Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01718/13
Data do Acordão:02/26/2014
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:VALENTE TORRÃO
Descritores:PRESTAÇÃO DE GARANTIA
CADUCIDADE DE GARANTIA
EFEITO SUSPENSIVO
EXECUÇÃO FISCAL
Sumário:I - Tendo sido atribuído efeito suspensivo à reclamação graciosa, em razão da prestação de garantia, esse efeito mantém-se, ainda que tenha sido declarada a caducidade da garantia por inobservância do prazo de decisão da reclamação graciosa, se for apresentada impugnação judicial na sequência do indeferimento daquela reclamação.
II - É que, nos termos do disposto no artº. 169.º, n.º 1, do CPPT, a execução fiscal fica suspensa até à decisão do pleito, sendo que, em relação à reclamação graciosa, a decisão do pleito só ocorrerá quando se formar o caso decidido ou caso resolvido, quando a liquidação se puder considerar estabilizada na ordem jurídica, por a decisão da reclamação graciosa já não ser suscetível de impugnação administrativa (recurso hierárquico) ou contenciosa (impugnação judicial) com fundamento em vícios geradores de anulabilidade.
Nº Convencional:JSTA000P17156
Nº do Documento:SAP2014022601718
Data de Entrada:11/13/2013
Recorrente:A..., S.A.
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1.”A…………….., SA”, com os demais sinais nos autos, veio recorrer do Acórdão proferido pelo TCA Sul em 14.05.2013, que constitui fls. 334/346, invocando oposição com o Acórdão proferido por este STA em 20.02.2013 no Processo nº 0162/13.

2. Admitido o recurso, foram pela recorrente apresentadas alegações tendentes a demonstrar a oposição entre os citados arestos, tendo concluído pela forma seguinte:

a) Para que se verifique a oposição de acórdãos invocada pelo recorrente como fundamento do presente recurso, impõe-se a demonstração que o Acórdão recorrido e o Acórdão fundamento perfilharam, de forma expressa, soluções opostas sobre a mesma questão fundamental de direito, e perante a identidade de situações de facto.

b) Subjacente às decisões proferidas, quer no Acórdão Recorrido, quer no Acórdão Fundamento está o mesmo enquadramento factual:
1 - Contestação administrativa de ato de liquidação;
2 - Instauração de processo de execução fiscal;
3- Prestação de garantia para suspensão do processo de execução fiscal;
4 - Declaração de caducidade da garantia por a reclamação graciosa não ter sido decidida no prazo de um ano;
5 - Decisão de reclamação graciosa (decorrido que estava mais do que um ano, contado da sua apresentação);
6 - Dedução de impugnação judicial; e,
7 - Exigência, por parte do Órgão de Execução Fiscal de nova garantia para suspensão do processo de execução fiscal.

c) Do mesmo modo, em ambos os acórdãos foi discutida idêntica questão de direito, que sinteticamente se prende com a exigibilidade de prestação de (nova) garantia para suspensão de processo de execução fiscal, após o reconhecimento de caducidade de garantia anteriormente prestada, e no seguimento de dedução de impugnação judicial.

d) Porém, perante esta mesma questão de direito, e num quadro legislativo substancialmente idêntico foram proferidas decisões opostas pelos Acórdãos em confronto.

e) Com efeito, no Acórdão Recorrido foi sufragado o entendimento de que para a suspensão de execução fiscal, no seguimento de dedução de impugnação judicial, é exigível a prestação de nova garantia idónea (ainda, que tendo a anteriormente prestada sido declarada caduca),

f) Já no Acórdão Fundamento concluiu-se que tendo sido atribuído efeito suspensivo à reclamação graciosa, em razão da prestação de garantia, esse efeito mantém-se, ainda que tenha sido declarada a caducidade da garantia, se for apresentada impugnação judicial na sequência do indeferimento daquela reclamação, porque nos termos do disposto no artº. 169.°, n.° 1, do CPPT, a execução fiscal fica suspensa até à decisão do pleito, sendo que, em relação à reclamação graciosa, a decisão do pleito só ocorrerá quando se formar o caso decidido ou caso resolvido, quando a liquidação se puder considerar estabilizada na ordem jurídica, por a decisão da reclamação graciosa já não ser suscetível de impugnação administrativa (recurso hierárquico) ou contenciosa (impugnação judicial) com fundamento em vícios geradores de anulabilidade.

g) Em ambos os acórdãos, os Tribunais pronunciaram-se, expressamente, sobre a questão em apreço, tendo o Acórdão fundamento concluído no sentido da inexigibilidade da prestação de nova garantia para suspensão de execução fiscal, e no Acórdão Recorrido concluído num quadro factual idêntico pela exigibilidade

h) Verificando-se, como acima exposto, a identidade de questões de facto e de direito, e bem assim a oposição de decisões expressas entre os Acórdãos em confronto, encontra-se demonstrada a questão preliminar da oposição de acórdãos, exigida no artigo 284°, n.° 3, do Código do Procedimento e Processo Tributário.

Nestes termos, requer-se que, em conformidade com o supra exposto, se julgue verificada a oposição entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento e se determine o prosseguimento do presente recurso.

