Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0686/07
Data do Acordão:02/13/2008
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:JORGE DE SOUSA
Descritores:RECURSO POR OPOSIÇÃO DE JULGADOS
IVA
PRESCRIÇÃO
IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
PERITOS INDEPENDENTES
LEI GERAL TRIBUTÁRIA
AMPLIAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
LEI
REVISÃO DO ACTO TRIBUTÁRIO DA LIQUIDAÇÃO
Sumário:I – Sendo suficiente, para obstar à prescrição da obrigação tributária, nos casos em que ocorre mais que um acto com efeito interruptivo, que um só deles tenha esse efeito obstativo, não é possível afirmar que ocorra inutilidade superveniente da lide, sem conhecimento de todos os processos em que podem ter ocorrido factos com aquele efeito.
II – O recurso com fundamento em oposição de acórdãos tem por objecto a apreciação da questão ou questões sobre as quais existe contradição de julgados, mas apenas delas, para além de questões prévias e questões de conhecimento oficioso.
III – Assim, questões relacionadas com o mérito que dependam de apreciação de outras questões deverão ser apreciadas após a baixa do processo, se o seu conhecimento não ficar prejudicado pelo decidido sobre a questão que é objecto do recurso com fundamento em oposição de julgados.
IV – O regime de intervenção de perito independente, a requerimento do contribuinte, previsto nos arts. 91.º e 92.º da LGT, é aplicável a todas os pedidos de revisão apresentados após a entrada em vigor da LGT, em 1-1-1999, desde que o contribuinte o requeira, nos termos do n.º 4 do referido art. 91.º.
V – O facto de, no momento da entrada em vigor da LGT, não estar ainda constituída a Comissão Nacional prevista nos seus arts. 93.º e 94.º e elaborada lista de peritos independentes, não obsta ao exercício desse direito pelo contribuinte a partir da entrada em vigor da LGT, como evidencia o art. 3.º do DL n.º 398/98, de 17 de Dezembro.
Nº Convencional:JSTA00064874
Nº do Documento:SAP200802130686
Data de Entrada:09/05/2007
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A...
Votação:MAIORIA COM 4 DEC VOT E 2 VOT VENC
Meio Processual:REC OPOS JULGADOS.
Objecto:AC TCA NORTE - AC STA PROC368/04 DE 2005/04/13.
Decisão:NEGA PROVIMENTO.
Área Temática 1:DIR PROC FISC GRAC - REVISÃO.
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART99 ART124 ART284.
CPC67 ART768.
LGT98 ART46 ART49 ART91 ART92 ART93.
ETAF96 ART30 B'.
CPC96 ART684-A.
DL 398/98 DE 1998/12/17 ART3 ART4.
DL 433/99 DE 1999/10/26 ART4.
CPPTRIB91 ART84 ART85-A.
CONST97 ART2 ART3 ART119.
CCIV66 ART1 ART5 ART8.
L 52-C/96 DE 1996/12/27 ART52.
DESP MINFIN 5624/99 DE 1999/03/19.
PORT 690/99 DE 1999/08/12.
Referência a Doutrina:BAPTISTA MACHADO INTRODUÇÃO AO DIREITO E AO DISCURSO LEGITIMADOR PAG186.
PIRES DE LIMA E OUTRO CÓDIGO CIVIL ANOTADO V1 ART1.
GOMES CANOTILHO DIREITO CONSTITUCIONAL E TEORIA DA CONSTITUIÇÃO 2ED PAG771.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1 – A… impugnou no Tribunal Tributário de 1.ª Instância do Porto liquidações de IVA e juros compensatórios.
O Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que sucedeu na competência daquele Tribunal, julgou a impugnação improcedente.
Foi interposto recurso jurisdicional, pelo Impugnante, para o Tribunal Central Administrativo Norte, que veio a conceder-lhe provimento e a julgar procedente a impugnação, anulando os actos de liquidação impugnados.
Inconformada, a Fazenda Pública interpôs o presente recurso para este Supremo Tribunal Administrativo, com fundamento em oposição entre o acórdão recorrido e o acórdão do STA de 13-4-2005, recurso n.º 368/04.
Pelo Excelentíssimo Senhor Juiz Relator no Tribunal Central Administrativo Norte foi decidido o seguimento do recurso, nos termos do art. 284.º, n.º 5, do CPPT, por entender existir oposição entre o acórdão recorrido e o acórdão invocado como fundamento.
A Fazenda Pública apresentou alegações relativas à questão que é objecto do recurso, concluindo da seguinte forma:
1. O regime concernente à intervenção do perito independente no procedimento de revisão não entrou em vigor em simultâneo com as demais normas da Lei Geral Tributária.
2. Efectivamente, a aplicação daquele regime pressupunha a elaboração prévia de uma lista de peritos, cuja organização foi cometida à Comissão Nacional de Revisão.
3. Essa Comissão foi criada ex — novo pela própria Lei Geral Tributária (art. 94.º), sendo que esta expressamente previa que os estatutos e funcionamento da dita Comissão dependiam de ulterior regulamentação por novo diploma.
4. Todas estas normas deferiam automaticamente a entrada em vigor do regime concernente ao perito independente para momento futuro e incerto, coincidente com a publicação da lista de peritos.
5. Impõe-se, pois, uma interpretação correctiva do art. 6.º do Dec. Lei 398/98, de 17 de Dezembro, que não se confine ao mero texto legal mas que faça apelo ao elemento sistemáticos e lógico, decorrentes dos arts 93.º e 94.º da L.G.T.
6. A decisão recorrida, ao proceder a uma interpretação meramente literal do citado preceito, violou o art. 9.º do C.C.
Termos em que deve ser concedido provimento ao recurso e revogada a decisão recorrida, com as legais consequências.
O Impugnante contra-alegou, formulando as seguintes conclusões:
1. Como questão prévia, verifica-se existir prescrição das dívidas exequendas, porquanto se referem a Iva e juros compensatórios do ano de 1995, que prescrevem no prazo de oito anos contados a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário.II. Nos termos do n.º 2 do art. 49.º da mesma Lei, a paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito de interrupção da prescrição por apresentação de reclamação por parte do mesmo.
