Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:093/11.5BEVIS
Data do Acordão:03/21/2024
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:RECURSO PARA UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS
BENEFÍCIOS FISCAIS
INTERPRETAÇÃO
Sumário:I - O recurso por oposição de acórdãos depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos legais: i) que exista contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento na decisão da mesma questão fundamental de direito e ii) que não ocorra a situação de a decisão impugnada estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo (cf. art. 284.º, n.ºs 1 e 3, do CPPT).
II - Não há que conhecer do mérito do recurso se os dois acórdãos em alegada oposição não conheceram de uma mesma questão de direito, sendo que para que se considere existir oposição exige-se que se tenha perfilhado, nas decisões em confronto, solução oposta, não bastando a simples oposição entre razões ou argumentos enformadores das decisões finais ou consideração colateral tecida no âmbito da apreciação de questão distinta.
III - As regras da hermenêutica das normas legais tributárias (que são as do art. 9.º do CC, ex vi do n.º 1 do art. 11.º da LGT) não consentem que do art. 17.º do EBF, na redacção vigente à data (a que hoje corresponde o art. 19.º do EBF), se extraia o sentido de que, nos casos em que os contratos de trabalho elegíveis à luz do referido artigo cessem ou se iniciem durante o período de tributação (sem coincidirem com o início e o termo desse período), o limite máximo da majoração prevista no n.º 1 deva ser restringido proporcionalmente ao tempo de vigência dos contratos.
IV - Nos benefícios fiscais que dependem de um comportamento do contribuinte, que pode livremente optar por preencher as condições legalmente estabelecidas para deles usufruir, a questão do princípio da igualdade deve colocar-se relativamente às condições de acesso ao benefício e não em relação aos contornos em que são previstos.
V - Assim, não há tratamento discriminatório, nem sequer arbitrariedade da solução legal, se é colocada na disponibilidade do contribuinte a optimização dos efeitos variáveis do benefício fiscal.
Nº Convencional:JSTA000P32048
Nº do Documento:SAP20240321093/11
Recorrente:A...., SA
Recorrido 1:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Recurso para uniformização de jurisprudência do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte no processo n.º 93/11.5BEVIS
Recorrente: “A..., S.A.”
Recorrida: Autoridade Tributária e Aduaneira (AT)

1. RELATÓRIO

1.1 A sociedade acima identificada veio, ao abrigo do disposto no art. 284.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), interpor recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte em 25 de Maio de 2023 no presente processo, para uniformização de jurisprudência, relativamente a duas questões, por oposição com os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo proferidos em 13 de Abril de 2005, no processo 1265/04 (Disponível em https://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/0960e238b7343bd980256feb00497746.), e em 9 de Novembro de 2022, no processo 881/12.5BELRS (Disponível em https://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/ba36cd5a4387a29a802588fa0038712f.). Alegou o recurso, com conclusões do seguinte teor:

«1. Está em causa o benefício fiscal da criação líquida de emprego para jovens (CLEJ), na parte não aceite pela AT, € 587.382,77,

2. correspondente à soma das seguintes parcelas: (i) € 584.260,31, valor do benefício fiscal quanto aos trabalhadores provenientes das sociedades fundidas, e (ii) € 3.122,46, alegado excesso no cálculo do benefício.

3. Em 2004, ano aqui em questão, o benefício fiscal da CLEJ estava previsto no artigo 17.º do EBF (redacção da Lei n.º 32-B/2002, de 30/12).

4. A parte do benefício fiscal não aceite advém, por um lado, (i) da sua alegada inaplicabilidade quanto aos trabalhadores que passaram para os quadros da Impugnante/Recorrente,

5. em consequência de cisões-fusões e fusões (consoantes os casos) das sociedades B..., C..., D... e E…, e incorporação destas sociedades na Impugnante/Recorrente, por pretensa intransmissibilidade do benefício fiscal,

6. e, por outro, (ii) por alegado erro no cálculo e apuramento do benefício, ao nível da quantificação do limite máximo da majoração anual, quando os contratos de trabalho se iniciam e/ou terminam no decurso do exercício fiscal (e não a 1/1 ou a 31/12).

Posto isto,

7. O sobredito Acórdão, no segmento decisório acima referido em (i) está em oposição com o Acórdão do STA, Secção de CT, de 13.04.2005, proc. 01265/04, in www.dgsi.pt - Acórdão fundamento.

8. Por sua vez, no segmento decisório acima referido em (ii), o douto Acórdão recorrido está em oposição com o douto Acórdão do STA, Secção de CT, de 09.11.2022, proferido no Proc. 0881/12.5BELRS, in www.dgsi.ptAcórdão fundamento.

Com efeito,

Quanto à oposição/contradição dos Acórdãos em confronto

9. Segundo o douto Acórdão fundamento, a empresa incorporada, embora sem personalidade jurídica, não desaparece e permanece a respectiva realidade económica e empresarial, pelo que não ocorre transmissão do benefício – tão pouco se extingue o benefício.

10. Já segundo o douto Acórdão recorrido, quanto ao primeiro segmento decisório, em expressa e directa referência/oposição ao aqui Acórdão fundamento, (…) “isso (referindo-se à Jurisprudência do Acórdão fundamento) não podemos sufragar, pois se a pessoa jurídica da incorporante passa a ser, juridicamente, o sujeito do activo dos direitos da incorporada, do que se pode tratar, em linguagem denotativa, se não de uma transmissão dos mesmos?”.

11. Por sua vez, e quanto ao segundo segmento decisório, o douto Acórdão fundamento considera que, nos casos em que os contratos de trabalho elegíveis à luz do artigo 17.º do EBF cessem ou se iniciem durante o período de tributação, o limite máximo da majoração prevista no n.º 1 daquele preceito não pode ser restringido proporcionalmente ao tempo de vigência do contrato de trabalho.

12. Já o douto Acórdão recorrido, neste segmento decisório, considera que é legítima a restrição do limite máximo da majoração (em que se traduz o benefício fiscal em questão) na parte proporcionalmente correspondente ao tempo de duração do contrato de trabalho nos exercícios do início e do termo do mesmo, quando este se inicia ou termina no decurso/a meio do exercício fiscal.

Por conseguinte,

13. Perante factualidade idêntica; perante a mesma questão jurídica fundamental; e diante do mesmo quadro legislativo aplicável,

14. o douto Acórdão recorrido está em oposição/contradição com os doutos Acórdãos fundamento acima elencados.

Posto isto,

Quanto ao erro de julgamento e violação de lei do Acórdão recorrido

15. Salvo o devido respeito, o douto Acórdão recorrido padece de erro de julgamento.

Com efeito,

16. Conforme ficou provado, todas as sobreditas operações de cisão fusão foram realizadas segundo o regime da neutralidade fiscal (cfr. 9) dos factos provados), nos termos dos artigos 67.º e seguintes do CIRC, redacção ao tempo dos factos.

17. Segundo o douto Acórdão recorrido, a criação líquida de emprego nas 4 sociedades incorporadas não pode ser aceite no cômputo do benefício fiscal da CLEJ de 2004 da Impugnante/Recorrente,

18. porque isso representaria a transmissão daquele benefício fiscal das sociedades incorporadas para a sociedade incorporante (a Impugnante/Recorrente), legalmente vedada pelo artigo 13.º do EBF (redacção de 2004).

19. Ora, contrariamente ao entendimento do douto Acórdão recorrido, da factualidade provada resulta que não está em causa qualquer transmissão de benefícios fiscais.

20. Com efeito, a B..., a C..., a D... e a E... não alienaram/não transmitiram à Impugnante quaisquer benefícios fiscais.

21. Como se extrai da factualidade provada e dos demais sinais dos autos, o benefício fiscal em questão foi constituído em 1999, 2000, 2001, 2002 e 2003 e 2004, na esfera das sociedades incorporadas (B..., C..., D... e E…, consoante os anos), por verificação, nestas sociedades, dos respectivos pressupostos legais.

22. Ou seja, da contratação/criação de emprego naqueles anos, por parte daquelas sociedades incorporadas.

23. Com efeito, como se retira dos sinais dos autos, o benefício fiscal em causa advém da criação líquida de postos de trabalho na esfera das sociedades incorporadas, B..., C..., D... e E…, naqueles anos de 1999 a 2004, inclusive.

24. Logo, estas sociedades incorporadas poderiam usufruir do benefício fiscal da CLEJ por um período de 5 anos contado daqueles anos, nos termos do artigo 17.º n.º 3 do EBF – aquele benefício fiscal “tem lugar durante um período de cinco anos a contar do início do contrato de trabalho.”.

25. Ou seja, o benefício fiscal do artigo 17.º do EBF (CLEJ) constituiu-se automaticamente nos sobreditos anos (cfr. artigo 4.º, n.º 1, 1.ª parte, do EBF, redacção à data), sem necessidade de reconhecimento administrativo.

26. E constituiu-se no momento da criação líquida dos postos de trabalho, ainda na esfera das sociedades incorporadas.

27. Ou seja, as sociedades incorporadas poderiam sempre usufruir desse benefício fiscal, elas próprias, ao longo desse período de 5 anos.

28. Contudo, isso não chegou a suceder porque, entretanto, foram fundidas na sociedade incorporante, aqui Impugnante/Recorrente – como se extrai da factualidade provada, não foi contestado pela AT e tão pouco está em discussão.

29. Sendo que, nos termos do artigo 11.º do EBF (sempre redacção à data), “o direito aos benefícios fiscais deve reportar-se à data da verificação dos respectivos pressupostos” – no caso, à data da contratação/criação líquida de emprego (o que sucedeu nos sobreditos anos).

30. Por outro lado, conforme é Doutrina e Jurisprudência unânime, a fusão (seja cisão-fusão, seja fusão), em substância, não implica a extinção da sociedade incorporada.

31. Não se extinguindo a sociedade incorporada, todos os seus direitos e obrigações mantêm-se nos precisos termos e limites em que existiam anteriormente.

32. Simplesmente, porque foi incorporada noutra sociedade, esses seus direitos e obrigações, constituídos antes da fusão, passam a subsistir formalmente sob a esfera e na égide da sociedade incorporante.

33. Com efeito, a fusão implica a continuação da sociedade incorporada no seio da sociedade incorporante.

34. Daí que não tenha havido qualquer “transmissão” de benefícios fiscais.

35. Assim, não existem quaisquer razões para impedir que, tendo a criação líquida de postos de trabalho, nos termos e para os efeitos do artigo 17.º do EBF, ocorrido na esfera da sociedade incorporada,

36. o correspondente benefício fiscal seja efectivamente usufruído pela sociedade incorporante, respeitado que seja e durante o período de 5 anos subsequente, dada a sua continuação/sucessão na esfera desta última.

37. Com efeito, em rigor não há qualquer “transmissão”: o benefício fiscal nasceu na esfera das sociedades incorporadas, antes das cisões-fusão/fusão, e na esfera das sociedades incorporadas se mantinham – ainda que estas, após a fusão, hajam formalmente perdido a sua personalidade jurídica e passado a integrar a sociedade incorporante.

38. Também contrariamente ao entendimento do douto Acórdão recorrido, o regime da neutralidade fiscal das cisões e fusões (cfr. artigo 68.º do CIRC), ao qual as cisões-fusão e fusão aqui em causa foram comprovadamente subordinadas,

39. abona precisamente no sentido de que, na cisão-fusão ou na fusão segundo aquele regime (de neutralidade fiscal), não há lugar a qualquer transmissão entre sociedade incorporante e incorporada, tão pouco o apuramento de qualquer resultado decorrentes de qualquer transmissão.

40. Outrossim, e do ponto de vista fiscal, a sociedade incorporante é a continuação, na sua esfera, da sociedade incorporada: são dois em um, como acima se afirma de forma elucidativa.

41. A intransmissibilidade inter-vivus, por via de regra, dos benefícios fiscais, prevista no artigo 13.º do EBF (redacção à data), é direccionada às situações de “transmissão” dos benefícios fiscais de um sujeito para outro, como resulta do texto da lei.

42. Ora, é notório, pelos motivos referidos, que na fusão não há qualquer transmissão inter-vivus.

43. Aliás, nos termos do artigo 17.º do EBF, os pressupostos do benefício fiscal apenas terão de se verificar por uma vez, aquando da constituição do benefício.

44. Com efeito, a lei não faz depender esse benefício de quaisquer condições verificáveis a posteriori, ao longo dos 5 anos subsequentes.

45. Apenas estabelece que o benefício fiscal em questão, uma vez constituído, é passível de ser usufruído durante os 5 anos subsequentes ao início da vigência dos contratos de trabalho.

46. De facto, não está em causa qualquer transmissão de benefícios fiscais – outrossim, apenas o reconhecimento fiscal de benefícios fiscais constituídos na esfera das sociedades incorporadas, quando estas tinham personalidade jurídico-fiscal.

47. E da sua continuação na esfera da sociedade incorporante, aqui Impugnante/Recorrente, durante e respeitado que seja aquele hiato temporal legal de 5 anos.

48. As sociedades incorporadas não decidiram transmitir benefícios fiscais para a sociedade incorporante (Impugnante/Recorrente).

49. Outrossim, na fusão a sociedade incorporante sucedeu nas posições jurídicas anteriormente tituladas pelas sociedades incorporadas.

50. Com efeito, a fusão é decidida pelos accionistas das sociedades envolvidas (incorporada e incorporante) – e não pelas administrações das próprias sociedades incorporada e incorporante.

