Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0721/17
Data do Acordão:10/04/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO DELGADO
Descritores:CONTRA-ORDENAÇÃO
CUSTAS
FAZENDA PÚBLICA
Sumário:Por força das disposições conjugadas dos art. 66.º do RIGT e 94.º, n°s. 3 e 4 do Regime Geral do Ilícito de Mera Ordenação Social, num processo de contra-ordenação tributária em que tenha sido verificada a nulidade insuprível prevista no artigo 63.°/1/ d), ex vi do artigo 79.°/1/ b) e c) e 27.° do RGIT e anulada a decisão de aplicação da coima, não são devidas custas pela Fazenda Pública.
Nº Convencional:JSTA00070360
Nº do Documento:SA2201710040721
Data de Entrada:06/16/2017
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A....
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF MIRANDELA
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT.
DIR FISC - CONTRA-ORDENAÇÃO TRIB.
Legislação Nacional:LGT98 ART101.
CPPTRIB99 ART97 N1 ART280 N5.
RGCO ART92 ART94.
RGIT01 ART27 ART63 ART66 ART79.
CCIV66 ART8 N3.
RCPIT98
DL 324/03 DE 2003/12/27 ART4 N6
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC01106/16 DE 2016/11/23.; AC STA PROC01408/15 DE 2016/02/24.
Referência a Doutrina:JORGE LOPES DE SOUSA E SIMAS SANTOS - REGIME GERAL DAS INFRACÇÕES TRIBUTÁRIAS ANOTADO 4ED PAG458.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1 – Vem a Fazenda Pública recorrer para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, de fls. 120/122, no segmento em que a condenou nas custas do processo.

Termina as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:


«1. Vem o presente recurso jurisdicional interposto referencialmente à douta sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal, no segmento em que determinou a condenação da Fazenda Pública no pagamento das custas do processo;
2. A questão de direito controvertida foi alvo de pronúncia no Tribunal a quo em pelo menos cinco decisões judiciais (que se anexam), extemadas em sentido oposto ao do aresto sob recurso e convergente com o aqui defendido;
3. A Fazenda Pública não é parte no processo nem teve, ou despoletou qualquer impulso processual durante o decorrer da instância;
4. Compete ao Ministério Público introduzir o feito em juízo, tornando-o presente ao juiz, valendo esse acto como acusação [cf. artigo 62.°, n.º 1 do Regime Geral das Contra-Ordenações (RGCO), aplicável ex vi da alínea b) do artigo 3º do RGIT]
5. No processo contra-ordenacional tributário tem aplicação mediata o regime de custas estatuído nos artigos 92.° a 94.° do RGCO e, imediatamente - porque especial relativamente àqueloutras - a norma contida no artigo 66.° do RGIT;
6. Atento o regime legal de custas aplicável em sede de processos de contra-ordenação tributária manifesto é concluir pela inexistência de norma legal que preveja a condenação da Fazenda Pública em custas;
7. Pese embora a Fazenda Pública não beneficie de qualquer isenção no pagamento de custas no âmbito dos processos judiciais tributários (cf. art. 4°, nºs. 4 e 5, do Decreto-Lei n.º 324/2003 de 27 de dezembro), o mesmo se pode afirmar no que concerne à presente espécie processual, uma vez que no regime anterior ao Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo DL 34/2008, de 26/02, em vigor desde 20/04/2009, o regime de custas em processo de contra-ordenação tributária passou a ser regulado, em primeira linha pelos normativos constantes dos artigos 92.° a 94° do RGCO;
8. Pelo que, por força das disposições conjugadas dos art. 66.° do RGIT e 94.°, nºs. 3 e 4 do RGCO, será de concluir, contrariamente ao decidido no douto aresto sob recurso, que nos processos - como o aqui em causa - em que tenha sido verificada a nulidade insuprível prevista no artigo 63.°, n.º 1 alínea d), ex vi do artigo 79.°, n.º 1 alíneas b) e c) e artigo 27º, todos do RGIT, e anulada a decisão de aplicação da coima, não são devidas custas pela Fazenda Pública.

Nestes termos, e nos demais de direito, doutamente supridos por V. Exas., deverá revogar-se a decisão recorrida no segmento em que condenou a Fazenda Pública em custas e, em substituição, determinar que o processo fica sem custas.»

2. Não foram produzidas contra-alegações.

3. Neste Supremo Tribunal Administrativo o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido do provimento do recurso, de acordo com a jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo (Acórdão 1106/16 de 23.11.2006).

4. Colhidos os vistos dos Exmos. Adjuntos, cumpre decidir

5. Do objecto do recurso
Como se constata das alegações e respectivas conclusões a única questão objecto do recurso consiste em saber se padece de erro de julgamento a decisão recorrida no segmento em que determinou a condenação em custas da Fazenda Pública.

A decisão recorrida julgou verificada a nulidade insuprível prevista no artigo 63.°/1/ d), ex vi do artigo 79.°/1/ b) e c) e 27.° do RGIT, anulou a decisão de aplicação da coima e condenou a Fazenda Pública em custas, que fixou em 2 UCs.

Contra o assim decidido se insurge a Fazenda Pública argumentando que não teve, nem promoveu qualquer impulso processual nos autos tal como previsto no artº 6º, nº do RCP e que o Regime Geral das Contra-ordenações estabelece que dão lugar a pagamento de taxa de justiça as decisões judiciais desfavoráveis ao arguido (artº 93º, nº 3 do RGCO), o que não é o caso.
Mais argumenta que do artº 94º, nº 3 e 4 do RGCO resulta que as custas não imputadas ao arguido são suportadas pelo erário público.