III. Não se ignora que tal artigo veio recentemente a ser revogado, aplicando-se, no entanto, ao caso dos autos, dado que, anteriormente a tal revogação, ocorreu paragem do processo superior a um ano, nos termos previstos na lei.
IV. A todos os títulos é, assim, patente que ocorreu já a prescrição das dívidas tributárias impugnadas, prescrição essa que, aliás, é do conhecimento oficioso, e que aqui expressamente se invoca.
V. Quanto ao objecto do recurso em causa, verifica-se que o acórdão proferido fez correcta aplicação do Direito aos factos, não merecendo qualquer censura, ao contrário do que pretende o recorrente.
VI. Na verdade, no caso dos autos, verifica-se provado que, tendo a impugnante requerido a nomeação de perito independente no âmbito do procedimento administrativo de revisão da matéria tributável por métodos indirectos, e tendo sido agendada a reunião de peritos para Novembro de 1999, foi a mesma notificada de um despacho, que informava que por despacho do Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, não havia sido nomeado perito independente, por falta de listas de peritos.
VII. Ora, tendo a impugnante requerido a sua nomeação, nos termos do art. 910 da Lei Geral Tributária, é ilegal a decisão de proceder à reunião de peritos sem a sua intervenção.
VIII. Na verdade, é apodíctico que não pode um despacho retirar ao contribuinte um direito que lhe foi conferido por Lei, e muito menos operar (como é o caso) uma revogação tácita da mesma, ao decidir que não participarão no procedimento de revisão da matéria colectável os peritos independentes, por inexistirem listas dos mesmos.
IX. E não se diga, como pretende o recorrente, que não estava nomeada a Comissão Nacional de Revisão, pelo que a Lei Geral Tributária não podia ter entrado em vigor naquela data, até porque aquela Comissão estava constituída e regulamentada desde 12.08.1999 (portaria 640/99), ou seja, cerca de quatro meses antes.
X. O n.º 4 do art. 91.º da LGT entrou em vigor na mesma data que a própria Lei, não tendo sido ressalvada a sua aplicação, motivo pelo qual não deve ser atendida a interpretação correctiva invocada pelo recorrente.
XI. E mesmo que devesse atender-se à mesma, o que se não aceita, a Comissão em causa já estava criada desde Agosto de 1999, pelo que, pelo menos desde aquela data, já existiam condições para serem nomeados peritos independentes.
XII. O procedimento em causa padece, nestes termos, de preterição de formalidades legais, conforme doutamente decidiu o Acórdão recorrido, o qual não merece qualquer censura.
XIII. Sem prescindir, e caso se entenda, o que por mero dever de patrocínio se admite, ser procedente a questão suscitada pelo recorrente, requer-se a ampliação do objecto do recurso, ao abrigo do disposto no art. 684– a do Código de Processo Civil, nos seguintes termos (já constantes das alegações apresentadas no recurso interposto para o Tribunal Central Administrativo, mas que não chegaram a ser conhecidas), devendo ser conhecida da seguinte matéria, ou ordenar-se a descida dos autos ao Tribunal recorrido para dela se conhecer:
XIV. Desde logo, a matéria de facto dada como provada em primeira instância, deve ser alterada, nos termos do art. 684.ºA do Código de Processo Civil, devendo ser dado como provado o facto constante do art. 35.º da petição de impugnação, na medida em que tal facto está comprovado por documento, que se juntou àquele recurso como doc. n.º 1, mas que deveria ter sido junto, nos termos do art. 110.º do Código de Processo e Procedimento Tributário.
XV. Com efeito, o documento foi junto ao processo de reclamação graciosa, tendo sido invocado e demonstrado pelo impugnante no direito de audição prévio à liquidação, pelo que deveria ter sido junto pela administração tributária na preparação do processo.
XVI. Por outro lado, caso o Mmo. Juiz a quo não considerasse provado tal facto, deveria ter notificado o requerente para juntar o documento, nos termos do art. 13.º do Código de Processo e Procedimento Tributário, na medida em que se tratava de um facto relevante para a decisão da causa.
XVII. Deve, assim, ser dado como provado que “Em “informação” produzida em 13 de Março de 1989, elaborada na sequência de uma outra visita de fiscalização à impugnante, referiu-se expressamente o seguinte: “Os condóminos entregam à administração do Condomínio as suas quotas nas despesas comuns, reembolsando apenas o valor exacto da parte que lhes incumbe nessas despesas. Por tal facto, estas prestações estão enquadradas no n.º 23 do artigo 9.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado ‘
XVIII. Caso assim se não entenda, sempre deverá ordenar-se a renovação da prova, nos termos do disposto no art. 712.º do Código de Processo Civil, na medida em que se trata de facto indispensável ao apuramento da verdade.
XIX. Sem prescindir, as liquidações em causa fundam-se num exame à escrita de que a recorrente foi objecto, com relação ao exercício de 1995, mediante o qual a Administração Fiscal entendeu fixar, por métodos indirectos, imposto sobre o valor acrescentado (IVA) na quantia de 20 640 828$00, por considerar que a recorrida praticou operações tributáveis no montante de 121 416 666$00.
XX. De facto, o n.º 23 do art. 9.º do Código do IVA visa isentar as prestações de serviços que, em última análise, representam somente o reembolso de despesas pelos aderentes de certos grupos autónomos de pessoas, sendo que os “condomínios” contam-se, inequivocamente, entre os grupos autónomos de pessoas que efectuam aquelas prestações de serviços ou reembolso de despesas.
XXI. Esta afirmação é corroborada, de forma expressa, pela administração tributária, designadamente na informação datada de 13 de Março de 1989, elaborada na sequência de uma outra visita de fiscalização à recorrente, bem como no Ofício-circulado no 2 593-SIVA, de 16-11-1993, quando no seu n.º 3 se afirma que são pois de considerar aqui incluídos os grupos de condóminos de um mesmo prédio, em regime de propriedade horizontal quanto às despesas de condomínio.
