Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0172/09
Data do Acordão:05/06/2009
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:LÚCIO BARBOSA
Descritores:GRADUAÇÃO DE CRÉDITOS
CONTRIBUIÇÕES PARA A SEGURANÇA SOCIAL
IRS
PRIVILÉGIO IMOBILIÁRIO
Sumário:I - Nos termos do art. 11º do DL n. 103/80, de 9/5, que se mantém em vigor na ordem jurídica, os créditos pelas contribuições à Segurança Social gozam de privilégio imobiliário sobre os bens imóveis existentes no património das entidades patronais à data do processo executivo, graduando-se logo após os créditos referidos no art. 748º do CC.
II - Por sua vez, e no tocante aos créditos de IRS, a FP goza de privilégio imobiliário sobre os bens existentes no património do sujeito passivo à data da penhora (art. 111º do CIRS).
III - Concorrendo à graduação créditos de ambas as proveniências, os créditos pelas contribuições à Segurança Social logram preferência sobre os créditos de IRS.
Nº Convencional:JSTA00065707
Nº do Documento:SA2200905060172
Data de Entrada:02/17/2009
Recorrente:MINISTÉRIO PÚBLICO
Recorrido 1:A... - FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 2:OUTRO
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TAF COIMBRA PER SALTUM.
Decisão:PROVIDO.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL.
Legislação Nacional:DL 103/80 DE 1980/05/09 ART11.
CCIV66 ART748.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1. O MINISTÉRIO PÚBLICO interpôs recurso para este Supremo Tribunal da sentença proferida pelo Mm. Juiz do TAF de Coimbra nos presentes autos de graduação de créditos, em que é originário executado B....
Formulou as seguintes conclusões nas respectivas alegações de recurso:
a) Quer o privilégio imobiliário constante do art. 111º do C.I.R.S., quer o privilégio imobiliário consignado pelo art. 11º do D.L. 103/80 de 9.5, são privilégios imobiliários gerais, abrangendo todos os bens imóveis do devedor;
b) Porém, deste art. 11º do D.L. 103/80 ressalta ainda que os créditos da segurança social se graduam logo após os referidos no art. 748º do C. Civil;
c) Inserindo-se nos créditos do Estado aí previstos, apenas os de contribuição predial, sisa e imposto sobre sucessões e doações (aos quais correspondem, actualmente, o I.M.I., o I.M.T. e o Imposto de selo – sobre transmissões gratuitas) – terá que se dar preferência aos créditos da segurança social;
d) Com efeito, todos os outros créditos do Estado são excluídos, designadamente o I.R.S., imposto que, embora criado posteriormente, com o D.L. n. 442-A/88, de 30 de Novembro, veio substituir, no fundo, anteriores impostos que incidiam sobre o rendimento das pessoas singulares, tais como, o imposto profissional, o imposto complementar e a contribuição industrial (grupo C), que o citado art. 748º do C. Civil não abrange;
e) A sentença devia, pois, ter concedido prioridade de pagamento aos créditos – exequendos e reclamados – da Segurança Social, sobre os créditos reclamados provenientes de I.R.S.;
f) Não o tendo feito, errou na aplicação do direito, violando o disposto nos artºs 748º do C. Civil, 11º do D.L n. 103/80, de 9 de Maio e 111º do C.I.R.S.;
g) Pelo que deve ser revogada e substituída por outra que reconheça e gradue os créditos pela seguinte ordem:
1º - Os créditos por contribuições devidas à Segurança Social;
2º -Os créditos relativos a I.R.S. e
3º -O crédito reclamado pelo A..., S.A..
Não houve contra-alegações.
Foram colhidos os vistos legais.
2. É a seguinte a matéria de facto fixada na instância:
1. Contra B..., LDA., N.I.F. 502 287 233, com sede em Rua ... ..., Marinha das Ondas, 3080 Figueira da Foz, foi instaurada no I.G.F.S.S. -Secção de Processo de Coimbra, em 2004.07.12, a execução fiscal 0601-2004/101174.0, para cobrança coerciva das seguintes dívidas à Segurança Social:
Imposto Período Execução Certidão Valor(€)
Contribuições Mar02 a Dez02 0601-2004/101174.0 2903/04 1.077,39
Contribuições Jan03 a Dez03 0601-2004/101174.0 2904/04 1.316,81
Contribuições Jan04 a Jul04 0601-2004/101174.0 2905/04 730,24
2. Por despacho da Exmª Coordenadora da Secção de Processo de 2005.11.16, foi na execução fiscal a que alude o n. anterior ordenada a reversão das dívidas contra C..., NIF …, com domicílio em … e D..., NIF …, com o mesmo domicílio
3. Para garantia do pagamento da dívida a que aludem os números anteriores foi, em 2006.01.31, penhorado o seguinte imóvel: “Casa de habitação composta de rés-do-chão com 4 divisões, sita no lugar de ..., Marinha das Ondas, com a área coberta de 148m2, logradouro com 300m2, a confrontar do Norte com E..., Sul com F..., Nascente com G... e Poente com Caminho Público, inscrita na matriz predial da freguesia de Marinha das Ondas sob o artigo n.º 1471, com o valor patrimonial de 4.981,66 €, à qual se atribui o valor de 40.000,00 € (quarenta mil euros)”.
