Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0484/16.5BEVIS
Data do Acordão:09/10/2020
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:CARLOS CARVALHO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
ACIDENTE DE SERVIÇO
NÃO ADMISSÃO DO RECURSO
Sumário:Não é de admitir a revista do acórdão do TCA que manteve o juízo do TAF de parcial procedência de ação administrativa - na qual se discutia, nomeadamente, a qualificação de acidente como de serviço e extensão das lesões sofridas - se no entendimento firmado pelas instâncias não se vislumbra que, no plano dos raciocínios lógicos ou jurídicos, o mesmo enferme de erros manifestos, e se relativamente às questões suscitadas não se descortina uma especial relevância social ou um indício de interesse comunitário significativo que extravase os limites do caso concreto.
Nº Convencional:JSTA000P26274
Nº do Documento:SA1202009100484/16
Data de Entrada:06/04/2020
Recorrente:A.......
Recorrido 1:MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CIÊNCIA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

1. A……….. [doravante A.], invocando o disposto no art. 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos [CPTA], peticiona a admissão do recurso de revista por si interposto do acórdão de 03.04.2020 do Tribunal Central Administrativo Norte [doravante TCA/N] [cfr. fls. 1225/1256 - paginação «SITAF» tal como as ulteriores referências à mesma, salvo expressa indicação em contrário], que negou provimento ao recurso que a mesma havia deduzido por inconformada com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu [doravante TAF/V] que julgou apenas parcialmente procedente a ação administrativa deduzida contra MINISTÉRIO DE EDUCAÇÃO [doravante R.].

2. Motiva a necessidade de admissão do recurso de revista [cfr. fls. 1262/1275] «para uma melhor aplicação do direito», fundada in casu na violação, nomeadamente, do disposto nos arts. 615.º, n.º 1, als. b) e d) do Código de Processo Civil [CPC] e 07.º, n.º 5, do DL n.º 503/99, de 02.11, dado que a invocada infração a este último preceito, feita em sede de apelação, não configura ou pode ser qualificada como constituindo uma «questão nova» e como tal subtraída à apreciação e conhecimento pelo tribunal de recurso.

3. O R. produziu contra-alegações em sede de recurso de revista [cfr. fls. 1283/1298] nas quais pugna, mormente, pela sua não admissão.
Apreciando:

4. Dispõe-se no n.º 1 do art. 150.º do CPTA que «[d]as decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

5. Do referido preceito extrai-se, assim, que as decisões proferidas pelos TCA’s no uso dos poderes conferidos pelo art. 149.º do CPTA, conhecendo em segundo grau de jurisdição, não são, em regra, suscetíveis de recurso ordinário, dado a sua admissibilidade apenas poder ter lugar quando: i) esteja em causa apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, revista de importância fundamental; ou, ii) o recurso revelar ser claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

6. O TAF/V julgou como parcialmente procedente a ação administrativa sub specie reconhecendo apenas «o direito da Autora de ver o incidente ocorrido a 15/01/2015 ser qualificado como acidente em serviço, no que às lesões sentidas ao nível dos joelhos diz respeito, e consequentemente, a serem anulados todos os atos dependentes dessa qualificação, especificamente, aquele praticado a 16/11/2015» e condenando o R. a pagar à A. «a quantia indemnizatória dos montantes por esta suportados com consulta médicas, medicamentos, sessões de fisioterapia e meios complementares de diagnóstico, bem como todas as demais quantias que aquela vier a suportar em resultado de tratamentos médicos, ou outros, que se revelaram de necessários à recuperação das lesões sentidas a nível dos joelhos, a liquidar em sede de execução da sentença» e «as diferenças remuneratórias devidas, incluindo os suplementos de carácter permanente sobre os quais incidam descontos para o respetivo regime de Segurança Social, e o subsídio de refeição, relativos ao período em que aquela faltou em resultado do acidente, atenta a incapacidade temporária sentida face às lesões sofridas nos joelhos, montantes estes a liquidar em sede de execução de sentença», absolvendo o R. no que releva para a discussão suscitada nesta sede do demais peticionado e que se prende com o reconhecimento da qualificação como acidente de serviço e condenação do R. na indemnização pelas lesões e danos sofridos no mesmo acidente ao nível do ombro direito [cfr. fls. 1077/1112].

7. O TCA/N manteve este juízo, negando provimento ao recurso que havia sido deduzido pela A., considerando, no que aqui releva, que o erro de julgamento por infração do n.º 5 do art. 07.º do DL n.º 503/99 acometido àquela decisão do TAF/V trata-se de «questão nova» «não suscitada anteriormente em 1.ª instância e como tal, insuscetível de ser apreciada pelo tribunal de Recurso».

8. Esta sustenta a relevância jurídica da questão e, bem assim, a necessidade de melhor aplicação do direito, insurgindo-se contra o segmento absolutório da pretensão que havia deduzido já que proferido enfermando nulidade e com errada interpretação e aplicação do quadro normativo atrás elencado.

9. Tal como repetidamente tem sido afirmado constitui questão jurídica de importância fundamental aquela - que tanto pode incidir sobre direito substantivo como adjetivo - que apresente especial complexidade, seja porque a sua solução envolva a aplicação e concatenação de diversos regimes legais e institutos jurídicos, seja porque o seu tratamento tenha suscitado dúvidas sérias, ao nível da jurisprudência, ou da doutrina.

10. E tem-se considerado de relevância social fundamental questão que apresente contornos indiciadores de que a solução pode corresponder a um paradigma ou contribuir para a elaboração de um padrão de apreciação de casos similares, ou que verse sobre matérias que se revistam de particular repercussão na comunidade.

11. No caso as questões que se mostram colocadas em sede de revista revestem de índole adjetiva, sendo de invocação e tratamento corrente, não envolvendo a realização de operações lógico-jurídicas de melindre, complexidade e dificuldade, pelo que não assumem, assim, a natureza de questões jurídicas de importância ou de relevância social fundamental.

12. E quanto à necessidade de melhor aplicação do direito também aqui a alegação expendida pela A./recorrente não se mostra persuasiva, tudo apontando, presentes os contornos do caso sub specie e daquilo que foram os fundamentos em que a pretensão da mesma se mostra estribada e as questões que haviam sido suscitadas nos autos, no sentido de que o tribunal de recurso decidiu com acerto, tanto mais que a solução alcançada não evidencia erro grosseiro ou manifesto, o que vale por dizer que a admissão do recurso não se revela como necessária para prosseguir tal desiderato.

13. Assim, tudo conflui para a conclusão de que a presente revista mostra-se inviável, não se justificando submetê-la à análise deste Supremo, impondo-se in casu a valia da regra da excecionalidade supra enunciada.

DECISÃO
Nestes termos e de harmonia com o disposto no art. 150.º do CPTA, acordam os juízes da formação de apreciação preliminar da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal em não admitir a revista.
Sem custas [cfr. art. 48.º, n.º 2, do DL n.º 503/99]. D.N..

Lisboa, 10 de setembro de 2020
[O relator consigna e atesta, que nos termos do disposto no art. 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13.03, aditado pelo art. 03.º do DL n.º 20/2020, de 01.05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes integrantes da formação de julgamento, os Conselheiros Jorge Artur Madeira dos Santos e José Augusto Araújo Veloso]
Carlos Luís Medeiros de Carvalho