4. Em conclusões sobre o mérito do recurso, ao abrigo do artº 284º, nº 5 do CPPT, veio a recorrente concluir:

Iª) A Recorrente interpôs o presente recurso, por oposição de acórdãos, com fundamento na oposição entre o Acórdão (Recorrido) proferido no Processo n.° 06619/13, que correu os seus termos no 2.° Juízo, 2ª Secção (Contencioso Tributário), do Tribunal Central Administrativo Sul e o Acórdão (Fundamento) do Supremo Tribunal Administrativo de 20 de fevereiro de 2013, proferido no processo n.° 0162/13.

IIª). Sustentou o oponente, ora recorrente, a invocada oposição de acórdãos na circunstância de estar subjacente a ambas as decisões - a apreciação da (in)exigibilidade da prestação de (nova) garantia, para suspensão de processo de execução fiscal, na pendência de impugnação judicial após a declaração de caducidade da anteriormente prestada.

IIIª). Com efeito, os arestos em oposição foram proferidos tendo sobre a mesma questão sido tomadas decisões expressas opostas, uma vez que no Acórdão recorrido foi sufragado o entendimento de que na pendência de impugnação judicial, independentemente do reconhecimento da caducidade de garantia anteriormente prestada, será exigível a prestação de nova garantia, sob pena de a execução fiscal, não se encontrar suspensa, tendo no Acórdão fundamento, concluindo-se em sentido inverso, ou seja, pela inexigibilidade.

IVª). Em suma, em ambos os acórdãos, os Tribunais pronunciaram-se, expressamente, sobre a mesma questão, tendo o Acórdão fundamento concluído no sentido da ilegalidade do despacho reclamado por violação da lei, e no Acórdão Recorrido concluído, num quadro factual e jurídico idêntico, pela legalidade e validade do Despacho que determinava a exigibilidade de prestação de nova garantia.

Vª).Verificada a questão preliminar da oposição de acórdãos importa apreciar a questão de fundo que deverá determinar, salvo melhor opinião, a revogação da decisão recorrida, por ser inexigível a prestação de (nova) garantia, para suspensão de processo de execução fiscal, na pendência de impugnação judicial, após a declaração de caducidade da anteriormente prestada.

VIª). No caso vertente, a recorrente viu reconhecida a caducidade de garantia prestada para suspensão de processo de execução fiscal n.° 3107200901014250, por efeito de as decisões das reclamações graciosas deduzidas contra as liquidações que originaram a alegada dívida em cobrança coerciva no indicado processo de execução fiscal.
VIIª). No seguimento da notificação das decisões de indeferimento das indicadas reclamações graciosas, a ora Recorrente deduziu impugnações judiciais, tendo disso dado conhecimento ao órgão de execução fiscal.

VIIIª). Através de Oficio n.° 4620, de 29 de maio de 2012, do Serviço de Finanças de Lisboa-8, a ora RECORRENTE foi notificada do Despacho de 28 de maio de 2012 da Senhora Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa-8, em regime de substituição, para, no prazo de quinze dias, prestar garantia no montante total de € 1.865.308, sob pena do processo de execução fiscal prosseguir os seus termos.

IXª). Através de douta Sentença proferida, em 15 de fevereiro de 2013, foi a reclamação judicial julgada procedente, uma vez que tendo sido atribuído efeito suspensivo à reclamação graciosa, em razão da prestação de garantia, esse efeito mantém-se, ainda que tenha sido declarada a caducidade da garantia por inobservância do prazo de decisão da reclamação graciosa, se for apresentada impugnação judicial na sequencia do indeferimento daquela reclamação (...), uma vez que, nos termos do disposto no artº. 169°, n.° 1, do CPPT, a execução fiscal fica suspensa até à decisão do pleito, que em relação à reclamação graciosa, só ocorrerá, quando se formar o caso decidido ou caso resolvido, quando a liquidação se puder considerar estabilizada na ordem jurídica, por a decisão da reclamação graciosa já não ser suscetível de impugnação administrativa (recurso hierárquico) ou contencioso (impugnação judicial).

Xª). Na verdade, no que respeita à exigibilidade de prestação de nova garantia, após o reconhecimento de caducidade de garantia anteriormente prestada, e no seguimento de dedução de impugnação judicial, deverá acolher-se o douto entendimento sufragado pelo Acórdão Fundamento (processo n.° 0162/13) segundo o qual “Tendo sido atribuído efeito suspensivo à reclamação graciosa, em razão da prestação de garantia, esse efeito mantém-se, ainda que tenha sido declarada a caducidade da garantia por inobservância do prazo de decisão da reclamação graciosa, se for apresentada impugnação judicial na sequência do indeferimento daquela reclamação.”

XIª). Com efeito, por força do disposto no n.° 1, do artigo 169.° do CPPT, o efeito suspensivo decorrente da prestação de garantia, entretanto levantada por caducidade do direito do Estado a exigir garantia nos termos do disposto no artigo 183°-A do Código de Procedimento e Processo Tributário, mantém-se, até à decisão do pleito, sendo que a decisão do pleito só ocorrera quando se formar caso decidido ou resolvido, ou seja, no caso em apreço, quando a decisão que venha a ser proferida em sede judicial transitar em julgado.