XXII. A interpretação dada pela administração tributária não está conforme ao teor do no 23 do art. 9.º do CIVA, na medida em que daquele normativo destacam-se três requisitos, sendo prestações de serviços fornecidas aos seus membros por grupos autónomos de pessoas, reembolso exacto da parte que lhes incumbe nas despesas comuns e trata-se grupos autónomos de pessoas que exerçam uma actividade isenta.
XXIII. O confronto deste último requisito com o afirmado na informação n.º 1861 permite identificar uma divergência relevante: enquanto o normativo se refere a pessoas que exerçam uma actividade isenta a administração fiscal invoca que estamos perante sujeitos passivos não isentos e, por isso, a aplicação da isenção afigura-se inviável.
) O (IV. Isto significa que a administração considere equivalentes as expressões “pessoas que exerçam uma actividade ísentd’ e “sujeitos assi vos ientos’. não se podendo confundir o exercício de actividades isentas com categorias de sujeitos passivos, sejam eles isentos, não isentos ou mistos.
XXV. O que o norma exige é que as pessoas, independentemente da sua qualificação em sede de IVA, exerçam uma actividade isenta, que há-de ser a que resulta da participação no grupo autónomo e não qualquer outra alheia ao escopo do grupo.
XXVI. O condómino, enquanto comproprietário das partes comuns de um edifício, não exerce qualquer actividade ou a única que pode desenvolver traduz-se na cedência do imóvel, actividade que é isenta ao abrigo do n.º 30 do art. 9.º.
XXVII. E se se admitisse que a isenção só seria aplicável a sujeitos passivos isentos, então, ter-se-ia de concluir que ela não beneficia os particulares, dado que estes não são sujeitos passivos, o que equivalia a dizer que qualquer condomínio habitacional, cujos condóminos sejam particulares, não poderia usufruir da isenção prevista no n.º 23 do art. 9.º.
XXVIII. O que releva é, assim, a actividade que resulta da participação no grupo, que tem de ser isenta, e não a qualificação que as pessoas possam ter em sede de IVA em virtude do exercício de quaisquer outras actividades estranhas ao grupo.
XXIX. Assim, a isenção só é afastada se o grupo autónomo for constituído, por exemplo, por comerciantes (sujeitos passivos não isentos) que repartam despesas comuns de uma actividade conjunta, actividade essa de natureza comercial e não isenta.
XXX. Por outro lado, e sem prescindir ainda, verifica-se que, de acordo com a matéria de facto cuja inclusão se peticionou na matéria dada como provada, bem como nos termos do ofício circulado n.º 2 593-SIVA, sempre se deveriam ter considerado isentas as operações praticadas pela recorrida em 1995,
XXXI. Em face do no 5 do art. 68.º da Lei Geral Tributária, e tendo em conta ser inequívoco que no ano de 1995 a recorrida adoptou os procedimentos que estão vertidos na informação emitida pelos serviços de fiscalização em 13 de Março de 1989, bem como no ofício circulado n.º 2 593-SIVA, que não se refere na sentença proferida em primeira instância.
XXXII. Deverá, assim, revogar-se a sentença proferida em primeira instância, na medida em que não fez correcta aplicação do direito aos factos, anulando-se as liquidações impugnadas, ainda por esta via.
XXXIII. Por último, e sempre sem prescindir, devem anular-se os juros compensatórios liquidados, uma vez que não existe um facto ilícito e culposo no caso em apreço, tratando-se antes de divergências entre o contribuinte e a administração fiscal, que o contribuinte não poderia prever.
XXXIV. A sentença proferida em primeira instância violou, assim, entre outros, os artigos 910 a 93.º da Lei Geral Tributária, 23.º e 23.º-A do C.I.V.A., bem como o n.º 5 do art. 68.º e o art. 35.º da Lei Geral Tributária, pelo que se impõe a sua revogação.
XXXV. O acórdão proferido fez correcta aplicação do Direito aos factos, devendo manter-se, sendo que o entendimento expresso pelo recorrente nas suas alegações constitui violação do princípio constitucional da confiança e, bem assim, dos n.º s 2 e 3 do art. 103.º da Constituição da República Portuguesa.
Deve, assim:
a) Ser declarada a prescrição das dívidas em causa;
b) Caso assim se não entenda, ser negado provimento ao presente recurso, mantendo-se o acórdão recorrido;
c) Ainda que assim se não entenda, conhecer da ampliação do objecto do recurso requerida nas presentes alegações, ou ordenar a descida dos autos ao Tribunal recorrido para dela se conhecer, sempre julgando procedente a impugnação deduzida, assim se fazendo JUSTIÇA
O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido do provimento do recurso, nos seguintes termos:
1, Prescrição da obrigação tributária
A prescrição da obrigação tributária é de conhecimento oficioso até ao trânsito em julgado da sentença (art. 175.º CPPT)
O recurso com fundamento em oposição de acórdãos é um recurso ordinário: a questão pode ser apreciada pelo tribunal, ainda que o recorrido A… não a tivesse suscitado nas alegações (art. 677.º CPC art. 2.º al. e) CPPT) fls. 271-22.
As obrigações tributárias emergem de IVA (ano 1995),
O início do prazo verificou-se em 1.01.96 (art. 34.º n.º 2 CPT: art. 48.º n.º 1 LGT).
