto acto de liquidação, não é permitida em sede de oposição por força do disposto no artigo 204.º, n.º 1, alínea h), do CPPT.
II - O acto de liquidação de Contribuição Autárquica e de Imposto Municipal sobre Imóveis efectuado dentro do prazo normal não carece de notificação ao sujeito passivo, bastando o envio do documento de cobrança aludido nos artigos 22.º e 23.º do CCA e nos artigos 119.º e 120.º do CIMI para tornar a dívida exigível.
III - A ilegalidade do acto de liquidação resultante da desconsideração do direito a eventual isenção de tributação envolve a discussão sobre a legalidade concreta desse acto, e essa discussão só pode ser válida e eficazmente efectuada em processo de oposição nos casos em que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto da liquidação - artigo 204.º, nº 1, alínea g), do CPPT.
Nº Convencional:JSTA00066646
Nº do Documento:SA22010102001089
Data de Entrada:11/03/2009
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TAF BRAGA PER SALTUM.
Decisão:NEGA PROVIMENTO.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - OPOSIÇÃO.
DIR PROC FISC GRAC - LIQUIDAÇÃO.
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART204 N1 E H.
CCA88 ART10 N6 ART22 ART23.
CIMI03 ART9 N5 ART119 ART120.
LGT98 ART95.
CPPTRIB99 ART97 ART102.
CONST97 ART268 N4.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC300/08 DE 2008/09/18.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
A…, LDA, com os demais sinais dos autos, recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga na parte em que julgou improcedente a oposição que deduzira à execução fiscal contra si instaurada para cobrança de dívidas referentes a Contribuição Autárquica e a Imposto Municipal sobre Imóveis.
Terminou a sua alegação enunciando as seguintes conclusões:
- Na contribuição autárquica e no IMI, só a notificação ao contribuinte da liquidação efectuada dentro do prazo de caducidade impede a preclusão do direito de liquidar o imposto.
- O art.° 10º/6 do CCA e 9°/5 do CIMI, ao preverem como cominação para a não comunicação que o imposto seja devido, mesmo que materialmente a empresa esteja em condições de beneficiar da não tributação, são inconstitucionais, por violação do princípio da boa fé, do princípio da segurança jurídica e do princípio da proporcionalidade.
- O incumprimento das obrigações declarativas não pode ter como consequência a tributação de situações de facto que a lei expressamente prevê que não sejam isentas de tributação, caso o contribuinte prove, através de um meio de prova qualificado (os seus registos contabilísticos) que estava em condições de beneficiar da isenção;
- Concorre no incumprimento do contribuinte, tornando o esquecimento deste desculpável, a Administração Tributária que não proceda à notificação das liquidações de CA e IMI em tempo útil.
1.2. A Fazenda Pública (Recorrida) não apresentou contra-alegações.
1.3. O Exmo. Procurador-Geral-Adjunto emitiu douto parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso, com a seguinte argumentação:
«A questão objecto do presente recurso prende-se com a exigibilidade em processo de execução fiscal das liquidações de contribuição autárquica e IMI nomeadamente saber se a lei impõe, ou não, a notificação dessas liquidações ao contribuinte.
Alega a recorrente que na contribuição autárquica e no IMI, só a notificação ao contribuinte da liquidação efectuada dentro do prazo de caducidade impede a preclusão do direito de liquidar o imposto.
E que o artº 10º, 6, do Código da Contribuição Autárquica e o artº 9º, 5 do CIMI, ao preverem como cominação para a não comunicação que o imposto seja devido, mesmo que materialmente a empresa esteja em condições de beneficiar da não tributação, são inconstitucionais, por violação do princípio da boa fé, do princípio da segurança jurídica e do princípio da proporcionalidade.
Afigura-se-nos que o recurso não merece provimento.
Como se sublinha no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 18.09.2008, recurso 300/08, citado na decisão recorrida, «independentemente de notificação-interpelação, há mora do devedor, se a obrigação tiver prazo certo - cf., v.g. a alínea a) do nº 2 do artigo 805º do Código Civil. E, assim, se esse for o regime legal consagrado, a dívida de imposto pode tornar-se certa, líquida e exigível sem necessidade da respectiva notificação, logo após a sua liquidação».
