Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0823/14
Data do Acordão:07/23/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:GARANTIA
IDONEIDADE
AVALIAÇÃO
Sumário:I - Não tendo o órgão de execução fiscal procedido à avaliação em concreto da garantia oferecida significa que não há interesse público que justifique o sacrifício dos interesses da Executada.
II - A administração fiscal deve pautar a sua actuação de acordo com o princípio da proporcionalidade (cfr. art. 266.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, art. 55.º da LGT, art. 46.º do CPPT e art. art. 5.º, n.º 2, do Código de Procedimento Administrativo), o que aponta para a necessidade da ponderação dos interesses em jogo de molde a não sacrificar nenhum deles.
III - Ao ter fundado a decisão de recusa da garantia oferecida em parâmetros que, seguramente, não integram o critério legal de aferição da idoneidade dessa garantia, incorreu o respectivo autor em vício de violação de lei, a determinar a respectiva anulação, como bem decidiu o Mmº juiz do Tribunal recorrido.
Nº Convencional:JSTA00068859
Nº do Documento:SA2201407230823
Data de Entrada:07/03/2014
Recorrente:AT-AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:GRUPO A......., SGPS, S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF PORTO
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART169 ART199 N1 ART46 ART196.
LGT98 ART55.
CONST76 ART266 N2.
CPA91 ART5 N2
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC01731/13 DE 2013/12/18.
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO 6ED VOLIII PAG411-412.
Aditamento:
Texto Integral: 1- RELATÓRIO
GRUPO A……, SGPS, SA, pessoa colectiva n.º ………, com sede na Rua ………., n.º ….., Porto, deduziu a presente reclamação visando o despacho proferido pela Directora de Finanças Adjunta de 20 de Novembro de 2012, que indeferiu o oferecimento de garantia da dívida exequenda e suspensão da execução mediante o oferecimento de créditos que a sociedade A…….., SA, detém sobre a Região Autónoma da Madeira, até ao montante de €2.743.124,00.

Por sentença de 16/12/2013, foi decidido julgar procedente a reclamação e anulado o despacho reclamado.

Reagiu a Fazenda Pública apresentando recurso para o STA que foi admitido a fls. 178 por despacho de 08/01/2014 com efeito suspensivo.

Reagiu por sua vez, a recorrida insurgindo-se contra o efeito atribuído ao recurso.