XIIª). Ora, à semelhança do defendido pela Recorrente, do Acórdão resulta que “no caso de ter sido prestada garantia na sequência de reclamação graciosa deduzida contra a liquidação do tributo que deu origem à dívida exequenda em ordem a obter a suspensão da execução fiscal, esta suspensão só cessa, quer a garantia se mantenha, quer tenha havido declaração de caducidade da garantia, quando a decisão proferida naquela reclamação graciosa já não seja suscetível de impugnação administrativa ou contenciosa, esta com fundamento em vícios geradores de anulabilidade (Como é sabido, relativamente aos vícios geradores de nulidade, a impugnação judicial não fica sujeita a prazo (artº. 102.°, n.° 3, do CPPT).); dito de outro modo, quando estiver definitivamente decidida a controvérsia entre a AT e a Contribuinte. Na verdade, a decisão da reclamação graciosa suscetível de ser considerada decisão do pleito para os referidos efeitos será aquela que já não seja suscetível de impugnação judicial por via administrativa - recurso hierárquico (artº. 76.°, n.° 1, do CPPT) - ou contenciosa - impugnação judicial (arts. 97.º n°1, alínea c), e 102º, nº 2, do CPPT). Só nesses casos se poderá falar na formação de caso decidido ou caso resolvido; até lá, a liquidação exequenda não se considera estabilizada na ordem jurídica.”

XIIIª). A própria Administração tributária já aderiu a este entendimento, no Oficio Circulado n.° 60094, de 12 de março de 2013 da Direção de Serviços de Gestão de Créditos da Autoridade Tributária e Aduaneira.

XIVª). Deverá, pois, concluir-se acolhendo a douta jurisprudência do Acórdão fundamento proferido no Processo nº 0162/13 que, não se mostra exigível a prestação de nova garantia para suspensão do processo de execução fiscal nº 3107200901014250, atento o facto de ter sido reconhecida a caducidade da garantia anteriormente prestada e se encontrar pendente impugnação judicial e, assim, ser determinada a revogação do Acórdão do Tribunal Central Administrativo, proferido em 14 de maio de 2013 (Acórdão Recorrido) e, consequentemente, do Despacho de 28 de maio de 2012 da Senhora Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa-8, em regime de substituição, para, no prazo de quinze dias, prestar garantia no montante total de € 1.865.308 - objeto de contestação nos presentes autos, por violação do disposto no artigo 169.° e 183°-A do Código de Procedimento e Processo Tributário.

Nestes termos e nos mais de direito aplicáveis sempre com o douto suprimento de vossas excelências, deverá o presente recurso ser julgado procedente, e, assim, determinada a revogação do acórdão proferido em 14 de maio de 2013 pelo tribunal central administrativo sul, por erro de julgamento e violação do disposto nos artigos 169.° e 183.°-A do Código de Procedimento e Processo Tributário com as devidas consequências legais.

5. O MºPº emitiu o parecer que consta de fls. 491/493 no qual se manifesta no sentido da procedência do recurso.

6. Colhidos os vistos legais cabe agora decidir.

7. Com interesse para a decisão foram dados como provados os seguintes factos:

A) No acórdão recorrido:

A) Em 10/02/2009, foi instaurado contra a Reclamante o processo de execução fiscal nº 3107200901014250, por dívida de Imposto do Selo, do exercício de 2006, no valor de 1.255.687,19€, liquidação n.° 2008 6430007538 (cfr. fls. 1 e 2 do apenso, e fls. 39 e 40 dos autos).

B) A Reclamante apresentou duas reclamações graciosas contra a liquidação mencionada na alínea antecedente (cfr. fls. 76 e ss dos autos).

C) Em 25/02/2009 a Reclamante apresentou a garantia bancária nº 00348693 do Banco B………….., no montante de 1.604.990,21€, para suspensão do processo de execução fiscal nº 3107200901014250 e apensos (cfr. fls. 4 dos autos).

D) As reclamações graciosas mencionadas em B) foram indeferidas pela Diretora de Finanças Adjunta da Direção de Finanças de Lisboa (cfr. fls. 123 e ss e 152 e ss do apenso).

E) Em 18/11/2010, a ora Reclamante impugnou judicialmente ambas as decisões de indeferimento das reclamações graciosas, apresentando duas ações contra aqueles atos (cfr. fls. 42 e ss e 76 e ss dos autos).
F) Em 19/09/2011, foi proferida decisão no recurso hierárquico nº 471/2011 que deferiu a pretensão da Reclamante, e por conseguinte, declarou a caducidade da garantia bancária nº 00348693 do Banco B…………., no montante de 1.604.990,21, com fundamento no disposto no artº. 183º-A, nº 1 do CPPT (cfr. decisão de fls. 133 a 142 dos autos).
G) Em 28/05/2012, no âmbito do processo executivo mencionado em A), foi emitida a seguinte informação, e ainda despacho da Chefe de Finanças do Serviço de Finanças de Lisboa 8 com o seguinte teor:

“INFORMAÇÃO
Contra a liquidação em cobrança nos presentes autos foi deduzida impugnação judicial em 2010-12- 02, encontrando-se a garantia prestada para suspensão do processo de execução fiscal caduca por não ter ocorrido decisão de reclamação graciosa no prazo de um ano, em cumprimento do determinado por oficio circulado 60090 da Direção de Serviços de Gestão dos créditos Tributários, para manutenção da suspensão do processo de execução fiscal, deverá ser prestada nova garantia idónea calculada nos termos do n.° 6 do artº. 199.° do CPPT
(…)
DESPACHO
Tendo em vista a suspensão dos autos, fixo o valor da garantia em €1.865.308,00 (um milhão oitocentos e sessenta e cinco mil trezentos e oito euros e zero cêntimos). Notifique-se. “ (cfr. despacho reclamado a fls. 38 dos autos).