Não resulta a prescrição da aplicação do regime do CPT porque:
– a dedução de impugnação judicial em 24.08.2000 interrompeu o prazo de prescrição (art. 34.º n.º 3 CPT)
– o processo de impugnação judicial esteve parado, por facto não imputável ao sujeito passivo, entre 22.01.2002 e 23.12.2003 (fls. 103 e 104)
– a soma dos períodos compreendidos entre 1.01.1996 e 24.08.2000 (4 anos 8 meses 24 dias) e entre 22.01.2003 e a presente data (4 anos 8 meses 26 dias) é inferior ao prazo de prescrição de 10 anos (art. 34.º n.º s 1 e 3 CPT) Igualmente não resulta a prescrição da aplicação do regime da LGT porque:
– o prazo mais curto de 8 anos conta-se a partir de 1.01.1999, início da vigência da LGT (art 48.º n.º 1 LGT, art. 297.º n.º 1 CCivil, arts. 5.º n.º 1 e 6.º DL n.º 398 98, 17 Dezembro)
– a dedução de impugnação judicial em 24.08.2000 interrompeu o prazo de prescrição (art. 49.º n.º 1 LGT)
– o processo de impugnação judicial esteve parado, por facto não imputável ao sujeito passivo, entre 22.01.2002 e 23.12.2003 (fls. 103 e 104)
– a revogação do art. 49.º n.º 2 LGT (operada pelo art. 89.º Lei n.º 53-A/2006, 29 Dezembro OGE 2007) não se aplica no caso sub judicio, na medida em que já tinha decorrido o período de paragem do processo superior a um ano quando a norma revogatória entrou em vigor (art. 91.º Lei n.º 53-A/2006, 29 Dezembro)
– a soma dos períodos compreendidos entre 1.01.1999 e 24.08.2000 e entre 22.01.2003 e a presente data é inferior ao prazo de prescrição de 8 anos (art. 49.º n.º 2 LGT)
2, Ampliação do objecto do recurso (alegações do recorrido conclusões XIII e seguintes)
O Ministério Público reitera o entendimento manifestado na intervenção processual em 18.09.2007 sobre a impossibilidade de conhecimento das questões suscitadas na ampliação do âmbito do recurso, face aos objectivos visados com o recurso por oposição de acórdãos (fls. 248)
Sem prescindir, salienta-se que a questão da isenção de IVA, suscitada na petição de impugnação judicial, não foi apreciada no acórdão recorrido, por isso não tendo a parte vencedora decaído quanto a esse fundamento (art. 684.º-A n.º 1 CPC)
3, Recurso por oposição de acórdãos
I, Pressupostos para o seguimento do recurso
Sufragamos a argumentação da recorrente, acolhida pelo juiz relator no tribunal recorrido, sobre a verificação os pressupostos para resolução do conflito de jurisprudência emergente da oposição de acórdãos (alegações de 11.º grau)
– identidade da questão jurídica decidenda
– identidade da regulamentação jurídica aplicável
– antagonismo das soluções jurídicas plasmadas nos arestos em confronto (art. 30.º al, b’) ETAF aprovado pelo DL n.º 129, 84, 27 Abril)
II, Conflito de jurisprudência
A convincência da fundamentação do acórdão recorrido justifica a resolução do conflito no sentido da confirmação da sua doutrina, a qual se pode sumariar nos termos seguintes:
– a falta de intervenção do perito independente requerida pelo sujeito passivo, no procedimento de revisão da matéria tributável fixada por métodos indirectos, constitui preterição de formalidade legal, na medida em que a vigência da norma constante do art. 91.º n.º 4 LGT não depende da respectiva regulamentação, concretizada com a publicação da Portaria n.º 640/99, 12 Agosto (constituição, competência e funcionamento da Comissão Nacional de Revisão) e do Aviso n.º 11 545/00 no Diário da República — II Série 25.07.2000 (lista dos peritos independentes)
Igualmente se releva:
a) o voto de vencido do acórdão fundamento, em sintonia com a doutrina do acórdão recorrido (fls. 253)
b) a inexistência de norma transitória do DL n.º 398/98, 17 Dezembro que tenha feito depender o início da vigência ou da produção de efeitos do art. 91.º LGT da publicação de qualquer portaria regulamentadora, como constitui técnica legislativa habitual (cf. recente DL n.º 303/2007, 24 Agosto que alterou o CPC: arts. 8.º n.º 1 e 11.º n.º 2 onde se estabelece o diferimento da produção de efeitos de normas do CPC)
CONCLUSÃO
A obrigação tributária (IVA 1995) não se encontra prescrita
O recurso não merece provimento,
O acórdão recorrido deve ser confirmado,
As partes foram notificadas deste douto parecer e nada vieram dizer.
2 – A Impugnante suscita, como questão prévia, a prescrição da obrigação tributária liquidada.
Como vem entendendo este Supremo Tribunal Administrativo, a prescrição, não constitui fundamento de impugnação judicial, por não ter a ver com a legalidade da liquidação, cuja apreciação é o objectivo do processo de impugnação judicial (arts 99.º e 124.º do CPPT), mas sim com a sua exigibilidade. No entanto, poderá ser apreciada a questão da prescrição em processo de impugnação judicial, como fundamento de inutilidade superveniente da lide, desde que no processo de impugnação judicial se possuam todos os elementos necessários.
No caso em apreço, constata-se que, além do presente processo de impugnação judicial, foi instaurada uma execução fiscal (como se informa a fls. 42), em que pode ter sido efectuada citação, que tem efeito interruptivo da prescrição (art. 49.º, n.º 1, da LGT, na redacção da Lei n.º 100/99, de 26 de Julho).
Desconhecendo-se se há nesse processo de execução fiscal factos que obstem à prescrição e sendo suficiente, para obstar à prescrição da obrigação tributária, nos casos em que ocorre mais que um acto com efeito interruptivo, que um só deles tenha esse efeito obstativo, não é possível afirmar que ocorra inutilidade superveniente da lide, no presente processo.
Improcede, assim, a questão prévia suscitada.
3 – A decisão do Excelentíssimo Relator no Tribunal Central Administrativo Norte que reconheceu a existência de oposição não é obstáculo a que no julgamento do conflito de jurisprudência se decida em sentido contrário, como vem sendo entendido pacificamente.
Como resulta do texto do n.º 1 do art. 284.º do CPPT e do preceituado no art. 30.º, alínea b), do ETAF de 1984, a viabilidade dos recursos com fundamento em oposição de julgados depende da invocação de um acórdão em oposição com o recorrido, isto é, um acórdão em que, quanto ao mesmo fundamento de direito e na ausência de alteração substancial de regulamentação jurídica, tenha sido perfilhada solução oposta à do acórdão recorrido.