51. Por isso, na cisão-fusão ou fusão a sociedade cindida/incorporada/fusionada nunca “decide transmitir” benefícios fiscais à sociedade incorporante ou a quem quer que seja – não ocorre uma alienação de benefícios fiscais entre as sociedades envolvidas.

52. Acresce que a “contabilização” da criação líquida de postos de trabalho foi feita aquando da constituição do direito benefício, quando as sociedades incorporadas ainda não tinham sido fundidas, quando ainda tinham personalidade e individualidade jurídico-tributária.

53. Ou seja, o cômputo da criação líquida de postos de trabalho, designadamente a diferença/saldo positivo/líquido entre entradas e saídas de trabalhadores, como se retira dos sinais dos autos e da factualidade provada, foi feito aquando da constituição do direito ao benefício, quando cada uma das sociedades ainda exista juridicamente,

54. e esse cômputo foi feito de forma individualizada, por cada uma das 5 sociedades envolvidas (incorporante e 4 incorporadas), naquele preciso momento/instante.

55. Por conseguinte, o douto Acórdão recorrido equivoca-se quando pressupõe que o contrato de trabalho tem de vigorar durante 5 anos.

56. Não é o caso, como se retira do teor artigo 17.º do EBF, na redacção em vigor à data dos factos (2004).

57. Aliás, no caso das fusões, os contratos de trabalho mantêm-se, como se disse – apenas se substituindo a posição jurídica da entidade empregadora, mantendo o trabalhador todos os seus direitos, designadamente diuturnidades e antiguidade.

58. Ou seja, não se verifica qualquer cessação de contrato de trabalho, como parece pressupor o douto Acórdão recorrido.

59. Com efeito, nos casos de fusão, as posições jurídicas das sociedades fusionadas/incorporadas nos contratos/relações jurídicas de trabalho (enquanto sociedades empregadoras/entidades patronais), passam a ser ocupadas pela sociedade incorporante.

60. Ou seja, verifica-se uma “substituição "ope legis" da pessoa do empregador”, como bem se afirma no douto Acórdão do STJ, de 30.06.1999, Processo 98S390, in www.dgsi.pt.

61. Além disso, in casu não estamos perante uma situação em que 2 sociedades (incorporada e incorporante) usufruem duplamente do benefício em causa relativamente ao mesmo trabalhador.

62. Com efeito, o benefício nasceu na esfera da sociedade incorporada, num dos sobreditos exercícios, aquando da criação de emprego (1999, 2000, 2002, 2002, 2003 ou 2004, consoante os casos), e essa mesma sociedade teria direito de usufruir das vantagens fiscais previstas na lei nos 5 exercícios seguintes.

63. Simplesmente, no decurso desses 5 exercícios (de usufruição das vantagens legais associadas ao benefício fiscal, como prevê a lei), a sociedade em cuja esfera foi criado o emprego elegível foi incorporada na Impugnante/Recorrente,

64. e esta limitou-se a usufruir desses benefícios pelo período remanescente (daqueles 5 exercícios), em substituição da sociedade incorporada.

65. Com efeito, se não tivesse havido cisão-fusão ou fusão, a sociedade incorporada poderia sempre usufruir dessas vantagens fiscais no decurso daqueles 5 exercícios subsequentes.

66. Por conseguinte, o douto Acórdão recorrido, salvo o devido respeito, padece de erro de julgamento e violação das sobreditas normas e princípios legais.

Por outro lado,

67. Contrariamente ao entendimento do douto Acórdão recorrido, não há lugar a qualquer “ajuste proporcional” ao “limite máximo da majoração anual” nos exercícios do início ou do fim do período de fruição do benefício fiscal, sempre que essas datas não coincidam com o início ou o fim do exercício económico.

68. Com efeito, do disposto no artigo 17.º do EBF não se extrai a necessidade de qualquer ajuste proporcional no cálculo daquele limite máximo nas referidas circunstâncias,

69. O artigo 17.º n.º 1 do EBF deve ser interpretado segundo as regras gerais e especiais de interpretação e aplicação das leis sobre benefícios fiscais.

70. Assim, e nos termos do artigo 9.º do EBF, as normas que estabelecem benefícios fiscais não são susceptíveis de integração analógica, embora admita interpretação extensiva.

71. Essa “integração analógica” já é vedada no artigo 11.º n.º 4 da LGT, uma vez que o artigo 17.º do EBF é norma tributária abrangida pela reserva de lei da Assembleia da República (princípio da legalidade em sentido formal; cfr. artigo 103.º n.º 2 e 3 da CRP).

72. E é vedada por se tratar de norma excepcional, na medida em que, enquanto norma de benefício fiscal, obvia à regra geral, que é a da tributação (artigo 11.º do CC, ex vi do artigo 11.º da LGT).

73. Por outro lado, aquela admitida interpretação extensiva vai naturalmente no sentido de estender os benefícios fiscais, vai no sentido de abranger mais situações de benefício fiscal para além daquelas que de imediato decorrem da literalidade da norma sobre benefícios fiscais (por ser essa a intenção do legislador ou a “ratio” do preceito).

74. E não no sentido de “encurtar” a abrangência e quantificação do benefício.

75. No mesmo sentido (extensão dos benefícios fiscais) vai o disposto no artigo 10.º do EBF, segundo o qual as normas que alterem BF temporários não são aplicáveis aos contribuintes que já aproveitem do direito ao benefício fiscal, “em tudo o que os prejudique”, salvo quando a lei dispuser o contrário.

76. Com efeito, o legislador, no artigo 9.º do EBF, não admite uma interpretação das normas sobre benefícios fiscais que não tenha um mínimo de correspondência com a letra da lei.

77. Conforme, aliás, exige o artigo 9.º n.º 2 do CC, por remissão do artigo 11.º da LGT: “Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso”.

78. Nos termos do artigo 103.º nº. 2 da CRP, os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes.

79. Assim, está constitucionalmente consagrado o princípio da legalidade tributária.

80. Da conjugação daquele artigo 103.º n.º 2 da CRP com artigo 165.º n.º 1 alínea i) da CRP resulta a imposição de que os impostos sejam criados por lei parlamentar ou decreto-lei autorizado,

81. impondo também que a lei fixe os elementos essenciais do tributo – incidência, taxas, benefícios fiscais e garantias dos contribuintes – com clareza e completude.

82. O princípio da legalidade tributária não se compadece com a “delegação” do âmbito dos benefícios fiscais em acto administrativo ou em apreciação discricionária,

83. pois exige que as leis sobre benefícios fiscais sejam votadas pelo Parlamento democraticamente eleito e que essas leis fixem os elementos essenciais dos impostos, designadamente os benefícios fiscais, com a densidade suficiente para garantir a segurança dos contribuintes.

84. Ou seja, o princípio da legalidade tributária desdobra-se não apenas na exigência formal da lei parlamentar em matéria fiscal, como também numa exigência de tipicidade ou determinabilidade da lei de imposto, que constitui a sua expressão material.

85. A reserva de lei sairia frustrada se o Parlamento definisse os elementos essenciais dos impostos, designadamente o âmbito dos benefícios fiscais, através de fórmulas abertas ou se remetesse a sua concretização para juízos casuísticos ou discricionários.

86. Por isso, o respeito pela reserva de lei exija que os elementos essenciais do imposto, designadamente os benefícios fiscais, sejam densificados por lei parlamentar – garantindo, deste modo, segurança e previsibilidade.

87. A lei e só a lei define os elementos essenciais do imposto — entre eles os benefícios fiscais.

88. E define-os em termos que seja possível ao contribuinte prever, com razoável segurança, o valor dos benefícios fiscais a que tem direito.

89. O princípio da legalidade tributária está igualmente consagrado no artigo 8.º da LGT.

90. De acordo com o princípio da legalidade tributária, os elementos integrantes da norma tributária devem ser de tal modo precisos e determinados na sua formulação legal que o órgão de aplicação do direito não possa introduzir critérios subjectivos de apreciação da sua aplicação concreta.

91. Verifica-se, pois, na norma tributária o fenómeno da tipicidade fechada – elevado grau de determinação conceitual ou de fixação do conteúdo –, e que se opõe à existência de normas «incompletas», «elásticas» ou «de borracha», como alguns as designaram.

92. Ora, contrariamente ao pressuposto no douto Acórdão recorrido, do artigo 17.º do EBF não se extrai a necessidade de qualquer ajuste proporcional do limite máximo de majoração anual do benefício fiscal nos exercícios do início ou do fim do período de fruição do benefício fiscal (sempre que essas datas não coincidam com o início ou o fim do exercício económico).

Assim,

93. Salvo o devido respeito, o douto Acórdão recorrido padece de erro de julgamento e violação das sobreditas disposições legais.

Nestes termos, nos melhores de Direito e com o douto suprimento de V. Exas., verificando a existência das oposições de Acórdãos acima alegadas, revogando o douto Acórdão recorrido e substituindo-o por outro que, decidindo as questões controvertidas, julgue a Impugnação integralmente procedente, com as legais consequências, V. Exas., como sempre, farão inteira JUSTIÇA».

1.2 A AT não contra-alegou.

1.3 Dada vista ao Ministério Público, o Procurador-Geral-Adjunto neste Supremo Tribunal emitiu parecer no sentido de que deverá tomar-se conhecimento do recurso quanto às duas questões suscitadas, que deverão ser decidida em conformidade com os acórdãos fundamento. Isto, após enunciar os requisitos da admissibilidade do recurso e considerar que se verifica a identidade de situações de facto requerida para que se considere haver contradição sobre a mesma questão fundamental de direito entre o acórdão recorrido e os acórdãos fundamento, com a seguinte fundamentação:

«[…] somos a entender, salvo melhor, ser de acolher a posição plasmada no 1.º Acórdão Fundamento no sentido de que o benefício fiscal atribuído à sociedade a incorporar não é afectado após incorporação resultante de fusão.
Salvo melhor, afigura-se-nos que in casu o benefício fiscal permanece vigente na nova realidade societária.
A proibição constante do citado art. 13.º do EBF (na redacção coeva) não afectará, a nosso ver, tal permanência do benefício anteriormente atribuído à sociedade incorporada na medida em que não estará em causa uma transmissão propriamente dita e ainda porque não se trataria aqui de uma transmissão “inter vivos”.
No que respeita à questão do eventual excesso no cálculo do benefício, vimos já que o Acórdão Recorrido pugna pela “restrição” do limite máximo da majoração na parte proporcional correspondente ao tempo de duração do contrato de trabalho nos exercícios do início e do termo do mesmo, quando este se inicia ou termina no decurso do exercício fiscal.
Pode ler-se no Acórdão Recorrido:
«Um período de cinco anos a contar de determinado dia é, em linguagem denotativa e comum, um período que começa nesse determinado dia (não no início do ano em que se situe esse determinado dia) e termina no mesmo dia do quinto ano posterior.
Esta semântica, quanto ao dies ad quod, foi assumida pelo Direito, para excluir quaisquer dúvidas, quando, no artigo 279.º n.º 1 al. c) do CC, aplicável ex vi artigo 296.º do mesmo código, se dispõe que: “o prazo fixado em semanas, meses ou anos, a contar de certa data, termina às 24 horas do dia que corresponda, dentro da última semana, mês ou ano, a essa data; mas, se no último mês não existir dia correspondente, o prazo finda no último dia desse mês”.
Assim, a AT, ao considerar, quanto aos exercícios de início e do termo do período de cinco anos de vigência do benefício correspondente a cada contrato, apenas a parte do ano desses exercícios compreendida no período de cinco anos iniciado com o início de vigência do contrato de trabalho respectivo e o semelhante dia do quinto ano posterior, não fez qualquer interpretação restritiva, ou correctiva, do artigo 17.º n.º 3 do EBF e muito menos uso de qualquer discricionariedade a coberto de uma quejanda interpretação, pelo que fica prejudicada toda a argumentação da recorrente, subjacente à presente questão».