5.1 Da admissibilidade do recurso interposto ao abrigo do artº 280º, nº 5 do CPPT.
No caso vertente verificam-se os requisitos do recurso por oposição de julgados previsto no artº 280º, nº 5 do CPPT, como resulta do teor de, pelo menos, quatro decisões juntas pela recorrente, as quais perfilham solução oposta relativamente ao mesmo fundamento de direito.

5.2 Da responsabilidade da Fazenda Pública por custas nos processos de contra-ordenações tributárias.
A questão nestes termos suscitada é em tudo idêntica à questão foi apreciada e decidida neste Supremo Tribunal Administrativo no acórdão 1106/16, de 23.11.2016, interposto pela mesma recorrente, sendo idênticas as alegações de recurso e os pressupostos de facto, pelo que se acompanhará a argumentação jurídica aduzida naquele aresto tendo, também em vista uma interpretação e aplicação uniformes do direito (cfr. artigo 8.º n.º 3 do CC).
Será, pois, pertinente referir o que sobre tal matéria se decidiu no supra citado Acórdão 1106/16:
«Como é sabido, por força do disposto no art. 4º, nºs. 4 e 5, do citado Dec.Lei n.º 324/2003, a Fazenda Pública perdeu a isenção de custas nos processos judiciais tributários a partir de 01.01.2004.
Todavia no caso em apreço estamos perante um recurso de decisão de aplicação de coimas e sanções por contra-ordenações tributárias que, sendo um «meio processual tributário» (art . 101.°, alínea c), da LGT), não está incluído, actualmente, no conceito de «processo judicial tributário», pois deixou de estar incluído na lista de processos judiciais tributários que consta do art. 97.°, n .° 1, do CPPT.
Como sublinham Lopes de Sousa e Simas Santos (Ob. citada, pag. 458.) «embora esta lista não seja exaustiva (como se vê pela alínea q) do mesmo número), a comparação da lista que consta deste art . 97 .°, com a que constava da norma equivalente do CPT (que era o art. 118.°-, n.° 2, em que expressamente se integrava o recurso judicial das decisões de aplicação das coimas e sanções acessórias entre os «processos judiciais tributários»), revela inequivocamente que se pretendeu excluir este recurso do âmbito do conceito de processo judicial tributário, opção legislativa esta que, aliás, está em consonância com a adoptada no RGIT, de aplicar subsidiariamente ao processo contra-ordenacional tributário o RGCO e a respectiva legislação complementar e não o CPPT, limitando a aplicação deste último Código apenas à execução das coimas».
Ora, em matéria de custas dos processos de contra-ordenações tributárias, a primeira norma a atender, por ter natureza especial, é a do art. 66.° do RGIT.
Dispõe aquele normativo que, sem prejuízo da aplicação subsidiária do regime geral do ilícito de mera ordenação social, nomeadamente no que respeita às custas nos processos que corram nos tribunais comuns, as custas em processo de contra-ordenação tributário regem-se pelo Regulamento das Custas dos Processos Tributários (RCPT).
Sucede que o n.º 6 do art. 4º do DL nº 324/2003, de 27 de Dezembro, revogou o RCPT, com excepção das normas relativas a actos da fase administrativa.
Assim, não havendo na legislação aprovada por aquele Decreto-Lei normas especiais para a fase judicial dos processos de contra-ordenações tributárias, haverá que fazer apelo à primeira parte do referido artº 66º do RGIT, o que conduz à aplicação subsidiária do regime de custas previsto no RGCO para as contra-ordenações comuns, nomeadamente o disposto nos artigos 92.° a 94.° do RGCO. (Vide, neste sentido, Lopes de Sousa e Simas Santos, Regime Geral das Infracções Tributárias anotado, Áreas Editora, 4ª edição, pag. 458.).
Ora nos termos do nº 3 do artº 93º do RGCO, há lugar a pagamento de taxa de justiça sempre que houver uma decisão judicial desfavorável ao arguido. E resulta também do nº 3 artº 94º do RGCO que as custas são suportadas pelo arguido em caso de aplicação de uma coima ou de uma sanção acessória, de desistência ou rejeição da impugnação judicial ou dos recursos de despacho ou sentença condenatória, sendo que, nos demais casos, as custas serão suportadas pelo erário público (nº 4 do mesmo normativo).
Em suma do regime legal de custas aplicável em processo de contra-ordenação tributária é manifesto que inexiste norma legal que preveja a condenação da Fazenda Pública em custas (Neste sentido se decidiu também no Acórdão desta Secção de Contencioso Tributário de 24.02.2016, recurso 1408/15.)
Subscrevemos esta jurisprudência cuja fundamentação jurídica tem plena aplicação também no caso vertente.
Daí que se conclua que, por força das disposições conjugadas dos art. 66.º do RIGT e 94.º, n°s. 3 e 4 do Regime Geral do Ilícito de Mera Ordenação Social, num processo de contra-ordenação tributária, como o dos presentes autos, em que tenha sido verificada a nulidade insuprível prevista no artigo 63.°/1/ d), ex vi do artigo 79.°/1/ b) e c) e 27.° do RGIT e anulada a decisão de aplicação da coima, não são devidas custas pela Fazenda Pública.
A decisão recorrida padece, pois, do erro de julgamento que lhe é imputado, pelo que não pode ser confirmada.

6-DECISÃO
Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida na parte em que condenou a Fazenda Pública em custas e, em substituição, determinar que o processo fica sem custas.
Sem custas.

Lisboa, 04 de Outubro de 2017. – Pedro Delgado (relator) – Isabel Marques da Silva – Dulce Neto.