Ora a CA e o IMI são impostos periódicos que devem ser pagos durante o mês de Abril do ano seguinte àquele a que respeitam. Daí que só haja lugar a notificação da liquidação quando esta é feita fora do prazo legal ou é adicional.
Nos demais casos, ocorrendo a liquidação no prazo normal, a dívida é exigível sem necessidade da respectiva notificação.
Mas a recorrente invoca ainda a inconstitucionalidade material dos artsº 10º, 6, do Código da Contribuição Autárquica e o 9º, 5 do CIMI, por violação do princípio da boa fé, do princípio da segurança jurídica e do princípio da proporcionalidade.
Também aqui não deverão proceder os argumentos da recorrente.
Na verdade face ao disposto no art. 10º al. do CCA a lei contempla uma não sujeição temporal daquele imposto desde que a empresa tenha como objecto social quer a construção de edifícios quer a comercialização dos mesmos, e a respectiva contabilidade reflicta, de modo claro e inequívoco, a realidade dos novos prédios edificados, ou destinados a venda.
Não está pois em causa, como se salienta no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 23.02.2000, recurso 24184, in www.dgsi.pt, o regime dos direitos liberdades e garantias na acepção do principio constitucional da proibição do excesso, nas sim um requisito legal do funcionamento do regime de não sujeição à Contribuição Autárquica.
Acresce que não é sequer demonstrado pela recorrente, que, diga-se de passagem, se fica pelo plano da remissão genérica para as normas constitucionais, em que termos é que os referidos normativos contendem com os princípios da boa fé, da segurança jurídica e da proporcionalidade.
Pese embora nas conclusões sejam invocados os referidos princípios constitucionais, o certo é que nas alegações não é desenvolvida qualquer argumentação de onde se possa inferir essa inconstitucionalidade.
Em face do exposto, somos de parecer que o presente recurso não merece provimento, devendo ser confirmado o julgado recorrido.»
1.4. Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Conselheiros Adjuntos, cumpre decidir em conferência.
2. Na sentença recorrida constam como provados os seguintes factos:
1. Em 21.Set.2006, foi proferido mandado de penhora dos bens pertencentes a “A…, Ld.ª”, necessários para pagamento da quantia exequenda no valor de € 23.542,01 (vinte e três mil, quinhentos e quarenta e dois euros e um cêntimo), relativa a dívidas de contribuição autárquica (CA) e imposto municipal sobre imóveis (IMI).
2. No mesmo dia, para pagamento daquela quantia, foram penhoradas várias fracções dos prédios 1181 e 1182, sitos na freguesia da Costa, concelho de Guimarães
3. Em 20.Nov.2006, após várias tentativas de citação frustradas, o oponente foi citado por edital.
4. Em 05.Fev.2007 deu entrada oposição judicial à execução.
5. Relativamente às quantias em execução nos processos executivos n.º 3476200201029630, 347620001012100, 3476200201029142, 3476200201043714, 3476200201057740, 3476200201062301 e 3476200201007696, não foi notificada qualquer liquidação à oponente.
6. De igual modo, não foi solicitada pela oponente qualquer 2ª via, nem foi devolvido ao Serviço de Finanças da área da localização dos prédios em causa nenhuma nota de cobrança ou aviso de pagamento.
7. A oponente nunca comunicou ao Serviço de Finanças que os prédios em causa nos autos se destinavam a ser vendidos nem apresentou qualquer requerimento de não sujeição.
8. Na declaração para inscrição ou alteração de inscrição de prédios urbanos na matriz não foi assinalado que o prédio se destinava a venda.
9. As certidões de dívida em causa no Processo de Execução Fiscal n.º 3476200201007696, respeitam a contribuição autárquica relativa, entre outras, às fracções H do artigo 1181 e às fracções I e L do artigo 1182, freguesia da Costa, concelho de Guimarães.
10. Todavia, a certidão n.º 5005908 refere-se ao ano de 1999 e a certidão n.º 5035608 a 2000.
11. Por seu lado, a certidão de dívida n.º 29773608, título executivo do Processo de Execução Fiscal n.º 3476200201043714, refere-se a contribuição autárquica que, entre outras, incidiu sobre as fracções acima mencionadas e reporta-se ao ano de 2000.
