Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 01038/10 |
Data do Acordão: | 03/02/2011 |
Tribunal: | 2 SECÇÃO |
Relator: | ANTÓNIO CALHAU |
Descritores: | OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL PRESCRIÇÃO PRAZO INSTAURAÇÃO DA EXECUÇÃO FISCAL RESPONSÁVEL SUBSIDIÁRIO CITAÇÃO |
Sumário: | I - A determinação da lei aplicável em caso de sucessão de leis que estabelecem distintos prazos de prescrição resulta da ponderação do regime constante do artigo 297.º, n.º 1 do CC. II - Os efeitos interruptivos ou suspensivos do prazo de prescrição produzidos por certos factos jurídicos são regulados pela lei vigente na data em que se verificam (artigo 12.º, n.º 1 do CC). III - E, sendo o prazo a aplicar o da LGT, contado da data da sua entrada em vigor, a instauração da execução fiscal em data anterior à sua vigência e a sua pendência, só por si, não terão qualquer efeito sobre o prazo de prescrição, pois todo o prazo a considerar decorrerá na vigência da lei nova, que não reconhece efeito interruptivo e suspensivo derivado da instauração da execução fiscal e sua pendência, mas apenas à citação, nos termos do n.º 1 do artigo 49.º da LGT (na redacção da Lei 100/99, de 26 de Julho). IV - Assim sendo, o prazo de prescrição iniciado a 1/1/1999 foi interrompido com a citação do oponente, responsável subsidiário, em 25/11/2003, ou seja, antes do termo do prazo de oito anos. |
Nº Convencional: | JSTA000P12674 |
Nº do Documento: | SA22011030201038 |
Recorrente: | FAZENDA PÚBLICA |
Recorrido 1: | A... |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: I – A Representante da Fazenda Pública, não se conformando com a sentença da Mma. Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou extinta a instância de oposição deduzida por A…, com os sinais dos autos, à execução fiscal instaurada contra B…, com sede em Lisboa, por dívida referente a IRC do exercício de 1994, e contra si revertida, por impossibilidade superveniente da lide, face à prescrição da dívida exequenda, dela vem interpor recurso para este Tribunal, formulando as seguintes conclusões: 1. A decisão recorrida ao julgar que a obrigação tributária objecto dos presentes autos se encontra prescrita fez uma errada interpretação da lei aplicável; 2. Aliás, a douta decisão recorrida faz uma errada interpretação dos factos constantes do processo de execução fiscal; 3. O processo de execução fiscal esteve parado desde 16.09.1998 até 14.02.2002, em virtude de ter sido avocado pelo Tribunal de Recuperação de Empresa; 4. Por força do disposto no art.º 29.º do Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência, o processo ficou suspenso, por força da lei; 5. A suspensão do processo de execução fiscal provocada pelo disposto no art.º 29.º do Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência deverá ter o mesmo tratamento que as suspensões previstas na LGT; 6. Nos termos do disposto no art.º 9.º, n.º 3 do Código Civil, a interpretação a dar à norma do art.º 169.º do CPPT conjugada com a do art.º 49.º, n.º 3 (com a redacção dada pelo art.º único da Lei n.º 100/99, de 26 de Julho) só pode ser a de que a contagem do prazo de prescrição se suspende, enquanto se verificar a suspensão da execução fiscal por força da lei Contra-alegando, veio o oponente dizer que: 1.ª A questão material controvertida que cumpre analisar, objecto do presente recurso, refere-se essencialmente a saber se as dívidas de IRC do exercício de 1994 estão ou não prescritas. 2.ª Entende o Ilustre Representante da Fazenda Pública que “no que respeita à decisão recorrida, entendemos que a mesma não fez uma análise de todos os factos constantes dos autos de execução fiscal, nomeadamente ao não ter em conta que o mesmo esteve parado desde 16.09.1998 até 14.02.2002, em virtude de ter sido avocado no âmbito do processo de falência n.º 123/98, que correu termos no 1.º Juízo do Tribunal de Recuperação de Empresas”. 3.ª Com efeito, o artigo 29.º do CPEREF dispunha que “ficam imediatamente suspensas todas as execuções instauradas contra o devedor e todas as diligências de acções executivas que atinjam o seu património”. 4,ª Não obstante, é manifesto que, nos termos do artigo 34.º do CPT, as presentes dívidas se encontram já prescritas. 5.