ESTATUTO DOS BENEFÍCIOS FISCAIS
Artigo 17.º
(Criação de empregos para jovens)
(redacção resultante da Lei 32-B/2002, de 30/12)
«1- Para efeitos do imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (IRC), os encargos correspondentes à criação líquida de postos de trabalho para trabalhadores admitidos por contrato sem termo com idade não superior a 30 anos são levados a custo em valor correspondente a 150%.
2- Para efeitos do disposto no número anterior, o montante máximo da majoração anual, por posto de trabalho, é de 14 vezes o salário mínimo nacional mais elevado.
3- A majoração referida no n.º 1 tem lugar durante um período de cinco anos a contar do início da vigência do contrato de trabalho».
Diversamente, o 2.º Acórdão Fundamento vem dizer que «da norma em questão retira-se que o prazo de 5 anos se pode reflectir em 6 exercícios económicos, sempre que o início do contrato de trabalho não coincida com o início do exercício fiscal, mas nada nos permite inferir que a vontade do legislador fosse a de restringir, proporcionalmente, o limite máximo da majoração nos casos em que o trabalhador não trabalhe o ano fiscal completo quando celebra o contrato de trabalho, tal como nos casos em que se completam os cinco anos de vigência do contrato antes do final do exercício fiscal respectivo».
O que aqui está em causa é saber se o limite máximo da majoração anual estabelecido no art. 17.º do EBF se deverá aplicar em absoluto ou, ao invés, se deve aplicar proporcionalmente, por referência ao período de vigência do contrato que está subjacente à concessão do benefício fiscal.
Como referido no Acórdão Fundamento, «tal visão hermenêutica da norma, tal como de outras versões posteriores, foi expressa em jurisprudência recente do Pleno deste Tribunal e Secção, a qual sufragamos: “As regras da hermenêutica das normas legais tributárias (que são as do art. 9.º do CC, ex vi do n.º 1 do art. 11.º da LGT) não consentem que do art. 19.º do EBF se extraia o sentido de que, nos casos em que os contratos de trabalho elegíveis à luz do referido artigo cessem ou se iniciem durante o período de tributação, o limite máximo da majoração prevista no n.º 1 deva ser restringido proporcionalmente ao tempo de vigência dos contractos” (cfr. ac. S.T.A. - Pleno da 2.ª Secção, 8/05/2019, rec. 1054/17.6BALSB; ac. S.T.A. - Pleno da 2.ª Secção, 8/07/2020, rec. 568/17.2BALSB; ac. S.T.A. - 2.ª Secção, 7/09/2022, rec.1845/09.1BELRS)».
Assim, aderindo à posição expressa no 2.º Acórdão Fundamento, pronunciamo-nos no sentido da não admissão legal de qualquer ajuste proporcional ao limite máximo da majoração anual nos exercícios do início ou do fim do período de fruição do benefício fiscal, sempre que essas datas não coincidam com o início ou o fim do exercício económico».

1.4 Cumpre apreciar e decidir, em conferência, no Pleno desta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.


* * *
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 DE FACTO

2.1.1 O acórdão recorrido efectuou o julgamento da matéria de facto nos seguintes termos:

«1) Por escritura pública de 28 de Dezembro de 2000, foi realizada uma operação de cisão-fusão, no âmbito da qual a B..., S.A. (B...) destacou o seu património afecto à actividade industrial de fabricação de F..., para incorporação na sociedade G..., S.A. (actualmente designada “A..., S.A.”, ora impugnante) – facto não controvertido e cfr. documento 1 junto com a reclamação graciosa, de fls. 25 a 39 do processo administrativo de reclamação graciosa;

2) Os efeitos contabilísticos e fiscais da operação referida em 1) reportam-se à data de 1 de Julho de 2000 e, por efeito da mesma, 160 trabalhadores da B... passaram a integrar os quadros da impugnante – facto não controvertido e cfr. documentos 1 e 2 juntos com a reclamação graciosa, de fls. 25 a 39 e 40 a 43 do processo administrativo de reclamação graciosa;

3) Por escritura pública de 3 de Dezembro de 2003, foi realizada uma operação de cisão-fusão, no âmbito da qual a C..., S.A. destacou o seu património afecto à actividade de compra e armazenamento de madeira, para incorporação na aqui impugnante – facto não controvertido e cfr. documento 3 junto com a reclamação graciosa, de fls. 44 a 51 do processo administrativo de reclamação graciosa;

4) Os efeitos contabilísticos e fiscais da operação referida em 3) reportam-se à data de 1 de Julho de 2003 e, por efeito da mesma, 7 trabalhadores da C... passaram a integrar os quadros da impugnante – facto não controvertido e cfr. documentos 3 e 4 juntos com a reclamação graciosa, de fls. 44 a 51 e 52 a 53 do processo administrativo de reclamação graciosa;

5) Por escritura pública de 29 de Outubro de 2004, foi realizada uma operação de fusão, no âmbito da qual a D..., S.A. (D...) e a E... S.A. (E...), foram incorporadas na impugnante – facto não controvertido e cfr. documento 5 junto com a reclamação graciosa, de fls. 54 a 59 do processo administrativo de reclamação graciosa;

6) Os efeitos contabilísticos e fiscais da operação referida em 5) reportam-se à data de 1 de Abril de 2004 e, por efeito da mesma, 74 trabalhadores da D... e 28 da E... passaram a integrar os quadros da impugnante – facto não controvertido e cfr. documentos 5 e 6 juntos com a reclamação graciosa, de fls. 54 a 59 e 60 a 62 do processo administrativo de reclamação graciosa;

7) Na sequência da referida operação de fusão, a impugnante apresentou, em 28 de Dezembro de 2004, um requerimento a solicitar a autorização do Ministério das Finanças para deduzir aos seus lucros tributáveis os prejuízos fiscais das sociedades fundidas (D... e E...) – facto não controvertido e cfr. documento 7 junto com a reclamação graciosa, de fls. 63 a 67 do processo administrativo de reclamação graciosa;

8) O requerimento referido na alínea precedente foi deferido pelo SEAF por ... o n.º 729/20..., de 29 de Julho de 2005, estabelecendo-se um plano de dedução de prejuízos – facto não controvertido e cfr. documento 7 junto com a reclamação graciosa, de fls. 63 a 67 do processo administrativo de reclamação graciosa;

9) Todas as referidas operações de cisão-fusão e de fusão foram realizadas sob o regime da neutralidade fiscal – facto não controvertido;

10) Em 31 de Maio de 2005, a impugnante procedeu à entrega da declaração modelo 22 de IRC referente ao exercício de 2004, tendo apurado um lucro de € 10.584.709,66 – facto não controvertido, cfr. documento 8 junto com a reclamação graciosa, de fls. 68 a 72 do processo administrativo de reclamação graciosa;

11) Em 25 de Outubro de 2005, a impugnante procedeu à entrega de uma declaração de substituição da declaração modelo 22 do exercício de 2004 – facto não controvertido e cfr. documento 9 junto com a reclamação graciosa, de fls. 73 a 77 do processo administrativo de reclamação graciosa;

12) A impugnante não inscreveu qualquer valor no campo 234 do quadro 07 da declaração modelo 22 de IRC de substituição – facto não controvertido e cfr. informação constante de fls. 223 do processo administrativo de reclamação graciosa;

13) Nos cinco anos anteriores, a impugnante não usufruiu do benefício fiscal previsto no artigo 17.º do EBF – facto não controvertido e cfr. informação constante de fls. 223 do processo administrativo de reclamação graciosa;

14) No âmbito de uma revisão interna aos procedimentos adoptados, a impugnante apercebeu-se que, no apuramento do lucro tributável do exercício de 2004, não considerou o benefício fiscal previsto no artigo 17.º do EBF que pode ser usufruído por um período de cinco anos a contar do início do contrato de trabalho – facto não controvertido, cfr. informação constante de fls. 216 do processo administrativo de reclamação graciosa;

[(Este número tem a redacção que lhe foi dada pelo Tribunal Central Administrativo Norte no uso dos poderes que lhe são conferidos pelo art. 662.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (cfr. fls. 32/33 do acórdão recorrido).)] 15) A Impugnante constatou também que nos anos 1999, 2000, 2001 e 2003 as sociedades cindidas/fundidas e fundidas antes referidas haviam admitido trabalhadores em condições de usufruírem do benefício fiscal previsto no artigo 17.º do EBF – facto não controvertido

16) A impugnante apurou um valor de majoração de € 1.109.440,20 a deduzir ao resultado líquido do exercício de 2004, em resultado do cálculo do referido benefício fiscal (por si não utilizado), correspondente a este exercício, o qual inclui a consideração do benefício fiscal decorrente da criação líquida de emprego para jovens apurado nas empresas B..., C... (sociedades cindidas), D... e E... (sociedades fundidas), nos exercícios de 1999 a 2004 – facto não controvertido e cfr. informação constante de fls. 223 do processo administrativo de reclamação graciosa;

17) Em 31 de Maio de 2006, a impugnante apresentou reclamação graciosa relativamente à autoliquidação de IRC, respeitante ao exercício de 2004, na qual concluiu que, com referência a tal exercício, pagou um montante de IRC e de derrama em excesso, no montante de € 659.405,59, por não ter deduzido o montante de € 1.109.440,20 de que deveria ter beneficiado pelo regime da criação líquida de emprego para jovens, prevista no artigo 17.º do EBF – cfr. documento de fls. 1 a 109 do processo administrativo de reclamação graciosa;

18) Na reclamação graciosa referida na alínea precedente, a impugnante formulou os seguintes pedidos:
«(…) Nestes termos, e nos demais de direito, vem a A..., S.A. solicitar que:
- seja atendida a presente reclamação graciosa relativamente à autoliquidação de IRC, respeitante ao exercício de 2004;
- seja considerada a dedução do montante de € 1.109.440,20 (um milhão, cento e nove mil, quatrocentos e quarenta euros e vinte cêntimos) de que a ora reclamante deveria ter beneficiado, pelo regime da criação líquida de emprego para jovens, prevista no artigo 17.º do EBF, mas que, pelos motivos acima enunciados, não foi considerado no campo 234 da Declaração de Rendimentos (Modelo 22) do exercício fiscal de 2004;
- seja aceite a dedução do montante de € 40.334,93 (quarenta mil, trezentos e trinta e quatro euros e noventa e três cêntimos) de que a requerente deveria ter beneficiado, pelo regime dos incentivos fiscais à interioridade, previsto no artigo 8.º da Lei 171/99, mas que, pelos motivos acima enunciados, não foi considerado no campo 234 da Declaração de Rendimentos (Modelo 22) de IRC da referida sociedade do exercício fiscal de 2004;
- seja ajustado o valor de prejuízos fiscais deduzido, no exercício de 2004, para o montante de € 1.477.412,08 (um milhão, quatrocentos e setenta e sete mil, quatrocentos e doze euros e oito cêntimos), tomando em consideração o plano específico de dedução fixado no ... n.º 729/20..., de 29 de Julho de 2005 do SEAF; ficando o remanescente reportável para exercícios seguintes;
- seja aceite a dedução à colecta de 2004, do valor de € 1.626.250,05 (um milhão, seiscentos e vinte e seis mil, duzentos e cinquenta euros e cinco cêntimos), reportado do exercício de 2003, referente ao crédito fiscal associado ao contrato celebrado com o IAPMEI;
- seja aceite a dedução à colecta de imposto de 2004, do montante de € 363.130,56 (trezentos e sessenta e três mil, cento e trinta euros e cinquenta e seis cêntimos), referente ao benefício fiscal relativo à realização de despesas de I&D, previsto no DL 292/97, de 22 de Outubro;
- lhe seja considerado como reportável para exercícios seguintes, o montante remanescente do benefício fiscal relativo à realização de despesas de I&D, previsto no DL 292/97, de 22 de Outubro, pelo valor de € 15.691,58 (quinze mil, seiscentos e noventa e um euros e cinquenta e oito cêntimos), por insuficiência de colecta apurada em 2004;
- lhe seja restituído o IRC e derrama pagos em excesso no valor de € 659.405,59 (seiscentos e cinquenta e nove mil, quatrocentos e cinco euros e cinquenta e nove cêntimos), referente ao exercício de 2004.
(…)» – cfr. documento de fls. 1 a 109 do processo administrativo de reclamação graciosa;