O recurso da sentença apresentado pela Fazenda Pública integra alegações com as seguintes conclusões:
A Fazenda Pública não se conforma com a decisão anulatória, assacando-lhe na aplicação do direito, na parte em que determinou, a anulação do despacho de 20.11.2012, que não aceitou a garantia oferecida para efeitos de suspensão do PEF 3174201201088327, por haver considerado que a AT, ao não convidar a Reclamante a fornecer as informações necessárias para suprir as deficiências do requerimento, juntando os documentos julgados necessários, para ponderar da idoneidade da garantia oferecida, violou os princípios do inquisitório e da cooperação entre as partes.
B. Ressalvado todo respeito devido, que é muito, a douta sentença incorre em erro de julgamento de direito, porque o ónus probatório que se impunha à executada, implica a decisão contra a parte que não faz prova dos pressupostos que estava obrigada a provar, não podendo ser valorada contra a AT a falta de prova efectuada pela executada ‘Grupo A…….., SGPS, SA” no seu requerimento, porquanto, a AT não estava obrigada a promover a realização de diligências para suprir as deficiências do mesmo, estando, como considera a sentença recorrida, obrigada à descoberta da verdade material e não se limitando à alegação dos factos por parte da reclamante.
C. A FP entende que assim decidir, no caso concreto destes autos, equivale à inversão do ónus probatório estabelecido pelo legislador, pelas seguintes razões que de imediato explicita.
D. Adoptada por Engrácia Antunes e aceite pela generalidade da doutrina, a noção de que o grupo de sociedades consiste em “um conjunto mais ou menos vasto de sociedades que, conservando embora as respectivas personalidades jurídicas próprias e distintas, se encontram subordinadas a uma direcção económica comum e unitária”, comporta três elementos essenciais8 (8 Engrácia Antunes, Estrutura e responsabilidade da empresa: O moderno paradoxo regulatório Texto apresentado no 1º Congresso Ítalo-Luso-Brasileiro de Direito Civil, realizado 2004, Revista Dreito GV, V. 1 N. 2, p. 029-068, Jun-Dez2005):
• Independência jurídica das várias sociedades - denotando a ideia de que no grupo as várias entidades componentes têm património, objectivos e organização próprias, apesar de se subordinarem a uma direcção económica comum e unitária.
• Falta de personalidade autónoma do grupo - sendo as entidades integrantes, dotadas elas próprias de personalidade jurídica, entende a maioria da doutrina não ser juridicamente adequado nem necessária a personalidade jurídica autónoma do grupo.
• Articulação do grupo através da direcção unitária - apresenta-se como peça chave da noção de grupo, significando que, formalmente, cada uma das sociedades mantem os seus órgãos próprios de definição e execução da sua vontade social. Porém, é o órgão de gestão da sociedade-mãe que procede à gestão dos sectores fulcrais da actividade das entidades agrupadas, designadamente as áreas financeira, fiscal, produtiva e logística 9 (9 Avelãs Nunes A tributação dos grupos de sociedades peio lucro consolidado em sede de IRC, Almedina, 2001)
E. O art. 52º da LGT, nos seus nºs 1 e 2, permite a suspensão da cobrança da prestação tributaria efectuada no processo de execução fiscal nos casos de pagamento em prestações ou reclamação, recurso, impugnação da liquidação e oposição à execução, que tenham por objecto a ilegalidade ou inexigibilidade da dívida exequenda, desde que acompanhada da prestação de garantia idónea nos termos das leis tributárias.
F. Por sua vez, o art. 169º do CPPT condiciona a suspensão da execução à constituição de garantia, em conformidade com o art. 195º do mesmo diploma, à sua prestação, nos termos do disposto no art. 199º, também do CPPT ou à penhora em bens suficientes para garantir o pagamento da dívida exequenda e respectivo acrescido.
G. A reclamante, não demonstrou a suficiência da garantia apresentada, não sendo essa uma incumbência da AT (que apenas posteriormente avaliará a veracidade do demonstrado e a sua aptidão), de harmonia com o consagrado nos artºs 74º da LGT e 342º do CC, o ónus da prova dos factos constitutivos do direito invocado pela reclamante incumbe à própria, devendo, no requerimento em que oferece a garantia, demonstrar a idoneidade desta, por via da junção da imprescindível prova.
H. A regra enunciada no art. 74º, nº 1 da LGT, em que se estabelece que o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da AT ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque. Estando a regra prevista no procedimento tributário, o seu conteúdo deve ser transposto para o processo judicial que se lhe seguir, por forma a que quem tinha o ónus da prova de certos factos no procedimento tributário tenha o respectivo ónus no processo judicial tributário.
I. A ponderação de interesses baseada nas regras da normalidade que justifica a repartição do ónus da prova no procedimento tributário é a mesma que deve presidir ao processo judicial, sendo o critério de repartição o mesmo como impõe a coerência valorativa e axiológica o que não foi considerado nesta sentença.
J. No caso presente, inexistia disposição legal expressa que autorizasse a AT a manter o processo suspenso (em virtude da “suspensão provisória” decorrente da apresentação do pedido), não decidindo o pedido de aceitação da garantia com base nos elementos com que o requerente o instruiu, e portanto a deficiente alegação e instrução probatória do pedido que lhe foi apresentado, apenas podia conduzir ao indeferimento da pretensão por falta de prova dos requisitos estabelecidos na lei, resultando tal como exarado na decisão.
K. Por entendermos pertinente para a explicitação do que pretendeu o legislador na forma como regulou decisões a tomar pela AT, com interferência no andamento do PEF, citamos, devendo ler-se com as necessárias adaptações o Acórdão do STA 5/2012 no processo 708/12, publicado no DRE, 1ª série, nº204, 22.10.2012, com o devido respeito: “No caso vertente, o curtíssimo prazo concedido à administração tributária para a decisão do pedido, conjugado com a obrigatoriedade de o executado apresentar imediatamente toda a prova no requerimento onde formula a sua pretensão, denuncia objectivamente o carácter urgente deste procedimento tributário, onde o tempo constitui um elemento determinante na finalidade pública que se visa prosseguir, de obviar ao sumiço de bens que possam garantir o pagamento integral da dívida exequenda”.
“A prescrição de um prazo imperativo tão curto, associado à preocupação do legislador em estabelecer que do pedido devem constar as razões de facto e de direito em que se baseia a pretensão e que o mesmo deve ser instruído com a prova documental pertinente, apontam no sentido de a AT ser chamada a decidir apenas com base nos elementos que lhe forem aportados pelo executado, recaindo sobre ele o ónus de instruir o procedimento com todos os elementos necessários á formação da decisão pela AT. E cabendo ao executado carrear para o procedimento todos os elementos, incluindo provas e demais informações, necessários ao êxito da sua pretensão” (destacado nosso),
L. Os princípios que obrigam a AT comprimem-se, por vezes, entre si e, mesmo que no caso presente não sejam inoperantes os princípios da colaboração e do inquisitório, eles não se sobrepõem às disposições expressas emanadas pelo legislador para regular a prestação de garantia para suspensão do processo executivo e a decisão respectiva, bem como ao ónus probatório estabelecido.
M. A falta rigor no requerimento apresentado quanto ao esclarecimento das circunstâncias inerentes à garantia em concreto proposta, a prestar por terceiro (a sociedade “Construções A…….., SA”, é uma entidade juridicamente distinta da “A………, SGPS, SA”, que é a executada nos autos) é patente face à respectiva falta de objectividade e documentação, características que se acentuam face, naturalmente, à assessoria juridico-tributária do “Grupo A……..”.
N. Por se tratar de um “Grupo” com capacidade económica para se fazer assessorar juridicamente por profissionais de reconhecida competência (não de uma empresa de “vão de escada”, sem competente assessoria jurídica), procedemos ao destaque da singeleza e falta de rigor do requerimento apresentado em termos de aptidão para fazer a demonstração dos elementos necessários para o deferimento do pedido apresentado perante a AT - oferecimento em garantia de créditos de terceiro sobre a RAM.
O. Entendemos que a harmonização dos princípios que obrigam a AT e se mostram conflituantes entre si (a que aludimos supra) no caso presente, deve ter em consideração todos os factores, designadamente a consideração de que a apresentação de requerimento nos moldes em que foi apresentado e instruído pelo “Grupo A…….”, denota uma intenção dilatória, revelando em si mesma uma violação dos princípios da cooperação para com a AT, não compatível com uma actuação cooperante nos termos do disposto nos art. 48º, nº 2 do CPPT e 59º da LGT - O contribuinte cooperará de boa-fé na instrução do procedimento, esclarecendo de modo completo e verdadeiro os factos de que tenha conhecimento e oferecendo os meios de prova a que tenha acesso.
Então,
P. não sendo inoperantes os princípios da colaboração e do inquisitório, eles não devem sobrepor-se às disposições expressas emanadas pelo legislador para regular a prestação de garantia para suspensão do processo executivo e a decisão respectiva, bem como ao ónus probatório estabelecido e a celeridade da tramitação processual na acção executiva, tendo em conta o escopo do processo judicial tributário de execução é sempre de assegurar a efectiva cobrança da dívida.
O. Face às circunstâncias concretas, a ausência de elementos demonstradores da efectiva existência do crédito e do seu quantum e condições de pagamento, bem como da demonstração da anuência do credor à prestação dessa garantia porque aquele é uma pessoa jurídica distinta do executado (ainda que integrantes do mesmo grupo económico em que é dominante a executada), apenas poderia ser indeferido o requerido.
R. A inclusão dentro da esfera da capacidade (de gozo e de exercício de direitos) da prestação de garantia a favor de sociedade do grupo, nos termos do disposto no art. 6º, nº 3 do CSC, no âmbito de uma relação de domínio ou de grupo, não anula a personalidade jurídica autónoma de cada uma das sociedades.
S. Tal como sucede com o pedido de dispensa da prestação de garantia a apresentar pelo executado (cfr. artigos 170º, n.º 3, e 199º, n.º 3, do CPPT), também os terceiros (cfr. artigo 196º, n.º 8, do CPPT) que se ofereçam para prestar garantia, estão onerados com a prova dos respectivos pressupostos fácticos do exercício desse seu direito, que neste caso significam a demonstração da legitimidade naquela assunção de dívida alheia.
T. Desta forma, deve considerar-se legal e manter na ordem jurídica a decisão da AT que indeferiu o requerimento apresentado considerando que o requerente nem sequer demonstrou a idoneidade da garantia oferecida, por ser a decisão que melhor serve a justiça e o direito, tendo em conta a compatibilização e harmonização dos princípios que obrigam a AT e os contribuintes e os interesses que os mesmos visam salvaguardar.
Termos em que,
deve conceder-se provimento ao presente recurso, determinando a manutenção do acto de indeferimento exarado pela AT por não ter sido demonstrada no pedido formulado a idoneidade da garantia oferecida para responder pelas dívidas exequendas e acrescido.