ª Assim, e atendendo ao preceituado no artigo 34.º do CPT e à situação de facto ocorrida, temos o seguinte: (i) Início do prazo de prescrição: 01/01/1995; (ii) Autuação do processo de execução fiscal – Interrupção do prazo de prescrição: 18/05/1998 – neste momento haviam decorrido 3 anos, 5 meses e 18 dias; (iii) Declaração de falência – 17/08/1998; (iv) Remessa do processo de execução fiscal ao Tribunal de Comércio – suspensão do prazo de prescrição – 16/09/1998; (v) Devolução do processo de execução fiscal ao Serviço de Finanças Lisboa 7 – 14/02/2002; (vi) Citação do responsável subsidiário: 25/11/2003 – neste momento havia decorrido mais de um ano de paragem do processo por motivo não imputável ao contribuinte – entre 14/02/2002 e 14/02/2003, pelo que cessa o efeito interruptivo e deve somar-se o tempo que decorreu após este período ao que tiver decorrido até à data da autuação. Assim, temos que: (vii) De 01/01/1995 a 18/05/1998 decorreram 3 anos, 5 meses e 18 dias; (viii) Durante o período que mediou entre 14/02/2002 e 14/02/2003, o processo esteve parado por motivo não imputável ao contribuinte, pelo que o prazo de prescrição deverá reiniciar-se em 15/02/2003; (ix) De 15/02/2003 até 22/11/2010, decorreram 7 anos, 9 meses e 7 dias; (x) Somando este prazo ao que decorreu antes da autuação da execução (3 anos, 5 meses e 18 dias), verificamos que decorreram já mais de 10 anos. 6.ª Acresce que, se trata de dívidas cuja liquidação teve lugar em 1994 e das quais só foi o ora oponente citado em 25 de Novembro de 2003, pelo que o disposto no n.º 3 do artigo 48.º da LGT é aplicável. 7.ª Com efeito, a jurisprudência tem entendido que mesmo que seja de aplicar o regime previsto no artigo 34.º do CPT, por ser o regime em concreto mais favorável, ainda assim se podem aplicar as regras da LGT que disponham sobre o conteúdo (ou efeitos) de relações jurídico-tributárias duradouras, sem referência ao facto que lhes deu origem, por força das regras gerais de aplicação da lei no tempo. 8.ª Neste sentido, ainda que no caso sub judice o regime da prescrição mais favorável seja o previsto no artigo 34.º do CPT, deverá atender-se também ao disposto no n.º 3 do artigo 48.º da LGT. Assim temos que: (i) O prazo de prescrição iniciou-se em 01/01/1995; (ii) Foi interrompido com a instauração de execução fiscal em 18/05/1998; no entanto, (iii) O oponente só foi citado em 25/11/2003; Pelo que, (iv) De acordo com o supra referido n.º 3 do artigo 48.º da LGT, a interrupção do prazo quanto ao devedor originário não produz efeitos quanto ao oponente; Donde concluímos que, (v) Mesmo tendo em consideração que durante o período que mediou entre 16/09/1998 e 14/02/2002, efectivamente, o prazo de prescrição esteve suspenso; (vi) Entre 01/01/1995 e 16/09/1998 – decorreram 3 anos, 9 meses e 16 dias; (vii) De 14/02/2002 a 22/11/2010 – decorreram 8 anos e 9 meses; pelo que, (viii) É manifesto que decorreram já mais de 10 anos. 9.ª Nos termos do disposto no artigo 34.º do CPT, a dívida (referente ao exercício de 1994) encontra-se prescrita, sendo por isso ilícito exigir o respectivo pagamento ao ora oponente. O Exmo. Magistrado do MP junto deste Tribunal emite parecer no sentido de que o recurso merece provimento, devendo a sentença ser revogada e substituída por acórdão que declare a inexistência de prescrição da obrigação tributária exequenda e devolva o processo ao tribunal recorrido para conhecimento das questões suscitadas na petição de oposição. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. II – Mostram-se fixados os seguintes factos com interesse para se concluir ou não pela prescrição: a) Foi instaurada em 18/6/1998 a execução fiscal n.º 3239-98/101059.0 contra A…, para cobrança coerciva de dívida de IRC, relativa ao período de 1994, no valor de € 21.752,05 (cfr. processo de execução apenso); b) O processo de execução esteve parado desde 03/09/1998 a 25/11/2003 (cfr. fls. 16 e fls. 68 do processo de execução); c) Os encargos incorridos com a prestação da garantia bancária atingiram o montante de € 1.983,36 (cfr. fls. 275 a fls. 283 dos autos). III – Vem o presente recurso interposto da decisão da Mma. Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou extinta a instância de oposição deduzida pelo ora recorrido à execução fiscal instaurada contra B…, com sede em Lisboa, por dívida referente a IRC do exercício de 1994, e contra si revertida, por impossibilidade superveniente da lide, face à prescrição da dívida exequenda. Para tanto, considerou a Mma. Juíza a quo que, tendo o prazo prescricional começado a contar-se desde o início do ano seguinte àquele em que ocorreu o facto tributário, ou seja, em 1/1/1995, e tendo sido interrompido com a instauração da execução fiscal em 18/6/1998, a qual teria estado parada desde 3/9/1998 a 25/11/2003, sem culpa do oponente, a dívida de IRC teria prescrito em 18/3/2006, pelo que, conhecida a prescrição, mostrava-se prejudicado o conhecimento dos restantes fundamentos da oposição. Alega a recorrente FP que na decisão recorrida se fez uma errada interpretação da lei aplicável e dos factos constantes dos autos, designadamente, ao ignorar-se que o processo de execução fiscal esteve parado em virtude de ter sido avocado pelo tribunal de recuperação de empresa, com a consequente suspensão da contagem do prazo de prescrição durante esse período. Contra-alega o oponente, afirmando que, mesmo aceitando que o prazo de prescrição esteve suspenso no período que mediou entre 16/9/1998 e 14/2/2002 e que o oponente só foi citado em 25/11/2003, é manifesto que a dívida em causa se mostra já prescrita. Vejamos. Tratando-se de dívida referente a IRC de 1994, o prazo de prescrição aplicável era de dez anos, nos termos do artigo 34.º do CPT, então em vigor, começando a contar-se a partir de 1/1/1995. Dado que os efeitos interruptivos ou suspensivos do prazo de prescrição produzidos por certos factos jurídicos são regulados pela lei vigente na data em que se verificam (artigo 12.º, n.º 1 do CC), nos termos do n.º 3 do citado artigo 34.º do CPT, a instauração da execução em 18/6/1998 interrompeu a prescrição, com inutilização do tempo anteriormente decorrido, e não se iniciando novo prazo até ao despacho de extinção do processo ou à declaração em falhas (artigos 326.º, n.º 1 e 327.º, n.º 1 do CC). O efeito interruptivo resultante da instauração da execução só cessaria, nos termos do n.º 3 do citado artigo 34.º do CPT, se o processo estivesse parado por facto não imputável ao contribuinte durante mais de um ano, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após este período ao que tiver decorrido até à data da autuação. Com a entrada em vigor da LGT em 1/1/1999, o prazo de prescrição estabelecido no seu artigo 48.º, n.º1 (oito anos) passou a ser o aplicável, nos termos do regime constante do artigo 297.º, n.º 1 do CC. E, sendo o prazo a aplicar o da LGT, contado da data da sua entrada em vigor, a instauração da execução fiscal e a sua pendência, só por si, não terão qualquer efeito sobre o prazo de prescrição, pois todo o prazo a considerar decorrerá na vigência da lei nova, que não reconhece efeito interruptivo e suspensivo derivado da instauração da execução fiscal e sua pendência, mas apenas à citação, nos termos do n.º 1 do artigo 49.º da LGT (na redacção da Lei 100/99, de 26 de Julho). Assim sendo, o prazo de prescrição iniciado a 1/1/1999 só foi interrompido com a citação do oponente, responsável subsidiário, em 25/11/2003, ou seja, antes do termo do prazo de oito anos. Razão por que, neste contexto, não ocorreu ainda a prescrição da dívida exequenda. A decisão recorrida não pode, por isso, manter-se, devendo o processo ser devolvido ao tribunal recorrido para apreciação das questões suscitadas na petição de oposição, e não conhecidas por se mostrar prejudicado o seu conhecimento face à questão da prescrição, por manifesta insuficiência da matéria de facto constante do probatório para conhecimento em substituição por este Tribunal. IV – Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do STA em conceder provimento ao recurso, revogando a decisão recorrida, por não se mostrar prescrita a dívida exequenda, e ordenar a baixa dos autos ao tribunal recorrido para, após fixação da matéria de facto pertinente, conhecimento das demais questões suscitadas na petição de oposição. Custas pelo recorrido, fixando-se a taxa de justiça devida em 1/6. Lisboa, 2 de Março de 2011. – António Calhau (relator) - Miranda de Pacheco - Brandão de Pinho. |