H) O despacho mencionado na alínea anterior foi notificado à Reclamante através do ofício de 29/05/2012, cujo aviso de receção foi assinado em 31/05/2012 (cfr. fls. 224 a 226 do apenso).

I) A presente reclamação deu entrada no Serviço de Finanças do Lisboa-8, em 14/06/2012 (cfr. carimbo aposto a fls. 4 dos autos).

B) No acórdão fundamento:

A). Em 26 de fevereiro de 2004, foi, pelo Serviço de Finanças de Lisboa 2, instaurada execução fiscal contra a ora Reclamante para cobrança de dívidas de IVA do ano de 1999, com o n.º 3247200401024574 - fls. 64 a 77 do processo de execução fiscal;

B). Em 31 de dezembro de 2003, a ora Reclamante apresentou Reclamação Graciosa das liquidações de IVA subjacentes à execução referida em A - fls. 96 do PEF e Informação de fls. 54;

C). Em 18 de fevereiro de 2004, na sequência da Reclamação Graciosa referida em 3, prestou a ora Reclamante garantia no valor de € 957.587,94, para suspensão da execução referida em A - informação de fls. 54 e fls. 83 do PEF;

D). Em 31 de março de 2004, no processo de execução fiscal referido em A, prestou a ora Reclamante nova garantia no valor de € 5.388,36, para reforço da referida em 3 - fls. 88 do PEF;

E). Por despacho de 2 de outubro de 2005, do Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 2, foi reconhecida a caducidade da garantia referida em C e em D - fls. 123 do PEF;

F). Por despacho de 29 de setembro de 2009, foi, parcialmente, indeferida a Reclamação Graciosa referida em B - fls. 139 do PEF;

G). Na sequência do despacho referido em F, deduziu a ora Reclamante, em 21 de outubro de 2009, impugnação judicial das liquidações referidas em B - Informação de fls. 151 e confirmação obtida por consulta, no SITAF, do processo de impugnação com o n.º 1999/09.7BELRS;

H). No processo de impugnação referido em G não foi, ainda, proferida decisão final - informação obtida por consulta do SITAF;

I). Por ofício datado de 14 de setembro de 2012, foi a ora Reclamante notificada para prestar garantia no valor de € 1.270.931,81, para suspensão da execução fiscal referida em A, conforme decidido por despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 2, de 14 de setembro de 2012 - fls. 25.

8. Antes de mais, e apesar de o Relator ter proferido despacho em que reconhece a alegada oposição de acórdãos, importa reapreciar se a mesma se verifica, pois tal decisão não faz caso julgado e não impede ou desobriga o Tribunal de recurso de a apreciar, em conformidade com o disposto no atual artigo 641º, n.º 5, do Código de Processo Civil (anterior artº 685º-C, nº 5 do mesmo diploma).

Tendo os autos dado entrada posteriormente a 1 de janeiro de 2004, são aplicáveis as normas dos artºs 27º, alínea b) do ETAF de 2002 e 152º do CPTA (neste sentido, entre outros, v. o acórdão de 26/09/2007 do Pleno desta Secção, proferido no Processo nº 0452/07).

Sendo assim, a oposição depende da satisfação dos seguintes requisitos:

a) Existir contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão invocado como fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito;

b) A decisão impugnada não estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.

Quanto ao primeiro requisito, de acordo com o acórdão de 29.03.2006 - Recurso nº 01065/05, do Pleno desta mesma Secção, relativamente à caracterização da questão fundamental sobre a qual deve existir contradição de julgados, devem adotar-se os critérios já firmados no domínio do ETAF de 1984 e da LPTA, para detetar a existência de uma contradição, a saber:
- identidade da questão de direito sobre que recaíram os acórdãos em confronto, o que supõe estar-se perante uma situação de facto substancialmente idêntica;
- que não tenha havido alteração substancial na regulamentação jurídica;
- que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta;
- a oposição deverá decorrer de decisões expressas e não apenas implícitas (Neste sentido podem ver-se, entre outros, os seguintes acórdãos:
- de 29.03.2006 – Processo nº 01065/05; de 17.01.2007 – Processo nº 048/06;
- de 06.03.2007 – Processo nº 0762/05; - de 29.03.2007 – Processo nº 01233/06. No mesmo sentido, v. ainda Mário Aroso de Almeida e Carlos Cadilha - Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2ª edição, págs. 765-766).

A oposição deverá, por um lado, decorrer de decisões expressas, não bastando a pronúncia implícita ou mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta e, por outro lado, a oposição de soluções jurídicas pressupõe identidade substancial das situações fácticas, entendida esta não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais.