19) No âmbito da análise da reclamação graciosa, em 20 de Novembro de 2007, a Divisão de Inspecção Tributária I, da Direcção de Finanças de Viseu emitiu “INFORMAÇÃO”, da qual se extrai o seguinte:
«(…)
II - ANÁLISE DA SITUAÇÃO
1- DA RECLAMAÇÃO EM GERAL
Após análise aos elementos apresentados conjuntamente com a reclamação, bem como dos solicitados ao contribuinte, nomeadamente cópias de contratos de trabalho sem termo e prova da criação líquida de postos de trabalho, para além dos disponíveis no sistema informático (SI), cumpre-nos informar o seguinte:
> A primeira declaração modelo 22, referente a 2004, foi entregue, dentro do prazo, tendo sido entregue em Outubro de 2005 declaração de substituição, com um lucro tributável de € 10.584.709,66;
> Relativamente a este exercício não foi utilizada a possibilidade de dedução de quaisquer benefícios fiscais a que teria direito;
> Foram incorporadas na reclamante, parte do património da B..., após cisão para esse fim, a C..., a D... e a E... com neutralidade fiscal ao abrigo dos arts. 67.º, 68.º e 69.º do CIRC com todos os direitos e obrigações inerentes a essas operações.
2- DO BENEFÍCIO FISCAL À CRIAÇÃO LÍQUIDA EMPREGO PARA JOVENS - ART. 17.º ESTATUTO BENEFÍCIOS FISCAIS (EBF)
2.1 Enquadramento legal
2.1.1 - Preceitos legais
2.1.1.1 - Art. 17.º EFB
- O art. 17.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), veio criar um benefício fiscal para os sujeitos passivos que procedem à criação líquida de postos de trabalho.
• Aplicação da lei no tempo
A redacção dada ao art. 17.º do EBF, pelo Dec-Lei n.º 198/01 de 03/07, aplicada ao caso em concreto, era a seguinte:
1- Para efeitos do imposto sobre o rendimento das pessoas colectiva (IRC), os encargos correspondentes à criação líquida de postos de trabalho para trabalhadores admitidos por contrato sem termo com idade não superior a 30 anos são levados a custo em valor correspondente a 150%.
2- Para efeitos do disposto no número anterior, o montante máximo dos encargos mensais, por posto de trabalho, é de 14 vezes o salário mínimo nacional mais elevado.
3- A majoração referida no n.º 1 tem lugar durante um período de cinco anos a contar do início do contrato de trabalho.
Em resumo, os requisitos estabelecidos neste artigo, são:
a) Criação líquida de postos de trabalho
b) Contratação de trabalhadores através de contratos sem termo, e
c) Idade não superior a trinta anos
2.1.1.2 - Despacho Ministerial de 05/03/99
A seguir se transcreve o teor do referido Despacho:
1. A criação líquida de postos de trabalho corresponde à diferença positiva entre o número de contratações efectuadas e o número de saídas num exercício.
2. Só contam os trabalhadores com idade não superior a 30 anos, fazendo-se a respectiva aferição no final de cada exercício.
3. Entende-se que para os efeitos do n.º 2 do art. 48-A do EBF” (correspondente ao actual art. 17.º após a revisão do articulado no EBF, efectuada pelo Dec-Lei n.º 198/01 de 03/07), “o montante máximo dos encargos por posto de trabalho não pode exceder.... isto é, 14 vezes o ordenado mínimo nacional mais elevado, ... .
4. Os “encargos”, a considerar limitam-se ao vencimento bruto ou ilíquido (onde se incluirá o IRS suportado pelo trabalhador mas pago pela entidade patronal) e os encargos sociais obrigatórios (contribuição para a segurança social obrigatoriamente suportados pela entidade patronal). Não se consideram encargos, as despesas com formação e as despesas com computadores e outros meios informáticos, secretários, cadeiras, etc.
Assim, criação líquida de postos de trabalho corresponde à diferença positiva entre o número de contratações e demissões de trabalhadores com idade não superior a trinta anos aferidas no final de cada exercício.
2.1.1.3 - Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 11/10/2006 Proc. N.º 723/06
A criação líquida de postos de trabalho e o incentivo à criação de emprego para jovens, foi objecto de acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, nomeadamente o acórdão proferido no processo 723/06 de 11/10 de 2006, retirando-se deste acórdão, a decisão que, seguidamente, se transcreve:
O incentivo à criação de emprego para jovens, previsto no art. “48. °-A do Estatuto dos Benefícios Fiscais, na redacção introduzida pela Lei n. ° 72/98 de 3 de Novembro (a que corresponde o artigo 17.“ na redacção de 2001) só é atribuído quando houver “criação líquida de postos de trabalho para trabalhadores admitidos por contrato sem termo com idade não superior a 30 anos”, o que pressupõe aumento do número global de trabalhadores da empresa admitidos com contrato sem termo com idade não superior a 30 anos em determinado exercício.”
2.2 - Síntese
Face aos elementos antes referidos pode-se concluir que a empresa apenas pode usufruir do benefício se:
- Existir criação líquida de postos de trabalho para trabalhadores com idade não superior a trinta anos e
- Tiverem sido admitidos por contratação sem termo.
Do exposto anteriormente, podemos concluir que o incentivo à criação de emprego para jovens, previsto no referido art. 17.º do EBF só poderá ser usufruído por contribuintes que preencham simultaneamente as condições acima enumeradas, a saber:
Criação líquida de postos de trabalho para trabalhadores admitidos por contrato sem termo e com idade não superior a 30 anos.
2.3 - Análise efectuada
2.2.1 - Contratações efectuadas
> Para verificação dos requisitos, no ponto anterior enumerados, foram consultados os elementos constantes no Sistema Informático (SI), bem como os remetidos pela reclamante, nomeadamente, mapas onde constam os trabalhadores admitidos, passagem a efectivos e as demissões ocorridas em cada exercício (1999, 2000, 2001, 2002, 2003 e 2004), bem como todas as fotocópias dos contratos de trabalho.
> Nos exercícios anteriores a 2004, houve criação líquida de postos de trabalho, sendo que, nem todos os contratos revestiam a forma de contratos sem termo, conforme seguidamente se resume:
2001
Para efeitos de majoração em 2004, foram considerados pela reclamante, encargos referentes a oito trabalhadores admitidos em 2001. Destes:
• Três, (AA NIF ...38, BB NIF ...05 e CC NIF ...67), foram admitidos por contrato com termo certo, passando a efectivos nos exercícios seguintes. Assim, relativamente a estes trabalhadores não estão reunidos todos os requisitos necessários para a empresa poder usufruir do benefício em 2004, uma vez que é condição essencial a contratação inicial sem termo. A conversão de contrato com termo em contrato sem termo não consubstancia um aumento efectivo do número de trabalhadores, mas apenas a alteração do vínculo laboral.
• Quatro, (DD NIF ...88, EE NIF ...69, FF NIF ...82 e GG NIF ...62), embora admitidos com contrato com termo certo, passaram a efectivos antes de 31/12. Como a aferição dos postos de trabalho criados em cada exercício se reporta à data de 31 de Dezembro, nessa data já eram efectivos e, como tal, reuniam os requisitos para poderem ser considerados para efeitos do benefício fiscal em causa.
• Só um HH NIF ...04) foi admitido com contrato sem termo. (Anexo n.º 1)
2002
Dos 7 trabalhadores que a reclamante considerou para efeitos do beneficio, apenas dois (II NIF ...64 e JJ NIF ...50) foram contratados inicialmente com contrato sem termo.
Os restantes cinco, (KK NIF ...69, LL NIF ...01, MM NIF ...87, NN NIF ...79 e OO NIF ...06) embora admitidos com contrato com termo certo, passaram a efectivos antes de 31/12. Como a aferição dos postos de trabalho criados em cada exercício se reporta à data de 31 de Dezembro, nessa data já eram efectivos e, como tal. reuniam os requisitos para poderem ser considerados para efeitos do benefício fiscal em causa. (Anexo n.º 2)
2004
Relativamente ao trabalhador PP, NIF ...30, este foi admitido em 01/07/04, com contratado inicial sem termo. (Anexo n.º 3)
> Todos os outros trabalhadores foram admitidos com contratos de trabalho a termo certo, o qual (contrato de trabalho), foi objecto de renovações sucessivas, tendo passado a efectivos através de aditamentos ao contrato inicialmente celebrado, ou ainda por cessão de posição contratual. A título de exemplo anexamos cópia de alguns contratos, já que todos os restantes são em tudo idênticos, onde se pode confirmar o atrás referido. (Anexo n.º 4)
> Do SI, confirma-se que o vínculo laboral entre os trabalhadores e a empresa, já existia antes da sua passagem a efectivos, o que confirma a informação constante dos contratos de trabalho com termo certo.
> Com base em todos os elementos elaborou-se o quadro resumo que constitui o anexo n.º 5, onde constam os elementos referentes a cada trabalhador, nomeadamente nome, data nascimento, data de admissão e data da passagem a efectivo ou da cessão de posição contratual, bem como o valor dos encargos e respectivas majorações, considerados como benefício fiscal, pelo contribuinte.
2.4 - Conclusão
A simples transformação de contratos com termo certo em contratos sem termo, não consubstancia qualquer criação líquida de postos de trabalho no conceito definido no art. 17.º do EBF, uma vez que do próprio artigo, se retira que a criação líquida de postos de trabalho terá que ocorrer através de contratações sem termo.
Assim, o valor da majoração de € 1.109.440,20, reclamado pelo contribuinte em 2004, como benefício pela criação líquida de emprego para jovens, apenas será de aceitar o montante de € 183.017,55.
3 - DOS INCENTIVOS FISCAIS À INTERIORIDADE
> A ora reclamante possui as suas instalações fabris em três concelhos distintos ..., ... e ..., concelhos estes referenciados na Portaria n.º 1.647-A/2001 de 31/12, como áreas territoriais para poderem usufruírem dos benefícios consagrados na Lei n.º 171/99 de 18 de Setembro;
> Efectuou investimentos avultados, ultrapassando, em muito, os limites referidos no art. 8.º da referida Lei n.º 171/99, conforme imobilizado constante do Anexo A da declaração anual de 2003, tendo considerado como investimento elegível o montante de € 498.797,90;
> No mapa apresentado com os cálculos da respectiva majoração, foram incluídos bens, que não constam dos mapas de reintegrações do imobilizado declarado no anexo A da declaração anual de 2003.
> As reintegrações do imobilizado naquelas condições, ascendem a € 56.786,44 a que corresponde a majoração de € 17.035,93, pelo que não será de aceitar, como benefício, este montante.
> Em alguns bens do restante imobilizado, as taxas de reintegrações praticadas para efeitos de custos do exercício, são inferiores às que foram consideradas para efeitos de majoração, embora respeitem os limites estabelecidos no Decreto Regulamentar 2/90 de 12 de Janeiro, conforme se pode verificar por comparação dos mapas de reintegrações que fazem parte do dossier fiscal, que foi pedido, com o mapa apresentado na presente reclamação, fls. 72. Deste modo, não será de aceitar como benefício, a majoração de € 7.431,24.
> Assim, do total do benefício reclamado de € 40.334,93 apenas será de aceitar € 15.867,76, conforme anexo n.º 6 da presente informação.
4 - DO CONTRATO DE INVESTIMENTO E DE CONCESSÃO DE INCENTIVOS FINANCEIROS E FISCAIS
> O SP apresentou uma proposta de investimento junto do IAPMEI, actualmente Agência Portuguesa para o Investimento (API), a qual contemplava um incentivo fiscal de € 5.949.915,00, proposta essa que foi aceite.
> No entanto, por não terem sido cumpridas todas as cláusulas do contrato celebrado, aquele valor, sofreu uma diminuição de € 438.508,04, passando de € 5.949.915,00 para € 5.511.406,96, conforme anexo n.º 7.
> A reclamante deduziu pela primeira vez em 2002 o valor de € 1.754.709,81, podendo o remanescente de € 3.756.697,15, ser deduzido nos exercícios subsequentes, em função da colecta.
5 - DO INCENTIVO FISCAL À INVESTIGAÇÃO E DESENVOLVIMENTO
A reclamante apresentou candidatura à Agência de Inovação, nos termos do art. 4.º do Dec-Lei 292/97 de 22 de Outubro, em virtude de ter montantes elevados com despesas de investigação e desenvolvimento, candidatura essa que foi deferida pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, através da Comissão Certificadora para Incentivos Fiscais à I&D Empresarial (11” 210 de reclamação).
Assim, os custos elegíveis em 2003, ascenderam a € 1.894.110,68, aos quais corresponde um incentivo fiscal de € 378.822,14 (1.894.110,68 * 20%). Como nesse exercício, por insuficiência de colecta, não foi utilizado, a respectiva dedução poderá ocorrer nos exercícios seguintes.
Em 2004 deduziu apenas € 363.130,56, reportando para 2005 o remanescente de € 15.691,58.
Deste modo o montante a deduzir dependerá da existência ou não de colecta suficiente.
III - CONCLUSÕES
♦ Art. 17.º do EBF - Majoração dos encargos com criação líquida de emprego
Do montante reclamado relativamente a 2004, de € 1.109.440,20, como benefício à criação líquida de emprego, afigura-se-nos que apenas pode ser considerado o valor de € 183.017,55, uma vez que nem todos os trabalhadores reúnem os requisitos do art. 17.º do EBF.
♦ Art. 8.º da Lei n.º 171/99 de 18 de Setembro - majoração de reintegrações
Do valor reclamado de € 40.334,93, apenas será de aceitar, como majoração do valor das reintegrações, o montante de € 15.867,76, conforme anexo n.º 6 da presente informação.
♦ Contrato de investimento e de concessão de incentivos financeiros e fiscais
O valor concedido e confirmado pela API, ascende a € 5.511.406,96, tendo sido deduzido em 2002 o montante de € 1.754.709,81, podendo o remanescente de € 3.756.697,15 ser deduzido nos exercícios de 2003 e seguintes, em função do valor da colecta apurada.
Incentivo fiscal à investigação e desenvolvimento (I&D)
Os montantes reclamados pelo SP são de aceitar, até ao limite da colecta apurada após a dedução dos incentivos fiscais resultantes de contratos de investimento.
Em resumo:

Benefício Valor reclamado Valor aceite Valor não aceite
Art. 17.º EFB - Criação líquida emprego
1.109.440,20
183.017,55
926.422,65
Lei 171/99 - Incentivos à interioridade
40.334,93
15.867,76
24.467,17
Incentivos financeiros e fiscais Em função da colecta
0
I&D Em função da colecta
0

É o que me cumpre informar.
À consideração superior.”
Viseu, 20 de Novembro de 2007
– cfr. documento de fls. 221 a 233 do processo administrativo de reclamação graciosa;

20) Com base na informação referida na alínea precedente, em 13 de Dezembro de 2007, o Chefe de Divisão de Justiça Tributária da Direcção de Finanças de Viseu propôs o deferimento parcial da reclamação graciosa e ordenou a notificação da reclamante para exercer o direito de audição prévia – cfr. documento de fls. 254 e 255 do processo administrativo de reclamação graciosa;

21) Através do ofício n.º ...2, de 13 de Dezembro de 2007, a impugnante foi notificada para, querendo, exercer o direito de audição sobre o projecto de deferimento parcial da reclamação graciosa, no prazo de 10 dias – cfr. documento de fls. 256 e 257 do processo administrativo de reclamação graciosa;

22) Decorrido o prazo referido na alínea precedente, a impugnante não exerceu o direito de audição prévia – facto não controvertido e cfr. informação constante de fls. 258 do processo administrativo de reclamação graciosa;

23) No dia 8 de Janeiro de 2008, o Chefe de Divisão de Justiça Tributária da Direcção de Finanças de Viseu proferiu despacho de deferimento parcial da reclamação graciosa – cfr. documento de fls. 258 do processo administrativo de reclamação graciosa;

24) No dia 9 de Janeiro de 2008, a impugnante foi notificada da decisão final de deferimento parcial da reclamação graciosa – cfr. documento de fls. 259 a 261 do processo administrativo de reclamação graciosa;

25) Em 7 de Fevereiro de 2008, a impugnante interpôs recurso hierárquico da decisão de deferimento parcial proferida relativamente à reclamação graciosa, formulando, a final, o seguinte pedido:
(...) Nestes termos requer-se a V. Exa., respeitosamente, se digne conceder provimento ao presente recurso hierárquico e revogar o despacho recorrido, no segmento em que indefere o benefício fiscal da criação líquida de postos de trabalho e o incentivo fiscal à interioridade, aceitando-se pelos valores reclamados, com as legais consequências” – cfr. documento de fls. 2 e seguintes do processo administrativo de recurso hierárquico;

26) Em 8 de Junho de 2010, a Direcção de Serviços do IRC, na análise do recurso hierárquico, emitiu a seguinte informação:
Da reclamação graciosa” apresentada em 31.05.2006
• Em 31.05.2005 a recorrente procedeu à entrega da declaração mod. 22 do exercício de 2004. Em 25.10.2005 procedeu à entrega de uma declaração de substituição.
• No âmbito de uma revisão interna aos procedimentos adoptados, a recorrente apercebeu-se que no apuramento do lucro tributável do exercício de 2004 não considerou o benefício fiscal previsto no art. 17.º do EBF.
• A recorrente constatou que, também com referência aos exercícios de 1999, 2000, 2001, 2002 e 2003, havia admitido trabalhadores em condições de usufruírem do benefício.
• A recorrente pode aproveitar do benefício fiscal da criação líquida de emprego para jovens no valor de € 1.109.440,20, conforme cálculos no doc. 101.
• A criação líquida de postos de trabalho ocorrida nos exercícios de 1999 a 2003 nas empresas em causa:
Recorrente – A...