12. A fracção H do artigo 1181 e as fracções I e L do artigo 1182 foram transmitidas, em 27 de Janeiro de 2000, a B… .
13. Por despacho datado de 27-03-2007, foi considerado não ser da responsabilidade da oponente a contribuição autárquica de 2000 que incidiu sobre as fracções H do artigo 1181 e sobre as fracções I e L do artigo 1182, freguesia da Costa, concelho de Guimarães, pelo que foram revogada a certidão de dívida nº 5035608, título executivo dos autos de execução n° 3476200201007696, e a certidão de dívida n.º 29773608, único título executivo do Processo de Execução Fiscal n.º 3476200201043714.
14. A Oponente é uma sociedade que tem no seu objecto a compra e venda de bens imobiliários.
15. Em 1999 constavam das existências da sociedade as fracções A, B, C e D do artigo 638/Mascotelos.
16. As fracções A, B, C, D e G integradas no artigo 1181, e as fracções A, B, C, D e M correspondentes ao artigo 1182, freguesia de Costa, constam das existências da Requerente desde 2000.
17. Das existências da Oponente consta em 2001 o prédio 4548T, Braga (S. Victor).
18. O artigo 1203, freguesia de Costa, foi inscrito nas existências da empresa em 2003.
19. O artigo 1203/Costa e 4548/Braga, fracção T, em 2003 figuravam no activo circulante da empresa.
3. Como é sabido, e constitui hoje entendimento pacífico Cfr., na doutrina, ALBERTO DOS REIS in “Código de Processo Civil Anotado”, vol. V, págs. 362 e 363, e, na jurisprudência, entre outros, os Acórdãos do STJ de 13/3/1991 (in Actualidade Jurídica, nº 17, p. 3), de 12/12/1995 (in BMJ nº 452, p. 385) e de 14/4/1999 (in BMJ nº 486, p. 279).
, sem embargo das questões de que o tribunal ad quem possa conhecer ex officio, é pelas conclusões da alegação de recurso que se determina o âmbito de intervenção do tribunal, podendo nelas ser restringido, expressa ou tacitamente, o objecto do recurso (artigo 684.º, nºs 2 e 3, do CPC), restrição que pode resultar do facto de o recorrente impugnar apenas a solução dada a uma determinada questão, ficando, assim, definitivamente decididas todas as questões de mérito que tenham sido objecto de julgamento na sentença e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação de recurso.
Neste enquadramento e visto que, no caso sub judice, emerge das conclusões da alegação que a decisão proferida em 1ª instância somente é atacada na parte relativa à improcedência da oposição no que toca às dívidas de Contribuição Autárquica (CA) e Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI), as questões que se colocam são as de saber se essa decisão padece de erro por ter julgado:
- que nesse tipo de tributos, quando liquidados dentro do prazo normal, não é necessário proceder à notificação do acto de liquidação dentro do prazo de caducidade, bastando o envio de nota de cobrança ao contribuinte;
- que a falta de oportuna comunicação à Administração Fiscal de os prédios se destinarem a revenda impede a oponente de beneficiar da isenção que invoca nesta oposição.
3.1. Quanto à primeira questão, importa desde já salientar que o tribunal “a quo” configurou, e bem, a situação explanada pela oponente como sendo de falta de notificação da liquidação da CA e do IMI no prazo de caducidade, e não como caducidade do direito de liquidar esses tributos, integrando-a no fundamento de oposição previsto da alínea e) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT.
Efectivamente, no processo de oposição apenas pode ser discutida a falta de notificação ou a falta de notificação tempestiva (no prazo de caducidade) da liquidação dos tributos que constituem a dívida exequenda, na medida em que essas situações são susceptíveis de retirar eficácia ao acto notificado e impedir, desse modo, a exigibilidade da correspondente dívida. Já a discussão da caducidade do direito à liquidação em si, na medida em que constitui matéria que contende com a legalidade desse concreto acto de liquidação, não é permitida em sede de oposição à execução fiscal por força do disposto no artigo 204.º, n.º 1, alínea h) do Código de Procedimento e de Processo Tributário, uma vez que a lei concede a possibilidade de reacção contra a liquidação de impostos através dos meios contenciosos próprios - cfr. artigo 95.º da Lei Geral Tributária e artigos 97.º e 102.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Feito este breve enquadramento, resta-nos dizer que aderimos, sem reservas, à doutrina professada no acórdão proferido por esta Secção do Supremo Tribunal Administrativo em 18/09/2008, no processo n.º 0300/08, segundo a qual a liquidação de CA e de IMI, efectuada dentro do prazo normal, não carece de notificação ao sujeito passivo, bastando o envio do documento de cobrança aludido nos artigos 22.º e 23.º do CCA e nos artigos 119.º e 120.º do CIMI para tornar a dívida exigível. Essa notificação do acto de liquidação apenas se impõe quando está em causa uma liquidação “fora do prazo normal” ou quando se trata de uma “liquidação adicional”.