Foram apresentadas CONTRA-ALEGAÇÕES com as seguintes CONCLUSÕES

1ª - O efeito meramente devolutivo nos recursos constitui o princípio-regra, apenas se admitindo a atribuição de efeito suspensivo em dois casos excepcionais:
i) ser prestada garantia; e, ii) afectação do efeito útil do recurso (Cfr. Artº 286º, nº2, do CPPT).
2ª - A Recorrente não deduziu justificação fáctica ou jurídica para a pretensão de atribuição de efeito suspensivo ao recurso, como é obrigatório, nos termos do nº4 do Artº 647º do novo CPC.
3ª - Nem alegou, nos termos do nº 2 do Artº 286º do CPPT, que o efeito meramente devolutivo afecta o efeito útil do recurso.
4ª - A Recorrente foi absolutamente omissa no que se refere aos factos, fundamentos ou razão de ser, mesmo origo peticionis, da sua pretensão de ver atribuído efeito suspensivo ao recurso que interpôs.
5ª - Para que ao recurso fosse atribuído efeito suspensivo, era pressuposto ou condição que a Recorrente o tivesse requerido ao juiz, devendo, ainda, alegar e provar os factos consubstanciadores da afectação do efeito útil que para si resulta da atribuição do efeito meramente devolutivo:
(cfr.: Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, Processo: 00511/06.4BEPNF, Secção: 2ª Secção - Contencioso Tributário, Data do Acordão: 15-10-2009, Relator: Moisés Rodrigues
Não tendo a Recorrente, Fazenda Pública, invocado qualquer possível afectação do efeito útil, [...] o presente recurso jurisdicional só pode ter efeito meramente devolutivo, fixado, como regra, no art. 286º nº2 (parte inicial) do CPPT.
Em suma, no âmbito do processo judicial tributário, os recursos jurisdicionais têm efeito meramente devolutivo, excepto, para todos os intervenientes processuais, com legitimidade para recorrer, se invocarem e comprovarem que o mesmo prejudica o efeito útil do apelo e para aqueles sujeitos que, tendo ou possam prestar, assegurem a existência de garantia, hipóteses em que os respectivas recursos terão efeito suspensivo.
(…)
Ao contrário, manifestamente, nenhum circunstancialismo foi invocado ou se vislumbra como capaz de viabilizar o reconhecimento de que [...] a execução imediata da decisão posta em causa poderia redundar na produção do tipo de prejuízo supra realçado;
Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, Processo: 00259/01 - COIMBRA, Secção: 2º Secção - Contencioso Tributário, Data do Acordão: 10-01-2008, Relator: Fonseca Carvalho
Ou seja, sendo, abstractamente e em princ4’io, aplicável a todos os acima aludidos sujeitos processuais o efeito simplesmente devolutivo, em tese, qualquer um deles pode pretender e obter a fixação de eficácia suspensiva ao recurso que interponha, desde que, preste ou aponte a existência de garantia, bem como, alegue e demonstre que o efeito devolutivo põe em causa a obtenção do efeito útil do recurso.
(...)
Em suma, no âmbito do processo judicial tributário, os recursos jurisdicionais têm efeito meramente devolutivo, excepto, para todos os intervenientes processuais, com legitimidade para recorrer, se invocarem e comprovarem que o mesmo prejudica o efeito útil do apelo e para aqueles sujeitos que, tendo ou possam prestar, assegurem a existência de garantia, hipóteses em que os respectivos recursos terão efeito suspensivo;
Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, Processo: 0669/08, Data do Acordão: 07-01-2009, Tribunal: 2 SECÇAO, Relator: JORGE DE SOUSA
A regra que se extrai daquele art 282.ºe a de o efeito ser devolutivo, pelo que a atribuição de efeito suspensivo só pode ocorrer se se verificar uma das excepções nele referidas…
6º - Não se lobriga um único fundamento ou razão para que a Recorrente requeresse o efeito suspensivo, pois que se a sentença recorrida for revogada, o que se não admite nem concede, o despacho reclamado manterá erectos os seus efeitos, podendo a AT prosseguir os meios e diligências para cobrança da dívida exequenda (Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 07.01.2009, in www.dgsi.pt/jsta
- A Reclamação do despacho que indeferiu o oferecimento da garantia por parte da Recorrida tem, como teve, subida imediata e efeito suspensivo, nos termos do Artº 278º do CPPT, a benefício do executado, no caso, a aqui Recorrida, não sendo de admitir que da decisão proferida sobre essa reclamação e que deu total procedência à pretensão da Reclamante, aqui Recorrida, possa haver recurso com efeito suspensivo.
- O ordenamento jurídico integrado pelas normas do CPPT resultaria, a fmal, num sistema perverso, anacrónico do ponto de vista da sua sistematização e monstruosamente iníquo!
9a - Ao recurso deveria ter sido atribuído efeito meramente devolutivo, nos termos do nº 2 do Artº 286º do CPPT.
loa - A decisão de admissão do recurso não especifica os fundamentos de facto e de direito quanto à atribuição de efeito suspensivo ao recurso, pelo que à Recorrida é completamente impossível sindicar, compreender ou conhecer os motivos ou razões que enformaram a decisão de atribuir ao recurso efeito suspensivo, o que gera nulidade (cfr. alínea b) do nº 1 do Artº 615º do CPC).
1V - A atribuição do efeito suspensivo não podia ter sido decidida sem ouvir a Recorrida, como decorre quer do cotejo entre o nº 2 do Artº 648º e do no 4 do Artº 647º, ambos do CPC, quer do princípio do contraditório que postula que o juiz não pode decidir quaisquer questões sem que ambas as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem, sob pena de nulidade (cf. nº 4 do Artº 3º do CPCJ.
122 Como à luz do n0 5 do Artº 641º do CPC, não é admissível recurso ordinário da decisão que admita o recurso, fixe a sua espécie e determine o efeito que lhe competir, a Reclamante arguiu, no dia 14.01.2014, as nulidades nos próprios autos de Reclamação perante a Meritíssima Sra. Dra. Juíza que proferiu a decisão de admissão do recurso, nos termos do nº 4 do Artº 615º do CPC.
132 - Caso a Recorrida tivesse sido, que não foi, notificada para se pronunciar sobre o efeito suspensivo do recurso, não poderia deixar de se opor frontal e categoricamente a uma tal pretensão, pois que para si é que decorre prejuízo considerável da atribuição desse efeito.