Vejamos então se, no caso dos autos, se verificam tais requisitos, começando pela questão da oposição entre os arestos acima identificados.
9. No acórdão recorrido ficou escrito, para além do mais, o seguinte:

“Determina o artigo 169.°, nº 1, do CPPT: «[a] execução fica suspensa até à decisão do pleito em caso de reclamação graciosa, a impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objecto a legalidade da dívida exequenda (...)”. Nos termos do artigo 169.°/2, «[a] execução fica igualmente suspensa, desde que, após o termo do prazo de pagamento voluntário, seja prestada garantia antes de apresentação do meio gracioso ou judicial correspondente, acompanhada de requerimento em que conste a natureza da dívida, o período a que respeita e a entidade que praticou o acto, bem como a indicação da intenção de apresentar meio graciosa ou judicial para discussão da legalidade ou da exigibilidade da dívida exequenda».
Nos termos do artigo 169º.º/6, «[s]e não houver garantia constituída ou prestada, nem penhora, ou os bens não garantirem a dívida exequenda e acrescido, é disponíbilizado no portal das finanças na internet, mediante acesso restrito ao executado, ou através do órgão da execução fiscal, a informação relativa aos montantes da dívida exequenda e acrescido, bem como a garantia a prestar, apensas se suspendendo quando da sua efectiva prestação. // n.° 7: «[c]aso no prazo de 15 dias, a contar da apresentação de qualquer dos meios de reacção previstos neste artigo, não tenha sido apresentada garantia idónea ou requerida a sua dispensa, procede-se de imediato à penhora». // n.° 8: «[q]uando a garantia constituída nos termos do artigo 195.° ou prestada nos termos do artigo 199º, se tomar insuficiente é ordenada a notificação do executado dessa insuficiência e da obrigação de reforço ou prestação de nova garantia idónea no prazo de 15 dias, sob pena de ser levantada a suspensão da execução».
Em face do regime transcrito, impõe-se concluir pela legalidade da interpelação em causa nos autos tendo em vista a prestação de nova garantia idónea, na pendência da impugnação judicial, após caducidade da anteriormente prestada, determinado nos termos do artigo 183 .°-A/1, do CPPT, sob pena da execução não se encontrar suspensa. A seguir-se outro entendimento, tal implicaria que a suspensão da execução manter-se até ao trânsito em julgado da decisão a proferir na impugnação judicial, sem que tivesse sido prestada garantia idónea por parte do executado, o que confraria o disposto no normativo do artigo 169.° do CPPT, citado.
Em face do exposto, impõe-se conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e manter o despacho reclamado”.

10. No acórdão fundamento, por sua vez, ficou escrito, para além do mais, o seguinte:
“…Ou seja, no caso de ter sido prestada garantia na sequência de reclamação graciosa deduzida contra a liquidação do tributo que deu origem à dívida exequenda em ordem a obter a suspensão da execução fiscal, esta suspensão só cessa, quer a garantia se mantenha, quer tenha havido declaração de caducidade da garantia, quando a decisão proferida naquela reclamação graciosa já não seja suscetível de impugnação administrativa ou contenciosa, esta com fundamento em vícios geradores de anulabilidade; dito de outro modo, quando estiver definitivamente decidida a controvérsia entre a AT e a Contribuinte. Na verdade, a decisão da reclamação graciosa suscetível de ser considerada decisão do pleito para os referidos efeitos será aquela que já não seja suscetível de impugnação judicial por via administrativa – recurso hierárquico (art. 76.º, n.º 1, do CPPT) – ou contenciosa – impugnação judicial (arts. 97.º, n.º 1, alínea c), e 102.º, n.º 2, do CPPT). Só nesses casos se poderá falar na formação de caso decidido ou caso resolvido; até lá, a liquidação exequenda não se considera estabilizada na ordem jurídica.
Ora, no caso sub judice a executada reclamou graciosamente da liquidação que deu origem à dívida exequenda, bem como, na sequência do indeferimento parcial dessa reclamação, deduziu impugnação judicial (cfr. B, F e G dos factos provados). O que significa que não pode considerar-se verificada a decisão do pleito enquanto não transitar em julgado a decisão a proferir naquela impugnação judicial.
Salvo o devido respeito, a questão nada tem a ver com a reconhecidamente diferente natureza entre a reclamação graciosa e a impugnação judicial, nem sequer com uma qualquer solução de continuidade da garantia entre a reclamação graciosa e a impugnação judicial, mas tão-só com a estabilidade da relação jurídico-tributária a que se refere a liquidação que deu origem à dívida exequenda.
Nesse sentido aponta também o n.º 5 do art. 103.º, do CPPT, na redação da Lei n.º 15/2001, de 5 de junho. Na verdade, nesta norma legal, depois de no número anterior se referir que «A impugnação tem efeito suspensivo quando, a requerimento do contribuinte, for prestada garantia adequada, no prazo de 10 dias após a notificação para o efeito pelo tribunal, com respeito pelos critérios e termos referidos nos n.ºs 1 a 5 e 9 do artigo 199.º», estatui-se: «Caso haja garantia prestada nos termos da alínea f) do artigo 69.º, esta mantém-se, independentemente de requerimento ou despacho, sem prejuízo de poder haver lugar a notificação para o seu reforço». O que parece significar, sem margem para dúvida, que a garantia que haja sido prestada quando da reclamação graciosa da liquidação da dívida exequenda em ordem a obviar à instauração da execução fiscal se mantém, em ordem ao mesmo efeito, quando for deduzida impugnação judicial contra o mesmo ato tributário. E, se assim é nos casos em que a garantia visa obviar à instauração da execução fiscal porque seria diferente nos casos em que a garantia visa obviar à prossecução da execução, mesmo que tenha sido declarada a sua caducidade?”