4. A penhora a que alude o n. anterior foi registada em 2006.02.03 (Ap. 13).
5. Contra B..., LDA., N.I.F. 502 287 233, com sede em Rua ..., Marinha das Ondas, 3080 Figueira da Foz, foi instaurada no I.G.F.S.S. -Secção de Processo de Coimbra, em 2004.11.16, a execução fiscal 0601-2004/101254.1, para cobrança coerciva das seguintes dívidas à Segurança Social:
Imposto Período Execução Certidão Valor (€)
Contribuições Mar02 a Dez02 0601-2004/101254.1 2902/04 2.289,51
Contribuições Jan03 a Dez03 0601-2004/101254.1 2901/04 2.798,29
Contribuições Jan04 a Jul04 0601-2004/101254.1 2902/04 1.551,77
6. Por despacho da Exmª Coordenadora da Secção de Processo de 2005.11.16, foi na execução fiscal a que alude o n. anterior ordenada a reversão das dívidas contra C..., NIF …, com domicílio em Rua ..., n. ..., ..., 3080 Marinha das Ondas, e D..., NIF …, com o mesmo domicílio.
7. Para garantia do pagamento da dívida a que aludem os números anteriores foi, em 2006.01.31, penhorado o seguinte imóvel: “Casa de habitação composta de rés-do-chão com 4 divisões, sita no lugar de ..., Marinha das Ondas, com a área coberta de 148m2, logradouro com 300m2, a confrontar do Norte com E..., Sul com F..., Nascente com G... e Poente com Caminho Público, inscrita na matriz predial da freguesia de Marinha das Ondas sob o artigo n. 1471, com o valor patrimonial de 4.981,66 €, à qual se atribui o valor de 40.000,00 € (quarenta mil euros)”.
8. A penhora a que alude o n. anterior foi registada em 2006.02.03 (Ap. 7).
9. Sobre o mesmo imóvel encontrava-se registada e em vigor, deste 2006.02.14 (Ap. 4), penhora a favor do A..., S.A., para garantia do pagamento de € 15.154,04.
10. A execução fiscal a que se alude em 5 supra foi entretanto apensada à execução fiscal a que se alude em 1 supra.
3. O Mm. Juiz a quo graduou os créditos do seguinte modo:
1º - Os créditos relativos a IRS;
2º - Os créditos por contribuições devidas à Segurança Social;
3º - O crédito reclamado pelo A..., SA.
O recorrente discorda, defendendo que os créditos relativos a IRS devem ser graduados em 2º lugar, sendo-o, em primeiro lugar, os créditos relativos às contribuições à Segurança Social.
Quid juris?
A razão está do lado do recorrente.
Vejamos então.
O Mm. Juiz a quo refere que, para pagamento do IRS, a FP goza de privilégio imobiliários sobre os bens existentes no património do executado à data da penhora (ou acto equivalente).
Por sua vez, e segundo ele, os créditos por contribuições à Segurança Social gozam de privilégio imobiliário (geral), por força do art. 11º do DL n. 103/80, de 9/5, devendo ser graduados logo após os créditos referidos no art. 748º do CC.
Parece inferir-se daqui que a razão pela qual os créditos de IRS devem ser graduados com primazia tem a ver com o disposto no citado art. 748º do CC.
Porém, analisado este preceito legal, logo vemos que nele não cabem nem o IRS nem os créditos à SS.
Quer isto dizer que não será por aqui que a solução para o problema há-de ser encontrada.
Avancemos pois noutra direcção.
Dispõe o art. 11º do já atrás referido DL n. 103/80, de 9/5:
“Os créditos pelas contribuições, independentemente da data da sua constituição, e os respectivos juros de mora gozam de privilégio imobiliário sobre os bens imóveis existentes no património das entidades patronais à data do processo executivo, graduando-se logo após os créditos referidos no art. 748º do CC”.
Este normativo continua em vigor na ordem jurídica.
Assim sendo, e nada dispondo a lei em contrário, os créditos para a Segurança Social, que gozam de privilégio imobiliário, devem ser graduados antes do crédito de IRS.
Isto porque se graduam imediatamente após os créditos referidos no art. 748º do CC, não vendo elencado neste normativo os créditos por IRS, como já acima notamos.
A pretensão do recorrente é assim de atender Vide, a título de exemplo, os acórdãos deste STA de 13/2/2008 (rec. n. 1068/07) e de 10/7/2002, rec. n. 181/02).
4. Face ao exposto, acorda-se em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida, e graduar os créditos do modo seguinte:
1º -Os créditos por contribuições devidas à Segurança Social;
2º -Os créditos relativos a I.R.S. e
3º -O crédito reclamado pelo A..., S.A..
Sem custas.
Lisboa, 6 de Maio de 2009. - Lúcio Barbosa (relator) - Jorge Lino - Isabel Marques da Silva.