- De facto, ao não suspender a execução e ao emitir mandados de penhora sobre contas bancárias, valores mobiliários e créditos da executada, no valor unitário de mais de dois milhões de euros, numa época em que a esmagadora maioria das empresas atravessa uma grave crise financeira e enormes dificuldades de tesouraria, a Recorrente impede que a executada cumpra com os seus compromissos mais elementares, como pagar aos seus trabalhadores, fornecedores, rendas das suas instalações, água, luz, consumíveis, contribuições à Segurança Social, etc., sendo susceptível de conduzir a Executada, aqui Recorrente, a uma situação de completa inoperacionalidade e de sério risco de insolvabilidade.
152 - A decisão recorrida faz a correcta interpretação e aplicação das regras de direito aos factos provados, pelo que nenhuma censura merece.
16 - A Recorrente vem alegar “ex novo” um outro argumento, qual seja a da falta de demonstração da anuência do credor dos créditos sobre a RÁM (ver Conclusão Q.), que não consta do despacho que foi anulado pela sentença.
172 - Pelo contrário, é referido no despacho reclamado, no que respeita à relação das empresas integradas em grupo, concretamente no Grupo Recorrido, o Grupo A…….., SGPS, SA, que, “No caso vertente existe uma relação de domínio da executada sobre a sociedade garante, pelo que a eventual prestação da garantia oferecida não é contrária aos se fim”.
182 - Ou seja, aceitou-se no despacho anulado que, para efeitos do nº 3 do Artº 6º do CSComerciais, a garantia era irrepreensível, não tendo merecido qualquer reparo ou objecção, pelo que constitui manifesta má-fé e ilegalidade vir invocar, agora, este novo argumento!
192 - Está assente que a Recorrida, no âmbito do processo executivo principal, manifestou a sua intenção de apresentar meio gracioso ou contencioso para discussão da legalidade da dívida exequenda, declarando, do mesmo passo, que pretendia a suspensão do processo executivo, para o que solicitou a fixação do valor da garantia a pagar e ofereceu para constituição da mesma e até ao montante de € 2.743.124,00 - quantia exequenda - os créditos que a Sociedade de Construções A…….., SA, sua participada e por si dominada a 100%, detém sobre a 11AM, no valor de € 10.958.965,86.
2o - Está assente que a Reclamante, aqui Recorrida, foi aos autos de Execução, por requerimento apresentado em 06.11.2012, dar conhecimento de que já havia apresentado Impugnação Judicial da liquidação que está na base da Execução, tendo junto um exemplar da referida peça processual.
- Para o efeito do oferecimento da garantia e suspensão do processo executivo, a Recorrida juntou àquele seu requerimento uma Declaração do Governo Regional da Região Autónoma da Madeira (RAM), na qual o Governo Regional declara, certifica e reconhece ser devedor de uma dívida na importância de € 10.958.965,86 à Sociedade de Construções A…….., SA, detida a 100% pela aqui Recorrida.
2V - A Declaração do Governo Regional da RAM foi junta em forma de documento autenticado e que a Recorrente não pôs em causa o seu valor probatório.
- Tal como se diz na douta sentença recorrida, a garantia oferecida pela Recorrida é em abstracto de aceitar em face do disposto nas disposições do CPPT.
24 - É manifesta a idoneidade como garantia do bem oferecido trata-se de um crédito sobre a Administração Pública do Estado, no caso da Região Autónoma das Madeira, pelo que comprovada está a capacidade do devedor para satisfazer os compromissos.
25 - É difícil imaginar uma outra garantia que assegure maior idoneidade e adequação aos fins pretendidos.
- Estamos em presença de valores monetários, imediatamente fungíveis por parte de um devedor que é o Estado, uma vez que, não obstante a autonomia da política-administrativa regional, reconhecida às Regiões Autónomas, tal não afecta a integridade da soberania do Estado (nº. 3 do artigo 225º da CR19, que é unitário (artigo 6º. CRP).
- Esta dívida não implica, assim, a necessidade de conversão por via de venda em valores monetários porque ela própria é valores monetários.
- Tal garantia oferece, aliás, a nosso ver, maior liquidez do que a própria hipoteca sobre bens imóveis, tipo de garantia expressamente enunciada como garantia idónea no texto da lei.
- Ainda que a idoneidade (da garantia) seja um conceito relativamente indeterminado, a Doutrina e a Jurisprudência assentam pacificamente no entendimento de que idónea quer dizer “adequada ao fim em vista” (Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo 0646/12 de 27-06-2012:”A garantia bancária, caução ou seguro-caução oferecem melhor garantia em face da hipoteca por gozarem de maior liquidez, mas o objectivo do legislador não é o de dotar a Administrarão Fiscal de garantia absoluta do seu crédito, mas tão só de garantia idónea, o mesmo é dizer adequada ao fim em vista”
30 - Que o crédito existe é inequívoco atento o conteúdo da Declaração do Governo Regional da Madeira.
31 - Atento o disposto no Artº 777º do Código Civil: na falta de estipulação ou disposição especial da lei, o credor tem o direito de exigir a todo o tempo o cumprimento da obrigação, assim como o devedor pode a todo o tempo desonerar-se dela.
32” - O devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que está vinculado, di-lo o Artº 762º, nº 1, do Código Civil, e que a prestação deve ser realizada integralmente e não por partes, excepto se outro for o regime convencionado, estipula o Artº 763º, nº 1, do Código Civil.
33ª - Dos termos da declaração de confissão de dívida, resulta que o crédito é imediatamente exigível da entidade devedora, a RAM.
34ª - É incontroverso e incontrovertível que a Recorrida cumpriu integralmente o seu ónus, circunscrito, obviamente, ao oferecimento de uma garantia susceptível de assegurar os créditos da AT, juntou a Declaração do Governo Regional da Madeira na qual é reconhecida e certificada a dívida de € 10.958.965,86 e, inclusive, juntou o documento sob forma autenticada.