Como se deixou ali explicitado, justifica-se «que a falta de notificação da liquidação do tributo, no prazo de caducidade, constitua hoje abertamente fundamento expresso de oposição à execução fiscal – por força do disposto na alínea e) do n.º 1 do artigo 204.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário. Com efeito, compreende-se, em tal hipótese, a necessidade de haver um meio de oposição à execução fiscal, sob pena de se postergar um direito inalienável dos interessados de serem notificados dos actos externos que lhes digam respeito. (...) E o fundamento de oposição, de não notificação da liquidação no prazo de caducidade, nada tem a ver com a apreciação, em concreto, da legalidade da liquidação da dívida exequenda, uma vez que não envolve apreciação da legalidade da liquidação, nem representa interferência em matéria da exclusiva competência da entidade que extrai o título executivo (...).
No entanto, a falta de notificação de uma liquidação pode ser que em nada contenda com a (i)nexigibilidade da obrigação liquidada. Pode acontecer que a obrigação se encontre já vencida, e, portanto, seja exigível independentemente da notificação da sua liquidação. Na verdade, a notificação da liquidação só é devida, quando legalmente imposta – valendo a notificação como interpelação para pagamento da obrigação liquidada, e ficando o contribuinte constituído em mora a partir de tal notificação. Sendo certo que, independentemente de notificação-interpelação, há mora do devedor, se a obrigação tiver prazo certo – cf., v. g., a alínea a) do n.º 2 do artigo 805.º do Código Civil. E, assim, se esse for o regime legal consagrado, a dívida de imposto pode tornar-se certa, líquida e exigível sem necessidade da respectiva notificação, logo após a sua liquidação.
Em relação à contribuição autárquica, o artigo 22.º do Código da Contribuição Autárquica, na redacção do Decreto-Lei n.º 211/90, de 27 de Junho, reza que «Os serviços da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos enviarão a cada sujeito passivo, até ao fim do mês anterior ao do pagamento, a competente nota de cobrança, com discriminação, em relação a cada município, dos prédios, suas partes susceptíveis de utilização independente, respectivo valor tributável e colecta» [n.º 1]; «No mesmo período serão enviados às câmaras municipais e repartições de finanças da área da situação dos prédios listas contendo os elementos referidos no número anterior, que poderão ser aí consultadas pelos interessados» [n.º 2]; «Caso o contribuinte não receba a nota mencionada no n.º 1, deverá solicitar à repartição de finanças da área da situação dos prédios uma 2.ª via» [n.º 3].
Diz o n.º 1 do artigo 23.º do mesmo Código da Contribuição Autárquica que «A contribuição deverá ser paga em duas prestações, nos meses de Abril e Setembro, desde que o seu montante seja superior a 50 000$00, devendo o pagamento, no caso desse montante ser igual ou inferior àquele limite, ser efectuado de uma só vez, durante o mês de Abril».
E o n.º 3 ainda deste artigo 23.º do Código da Contribuição Autárquica reza do seguinte modo: «Sempre que a liquidação deva ter lugar fora do prazo normal e nos casos de liquidação adicional, o sujeito passivo será notificado para proceder ao pagamento, que deverá ter lugar até ao fim do mês seguinte ao da notificação, findo o qual passarão a ser devidos juros de mora».
Como imediatamente se vê, a lei exige, dentro do prazo normal de liquidação-pagamento da contribuição autárquica, não a notificação formal (que sempre seria desproporcional, excessiva), mas o simples envio a cada sujeito passivo, até ao fim do mês anterior ao do pagamento, da competente nota de cobrança; e, caso o contribuinte não receba a nota mencionada, deverá solicitar à repartição de finanças da área da situação dos prédios uma 2.ª via dessa nota. [O regime acabado de descrever para a contribuição autárquica é, no essencial, idêntico ao que se encontra consagrado para o imposto municipal sobre imóveis (IMI), que veio suceder à contribuição autárquica – cf. os artigos 119.º e 120.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis].».