E concluiu-se no citado aresto, aliás na sequência de outros ali enunciados (acórdãos de 12 de abril de 2012-Processo com o n.º 0322/12, de 26.04.2012-Processo nº 0364/12, de 12.11.2012-Processo nº 01155/12, de 05.12.2012-Processo nº 01270/12 e de 23.01.2013-Processo nº 01500/12) que:
“Tendo sido atribuído efeito suspensivo à reclamação graciosa, em razão da prestação de garantia, esse efeito mantém-se, ainda que tenha sido declarada a caducidade da garantia por inobservância do prazo de decisão da reclamação graciosa, se for apresentada impugnação judicial na sequência do indeferimento daquela reclamação.
É que, nos termos do disposto no artº. 169.º, n.º 1, do CPPT, a execução fiscal fica suspensa até à decisão do pleito, sendo que, em relação à reclamação graciosa, a decisão do pleito só ocorrerá quando se formar o caso decidido ou caso resolvido, quando a liquidação se puder considerar estabilizada na ordem jurídica, por a decisão da reclamação graciosa já não ser suscetível de impugnação administrativa (recurso hierárquico) ou contenciosa (impugnação judicial) com fundamento em vícios geradores de anulabilidade”.

11. Será então, em face dos factos dados como provados em ambos os arestos e a argumentação em cada um aduzida, conduz ao conceito legal da oposição de acórdãos acima referida?

Desde já adiantaremos que sim.

Na verdade, em ambos os arestos as situações facto são semelhantes, tendo sido declarada a caducidade da garantia, tendo posteriormente vindo a ser exigida nova garantia para suspensão da execução fiscal, não obstante estar pendente impugnação judicial.

Ora, no acórdão recorrido entendeu-se legal tal exigência, enquanto o mesmo não sucedeu no acórdão fundamento.

Verificado então este requisito, cumpre apurar se ocorre o outro - saber se a decisão impugnada não está em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.

É que, se a decisão impugnada tiver seguido essa jurisprudência consolidada, o recurso não pode ser admitido, de acordo com o nº 3 do artº 152º do CPTA.

Sobre o alcance da expressão ”jurisprudência mais recentemen-te consolidada, no acórdão do Pleno desta Secção, de 02.05.2012- Processo nº 0895/2011, de que fomos também relator, escreveu-se o seguinte:

“Sobre a expressão “jurisprudência recentemente consolidada”, escreveram Mário Aroso e Carlos Cadilha - Comentário ao CPTA, 3ª edição, pág. 1010: “Se o acórdão impugnado seguir o entendimento expresso pelo Pleno no âmbito de um julgamento ampliado de revista ou em anterior acórdão uniformizador, não tem, na verdade, justificação submeter a questão de novo à apreciação do Pleno. Face à literalidade do preceito, a possibilidade de não admissão do recurso também existe quando o acórdão impugnado se conforme com a jurisprudência pacífica e uniforme do STA, mesmo quando tirada pelas subsecções ou, pelo menos, com a jurisprudência firme que se tenha consolidado mais recentemente”.
Por sua vez, no acórdão do STA (Pleno) de 18 de setembro de 2008 (Processo nº 212/08), escreveu-se o seguinte:“… a diferença entre haver uma jurisprudência «tout court» e uma «jurisprudência consolidada» há de necessariamente advir de um «plus» desta última, que cause ou revele uma estabilidade de julgamento; e esse acréscimo detetar-se-á por um critério quantitativo, significador de uma constância decisória - seja esse critérioo do número dos Juízes subscritores da solução, seja o do número das decisões do STA que a acolheram. Assim, a consolidação jurisprudencial transparecerá, ou do facto de a pronúncia respetiva constar de um acórdão do Pleno assumido pela generalidade dos Conselheiros em exercício na Secção (consoante prevê o artº. 17º, n.º 2, do atual ETAF), ou do facto de existir uma sequência ininterrupta de várias decisões no mesmo sentido e obtidas por unanimidade ou por maiorias inquebráveis, exigindo-se um maior número delas se os acórdãos provierem das Subsecções e um seu menor número se forem do Pleno (na formação de nove Juízes, referida no art. 25º, n.º 1, do anterior ETAF)”. “

Ora, como acima se referiu, existe jurisprudência deste STA uniforme e reiterada, traduzida em acórdãos subscritos por todos os Conselheiros em funções, à exceção do Srº Conselheiro Ascensão Lopes, no sentido da decisão recorrida.
No entanto, entende-se que a melhor forma de consolidar a jurisprudência de modo a melhor corresponder àquele conceito é elaborar acórdão no Pleno, que, relativamente à questão dos autos, ainda não existe.
Deste modo, consideramos que não se pode, para já, admitir que a decisão recorrida seguiu jurisprudência consolidada e, assim, iremos conhecer do mérito do recurso que consiste em apreciar se, declarada a caducidade da garantia ao abrigo do disposto no artº 183º-A do CPPT, a execução fiscal se mantém suspensa até à decisão final do pleito, sem necessidade de prestação de qualquer outra garantia.