35ª- Dito de outra forma, a Recorrida deu plena satisfação aos requisitos dos Artigos 169º. nº 2, e 199º, nº 1. ambos do CPPT.
36ª - Como acertadamente se diz na douta sentença recorrida, se a Recorrente tinha dúvidas, sobre ela recaía o dever de notificar a Recorrida para suprir eventuais deficiências, prestar esclarecimentos ou solicitar mais informações.
37ª - A AT não estava desobrigada, no procedimento tributário, de decidir de acordo com o principio do inquisitório, no sentido de que devia ter realizado todas as diligências necessárias à descoberta da verdade material, não estando subordinada à mera alegação dos factos pela Reclamante (cfr. Artº 58º da LGT).
38ª- E seria bem simples e fácil à Recorrente ter prosseguido a descoberta da verdade material, pois que o crédito oferecido em garantia é, como se disse, sobre a própria Administração Pública, no caso a Administração Pública Regional - a Região Autónoma da Madeira (RAM).
39ª- Por outro lado, foi facultado à Recorrente, e está junto aos autos, documento autêntico comprovativo da existência do crédito e seu montante, cujo valor probatório a Recorrente não pôs em causa, no caso uma declaração de confissão de dívida da autoria e emitida pela entidade devedora, a RAM.
40ª- A Recorrente, caso tivesse dúvidas, poderia ter instado a Recorrida a fazer melhor comprovação da existência do crédito, quer juntando outros documentos, quer apresentando testemunhas, tudo ainda ao abrigo do citado princípio do inquisitório e também do princípio da colaboração (cfr. Artº 59º da LGT).
41ª- Ademais, presume-se a boa-fé da actuação dos contribuintes (cfr. cit. Artº 59º, nº 2, da LGT).
42ª - A Recorrente vira do avesso as regras do ónus da prova, pois que, tendo a Recorrida junto documento consubstanciador da constituição e existência do crédito sobre a RAM, era à Recorrente que competia QM demonstrar factos tendentes a neutralizar ou destruir a força probatória dessa declaração de confissão de dívida, o que não fez, OU, como se entende na douta sentença recorrida, se tinha dúvidas, convidar a Recorrida a suprir ou esclarecer essas dúvidas, carreando para os autos os meios de prova tidos por necessários.
43ª - O que não podia era decidir arbitrariamente a falta de idoneidade da garantia sem levar a cabo as diligências necessárias à descoberta da verdade material (Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, Processo: 01414/12, Data do Acordão: 19-12-2012, Relator: FERNANDA MAÇÃS
Acontece que a Administração Fiscal não fez qualquer juízo sobre a concreta fiança apresentada. Por outro lado, se tivesse dúvidas sobre a capacidade financeira da fiadora deveria ter solicitado mais elementos e não ter pura e simplesmente indeferido o pedido com base em argumentos sobre a falta de idoneidade em abstracto da fiança para funcionar como garantia.
Na verdade, o problema reside no facto a Administração Fiscal não ter procedido à avaliação em concreto da idoneidade da garantia prestada, no âmbito da qual não estaria impedida de colher dados e informações sobre, por exemplo, os ónus ou garantias que incidem sobre o património da empresa fiadora, a identificação dos beneficiários, podendo até pedir certidão sobre as fianças já existentes. Acresce que também não estaria igualmente impedida de exigir a actualização periódica no futuro destes dados bem como dos relativos a informações sobre o balanço da empresa fiadora.
Em suma, não tendo o órgão de execução fiscal procedido à avaliação em concreto da garantia oferecida, que rejeitou exclusivamente com o fundamento que este tipo de garantia - fiança - não seria admissível, apenas com o argumento da sua maior segurança e qualidade (liquidez imediata), significa que não há interesse público que justifique o sacrifício dos interesses da Executada
Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, Processo: 01423/11.5BEPRT, 2’ Secção, Data do Acórdão: 30-11-2011, Relator: Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos
Por ouro lado, o ónus de demonstrar a solvabilidade do fiador não desonera o Órgão de Execução Fiscal de a confirmar através dos elementos de que disponha e que serão, em princípio, muito superiores aos que acede o credor privado, dado o extenso conjunto de obrigações acessórias que impendem sobre os sujeitos passivos e que asseguram o acesso a informação económico-financeira privilegiada. Pelo que a rejeição de fiança com base na insuficiência de dados que atestem a idoneidade do fiador não dispensaria uma referência aos dados de que própria Administração Tributária dispõe. E o princípio da colaboração sempre reclamaria que o Orgão de Execução Fiscal solicitasse os elementos relevantes antes de rejeitar a garantia com tal fundamento.
Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, Processo: 02606/ll.3REPRT, 2’ Secção, Data do Acórdão: 08-03-2012, Relator: Anabela Ferreira Alves Russo
Por outro lado, o ónus de demonstrar a solvabilidade do fiador não desonera o Órgão de Execução Fiscal de a confirmar através dos elementos de que disponha e que serão, em principio, muito superiores aos que acede o credor privado, dado o extenso conjunto de obrigações acessórias que impendem sobre os sujeitos passivos e que asseguram o acesso a informação económico-financeira privilegiada. Pelo que a rejeição de fiança com base na insuficiência de dados que atestem a idoneidade do fiador não dispensaria uma referência aos dados de que própria Administração Tributária dispõe. E o princípio da colaboração sempre reclamaria que o Órgão de Execução Fiscal solicitasse os elementos relevantes antes de rejeitar a garantia com tal fundamento.
44ª - Bem andou, por isso, a Meritíssima Sra. Dra. Juíza a quo ao decidir-se pela anulação do despacho reclamado.
TERMOS EM QUE
deve ser atribuído efeito meramente devolutivo ao recurso e ser-lhe negado provimento , mantendo-se in totum a douta decisão recorrida.
ASSIM SE FARÁ JUSTIÇA!