Nos acórdãos recorrido e fundamento foi apreciada a questão de saber se o n.º 4 do art. 91.º da LGT, em que se estabelece que «no requerimento referido no n.º 1, pode o sujeito passivo requerer a nomeação de perito independente, igual faculdade cabendo ao órgão da administração tributária até à marcação da reunião referida no n.º 3» entrou em vigor em 1-1-1999 ou apenas quando se concretizou a regulamentação atinente ao perito independente, concretizada pela Portaria n.º 640/99, de 12 de Agosto, e aviso n.º 11545/2000, publicado no Diário da República, II Série, de 25-7-2000.
No acórdão fundamento, entendeu-se que a entrada em vigor daquele n.º 4 do art. 91.º ocorreu apenas quando se concretizou esta regulamentação, isto é, quando foi publicado o referido aviso no Diário da República, II Série de 25-7-2000.
No acórdão recorrido, entendeu-se que a entrada em vigor daquela possibilidade de requerer a intervenção do perito independente no âmbito dos pedidos de revisão da matéria tributável ocorreu com a entrada em vigor da LGT em 1-1-1999.
Há, assim, manifesta oposição entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento sobre esta questão do momento da entrada em vigor do n.º 4 do art. 91.º da LGT.
Por outro lado, os dois acórdãos referidos foram proferidos à face do mesmo regime jurídico que é a redacção inicial da LGT, as decisões sobre tal questão são expressas, foram proferidas em processos diferentes e não é questionado que o acórdão fundamento tenha transitado em julgado, pelo que estão verificados todos os requisitos dos recursos com fundamento em oposição de julgados.
4 – O Impugnante, recorrido no presente recurso jurisdicional, requereu a ampliação do objecto do recurso, ao abrigo do art. 684.º-A do CPC.
O recurso com fundamento em oposição de acórdãos tem por objecto a apreciação da questão ou questões sobre as quais existe contradição de julgados, mas apenas delas, como decorre do art. 768.º, n.º 2, do CPC, na redacção anterior à reforma operada pelos Decretos-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Setembro, e 180/96, de 12 de Dezembro (que se tem entendido continuar a ser aplicável aos processos da jurisdição administrativa e tributária iniciados antes de 1-1-2004) e como resulta também, relativamente aos recursos para uniformização de jurisprudência, do disposto nos arts. 152.º, n.º 6, do CPTA e 770.º, n.º 2, do CPC, na redacção do Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, ao fazer-se referência à decisão «da questão controvertida».
Poderão ser apreciadas questões de conhecimento oficioso e questões prévias suscitadas pelas partes, que possam ser obstáculo ao conhecimento do recurso, mas não questões relativas ao mérito do recurso sobre que não exista conflito de jurisprudência.
Assim, apreciada a questão sobre a qual existe oposição de julgados, o processo baixará ao Tribunal recorrido, para, se for caso disso, serem apreciadas outras questões relacionadas com o mérito do recurso.
Por isso, independentemente da decisão do presente recurso jurisdicional, não se pode tomar conhecimento do pedido de ampliação.
5 – A Lei n.º 41/98, de 4 de Agosto, concedeu ao Governo autorização legislativa para aprovar uma lei geral tributária, fixando, como sentido geral da autorização, além do mais, que «a lei geral tributária visará aprofundar as normas constitucionais tributárias e com relevância em direito tributário, nomeadamente no que se refere à relação tributária, ao procedimento e ao processo, com reforço das garantias dos contribuintes, da participação destes no procedimento, da igualdade das partes no processo».
Para a prossecução dos fins indicados, autorizou-se o Governo a, além do mais, «introduzir no procedimento da determinação indirecta da matéria colectável a figura do perito independente».
O regime da intervenção do perito independente no procedimento de determinação indirecta da matéria colectável foi concretizado nos arts. 91.º e 92.º da LGT, reconhecendo-se ao sujeito passivo o direito de requerer a nomeação de perito independente (art. 91.º, n.º 4).
O DL n.º 398/98, de 17 de Dezembro através do qual foi aprovada a LGT fixou o regime da sua aplicação no tempo, estabelecendo, como data da entrada em vigor geral, o dia 1-1-1999 (art. 6.º deste Decreto-Lei).
Especificamente no que concerne à aplicação do novo regime de revisão da matéria tributável, incluíram-se neste Decreto-Lei as regras de que ele só se aplica à reclamações apresentadas após a sua entrada em vigor (art. 3.º, n.º1), de que até à entrada em vigor do novo CPT (que veio a ser o CPPT) o contribuinte podia optar pelo regime de reclamação previsto nos arts 84.º e seguintes do CPT então vigente (n.º 2 do mesmo artigo) e de que, até à reorganização da Direcção-Geral de Impostos, eram considerados órgãos da administração tributária do domicílio ou sede dos sujeitos passivos os directores distritais de finanças e os directores de finanças das Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores (art. 4.º do mesmo Decreto-Lei).
Há, assim, uma manifestação legislativa clara no sentido de aplicar o novo regime de revisão da matéria tributável imediatamente a todas as reclamações apresentadas após 1-1-1999, a não ser que o contribuinte optasse pelo regime do CPT, até à entrada em vigor do CPPT que veio a ocorrer em 1-1-2000 (art. 4.º do DL n.º 433/99, de 26 de Outubro).
Não há qualquer suporte normativo para afirmar que o n.º 4 do art. 91.º da LGT não entrou em vigor em 1-1-1999, como expressamente se refere no art. 6.º relativamente à globalidade da LGT, pois até há uma referência expressa no art. 3.º, n.º 1, do DL n.º 398/98, à imediata aplicação do novo regime de revisão da matéria tributável a todas as reclamações apresentadas após a sua entrada em vigor, desde que o contribuinte não optasse pelo regime anterior.