Vejamos então se a decisão recorrida deve ou não manter-se.

12. Este STA teve já ocasião de se pronunciar sobre esta questão mais de uma vez.

Assim, no acórdão de 26.04.2012 -Processo nº 0364/12, por exemplo, ficou escrito, para além do mais, o seguinte:

“A questão objeto do presente recurso consiste em saber se o efeito suspensivo do processo de execução fiscal decorrente da garantia prestada no âmbito da reclamação graciosa se mantém, independentemente da caducidade da garantia e sua verificação, até ao trânsito em julgado da decisão que vier a ser proferida na impugnação judicial entretanto deduzida, não sendo devida a prestação de qualquer outra garantia, na pendência da impugnação judicial, para obter o referido efeito suspensivo.

…Dispõe o artº 169º, nº 1 do Código de Procedimento e Processo Tributário que a execução ficará suspensa até à decisão do pleito em caso de reclamação graciosa, impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objeto a legalidade da dívida exequenda desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195.º ou prestada nos termos do artigo 199.º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, o que será informado no processo pelo funcionário competente. Esta suspensão está também prevista genericamente no artº 52º da Lei Geral Tributária para os casos de pagamento em prestações, reclamação, recurso, impugnação da liquidação e oposição à execução que tenham por objeto a ilegalidade ou inexigibilidade da dívida exequenda.

Por outro lado preceitua o artº 103º, nº 4 do Código de Procedimento e Processo Tributário que a impugnação tem efeito suspensivo quando, a requerimento do contribuinte, for prestada garantia adequada, no prazo de 10 dias após a notificação para o efeito pelo tribunal, com respeito pelos critérios e termos referidos nos n.ºs 1 a 5 e 9 do artigo 199.º, estabelecendo o nº 5 do mesmo normativo que caso haja garantia prestada nos termos da alínea f) do artigo 69.º, esta mantém-se, independentemente de requerimento ou despacho, sem prejuízo de poder haver lugar a notificação para o seu reforço.

Da conjugação destas normas se pode concluir, com segurança, que esta garantia, prestada para obter o efeito suspensivo da reclamação graciosa, valerá até à decisão final do pleito, entendendo-se por decisão final do pleito o trânsito da decisão final do processo de impugnação, ainda que seja interposto recurso judicial da decisão do tribunal de 1ª instância, ou, em caso de impugnação administrativa, quando se formar o chamado caso decidido ou resolvido, o que ocorre quando a decisão da Administração Tributária deixar de ser contenciosamente impugnável com fundamento em vícios geradores de anulabilidade - cf., neste sentido, na doutrina, João António Valente Torrão, no seu Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, pág. 474, Rui Duarte Morais, A Execução Fiscal, pág. 80, e Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e Processo Tributário Anotado, vol. III, pág. 220.

Ora, como bem se nota na decisão recorrida, se esta garantia, prestada para obter o efeito suspensivo da reclamação graciosa, vale até ao trânsito da decisão final do processo de impugnação, não há efetivamente razões para se considerar que o mesmo não suceda nas situações em que, estando já instaurado o preço executivo, a garantia tenha caducado por facto imputável à Administração Fiscal.

Aliás, só este entendimento se concilia com a ratio do instituto da caducidade da garantia, que se prende com a necessidade de acautelar e proteger os contribuintes da demora excessiva das decisões, quer na fase administrativa, quer na fase judicial. É isso mesmo que decorre do fim visado pelo legislador ao elaborar a norma do artigo 183-A nº1 do Código de Procedimento e Processo Tributário (redação da Lei nº 30-B/2002, aplicável ao caso subjudice), que prevê a possibilidade de caducar a garantia que tivesse sido efetivamente prestada, por atraso na decisão do processo de reclamação graciosa ou nos processos de impugnação judicial ou de oposição à execução, mantendo-se, contudo o efeito suspensivo da execução.

Com efeito, com o intuito de «responsabilizar a administração e os tribunais na condução célere e expedita do processo» e de prevenir a «imposição ao contribuinte de um encargo oculto por razões que lhe são alheias (Proposta de Lei nº 53/VIII que esteve na origem da Lei 15/2001, de 5 de junho.)» o legislador aditou ao Código de Procedimento e Processo Tributário o artº 183º-A, cuja redação, alterada pela Lei nº 30-B/2002, aplicável ao caso subjudice era a seguinte: (…)

Permitia-se assim ao interessado obter a declaração de caducidade da garantia, sem perder o efeito suspensivo da execução, se reclamação graciosa em que fosse discutida a legalidade da liquidação não fosse decidida no prazo de um ano ou o processo de impugnação judicial em que fosse discutida essa legalidade ou de oposição à execução fiscal não fossem decididos, em 1ª instância, no prazo de três anos.

Nessas situações, em que se enquadra, aliás, o caso em apreço, o processo de execução fiscal continua suspenso, mesmo sem garantia, até ao momento em que estaria se a garantia se mantivesse, ou seja, até à decisão do pleito (cf., adotando este entendimento, Jorge Lopes de Sousa, ob. cit., vol. III, págs. 341-342).