Através do despacho de fls. 261 o Mº Juiz alterou o efeito anteriormente fixado ao recurso para efeito meramente devolutivo.

Reagiu a Fazenda Pública a fls. 266 pretendendo a supressão de um parágrafo do despacho de fls. 261

Decidiu o Mº Juiz o seguinte:

Fls. 266 e as. dos autos

Pelo requerimento de fls. Supra mencionadas vem a FP arguir a nulidade do despacho proferido a fl. 261 dos autos, ao que a reclamante respondeu nos termos que resultam de fls. 271 e ss, dos autos.
Analisado o requerimento e o teor do despacho conclui-se que o despacho não produz qualquer alteração à decisão anteriormente proferida, tal como vem invocado.
Concretizemos. -
O despacho proferido pronuncia-se e decide apenas sobre o efeito do recurso interposto.
Não foi em momento algum solicitada a reforma da sentença ou o esclarecimento da mesma e o referido despacho não tem, nem podia ter, esse intuito.
Acresce que, a interposição da Reclamação tem como corolário natural a proibição de tramitação da execução fiscal após a subida do processo a tribunal, sendo esse o esclarecimento que se produziu no despacho em questão, pois só assim se assegura a tutela jurisdicional efectiva dos direitos e/ou interesses do reclamante (art. 20. º, n. º 1 e 268.º, n. º 4 da CRP).
Assim, a utilização do termo “suspensa” não visava a figura jurídica da “suspensão” tal como foi entendido pela FP, mas apenas aludia à proibição de tramitação nos moldes acima referidos.
Com o presente esclarecimento, vai indeferida a arguida nulidade do despacho. Notifique.
Após, conclua de novo,

Deste despacho interpôs a Fazenda Pública recurso com as seguintes conclusões:

A. Vem o presente recurso interposto contra o douto despacho judicial (a fls. 281 dos autos) proferido em 29/04/2014 e notificado à Fazenda Pública (FP) em 5/05/2014, no processo à margem melhor identificado, que indeferiu a nulidade arguida pela FP do despacho proferido pelo Tribunal a quo a fls. 261 dos autos, nos termos do art.º 280º, n.º 1 do CPPT.
B. Em 16/12/2013, o Tribunal a quo proferiu sentença nos presentes autos, julgando procedente a reclamação apresentada, determinando a anulação do despacho reclamado, por violação, por parte da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), dos princípios do inquisitório e da cooperação entre as partes, tendo a FP recorrido de tal decisão, interpondo o recurso juntamente com as respetivas alegações, talqualmente prevê o art.º 283.º do CPPT, onde se requeria a subida imediata nos próprios autos e efeito suspensivo.
C. Por despacho de 8/01/2014, a Meritíssima Juiz a quo proferiu despacho reconhecendo a legitimidade da Recorrente, a tempestividade do recurso, determinando a subida imediata nos próprios autos e com efeito suspensivo, tendo a ora Recorrida reclamado de tal despacho por não concordar com o efeito do recurso aí fixado.
D. Por despacho de 27/02/2014, o Tribunal a quo alterou o efeito do recurso, transformando-o em recurso com efeito meramente devolutivo, apresentando algumas justificações para a decisão que tinha proferido no anterior despacho, designadamente que “(...) a execução permaneceria suspensa até a decisão final transitada em julgado”.
E. Não concordando com aquele “esclarecimento”, a FP arguiu a nulidade do despacho quanto a esse parágrafo, por entender que o despacho que fixa o efeito do recurso deve circunscrever-se a essa decisão, e não, a fixar no despacho judicial, a suspensão da execução ou declarar suspensa a tramitação da execução, extravasando desta forma, as competências do Tribunal quanto à fixação do efeito do recurso, arguição que foi indeferida pelo despacho datado de 29/04/2014, notificado à FP em 5/05/2014, onde acrescenta que “a utilização do termo suspensa não visava a figura jurídica da suspensão tal como foi entendido pela FP, mas apenas aludia à proibição de tramitação nos moldes acima referidos”.
F. O presente recurso para o Supremo Tribunal Administrativo é admissível porquanto no despacho ora recorrido, não foi proferida decisão somente sobre o efeito do recurso, tendo o Tribunal a quo decidido que a execução estava suspensa desde o momento da interposição da presente reclamação (se a decisão contivesse apenas a decisão do efeito do recurso, a mesma não podia ser impugnada por força do art.º 641º, n.º 5 do CPC, aplicável ex vi do art.º 281.º do CPPT), decisão que no entender da FP, condenou em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido (art.º 615º, n.º 1, al. e) do CPC, aplicável ex vi do art.º 2º, al. e) do CPPT).
G. O art.º 630º, n.º 1 do CPC estabelece que “Não admitem recurso os despachos de mero expediente nem os proferidos no uso de um poder discricionário”, sendo que «os despachos de mero expediente destinam-se a prover ao andamento regular do processo, sem interferir no conflito de interesses entre as partes», ao passo que «consideram-se proferidos no uso legal de um poder discricionário os despachos que decidam matérias confiadas ao prudente arbítrio do julgador» - Abílio Neto, in Código do Processo Civil Anotado, 20.ª Edição, Abril/2008, pag. 980.
H. O despacho que ora se recorre interfere no conflito de interesses entre as partes, porquanto a AT não suspendeu a execução com a interposição da reclamação nem a ora Recorrida requereu tal suspensão (de forma imediata porque, ao recorrer do despacho que indeferiu a garantia proposta, de forma mediata, está a requerer a suspensão) na reclamação judicial interposta, sendo que a ora Recorrida se sente legitimada pelo teor do despacho de que se recorre, a solicitar a suspensão da execução junto do órgão de execução fiscal, em cumprimento de uma decisão judicial.
I. O cumprimento das decisões judiciais por parte da AT só é exigido quando a mesma transitar em julgado, significando isso que sempre que as decisões lhe sejam desfavoráveis, só após confirmação (ou não) da decisão de primeira instância por Tribunal Superior, é que a AT está obrigada a cumprir a decisão, sendo, por isso, indiferente o efeito atribuído ao recurso, conforme estatuem os artigos 102º, n.º 1 da LGT, 146.º do CPPT, 160.º e 170.º e seguintes do CPTA - vide, a este propósito Jorge Lopes de Sousa, in CPPT, anotado e comentado, 6.ª Edição 2011, Áreas Editora, pag. 510, em anotação ao art.º 286.º do CPPT; Acórdãos do STA de 21/01/2009, proc. 0668/08 e de 07/01/2009, proc. 0669/08.
J. O despacho ora recorrido tem como efeito averiguar da legitimidade, da tempestividade e da admissibilidade do recurso interposto, atribuindo-lhe o respetivo efeito, não tendo o efeito que a Recorrida lhe pretende atribuir, qual seja a suspensão da execução.
K. Dispõe o art.º 169.º do CPPT que a execução fica suspensa até à decisão do pleito em caso de reclamação graciosa, impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objeto a legalidade da dívida exequenda, desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195.º ou prestada nos termos do art.º 199.º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido.
L. Tendo apresentado impugnação judicial da liquidação que está na base da presente execução, a Recorrida apresentou garantia visando a suspensão do processo de execução fiscal, tendo a mesma sido indeferida, indeferimento que foi objeto da presente reclamação (nos termos do artº 276.º e seguintes do CPPT), motivo pelo qual a AT entendeu que a execução não estava suspensa, prosseguindo a execução contra bens da Recorrida no sentido da cobrança do crédito tributário.
M. Conforme resulta da conjugação do art.º 278.º e 97º, n.º 1, al. n), ambos do CPPT, no caso de subida imediata, a reclamação deve subir por apenso, nada obrigando a que a execução seja suspensa por causa da pendência da reclamação que subiu de imediato ao tribunal.
N. De resto, a alteração legislativa que deu origem à atual redação do art.º 97º, n.º 1, al. n) do CPPT, visa precisamente evitar a suspensão do PEF quando a reclamação não subir a final (note-se que estamos perante uma norma processual que tem aplicação imediata no tempo - art.º 12.º da LGT).
O. Por outro lado, o Tribunal não tem competência nem fundamento legal para determinar a suspensão da execução. Com efeito, as formas e fundamentos de suspensão da execução estão previstos no CPPT, cabendo a competência para a decisão da suspensão ao órgão de execução fiscal e não ao tribunal.
P. Por isso, nunca o tribunal poderia, em qualquer circunstância, decretar a suspensão da execução (ou declarar a proibição da tramitação do PEF) tal como o fez no despacho ora recorrido, pois ultrapassou a sua competência decisória, devendo ser declarado nulo nessa parte, nulidade que ora se requer para todos os efeitos legais.
Termos em que,
Deve o presente recurso ser admitido e, consequentemente, ser concedido provimento, revogando-se a decisão proferida na parte em que declara a suspensão da execução ou proibição da tramitação da execução fiscal, com as legais consequências.