Por outro lado, a diferença essencial entre o novo regime de revisão da matéria tributável e o anterior é precisamente a generalização da possibilidade de o contribuinte requerer a intervenção do perito independente, que até então, só podia ter lugar em casos de «especial complexidade», se a matéria tributável reclamada fosse superior ao produto do salário mínimo nacional mais elevado por 250 (art. 85.º-A do CPT, aditado pelo DL n.º 24/98, de 9 de Fevereiro).
O velho regime de revisão, esse, a partir da entrada em vigor da LGT, apenas poderia ser aplicado nos casos em que o contribuinte por ele optasse.
Aliás, a evidência destas conclusões não é sequer contestada pela Recorrente Fazenda Pública, que defende que, apesar de ser isso que resulta da lei, é necessário efectuar uma interpretação correctiva.
No entanto, num Estado de Direito, assente na soberania popular e no primado da Lei (arts. 2.º e 3.º, n.ºs 1 e 2, da C.R.P.), na sua aplicação aos casos concretos têm de ser acatados os juízos de valor legislativamente formulados, quando não ofendam normas de hierarquia superior nem se demonstre violação de limitações legais de carácter geral (abuso do direito), não podendo o intérprete sobrepor à ponderação legislativa os seus próprios juízos sobre o que pensa que deveria ser regime legal, mesmo que os considere mais adequados e equilibrados que os emanados dos órgãos de soberania com competência legislativa.
O dever de obediência à lei não pode ser afastado sob pretexto de ser injusto ou imoral o conteúdo do preceito legislativo (art. 8.º, n.º 2, do Código Civil) e muito menos por pretensas razões pragmáticas ou por os órgãos estaduais serem negligentes no cumprimento dos deveres de praticar actos de execução que a lei lhes impõe.
É certo que, em certas situações, é necessário fazer uma interpretação correctiva.
Mas, a interpretação correctiva apenas pode ser efectuada em obediência ao pensamento legislativo e não ao seu arrepio, e só em casos de «fórmulas legislativas abortadas ou de verdadeiros lapsos. Quando a fórmula normativa é tão mal inspirada que nem sequer consegue aludir com uma clareza mínima às hipóteses que pretende abranger e, tomada à letra, abrange outras que decididamente não estão no espírito da lei». (BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, página 186.)
No caso em apreço, nada disso sucede.
Na verdade, há uma intenção legislativa clara e reiterada no sentido de reconhecer ao contribuinte a possibilidade de fazer intervir um perito independente no procedimento de revisão da matéria tributável, que se manifestou, primeiramente, no art. 52.º, n.º 2, da Lei n.º 52-C/96, de 27 de Dezembro, depois no DL n.º 24/98, de 9 de Fevereiro, a seguir na Lei n.º 41/98, de 4 de Agosto, e, finalmente, na LGT.
Por outro lado, o legislador da LGT não teria razão para crer que fosse especialmente moroso para o Ministério das Finanças (O Ministro das Finanças é a entidade encarregada de regulamentar o funcionamento da Comissão Nacional de Revisão, nos termos do n.º 5 do art. 94.º da LGT.) pôr em funcionamento a Comissão Nacional de Revisão que devia elaborar as listas de peritos, pois quando foi aprovada a LGT, em Conselho de Ministros de 28-10-1998, já há vários meses, desde Fevereiro desse ano, que estava em vigor o DL n.º 24/98, que previa também a criação de uma comissão para elaboração de uma lista daquele tipo.
Finalmente, relativamente ao argumento utilizado pela Recorrente Fazenda Pública de que, sem essa interpretação correctiva, se chegaria a uma situação em que ocorreria a «caducidade dos impostos por mera impossibilidade de aplicação da lei dita vigente», assenta num pressuposto errado que é o decurso do prazo de caducidade dos impostos durante a pendência de um procedimento de revisão da matéria tributável.
Na verdade, como decorre do art. 46.º, n.º 2, alínea d), da LGT, o prazo de caducidade suspende-se «em caso de o direito à liquidação resultar de reclamação ou impugnação, a partir da sua apresentação até à decisão».
O pedido de revisão tem, à face da lei, a denominação de «reclamação», que já lhe era dada pelo CPT (art. 84.º) e é reafirmada à face da LGT, quer no art. 3.º, n.º 1, do DL n.º 398/98, de 17 de Dezembro, que a aprovou, quer no n.º 6 do art. 91.º da própria LGT. (Ao falar de «... desistência da reclamação».)
Por outro lado, o direito de liquidação que eventualmente subsistir após a reclamação é o que dela resultar, pois «havendo acordo entre os peritos … o tributo será liquidado com base na matéria tributável acordada» e não havendo acordo dos peritos, a fixação da matéria tributável será efectuada «tendo em conta as posições de ambos os peritos». Isto é, nestas situações o direito de liquidação resulta da reclamação, pois ou só existe se a decisão da reclamação o permitir e na medida em que o permitir (no caso de acordo) ou só pode ser exercido tendo em conta as posições adoptadas pelos peritos (no caso de desacordo).
Aliás, esta suspensão do prazo de caducidade durante a pendência do procedimento de revisão da matéria tributável é uma consequência lógica do efeito suspensivo da liquidação do tributo que é atribuído à apresentação de um pedido de revisão (art. 91.º, n.º 2, da LGT).
Mas, mesmo que assim não fosse, mesmo que o prazo de caducidade continuasse a correr na pendência do procedimento de revisão e ele não pudesse desenvolver-se por negligência da administração tributária em cumprir as obrigações de regulamentação complementar que a LGT lhe impôs, não se poderia justificar uma interpretação correctiva com fundamento no hipotético perigo de caducidade do direito de liquidação dos tributos, pois os Tribunais Tributários, como órgãos independentes e apenas sujeitos à lei que são (art. 203.º da CRP), não podem, na apreciação dos litígios entre entidades públicas e os cidadãos, deixar de aplicar os critérios interpretativos previstos na lei, não podendo admitir-se que adeqúem a interpretação da lei ao objectivo de evitar que a administração tributária sofra as consequências da sua negligência no cumprimento dos deveres que a lei lhe impôs, com prejuízo dos direitos procedimentais que a lei reconhece aos cidadãos, no âmbito das garantias do contribuintes.