No caso vertente, a oponente, ora recorrente, nunca invocou a falta de liquidação e/ou a falta de recebimento das notas de cobrança aludidas nos citados preceitos do CCA e do CIMI (as quais nunca foram, aliás, devolvidas ao Serviço de Finanças – cfr. ponto 6.º do probatório) ou que as dívidas exequendas resultassem de liquidações efectuadas fora do prazo normal ou de liquidações adicionais, limitando-se a insistir que não foi notificado dos actos de liquidação desses tributos.
Por conseguinte, não sendo legalmente devida a notificação de tais actos de liquidação ao sujeito passivo, bastando o envio das notas de cobrança para acautelar a exigibilidade da respectiva obrigação tributária, não pode deixar de improceder a concernente conclusão do recurso.
3.2. Quanto à segunda questão, importa recordar que tendo a oponente invocado que os tributos em questão não eram devidos, porquanto os prédios a que se referem se destinavam a revenda, estando, assim, sujeitos a isenção de imposto, julgou-se na sentença que essa argumentação não podia proceder em face do teor do artigos 10.º do CCA e 9.º do CIMI, pois que «resulta dos autos que a oponente não fez as comunicações a que aludem o n.º 5 do referido artigo 10.º do CCA e o n.º 4 do referido artigo 9.º do CIMI, pelo que não poderá beneficiar da isenção que reclama.».
A oponente insiste no direito à referida isenção, com o argumento de que fez prova nestes autos da existência da situação material objectiva que permite a concessão da isenção, isto é, de que destinava os prédios a revenda, e que o incumprimento das obrigações declarativas perante o Fisco não pode ter como consequência a tributação de empresas que estão em condições de beneficiar de isenção, sob pena de inconstitucionalidade dos preceitos por violação do princípio da boa fé, da segurança jurídica e da proporcionalidade.
Também aqui carece de razão.
Desde logo porque a ilegalidade da liquidação resultante da desconsideração do direito a eventual isenção de tributação implica, necessariamente, a discussão sobre a legalidade concreta do acto de liquidação de onde provém a dívida exequenda, e essa discussão só pode ser válida e eficazmente efectuada em processo de oposição nos casos em que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto da liquidação, isto é, nos casos em que o ordenamento jurídico não faculte ao executado meio de impugnar ou recorrer contenciosamente do acto tributário de liquidação - artigo 204.º, nº 1, alínea g), do CPPT .
O que bem se compreende, já que os fundamentos da oposição são como que residuais e visam proteger (excepcionalmente) o administrado por motivos que sejam sobrantes. Dito de outra maneira, o processo de declaração, que tem o seu equivalente no processo de impugnação, serve para definir e declarar o direito, e o processo de execução serve para tornar eficaz e coercivo o direito declarado. Permitir que na execução se pudesse voltar a discutir a legalidade da liquidação seria abrir a porta à discussão continuada e infindável do direito.
Daí que não seja possível apreciar a invocada ilegalidade da liquidação da dívida exequenda neste processo de oposição, pois a lei assegura meio judicial de impugnação contra esse acto tributário (artigo 95.º da Lei Geral Tributária e artigos 97.º e 102.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário), assim se mostrando cumprida a garantia constitucional de acesso à Justiça consignada no artigo 268.º nº 4 da Constituição da República Portuguesa.
Em suma, a ilegalidade concreta do acto de liquidação do IMI e da CA - designadamente por virtude da alegada inconstitucionalidade dos artigos 10.º, n.º 6 do CCA e 9.°, n.º 5 do CIMI ao preverem a desconsideração da isenção como cominação para o incumprimento de obrigações declarativas quando a empresa reúne as condições materiais para gozar desse benefício - não pode servir de fundamento a oposição de executado em processo de execução fiscal.
Termos em que improcedem todas as conclusões do recurso.
3. Pelo exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.
Custas pela Recorrente, com procuradoria de 1/6.
Lisboa, 20 de Setembro de 2010. – Dulce Manuel Neto (relatora) – Jorge Lino – Casimiro Gonçalves.