Entradas
Saídas
Criação líquida
1999
9
4
5
2000
16
14
2
2001
34
7
27
2002
27
4
23
2003
33
34
29
2004
9
5
4




B...
Entradas
Saídas
Criação líquida
2000
10
5
5



C...
Entradas
Saídas
Criação líquida
2003
1
5
\



D...
Entradas
Saídas
Criação líquida
2001
56
9
29
2002
19
10
8




E...
Entradas
Saídas
Criação líquida
2002
6
1
4



Do presente recurso hierárquico

Quanto ao benefício da criação líquida de postos de trabalho para jovens (artigo 17.º do EBF)
• Está em causa a criação líquida de emprego nos anos de 1999 a 2004, dentro dos condicionalismos do art. 17.º do EBF, por a Direcção de Finanças de Viseu ter considerado que não devem ser valoradas positivamente como “entradas”:
- As conversões de contratos de trabalho a termo em contratos de trabalho sem termo.
- As cessões (aquisições) de posições contratuais em contratos de trabalho sem termo.
• A DF Viseu exige que o trabalhador, à data da sua admissão, esteja na condição de desempregado, para que possa ser considerado na criação líquida de postos de trabalho.
• O despacho de indeferimento da reclamação padece de errada interpretação e aplicação do disposto no n.º 1 do art. 17.º EBF.
- Este preceito legal não exige a “condição de desempregado” do trabalhador, à data da sua entrada mediante contrato sem termo.
- Contrariamente ao que afirma a DF Viseu, o próprio n.º 1 do art. 17.º do EBF estabelece, ele próprio, os critérios a que deve obedecer a aferição da “criação líquida de postos de trabalho”. Não existe qualquer lacuna legislativa na matéria, muito menos a necessidade de apelar a conceitos oriundos de outros diplomas legais que nada têm a ver com benefícios fiscais, como é o caso do DL 34/96 de 18.04 inviabilizando a aplicação do benefício fiscal a situações, como sucede nos casos:
- da conversão de contratos de trabalho a termo em contratos de trabalho sem termo
- das cessões (aquisições) de posições contratuais em contratos de trabalho sem termo.
A forma de aferir o que é “criação líquida de postos de trabalho” é diferenciada, em função dos objectivos visados por cada um dos diplomas legais que recorrem a semelhante conceito. É ilegítimo “pegar” no conceito constante do n.º 2 do art. 7.º do DL 34/96 de 18.04, quando outros diplomas também contêm esse conceito: Portaria 170/2002 de 28.02; Portaria 196-A/2001 de 10.03; o actual art. 39.º-B do EBF e Lei 171/99 de 18.09.
O art. 17.º do EBF, contrariamente ao DL 34/96 de 18.04, tem âmbito de aplicação e objectivos distintos: visa, em especial, positivar a criação de situações de emprego estável, enquanto aquele outro visa positivar a criação de emprego para desempregados.
O art. 17.º do EBF não exclui “as situações em que o contrato de trabalho é pré-existente”, ou seja, as situações em que o trabalhador não está desempregado, quando é admitido sob contrato de trabalho sem termo.
Ao nível das entradas de trabalhadores por cessões (aquisições) de posição contratual em contratos de trabalho já existentes, importa ter em conta que, se na esfera da cessionária houve uma efectiva “entrada” de trabalhadores, na esfera da sociedade cedente houve, obviamente, uma saída de trabalhadores.
• A administração fiscal tem preconizado um entendimento diverso na matéria (informações n.ºs: ...02 e ...07 da DSIRC), pelo que em decorrência do princípio geral da boa fé, a AF está vinculada às orientações genéricas que a própria emite, sobre a interpretação das normas tributárias, não podendo adoptar posturas contraditórias.
• Ao nível da conversão dos contratos de trabalho a termo em contratos de trabalho sem termo, a DF Viseu preconiza, para determinar se houve criação líquida de postos de trabalho, a comparação entre a soma de trabalhadores (com idade não superior a 30 anos) contratados a termo ou sem termo e o número de trabalhadores contratados sem termo.
Ora, não se podem comparar ou estabelecer comparações entre “ordens de grandeza distintas”. Para efeitos de criação líquida de postos de trabalho, a diferença referida no art. 17.º do EBF só pode residir entre contratados sem termo.
• Por conseguinte, deveria ter sido admitida, na íntegra, a correcção à autoliquidação oportunamente reclamada.
3 - Informação sobre o recurso hierárquico da DF Viseu elaborada em 17.03.2008
Na informação, a fls. 589 a 592 dos autos de recurso, a Direcção de Finanças propõe a revogação parcial do despacho recorrido considerando “existir criação líquida de postos de trabalho”, para efeitos do disposto no artigo 17.º do EBF, quanto aos trabalhadores constantes da referida relação (anexo 3), com excepção dos identificados na informação complementar” ...
A mencionada informação complementar foi prestada pelos serviços de inspecção, em obediência ao despacho de 21.02.2008, a fls. 476 dos autos de recurso, que se transcreve:
Face ao entendimento da DGI, sancionado através da informação n.º ...07 da DSIRC, é considerada criação líquida de postos de trabalho a transformação de contrato com termo em contrato sem termo.
Assim, para que se possa aferir do benefício fiscal previsto no art. 17.º do EBF, é imprescindível saber se os funcionários que iniciaram funções com contrato a termo passaram a contrato sem termo, e em caso afirmativo desde quando.
Porque da informação prestada pelos serviços de inspecção tributária, conforme relação que se encontra anexa à mesma, constam funcionários onde não existe essa informação, vão os autos à DIT-I para que seja prestada informação complementar com esses elementos
Informação complementar da Divisão de Inspecção Tributária I (DIT I, elaborada em 04.03.2008, a fls. 477 a 484 dos autos de recurso
Nesta informação complementar, os serviços de inspecção vieram a informar, individualmente, a situação de cada um dos trabalhadores que passaram para a recorrente por cessão de posição contratual, conforme cópias dos contratos de trabalho juntas aos autos.
Segundo os Serviços a criação de postos de trabalho foi efectuada pela empresa cessante, pelo que a existir benefício seria esta a usufruí-lo, e que com a cessão de posição contratual, o benefício fiscal não se transmite para a empresa cessionária.
4 - Apreciação do recurso
A matéria recorrida analisada na presente informação incide sobre o benefício fiscal previsto no art. 17.º (actual 19.º) do EBF, cujos trabalhadores considerados pela recorrente elegíveis para efeitos do benefício e respectivos cálculos se encontram relacionados no Anexo 5 a fls. 248 a 251 dos autos de reclamação.
Verifica-se nesse anexo que em sede de reclamação graciosa apenas foi aceite a majoração dos encargos suportados com os trabalhadores relacionados no anexo 1 a fls. 234 e 235 dos autos de reclamação, resultando um benefício no valor de € 183 017,55.
Foi entendido que os restantes trabalhadores não reuniam os requisitos do art. 17.º (actual 19.) do EBF, por terem sido contratados a termo certo, tendo passado a efectivos através de aditamentos ao contrato inicialmente celebrado, ou ainda por cessão de posição contratual.
É informado em sede de reclamação que não estão reunidos todos os requisitos necessários para a empresa usufruir do benefício, uma vez que é condição essencial a contratação inicial sem termo. A conversão de contrato com termo em contrato sem termo não consubstancia um aumento efectivo do número de trabalhadores, mas apenas a alteração do vínculo laboral.
Basearam-se ainda os Serviços, no facto da jurisprudência se ter pronunciado no mesmo sentido, (acórdão do STA proferido no Proc. n.º 723/06).
Agora, e em face dos argumentos apresentados pela recorrente em sede de recurso, a Direcção de Finanças propõe a revogação parcial do despacho recorrido, considerando existir criação líquida de postos de trabalho para efeitos do disposto no art. 17.º (actual 19.º) do EBF, quanto aos trabalhadores constantes do referido Anexo 5, com excepção dos que passaram para a recorrente por cessão de posição contratual.
Os contratos de cessão de posição contratual em causa encontram-se a fls. 485 a 587 dos autos de recurso.
Da análise efectuada aos mesmos conclui-se que deverão ser considerados para efeitos do benefício fiscal em causa nos presentes autos.
É entendimento desta Direcção de Serviços que a criação líquida de postos de trabalho corresponde à diferença positiva entre o número de contratações efectuadas e o número de saídas num exercício, fazendo-se a respectiva aferição no final de cada exercício.
Sendo indiferente a forma de contratação, se por transferência ou não de outra entidade.
Nas condições impostas para as empresas usufruírem deste benefício fiscal nada é referido sobre a proveniência dos trabalhadores, sobre o modo como se opera a contratação, se inclui ou não direitos adquiridos. Não é exigida a condição de se tratar de um trabalhador sem relação contratual com o grupo empresarial em que a empresa esteja inserida.
É um facto que a legislação fiscal nesta matéria permitia que um grupo empresarial, recorrendo a transferência dos trabalhadores entre empresas, viesse a usufruir para o mesmo trabalhador do benefício para além dos 5 anos a contar da vigência do contrato de trabalho, prazo estabelecido no n.º 3 do art. 17.º (actual n.º 5 do art. 19.º) do EBF, desde que se verificassem os requisitos exigidos no n.º 1 do mesmo artigo e diploma.
Daí que o legislador através da Lei n.º 53-A/2006 de 29.12 viesse a alterar o art. 17.º (actual 19.º) do EBF e no seu n.º 6 refira o seguinte:
O regime previsto no n.º 1 só pode ser concedido uma vez em relação ao mesmo trabalhador, qualquer que seja a entidade patronal”.
Na realidade só a partir do exercício de 2007 a questão em análise constitui uma condição para aplicação do benefício fiscal.
Em face do exposto somos de opinião de que os contratos de cessão de posição contratual em causa constituem criação líquida de postos de trabalho.
Convém referir que no apuramento do benefício fiscal do exercício de 2004 a recorrente considera:
a) Os trabalhadores que constituíram criação líquida em exercícios anteriores nas empresas objecto de cisão-fusão e de fusão: B..., C..., D... e E....
Segundo a recorrente esses trabalhadores passaram a integrar os quadros da recorrente e as operações de cisão-fusão e de fusão observaram o regime de neutralidade fiscal, ao abrigo dos arts. 67.º e 68.º do CIRC.
Importa assim, analisar se é possível a transmissibilidade de benefícios fiscais em caso de fusão.
Considerar que a regra da sucessão universal do património que ocorre por efeito da fusão também incorpora a transmissão do direito aos benefícios fiscais é uma ideia que deve ser afastada peio facto de se estar perante uma relação jurídica de direito público que, em princípio, não é transmissível autonomamente por um acto inter-vivos entre particulares. Donde resulta que, não tendo as disposições do CIRC associado com efeito automático da fusão e de operações análogas a transmissão de benefícios fiscais e inexistindo qualquer dispositivo especial estabelecido no art. 17.º do EBF a estabelecer a sua transmissibilidade, a solução deste caso tem de ser encontrada no âmbito da disposição específica que o legislador reservou sobre esta matéria, a saber, o art. 15.º do EBF.
O princípio geral de intransmissibilidade inter vivos dos benefícios fiscais, por simples acto dos particulares, expressamente consagrado no n.º 1 do artigo 15.º do EBF, admite, porém, excepções, designadamente:
- Nos casos em que dos regimes jurídicos instituídos resulta claramente que estamos perante um direito inerente à propriedade de certo bem e dos respectivos rendimentos, em que a transmissão do benefício opera para o adquirente do bem, nos termos do n.º 2 do art. 15.º do EBF.
- Nos casos em que a lei fiscal expressamente o admita e nos termos aí estabelecidos.
- Nos casos em que a concessão do benefício tenha por fonte um contrato fiscal ou, ainda, quando se trate de actos de reconhecimento, nos termos estabelecidos no n.º 3 do art. 15.º do EBF.
Assim, quanto à transmissibilidade do benefício fiscal relativo ao art. 17.º do EBF, da sociedade incorporada para a sociedade incorporante, por não constituir um efeito automático associado ao regime especial de neutralidade das fusões, e na ausência de uma previsão expressa na norma que regula este benefício, é indispensável subsumir o benefício fiscal aos parâmetros prescritos no art. 15.º do EBF.
E, dada a natureza mista e automática do benefício fiscal em causa, as excepções consagradas nos n.ºs: 2 e 3 do art. 15.º do EBF ao princípio da intransmissibilidade inter vivos não lhe são directamente aplicáveis, dai resultando que o direito a efectuar a majoração prevista no art. 17.º do EBF, durante 5 anos após a criação líquida de postos de trabalho, não é transmissível da sociedade incorporada para a sociedade incorporante. no âmbito de uma fusão a que seja aplicável o regime especial do art. 67.º e seguintes do CIRC.
Este entendimento encontra-se vertido no Parecer n.º 100/09 de 15.12.2009 do Centro de Estudos Fiscais.
Deste modo no apuramento do benefício fiscal do exercício de 2004 a recorrente não pode considerar os trabalhadores que constituíram criação líquida em exercícios anteriores nas empresas B..., C..., D... e E....
b) As conversões de contratos de trabalho a termo em contratos de trabalho sem termo
Nas diversas informações proferidas por esta Direcção de Serviços tem sido entendido que uma vez que os contratos a termo certo não relevam para efeitos do art. 17.º (actual art. 19.º) do EBF quando estes se transformam em contratos sem termo, podem entrar para a aferição da criação líquida de postos de trabalho, desde que todos os outros requisitos de acesso ao benefício estejam preenchidos.
Já na informação n.º ...02 da DSIRC, havia sido proferido o seguinte entendimento:
No caso de contratações a termo se transformarem em contratos sem termo afigura-se-nos que serão de considerar para efeitos da criação líquida de postos de trabalho no exercício em que foi operada essa transformação, sendo de salientar que a idade do trabalhador não superior a 30 anos deverá verificar-se no exercício da transformação do contrato”.
Foram apresentadas pela recorrente listagens dos trabalhadores elegíveis para efeitos do benefício, com menção do respectivo nome, data de nascimento, data de passagem a efectivo e respectivos encargos susceptíveis de majoração. Assim como foram apresentados os movimentos de pessoal (entradas e saídas), com contratos sem termo e com idade não superior a 30 anos, encontrando-se evidenciado nos autos a criação líquida de postos de trabalho. Conforme fls. 190 a 197 dos autos de recurso.
Segundo a informação da Direcção de Finanças foram apresentados como meios de prova os contratos de trabalho, encontrando-se juntos aos autos apenas alguns.
Da análise efectuada aos elementos constantes dos autos afigura-se-nos que se verificam os pressupostos para a recorrente usufruir do benefício relativamente aos trabalhadores considerados elegíveis, excepto quanto aos trabalhadores considerados pela cisão-fusão da B... (cujo valor do benefício totaliza € 37 529,25 – fl. 192 dos autos de recurso); pela cisão-fusão da C... (QQ - valor do benefício € 21 920,87 - fl. 194 dos autos de recurso); pela fusão da D... (cujo valor total do benefício é de € 484 446,39 – fl. 196 dos autos de recurso) e pela fusão da E... (cujo valor total do benefício é de € 40 363,80 – fl. 197 dos autos de recurso).
Para além disso merece reparo os cálculos do benefício efectuados pela recorrente por não respeitarem integralmente o determinado nos n.ºs 1 e 2 do art. 17.º (n.ºs 1 e 3 do art. 19.º) do EBF.
Nos cálculos do benefício discordamos do facto da recorrente não ter atendido a que o prazo de 5 anos a que se refere o n.º 3 do art. 17.º (actual n.º 5 do art. 19.º) do EBF se pode reflectir em 6 exercícios económicos, sempre que o início do contrato de trabalho não coincide com o início do exercício económico, conforme entendimento expresso na ficha doutrinária extraída do proc. n.º 1498/2006.
Assim, de acordo com o entendimento proferido na informação n.º ...09 da DSIRC, deverá ser efectuado um ajuste do limite anual da majoração, conforme se transcreve:
No que respeita à criação líquida de postos de trabalho ocorrida posteriormente à entrada em vigor da alteração operada no n.º 2 do artigo 17.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF) - actual artigo 19.º, através da Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, entende-se que no exercício em que se verificar o início ou o fim das condições de elegibilidade do trabalhador para o benefício, o limite máximo da majoração anual deve ser ajustado proporcionalmente ao número de meses em que se mantiverem essas condições”.
No que respeita à criação líquida de emprego ocorrida após ../../2004, a recorrente não teve em consideração que o limite anual da majoração dos encargos (€ 5 118,40 - exercício de 2004) necessita de ser ajustado proporcionalmente aos meses em que o trabalhador esteve em condições de elegibilidade para o benefício.
Em face do referido entendimento, iremos proceder à correcção do cálculo do benefício evidenciado no quadro a fls. 195 dos autos de recurso:

Relativamente à empresa A... Admissões ou passagem a efectivos em 2004

Trabalhador Data de efectivo Tempo
majoração
Limite
majoração
Majoração
efectuada
Excesso
RR
21.10.04
2 meses e 10 dias
993,26
1 343,27
350,01
AA
14.01.04
11,5 meses
4 905,17
5 118,40
213,23
SS
01.07.04
6 meses
2559,18
5118,40
2 559,22
Total
3 122,46

5 - Conclusão
Merece provimento parcial o recurso hierárquico, relativamente à matéria recorrida analisada na presente informação, propondo-se a aceitação do valor do benefício fiscal na importância de € 339 039,88 (926 422,65 - 584 260,317 - 3 122,46).
6 - Direito de audição
Tendo em conta que a decisão ora tomada se baseia nos mesmos factos sobre que já foi o sujeito passivo notificado para exercer o direito de audição e, não tendo sido trazidos ao processo quaisquer dados novos é de dispensar nova audição nos termos do n.º 3 do art. 60.º da LGT e da alínea c) do n.º 3 do Cap. II do Circular n.º 13/99 de 8 de Julho.
À consideração superior,
DSIRC, 8 de Junho de 2010
cfr. documento de fls. 606 a 616 do processo administrativo de recurso hierárquico;

27) Com base na informação referida na alínea precedente, a Directora de Serviços do IRC proferiu despacho de deferimento parcial do recurso hierárquico – cfr. documento de fls. 602 do processo administrativo do recurso hierárquico;

28) A impugnante foi notificada da decisão final de deferimento parcial do recurso hierárquico – cfr. documento de fls. 617 e seguintes do processo administrativo de recurso hierárquico».

2.1.2 No primeiro dos acórdãos invocado como fundamento (acórdão do Supremo Tribunal Administrativo proferido em 13 de Abril de 2005 no processo 1265/04), considerou-se a seguinte factualidade (Permitimo-nos alterar a numeração dos factos provados.):

«1. A liquidação impugnada é relativa a Imposto de Selo sobre juros vencidos deste 22.01.92 até 02.01.95 do empréstimo n.º 939.90 contraído por «B…», N.I.P.C. …, com sede na Rua …, Tondela, junto do Banco de Fomento Exterior em 1991, no valor de Esc. 10.020.575$00 (inf. de fls. 27 do apenso);

2. Tem origem em acção de fiscalização realizada à escrita daquela sociedade, destinada à fiscalização das entidades candidatas aos benefícios fiscais previstos no Dec.-Lei n.º 161/87, de 6.04, tendo sido elaborado o relatório de fiscalização datado de 24.11.95 e junto a fls. 26 a 27 do apenso e que aqui se tem por reproduzido para todos os legais efeitos;

3. Da liquidação adicional relativa a Imposto de Selo foi apresentada reclamação graciosa pela «B….», à qual foi atribuído o n.º 400002.1/96 (apenso);

4. «B….» foi matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Tondela em 02.07.90, sob o n.º …, tendo por objecto a indústria de ferragens e acessórios em latão, impo o e exportação (fls. 12 a 15);

5. No mesmo ano organizou um projecto de investimento com vista à criação de uma unidade nova para fabrico de ferragens de mobiliário para exportação, que previa um crédito bancário total de Esc. 250.000.000$00, e formalizou a sua candidatura ao «Programa de Correcção Estrutural do Défice Externo e do Desemprego (PCEDED)» junto do «Banco de Fomento Exterior para ter acesso aos benefícios fiscais estabelecidos pelo Dec.-Lei n.º 161/87, de 6.4., nomeadamente duplo C.F.I. e isenção do imposto de selo nos juros do financiamento bancário (fls. 17 a 21 - fichas 1 a 5);

6. Em 11.03.91, o B.F.E. comunicou à «B...» que o projecto de investimento havia sido aprovado por aquele Banco enviando-lhe na mesma data a Ficha n.º 5, onde consta que «a empresa, após a conclusão do investimento, cumpre o critério B» (fls. 22 e 23);

7. A «B...» beneficiou da isenção do imposto de selo nos juros do crédito a prazo concedido pelo B.F.E. através do empréstimo n.º 939.90 de 100.000.000$00 cada (fls. 19 a 28 do apenso);

8. Por escritura pública lavrada em 18.03.92 no Cartório Notarial de Tondela e exarada de fls. 97v. a fls. 100 do livro 258-A, foi ademais declarado que foi aprovado em Assembleia Geral da «A…., «….», «….» e «B…» o projecto de fusão na modalidade de fusão por incorporação, e foram publicadas as deliberações no Diário da República, não tendo sido deduzida oposição no prazo legal, pelo que por aquele instrumento se opera a fusão em causa mediante a transferência global do património das três últimas para a primeira, conservando a sociedade incorporante a sua forma de sociedade anónima e considerando-se as operações da sociedade incorporada, do ponto de vista contabilístico, como efectuadas por conta da sociedade incorporante a partir de 01.01.92 (fls. 5 a 10 do apenso);

9. Em 01.04.92 foi definitivamente registada na Conservatória do Registo Comercial de Tondela a fusão das sociedades «A…., «….», «….» e «B….» (cfr. doc. de fls. 11 a 15 dos autos e que aqui se dá por reproduzido);

10. Pelo ofício n.º 200 da D.G.C.I. foi comunicado à ora impugnante que por despacho de Sua Excelência o Subsecretário de Estado Adjunto da Secretaria de Estado Adjunta e do Orçamento, de 19.01.15, lhe tinha sido concedida isenção do imposto municipal de sisa relativa à transmissão dos imóveis identificados no processo, bem como de imposto de selo, emolumentos e outros encargos legais, referentes ao acto de fusão (fls. 24 a 38)».

2.1.3 No segundo acórdão invocado como fundamento (acórdão do Supremo Tribunal Administrativo proferido em 9 de Novembro de 2022 no processo 881/12.5BELRS), considerou-se a seguinte factualidade:

«1- Em cumprimento da ordem de serviço n.º OI200800065, a Impugnante foi alvo de uma acção de inspecção externa, de âmbito geral, que incidiu sobre o exercício de 2005 – (cf. RIT a fls. 406 e seg. do PAT).

2- Em 10.02.2009, foi elaborado o Relatório de Inspecção Tributária (RIT), do qual constam, designadamente, as seguintes conclusões:

“[IMAGEM]

(…)» (cfr. RIT a fls 420 do PAT);

3- Na sequência das correcções efectuadas e indicadas no RIT, foram emitidas pela AT, em nome da Impugnante a liquidação adicional de IRC n.º ...85, referente ao exercício de 2005, bem como respectivos juros compensatórios e demonstração de acerto de contas n.º ...81, da qual consta liquidação de juros compensatórios n.º ...83, no valor de € 1.393,98, resultante de estorno de reembolso, que foi paga em 29.04.2009 – (cf. doc. 2 junto com a PI.).

4- Em 14.08.2009, a Impugnante apresentou, junto do Serviço de Finanças de Lisboa 10, reclamação graciosa das liquidações identificadas na alínea antecedente, contestando as correcções relativas à criação líquida de postos de trabalho e a liquidação dos juros compensatórios por falta de entrega do PEC, cujo processo foi autuado com o n.º ...70 – (cf. fls. 1 e seg. do processo de RG anexo ao PAT.).

5- Em 24.08.2010, por despacho do Chefe de Divisão da Justiça Administrativa da Direção de Finanças de Lisboa, foi indeferida a Reclamação Graciosa, tendo por base a informação elaborada pela Direcção de Serviços da Inspecção Tributaria – (cf. fls. 106 processo de RG anexo ao PAT).

6- Em 29.09.2010, a Impugnante deu entrada na Direcção de Finanças de Lisboa do Recurso Hierárquico da decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa – (cf. fls. 2 e seg. do processo de Recurso Hierárquico (RHQ) em anexo ao PAT).