Esta conclusão é particularmente evidente no caso da LGT, pois, por um lado, à face do seu art. 11.º, que fixa os critérios de interpretação da lei fiscal, não há qualquer suporte para adoptar um critério interpretativo que se reconduza a, na dúvida sobre a interpretação da lei, preferir a interpretação que melhor assegura a cobrança de impostos em vez daquela que melhor assegura os direitos do contribuinte, e, por outro lado, a preocupação legislativa que esteve subjacente à LGT, que é de primacial importância para determinação do pensamento legislativo, foi manifestamente a de assegurar e reforçar os direitos procedimentais e processuais dos contribuintes e não a de assegurar a eficácia da cobrança de impostos à custa dos direitos procedimentais que ela lhes reconhece.
Assim, é de concluir que a solução correcta da questão que é objecto do presente recurso jurisdicional é a que foi adoptada no acórdão recorrido.
Termos em que acordam em negar provimento ao recurso e em confirmar a decisão recorrida.
Sem custas, por a Fazenda Pública estar isenta no presente processo (art. 2.º da Tabela de Custas).
Lisboa, 13 de Fevereiro de 2008. – Jorge Manuel Lopes de Sousa (relator) – António José Martins Miranda de Pacheco – José Norberto de Melo Baeta de Queiroz – (voto a decisão. Mas só apreciaria a questão da prescrição depois de verificada a existência de oposição de acórdãos. E confirmaria o acórdão recorrido porque, à data relevante, já o artigo 94º da LGT fora regulamentado pela portaria nº 690/99, de 12/8, achando-se, só por isso, já em vigor). – Francisco António Vasconcelos Pimenta do Vale – (voto a decisão, subscrevendo, porém, o primeiro parágrafo do voto do Exmº. Conselheiro Baeta de Queiroz). – Lúcio Alberto de Assunção Barbosa (voto a decisão e os respectivos fundamentos, com ressalva sobre a questão de prescrição). – Domingos Brandão de Pinho (vencido nos termos da declaração de voto junta). – Jorge Lino Ribeiro Alves de Sousa – (vencido, nos termos da declaração de voto do Exmº Conselheiro Brandão de Pinho, e ainda nos termos da declaração que junto). – António Francisco de Almeida Calhau (voto a decisão, nos termos da declaração do Exmº Conselheiro Baeta de Queiroz).
Declaração de voto

Vencido, desde logo por não haver oposição já que o acórdão recorrido não decidiu expressamente — mas apenas implicitamente — a questão da entrada em vigor dos artigos 91.º e 92.º da Lei Geral Tributária. O que se decidiu foi que a falta de perito independente constituía preterição de formalidade legal. Parece até concluir-se que, em abstracto, a falta de regulamentação impede a entrada em vigor da lei. O que se decide é haver violação de lei.
Depois — e a entender-se haver oposição - nos termos da fundamentação expressa no acórdão fundamento, para que remeto, brevitatis causa.
Além de que, sucintamente:
- O artigo 3.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 398/98 limita-se a definir, como norma transitória que é, que o regime da revisão da matéria tributável prevista na Lei Geral Tributária se aplica apenas às reclamações apresentadas após a sua entrada em vigor com a opção prevista; e não, como se refere no acórdão, “a imediata aplicação do novo regime”.
Isto é, não desprezou qualquer necessidade de regulamentação de alguma(s) das suas disposições.
Antevendo obviamente que, à data de 1 de Janeiro de 1999, não podia estar constituída a Comissão Nacional nem organizada a lista de peritos independentes.
- Sem se pôr em causa o interesse público na aplicação do novo regime de determinação da matéria colectável, aquele é seguramente relativo, uma vez que a própria lei consagra a possibilidade de opção pelo regime até então vigente.
- Não está em causa a efectivação de qualquer interpretação correctiva mas a mera aplicação do consabido princípio de que a lei necessitada de regulamentação só entra em vigor quando emanada esta.
- A reclamação prevista no artigo 46.°, n.° 2, alínea d), da LGT é apenas a chamada reclamação graciosa — artigos 95.º do Código de Processo Tributário e 68.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário — como logo ressalta da referência à reclamação ou impugnação de que resulte o direito à liquidação.
- A interpretação sufragada no acórdão fundamento limita-se a acolher os normais cânones de interpretação das leis — cfr. o artigo 9.º do Código Civil — no sentido de que é de repudiar uma interpretação que necessariamente conduza à caducidade da liquidação do tributo.
- É metodologicamente incorrecto pretender suprir a necessidade de regulamentação dos artigos 91.º e 92.° da LGT com a existência de um diploma anterior — Decreto-Lei n.° 24/98 — igualmente necessitado de regulamentação ainda não operada e sem qualquer atinência ao novo regime.
- Em termos de procedimento, lato sensu, da liquidação o Ministério das Finanças actua em termos de administração tributária, que não no exercício da função legislativa que igualmente lhe compete. Domingos Brandão de Pinho.

Jorge Lino R. Alves de Sousa
Vencido.
1. Estou com o acórdão fundamento.
O acórdão fundamento foi tirado em consideração essencialmente da seguinte matéria de facto provada:
- através do oficio n.° 3165 de 24/02/2000 do Serviço de Apoio às Comissões de Revisão da Direcção de Finanças do Porto, foi comunicado à recorrente que a reunião dos peritos teria lugar no dia 10/03/2000, e que para apreciação do pedido de revisão “não foi nomeado perito independente, de harmonia com o decidido por despacho de SESEAF, de 28/07/1999, por falta de listas distritais de peritos independentes a que se refere o artigo 94° da Lei Geral Tributária”;
- o respectivo recurso contencioso foi interposto no dia 29/10/2002;
- A reunião dos peritos foi realizada no dia 10/03/2000, e a esta data (10/03/2000), a competente Comissão ainda não tinha sequer publicitado (o que só veio a acontecer no Diário da República de 29/06/2000, II série, Aviso n.° 11545/2000) as listas distritais das individualidades, aludidas no n.° 1 do artigo 93.° da Lei Geral Tributária.