O que bem se compreende pois o regime da caducidade da garantia estabelecido no artº 183º- A nº 1 do CPPT é sancionatório da morosidade na decisão do procedimento tributário e do processo judicial pelas entidades competentes, sem deixar de salvaguardar, num justo equilíbrio, a sua não aplicação, quando o atraso resultar de motivo imputável ao reclamante, impugnante, recorrente ou executado cfr. nº 3 do artº 183º -A do CPPT.

O prosseguimento da suspensão da execução sem garantia subsequente à declaração de caducidade surge assim, como bem nota o Exmº Procurador-Geral Adjunto no seu parecer, como uma compensação pelo ónus que foi imposto ao contribuinte de ter de suportar a garantia durante um período de tempo que se considera adequado para ser proferida decisão.

E é também neste sentido que se vem pronunciando a jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo, de que são exemplos, os Acórdãos 563/11 de 29.06.2011, 1258/09, de 20.10.2010, 21/08, de 31.01.2008, e 97/06, de 17.05.2006, todos in www.dgsi.pt.

Ora, sendo este o espírito da lei, não se compreende nem se aceita a tese da Fazenda Pública quando defende a existência da obrigação de prestação de nova garantia no âmbito do processo de impugnação judicial precisamente no caso de a garantia prestada na pendência da reclamação graciosa ter caducado por culpa unicamente imputável à Administração Fiscal, nomeadamente por não ter cumprido o prazo que o legislador considera razoável para decidir o mencionado procedimento.

Aliás, e como incisivamente refere a recorrida é manifesta a contradição em que incorre a Fazenda Pública quando igualmente defende (conclusões GG e HH) que tal obrigação não existe no caso de a garantia prestada na pendência da reclamação graciosa não ter caducado.

Em face de tudo o exposto forçoso é concluir que, no caso subjudice, a execução fiscal mantém a sua suspensão na sequência da apresentação da garantia bancária no âmbito da reclamação graciosa, independentemente da caducidade daquela garantia, suspensão que se mantém até trânsito em julgado da decisão que vier a ser proferida na impugnação judicial, não sendo, pois, devida qualquer outra garantia para obter o referido efeito suspensivo.

A sentença recorrida, que assim decidiu, deve pois ser confirmada, pelo que improcede o recurso. “

Esta doutrina foi adotada no Acórdão fundamento e nos acórdãos acima citados deste mesmo STA, sendo ainda certo que, tal como se refere no voto de vencido do Srº Desembargador Joaquim Gameiro (v. fls. 346), também a Administração Tributária passou a adotar este entendimento no ofício circulado nº 12.03.2013 (que revogou o Oficio-Circulado nº 60090 desta Direção de Serviços, de 15-05-2012).

Com efeito, naquele Ofício-Circulado, ficou escrito o seguinte:

“A caducidade da garantia, prevista atualmente no artº. 183º·A do CPPT, só ocorre em caso de falta de diligência da administração tributária, por não ter cumprido o prazo de um ano para proferir decisão em sede de reclamação graciosa. Caso esse incumprimento seja da responsabilidade do reclamante, não se verifica a caducidade.
A caducidade ocorre tanto nos casos em que se trate de "garantia prestada" pelo contribuinte, como de garantias constituídas pela própria administração, nos termos do artº. 195.° do CPPT (hipoteca legal ou penhor). O sentido da norma é incutir à administração tributária uma tramitação célere do processo, pelo que não há razão para distinguir estas garantias, para estes efeitos. Deste regime de caducidade de garantia ficará afastada a penhora, face à revogação expressa do nº 1 do artº. 235.° do CPPT.
Ao estabelecer um prazo de imutabilidade do valor da garantia, resultante da citação do executado, com a introdução do nº 13 do artº. 169° do CPPT, o legislador veio associar à execução fiscal a relação garantística ali constituída, sendo indiferente às diversas mutações que possam ocorrer em sede de contencioso.
Assim, da análise conjugada da atual redação do artigo 169º, com o nº 1 do artigo 183º-A, ambos do CPPT, podemos concluir que o pleito apenas termina com uma decisão definitiva (o caso decidido ou o trânsito em julgado). O efeito da caducidade da garantia previsto no artigo 183º.-A do CPPT sanciona a morosidade da AT na análise da reclamação graciosa, com efeitos extensíveis à fase jurisdicional, caso o contribuinte a ela recorra.
Deste modo, verificando-se a caducidade da garantia em sede de reclamação graciosa, não é exigível ao contribuinte a prestação de nova garantia, caso prossiga com a discussão da legalidade da divida em sede de recurso hierárquico ou de impugnação judicial, mantendo-se o processo de execução fiscal suspenso até que seja proferida decisão final pela administração tributaria (caso decidido) ou pelo tribunal (trânsito em julgado)“.

Pelo que ficou dito não existem, por ora, razões para alterar este entendimento, pelo que o acórdão recorrido tem de ser revogado.

13. Nestes termos e pelo exposto, concede-se provimento ao recurso, revogando-se o acórdão recorrido com as consequências legais, isto é, com a manutenção da decisão de 1ª instância recorrida e a respetiva anulação do despacho reclamado.

Sem custas.

Lisboa, 26 de fevereiro de 2014. – João António Valente Torrão (relator)Isabel Cristina Mota Marques da Silva – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes – Dulce Manuel da Conceição Neto – José da Ascensão Nunes Lopes – Pedro Manuel Dias Delgado – Joaquim Casimiro Gonçalves.