7- Em 22.09.2011 foi elaborada Informação pela Divisão de Administração da Direção de Serviços do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (DSIRSC), da consta o seguinte teor: «

[IMAGEM]

(…)» (cf. fls.176 a 190 do processo de RHQ anexo ao PAT);

8- Em 12.11.2011, com base na informação referida no ponto antecedente, foi proferido despacho pela Directora de Serviços DSIRC, que indeferiu o recurso hierárquico - (cf.fls.175 do processo de RHQ anexo ao PAT)».


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2.2 DE DIREITO

2.2.1 AS QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR

A sociedade acima identificada veio, ao abrigo do disposto no art. 284.º do CPPT, interpor recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo do acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte acima identificado, que invoca encontrar-se em oposição, quanto a duas questões fundamentais de direito, com anteriores acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, que identificou.
No acórdão recorrido está em causa o benefício fiscal da criação líquida de emprego para jovens (CLEJ), que, à data, estava previsto no art. 17.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF). Dizia esse artigo, na redacção aplicável, que é a que lhe foi dada pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro (que aprovou o Orçamento do Estado para 2003):
«1 - Para efeitos do imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (IRC), os encargos correspondentes ao direito aos benefícios fiscais concedidos, por acto ou contrato fiscal, a pessoas singulares ou colectivas para trabalhadores admitidos por contrato sem termo com idade não superior a 30 anos são levados a custo em valor correspondente a 150%.
2 - Para efeitos do disposto no número anterior, o montante máximo da majoração anual, por posto de trabalho, é de 14 vezes o salário mínimo nacional mais elevado.
3 - A majoração referida no n.º 1 tem lugar durante um período de cinco anos a contar do início da vigência do contrato de trabalho. Para a determinação do lucro tributável dos sujeitos passivos do IRC e dos sujeitos passivos do IRS com contabilidade organizada, os encargos correspondentes à criação líquida de postos de trabalho para jovens e para desempregados de longa duração, admitidos por contrato de trabalho por tempo indeterminado, são considerados em 150% do respectivo montante contabilizado como custo do exercício».
As questões suscitadas pela Recorrente referem-se à posição assumida pela AT: por um lado, de recusa da aplicação do benefício quanto aos trabalhadores que passaram a integrar os quadros da sociedade Recorrente provenientes das sociedades que, em consequência de cisões-fusões e fusões, se incorporaram na sociedade Recorrente, por ter considerado que se estava perante transmissão de benefício não permitida legalmente; por outro lado, quanto ao modo como procedeu ao cálculo do benefício, designadamente quanto à quantificação do limite máximo da majoração anual, quando os contratos de trabalho se iniciam e/ou terminam no decurso do exercício fiscal e não coincidem com as datas de início e fim do exercício (no caso, 1 de Janeiro e 31 de Dezembro).
Assim, a Recorrente enunciou as questões que pretende submeter a este Supremo Tribunal como sendo i) a da manutenção do benefício fiscal relativo à criação líquida de emprego para jovens quanto aos trabalhadores que passaram a integrar os seus quadros na sequência das operações de cisões-fusões e fusões de que resultou a incorporação de sociedades na sociedade ora Recorrente e ii) a do cálculo do benefício fiscal, quando o início e/ou o termo dos contratos de trabalho não coincide com o início e o termo do exercício fiscal.
Nos termos do art. 284.º do CPPT, «[a]s partes e o Ministério Público podem dirigir ao Supremo Tribunal Administrativo, no prazo de 30 dias contado do trânsito em julgado do acórdão impugnado, pedido de admissão de recurso para uniformização de jurisprudência, quando, sobre a mesma questão fundamental de direito, exista contradição: a) Entre um acórdão do Tribunal Central Administrativo, e outro acórdão anteriormente proferido pelo mesmo ou outro Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo; b) Entre dois acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo».
Não havendo dúvidas quanto aos requisitos formais da admissibilidade (legitimidade da Recorrente, admissibilidade e tempestividade do recurso), há que averiguar se estão verificados os respectivos requisitos substanciais da admissibilidade do recurso para uniformização de jurisprudência.
Só depois, se for caso disso, passaremos a conhecer do mérito do recurso.

2.2.2 DOS REQUISITOS SUBSTANCIAIS DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO PARA UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA

A admissibilidade do recurso para recurso para uniformização de jurisprudência, previsto no art. 284.º do CPPT, depende i) da existência de contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão invocado como fundamento, já transitado, sobre a mesma questão fundamental de direito e ii) que não ocorra a situação de a decisão impugnada estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.
No que ao primeiro requisito respeita, como tem sido inúmeras vezes explicitado pelo Pleno desta Secção relativamente à caracterização da questão fundamental sobre a qual deve existir contradição de julgados, devem adoptar-se os critérios já firmados no domínio do ETAF de 1984 e da Lei de Processo dos Tribunais Administrativos, para detectar a existência de uma contradição, quais sejam:
i. identidade da questão de direito sobre que recaíram os acórdãos em confronto, o que pressupõe uma identidade substancial das situações fácticas, entendida esta não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais;
ii. que não tenha havido alteração substancial na regulamentação jurídica, a qual se verifica sempre que as eventuais modificações legislativas possam servir de base diferentes argumentos que possam ser valorados para determinação da solução jurídica;
iii. que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta e esta oposição decorra de decisões expressas, não bastando a simples oposição entre razões ou argumentos enformadores das decisões finais ou a invocação de decisões implícitas ou a pronúncia implícita ou consideração colateral tecida no âmbito da apreciação de questão distinta.

Vejamos, pois, se estão verificados os requisitos da alegada contradição de julgados à luz dos supra referidos princípios.

2.2.3 DA OPOSIÇÃO ENTRE O ACÓRDÃO RECORRIDO E OS ACÓRDÃOS FUNDAMENTO

2.2.3.1 Quanto à primeira questão suscitada no recurso, vejamos o que decidiram os acórdãos em confronto.


O acórdão recorrido, secundando a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, entendeu, em resumo, que a sociedade ora Recorrente não podia continuar a usufruir (pelo período remanescente) do benefício fiscal previsto no art. 17.º do EBF de que gozavam as sociedades que nela foram incorporadas por fusão e/ou por cisão-fusão, porque a tal obstava o princípio da intransmissibilidade dos benefícios fiscais, à data previsto no n.º 1 do art. 13.º do EBF (a que corresponde, actualmente, o art. 15.º do mesmo Estatuto), afastando a tese sustentada pela Recorrente, de que nem a cisão e fusão nem a fusão das sociedades na sociedade Recorrente constituíram uma transmissão dos direitos e obrigações daquelas sociedades para esta, mas sim uma continuação das mesmas sob a personalidade jurídica da incorporante.
Por seu turno, o acórdão fundamento foi proferido no âmbito de uma impugnação judicial de liquidação de imposto de selo (IS) que foi efectuada na sequência de uma acção de fiscalização em que a AT concluiu que a isenção de IS de que beneficiara uma sociedade no financiamento bancário contraído em ordem à aquisição de determinados bens de investimento, ao abrigo do disposto no n.º 1 do art. 3.º, do Decreto-Lei n.º 161/87, de 6 de Abril, se extinguiu por incumprimento da condição de os bens objecto do investimento deverem manter-se na empresa durante um período mínimo de três anos, por força do disposto na alínea b) do art. 3.º do Decreto-Lei n.º 197-C/86, de 18 de Julho, aplicável ex vi do n.º 1 do art. 2.º do referido Decreto-Lei n.º 161/87. Isto porque considerou que a sociedade a quem foi concedido esse benefício se extinguiu por fusão antes de decorridos o período mínimo de três anos e o benefício não podia transmitir-se para a sociedade incorporante.
O Supremo Tribunal Administrativo, no acórdão invocado como fundamento do presente recurso, não ratificou o entendimento da AT e, ao invés, concluiu, em síntese, que a fusão por incorporação não implica a extinção das empresas fundidas mas a alteração, ainda que com perda de personalidade jurídica, e que, continuando os bens afectos à actividade em que antes eram utilizados, não tinha havido interrupção na actividade económica objecto de fusão.
Em face do que foi decidido em cada um dos acórdãos, consideramos que não pode considerar-se, para os efeitos requeridos, que exista entre eles a oposição que permitira o conhecimento do mérito do recurso, pois não conheceram da mesma questão. Senão vejamos:
No acórdão recorrido a questão decidida foi a de saber se a sociedade (incorporante) que recebeu trabalhadores de outras sociedades (incorporadas) na sequência de operações de fusão e fusão-cisão pode usufruir, relativamente àqueles trabalhadores, do benefício (majoração dos encargos laborais dedutíveis) de que as sociedades incorporadas vinham usufruindo ao abrigo do disposto no art. 17.º do EBF e pelo remanescente do período de vigência desse benefício (que, como vimos já, é de cinco anos a contar do início da vigência do contrato de trabalho).
No acórdão fundamento a questão decidida foi a de saber se o benefício concedido a uma sociedade incorporada por fusão numa outra sociedade (incorporante) – isenção de IS concedia ao financiamento bancário para aquisição de bens de investimento, ao abrigo da conjugação do Decreto-Lei n.º 161/87, de 6 de Abril, e do Decreto-Lei n.º 197-C/86, de 18 de Julho – se tinha extinguido por incumprimento da condição de que os bens objecto do investimento deverem manter-se na empresa durante um período mínimo de três anos.
Como resulta do confronto entre os acórdãos, não pode considerar-se que neles foi decidida a mesma questão, pois o benefício fiscal em causa em cada um deles é distinto, bem como é distinto o respectivo regime legal: o acórdão recorrido respeita ao benefício (majoração da dedução respeitante aos encargos laborais suportados) por criação líquida de postos de trabalho, enquanto no acórdão fundamento o benefício respeita à isenção de IS dos juros do financiamento bancário contraído para a investimento em bens afectos a uma actividade; por outro lado, no acórdão recorrido estava em causa a possibilidade de se continuar a usufruir de um benefício que tinha a duração de cinco anos, enquanto no acórdão fundamento o que se discutia era a verificação da condição suspensiva de uma isenção.
É certo que ambos os acórdãos se pronunciaram, em sentido divergente, sobre a questão de saber se a incorporação de uma sociedade noutra por fusão ou por fusão-cisão implica a extinção da sociedade incorporada, mas fizeram-no em ordem a indagar da transmissão, ou não, do benefício. Ou seja, essa questão foi apreciada como argumento enformador das decisões finais e não foi a questão fundamental que determinou o sentido decisório de cada um dos acórdãos. Aliás, ambos os acórdãos concluíram expressamente pela intransmissibilidade do benefício fiscal em discussão em cada um deles, o que significa que sempre falharia o requisito de que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta.
Assim, quanto à primeira questão enunciada pela Recorrente, não se prosseguirá para o conhecimento do mérito do recurso por não se poder considerar que os acórdãos em confronto tenham decidido a mesma questão fundamental de direito.

2.2.3.2 Relativamente à segunda questão suscitada no recurso – a do cálculo do limite máximo da majoração anual estabelecida no art. 17.º do EBF, designadamente como se conta o período de cinco anos fixado no n.º 3 do artigo quando os contratos de trabalho se iniciam e/ou terminam no decurso do exercício fiscal e não coincidem com as datas de início e fim do exercício – vejamos o que decidiu cada um dos acórdãos em confronto.
O acórdão recorrido entendeu, ratificando a posição da AT, que nesse caso, haverá que restringir proporcionalmente o benefício ao tempo de duração do contrato nos anos em que se iniciou e terminou.
Por seu turno, o acórdão fundamento sustenta que o prazo de 5 anos estabelecido na norma «se pode reflectir em 6 exercícios económicos, sempre que o início do contrato de trabalho não coincida com o inicio do exercício fiscal», ou seja, que «o limite máximo da majoração anual é sempre de 14 salários mínimos nacionais por exercício, mesmo nos casos em que o trabalhador elegível não trabalhe o ano completo, tal como nas situações em que o contrato perfaça cinco anos de vigência antes do final do exercício».
Existe, pois, oposição entre os acórdãos quanto à questão de saber como se calcula o período da majoração prevista no n.º 1 do art. 17.º da EBF, isto é, se esta deve reduzida proporcionalmente ao período de duração dos contratos de trabalho elegíveis no exercício inicial e final a que se reportam os cinco anos descritos, como sustenta o acórdão recorrido, ou se a majoração anual deve ser aplicado integralmente em cada um dos seis exercícios em que se reflectem os cinco anos de contrato de trabalho que está subjacente à atribuição do benefício fiscal.
Assim, há que conhecer do mérito do recurso quanto a esta questão, o que passamos a fazer de seguida.