2. O procedimento de revisão da matéria colectável — diz n.° 1 do artigo 92.° da Lei Geral Tributária — assenta num debate contraditório entre o perito indicado pelo contribuinte e o perito da Administração Tributária, com a participação do perito independente, quando o houver, e visa o estabelecimento de um acordo, nos termos da lei, quanto ao valor da matéria tributável a considerar para efeitos de liquidação. O n.° 1 do artigo 93.° da mesma Lei Geral Tributária estabelece que o perito independente é sorteado entre as personalidades constantes de listas distritais, que serão organizadas pela Comissão Nacional, nos termos do artigo 94.°.
Por sua vez, este artigo 94.°, no seu n.° 1, fala que compete à Comissão Nacional de Revisão a elaboração trienal das listas distritais de peritos independentes a que se refere o artigo anterior (para além de contribuir para a uniformidade dos critérios técnicos utilizados na determinação da matéria colectável por métodos indirectos).
O n.° 3 deste artigo 94.° da Lei Geral Tributária anuncia, de sua banda, que «a Comissão Nacional é constituída por representantes da Direcção Geral de Impostos, da Direcção Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo e da Inspecção Geral de Finanças e por cinco especialistas de reconhecido mérito que não façam parte nem tenham feito da Administração Tributária nos últimos cinco anos, a nomear por despacho do Ministro das Finanças, ouvido o Conselho Nacional de Fiscalidade e desde que a maioria dos representantes dos contribuintes e de entidades e organizações que representem categorias de interesses económicos sociais e culturais que o integrem se pronuncie favoravelmente».
Essa Comissão Nacional de Revisão viria a ser nomeada pelo despacho n.° 5624/99 do Ministro das Finanças, publicado no Diário da República, II série, de 19-3 de 1999.
Sendo certo que só pelo Diário da República de 29-6-2000 (II série, n.° 170, Aviso n.° 11545/2000) é que foram publicadas as listas distritais das personalidades, aludidas no n.° 1 do artigo 93.° da Lei Geral Tributária, dentre as quais pudesse ser sorteado o perito independente referido no n.° 1 do artigo 92.° da mesma Lei Geral Tributária.
Ora, é manifesto que, à data (de 10-3-2000) da reunião de peritos, não podia estar presente o perito independente, por uma irremovível e absoluta impossibilidade material de isso vir a acontecer. Com efeito, a essa data (10-3-2000), a competente Comissão ainda não tinha sequer publicitado (o que só veio a acontecer no Diário da República de 29-6-2000) as listas distritais das individualidades, aludidas no n.° 1 do artigo 93º da Lei Geral Tributária, dentre as quais podia ser sorteado o perito independente.
3. Em particular, não se acompanha o presente acórdão quando nele se considera que «o legislador da LGT não teria razão para crer que fosse especialmente moroso para o Ministério das Finanças pôr em funcionamento a Comissão Nacional de Revisão», e quando assevera que «Não há qualquer suporte normativo para afirmar que o n.° 4 do art. 91.° da LGT não entrou em vigor em 1-1-1999».
Em primeiro lugar, penso que, em relação ao Ministro das Finanças, é preciso que se faça a necessária distinção entre as suas funções de entidade política e legiferante, e a sua qualidade, que também têm, de órgão da Administração Tributária. Mas, na veste de entidade política e legiferante, o Ministro das Finanças não pode ver os seus actos objecto de censura pelo Supremo Tribunal Administrativo.
E o certo é que, nos termos do n.° 2 do artigo 1.º do Código Civil, sobre “Fontes imediatas de direito”, «Consideram-se leis todas as disposições genéricas provindas dos órgãos estaduais competentes».
Portanto: são “lei” também as disposições genéricas provindas do Ministro das Finanças.
A palavra lei é empregada neste artigo 1.º no seu sentido mais lato. Toda a disposição genérica e imperativa, emanada de um órgão estadual competente, é uma lei. O seu sentido é, portanto, o material, embora se exija que a norma tenha por fonte um órgão estadual, quer ele seja central como a Assembleia da República ou o Governo, quer seja local, como uma Câmara Municipal no domínio da sua competência — cf. Pires de Lima e Antunes Varela, no Código Civil Anotado, I vol., em anotação ao artigo 1.º.
E, nos termos do n.° 2 do artigo 119.° da Constituição da República Portuguesa, «A falta de publicidade (...) de qualquer acto de conteúdo genérico dos órgãos de soberania (...) implica a sua ineficácia jurídica».
Com efeito, a fase de integração de eficácia abrange os actos destinados a tornar eficaz o acto legislativo (requisitos de eficácia), designadamente através da sua publicidade. Os actos de integração de eficácia (actos de comunicação) não são requisitos de perfeição ou validade do acto legislativo; visam, sim, tornar os actos perfeitos em actos obrigatórios e oponíveis, levando-os ao conhecimento dos cidadãos através da publicação do Diário da República — cf. J.J. Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 2.ª edição, p. 771.
Aliás, sob a epígrafe “Começo da vigência da lei”, o n.° 1 do artigo 5.° do Código Civil preceitua que «A lei só se torna obrigatória depois de publicada no jornal oficial».
4. Donde, a meu ver, é forçoso concluir que o regime de intervenção de perito independente, a requerimento do contribuinte, previsto nos artigos 91.º e 92.° da Lei Geral Tributária, só ganha vigor e plena eficácia com a publicitação no Diário da República de 29-6-2000 (II série, n.° 170, Aviso n.° 11545/2000) das listas distritais das individualidades, aludidas no n.° 1 do artigo 93.° da Lei Geral Tributária, dentre as quais haverá de ser sorteado o perito independente.
Termos em que concederia provimento ao recurso da Fazenda Pública e, revogando o aresto recorrido, confirmaria a sentença da 1ª instância. Jorge Lino Ribeiro Alves de Sousa