2.2.4 DO MÉRITO DO RECURSO - OS LIMITES NO TEMPO DA MAJORAÇÃO PREVISTA NO N.º 1 DO ART. 17.º DO EBF

A questão é a de saber como se interpreta o n.º 3 do art. 17.º do EBF, na referida redacção, que dispunha: «A majoração referida no n.º 1 tem lugar durante um período de cinco anos a contar do início da vigência do contrato de trabalho». Como se conta o período de cinco anos fixado pela norma quando os contratos de trabalho elegíveis à luz daquele artigo se iniciam e/ou terminam no decurso do exercício fiscal e não coincidem com as datas de início e fim do exercício (no caso, 1 de Janeiro e 31 de Dezembro): nesse caso, deverá o limite máximo da majoração prevista no n.º 1 ser restringido proporcionalmente ao tempo de vigência dos contratos, como sustenta a Recorrente, ou poderá o benefício ser aplicado em seis exercícios?
Não é a primeira vez que a questão é colocada a este Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, como dá conta o acórdão que a Recorrente invoca como fundamento relativamente a esta questão, que cita a pertinente jurisprudência (Vide os seguintes acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 8 de Maio de 2019, proferido no processo com o n.º 1054/17.6BALSB, disponível em
https://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/a6d87df500be1b18802583f900556819;
- 8 de Julho de 2020, proferido no processo com o n.º 568/17.2BALSB, disponível em
https://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/45753232bb41fa29802585a5004a99a0.
No mesmo sentido, da Secção de Contencioso Tributário, para além do acórdão fundamento, pode ver-se o seguinte:
- de 7 de Setembro de 2022, proferido no processo com o n.º 1845/09.1BELRS (325/15), disponível em
https://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/f4dcd90d50e04073802588ba0055c57c.).
Porque não vislumbramos motivo para nos afastarmos dessa jurisprudência (Subscrita por 10 dos 12 Conselheiros que actualmente compõem a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.), vamos limitar-nos a reproduzir o que ficou dito no mais recente dos referidos acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário:

«Sobre questão em tudo idêntica à dos presentes autos pronunciou-se já o Pleno da Secção de Contencioso Tributário deste STA por Acórdão de 8 de Maio do ano passado, no processo n.º 1054/17.6BALSB, cuja fundamentação e decisão seguiremos, não apenas pelo dever que sobre nós impende de dar tratamento igual a situações semelhantes, assim contribuindo para “obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito” (artigo 8.º n.º 3 do Código Civil) , mas ainda porque estamos absolutamente convictos de bondade da interpretação aí perfilhada.
Consignou-se nesse aresto, e reitera-se aqui, o seguinte:
«Na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis» [art. 11.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária (LGT)].
O que significa que na interpretação das normas fiscais há que obedecer aos critérios reconhecidos pelo art. 9.º do Código Civil (CC).
Assim, desde logo, a letra da lei não dá apoio algum à tese da Recorrente. É certo que a letra da lei não constitui o único, nem sequer o mais importante elemento a considerar na tarefa hermenêutica, mas é o que constitui o seu ponto de partida e «[c]omo tal cabe-lhe desde logo uma função negativa: a de eliminar aqueles sentidos que não tenham qualquer apoio, ou pelo menos uma qualquer “correspondência” ou ressonância nas palavras da lei» [J. BAPTISTA MACHADO (Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 1983, pág. 182)], como resulta do disposto no n.º 2 do art. 9.º do CC. O mesmo Autor explicita: «A letra (o enunciado linguístico) é, assim o ponto de partida. Mas não só, pois exerce também a função de um limite, nos termos do art. 9.º, n.º 2: não pode ser considerado como compreendido entre os sentidos possíveis da lei aquele pensamento legislativo (espírito, sentido) “que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso”. Pode ter de proceder-se a uma interpretação extensiva ou restritiva, ou até porventura a uma interpretação correctiva, se a fórmula verbal foi sumamente infeliz, a ponto de ter falhado completamente o alvo. Mas, ainda neste último caso, será necessário que do texto “falhado” se colha pelo menos indirectamente uma alusão àquele sentido que o intérprete venha a acolher como resultado da interpretação» (Idem, pág. 189).
Assim, não figuramos como possível extrair da norma um sentido «não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso», bem como não podemos atribuir-lhe um sentido que faz tábua rasa da presunção de «que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados» (cfr., respectivamente, n.ºs 2 e 3 do art. 9.º do CC). Se o legislador queria estabelecer a proposta proporcionalidade porque o não deixou expresso?
Ademais, como ficou dito na decisão arbitral proferida no processo n.º 212/2013-T, acima referida, «há reforçadas razões para dar relevância ao elemento textual, derivadas do facto de se estar perante um regime legal que foi várias vezes revisto e em que, por isso, se materializaram várias possibilidades de o legislador ter reformulado a expressão do seu pensamento, se tivesse constatado que tinha dito mais ou menos do que o que pretendia. Ora, constata-se que, já depois da Lei n.º 32-B/2002, o artigo 17.º do EBF foi completamente revisto pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, e, no novo n.º 3, refere-se que «o montante máximo da majoração anual, por posto de trabalho, é o correspondente a 14 vezes a retribuição mínima mensal garantida», o que corresponde, com actualização terminológica, à redacção anterior».
Mas, salvo o devido respeito, também o elemento racional ou teleológico não aponta para a necessidade de uma interpretação restritiva do alcance do benefício fiscal, que só se imporia perante a certeza de que o legislador falhara a redacção da norma.
Como também ficou dito na referida decisão arbitral com o n.º 212/2013-T, «a única razão que, abstractamente, poderia explicar outras limitações da majoração, não expressamente previstas, seria a maximização das receitas fiscais, e essa razão não vale quando se está a interpretar normas que prevêem benefícios fiscais, que são justificadas por razões extrafiscais. Na verdade, subjacente ao estabelecimento do benefício fiscal não pode existir um desígnio legislativo de aumentar as receitas fiscais, pois está-se perante situações em que a lei considera que a esse interesse fiscal devem sobrepor-se «interesses públicos extrafiscais relevantes que sejam superiores aos da própria tributação que impedem» (artigo 2.º, n.º 1, do EBF). Por outro lado, a majoração tem sempre a duração máxima de cinco anos a contar do início da vigência do contrato de trabalho, nos termos do n.º 3 do artigo 17.º do EBF, pelo que não se vê como se possa concluir, como defende a Autoridade Tributária e Aduaneira, que «o benefício fiscal ocorreria por um período de seis anos». Isto é, se as condições para atribuição do benefício se verificaram, por exemplo, em 1 de Junho de 2001, o benefício fiscal terminará, no máximo, no dia 31 de Maio de 2006, tendo a exacta duração de cinco anos, apesar de essa duração abranger seis anos civis, dois deles parcialmente. No pressuposto de que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados, como tem de se presumir, por imposição do artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil, a «majoração anual» de que fala o n.º 2 do artigo 17.º do EBF, na redacção dada pela Lei n.º 32-B/2002, reportar-se-á a anos civis, como se infere do facto de ser anual e ser calculada em função do valor do salário mínimo nacional, relativamente ao qual vigorava a regra da fixação anual, com referência a cada ano civil, como decorre do disposto nos artigos 9.º, n.º 1, e 12.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 69-A/87, de 9 de Fevereiro. Por outro lado, se é certo que, abstractamente, o valor de uma «majoração anual» calculada em função do valor do salário mínimo nacional poderia ser calculado somando os montantes do salário mínimo nacional que em cada um deles vigorou, também é certo que esse método seria impraticável quando o valor dessa majoração anual não é de 12 meses, mas sim de 14 meses, o que pressupõe que seja o mesmo o valor do salário mínimo nacional que em cada um deles vigorou. Por outro lado, nem se pode imaginar que o legislador, ao estabelecer a majoração para vigorar em anos civis, não tenha previsto a situação de os trabalhadores iniciarem os seus contratos fora da data do início do ano civil, pois, estatisticamente, num ano com 365 dias, será 364 vezes mais provável que isso suceda do que no preciso dia do início do ano».
Poderia, é certo, o legislador ter optado por uma solução como a preconizada pela Recorrente, mas não resulta do texto da lei que tenha efectuado essa opção, nem resulta de quaisquer outros elementos interpretativos que tivesse querido fazê-la. Não pode, pois, o intérprete substituir-se-lhe e, com base numa pretensa unidade e coerência do sistema jurídico, criar uma norma que restrinja o âmbito do benefício fiscal.
Nem se argumente com uma pretensa violação do princípio da igualdade, consagrado no art. 13.º da Constituição da República Portuguesa,
Este princípio, como limite à discricionariedade legislativa, não exige o tratamento igual de todas as situações; ao invés, implica que sejam tratados igualmente os que se encontram em situações iguais e tratados desigualmente os que se encontram em situações desiguais, de modo a não serem criadas discriminações arbitrárias e irrazoáveis, porque carecidas de fundamento material bastante. O princípio da igualdade não proíbe se estabeleçam distinções, mas sim, distinções desprovidas de justificação objectiva e racional.
Como bem salientou a decisão recorrida, «A previsão de benefícios fiscais, ainda que justificada pela prossecução de fins de interesse público, não deixa, no plano normativo, de estabelecer regimes particulares de tributação e, como tal, trata de forma dissemelhante situações submetidas ao mesmo imposto. Ainda que as medidas de fomento previstas visem atingir fins ou interesses social e economicamente valiosos e, por isso, não se traduzam em discriminações arbitrárias sem fundamento jurídico algum.
Deste modo, se os benefícios fiscais já configuram um afastamento das regras que asseguram a tributação em função da capacidade contributiva, as exigências do princípio constitucional da igualdade não se traduzem no obstáculo à previsão de regimes fiscalmente privilegiados.
Consequentemente, a questão da violação do princípio da igualdade deve colocar-se nos benefícios fiscais que se alicerçam em normas de conduta cujo respeito produz efeitos fiscais, relativamente às condições de acesso e não em relação aos contornos em que são previstos.
O acesso ao benefício fiscal em apreço depende do comportamento do sujeito passivo, que é livre de optar por preencher as condições normativamente estabelecidas e assim beneficiar deste, ou não as cumprir e não usufruir da medida. E se os efeitos do benefício fiscal se modificarem consoante o momento do preenchimento das suas condições, dependerá da voluntas do sujeito passivo optar pelo preenchimento destas, de forma que lhe permita optimizar os seus efeitos.
Assim, nos benefícios fiscais dependentes das opções dos sujeitos passivos não existirá o tratamento discriminatório ofensivo do princípio da igualdade pela norma que estatui esses efeitos, mas apenas se houver distinção arbitrária e sem fundamento jurídico algum nas condições de acesso.
Revertendo tal interpretação para os autos, verifica-se que não existe qualquer discriminação arbitrária nas condições de acesso ao benefício fiscal em análise. Os distintos efeitos que se podem verificar na majoração são imputáveis às escolhas do sujeito passivo e não a uma lei discriminatória».
Não pode sequer considerar-se que a solução legislativa, na interpretação que subscrevemos, seja arbitrária, uma vez que, numa opção tão legítima como razoável, coloca na disponibilidade do contribuinte a optimização dos efeitos variáveis do benefício fiscal, como sucede em tantas outras situações».

O acórdão recorrido, na medida em que divergiu desta posição, não pode manter-se, pelo que será anulado na parte correspondente, como decidiremos a final.

2.2.5 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:

I - O recurso por oposição de acórdãos depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos legais: i) que exista contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento na decisão da mesma questão fundamental de direito e ii) que não ocorra a situação de a decisão impugnada estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo (cf. art. 284.º, n.ºs 1 e 3, do CPPT).

II - Não há que conhecer do mérito do recurso se os dois acórdãos em alegada oposição não conheceram de uma mesma questão de direito, sendo que para que se considere existir oposição exige-se que se tenha perfilhado, nas decisões em confronto, solução oposta, não bastando a simples oposição entre razões ou argumentos enformadores das decisões finais ou consideração colateral tecida no âmbito da apreciação de questão distinta.

III - As regras da hermenêutica das normas legais tributárias (que são as do art. 9.º do CC, ex vi do n.º 1 do art. 11.º da LGT) não consentem que do art. 17.º do EBF, na redacção vigente à data (a que hoje corresponde o art. 19.º do EBF), se extraia o sentido de que, nos casos em que os contratos de trabalho elegíveis à luz do referido artigo cessem ou se iniciem durante o período de tributação (sem coincidirem com o início e o termo desse período), o limite máximo da majoração prevista no n.º 1 deva ser restringido proporcionalmente ao tempo de vigência dos contratos.

IV - Nos benefícios fiscais que dependem de um comportamento do contribuinte, que pode livremente optar por preencher as condições legalmente estabelecidas para deles usufruir, a questão do princípio da igualdade deve colocar-se relativamente às condições de acesso ao benefício e não em relação aos contornos em que são previstos.

V - Assim, não há tratamento discriminatório, nem sequer arbitrariedade da solução legal, se é colocada na disponibilidade do contribuinte a optimização dos efeitos variáveis do benefício fiscal.


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3. DECISÃO

Pelo exposto, os Juízes do Pleno da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam em

i) não tomar conhecimento do mérito do recurso relativamente à primeira questão enunciada pela Recorrente;

ii) tomar conhecimento do mérito do recurso relativamente à segunda questão e, concedendo-lhe provimento, sempre nessa parte, anular o acórdão recorrido, julgar procedente a impugnação judicial e anular a liquidação impugnada no segmento que lhe corresponde.

Custas do recurso pela Recorrente e pela Recorrida, na proporção do vencimento (cfr. art. 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, aplicável ex vi do art. 281.º do CPPT).


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Lisboa, 21 de Março de 2024. – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes (relator) – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia – Isabel Cristina Mota Marques da Silva – José Gomes Correia – Joaquim Manuel Charneca Condesso – Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos – Aníbal Augusto Ruivo Ferraz – Gustavo André Simões Lopes Courinha – Pedro Nuno Pinto Vergueiro – Anabela Ferreira Alves e Russo – Fernanda de Fátima Esteves – João Sérgio Feio Antunes Ribeiro.