Foram apresentadas contra-alegações nas quais se considerou que devia ser negado provimento a este recurso. (dada a extensão das mesmas não se reproduzem)

O Ministério Público emitiu parecer do seguinte teor:

Recurso de fls. 166 e ss.:
Parece de improceder, porquanto o juízo de idoneidade da garantia não pode assentar em juízos sobre a prevalência a dar a certas formas de garantia em detrimento de outras previstas na lei, nem de ordem formal relacionadas com o tempo decorrido desde que terceiro assumiu a divida, mas sem fundamento jurídico que a tal obste”.

Recurso de fls. 284 e ss.:
“Parece não ser de conhecer do mesmo por relativo ao efeito do anterior recurso, o qual apenas é possível alterar nos termos do art. 652. º n. º 1 al. a) do actual CPC “.

2- FUNDAMENTAÇÃO:
.
a) Por dívidas de impostos englobados em conta corrente no montante de €2.163.530,35, foi instaurado em 19/09/2012, contra a sociedade “A….., SGPS, SA”, aqui, Reclamante, o processo executivo n. º 3174201201088327 a correr termos no serviço de Finanças do Porto 1 (cf. fls. 26 a 28 dos autos).
b) A Reclamante foi citada para o processo executivo referido em a) em 25/09/2012 (cf. fls. 29 dos autos).
c) No âmbito daquele processo, a Reclamante através de requerimento registado sob a entrada n. º 31742012E013721, de 10/10/2012, veio manifestar a sua intenção de apresentar meio gracioso ou contencioso para discussão da legalidade ou exigibilidade da dívida exequenda e indicando que pretendia a suspensão do processo executivo solicitou a fixação do valor da garantia a prestar e, ofereceu para constituição da mesma e até à quantia de €2.743.124,00, os créditos que a sociedade “A…… SA”, sociedade por si participada a 100%, detém sobre a Região Autónoma da Madeira, juntando para o efeito cópia do ofício com o registo de saída n. º 1581 de 2011.11.14 da Direcção Regional de Finanças, Secretaria Regional do Plano e Finanças, Governo Regional da Região Autónoma da Madeira, onde aquela entidade reconhece a dívida (cf. fls. 30 a 34 dos autos).
d) Em 02/11/2012, a Reclamante intentou no TAF do Porto impugnação judicial (cf. fls. 38 dos autos).
e) Sobre o oferecimento da garantia apresentado pela Reclamante recaiu a informação, datada de 25/10/2012 (fls. 41 a 43 dos autos), com o seguinte teor:







f) E sobre a informação assim elaborada recaiu o despacho da Directora Adjunta de Finanças de 20/11/2012, com o seguinte teor: “Concordo. Nos termos e com os fundamentos da presente informação indeferido o pedido. Notifique” (cf. fls. 40 dos autos).
g) A decisão referida em O foi comunicada à Reclamante através do ofício n. º 10025, de 23/11/2012, e ao mandatário da reclamante através do ofício n. º 10026 da mesma data, ambos recebidos em 27/11/2012 (cf. fls. 44 a 47 e 54 e 55 dos autos).
h) Em 23/11/2012 foi elaborado nos competentes serviços o auto de impugnação (cf. fls. 48 a 53 dos autos).
i) A presente reclamação foi deduzida em 04/12/2012 (cf. fls. 2 dos autos).

FACTOS NÃO PROVADOS
Dos autos não resultam provados outros factos com interesse para a decisão da causa.

3- DO DIREITO:
Para se decidir pela procedência da reclamação considerou Mº juiz de 1ª Instância o seguinte: (destacam-se apenas os trechos da sentença com maior relevo para o presente recurso)

1- RELATÓRIO
GRUPO A………, SGPS, SA, pessoa colectiva n. º ……., com sede na Rua …….., n. º ……., Porto, deduziu a presente reclamação visando o despacho proferido pela Directora de Finanças Adjunta de 20 de Novembro de 2012, que indeferiu o oferecimento de garantia da dívida exequenda e suspensão da execução mediante o oferecimento de créditos que a sociedade A..…, SA, detém sobre a Região Autónoma da Madeira, até ao montante de €2.743.124,00.
(…)
Posteriormente, os autos foram com vista ao IMMP que emitiu o parecer de fls. 142/144 no sentido da improcedência da reclamação.
2-SANEAMENTO PROCESSUAL
(…)
3-. OS FACTOS
(…)
4-OS FACTOS E O DIREITO
Assente que se mostra a factualidade com interesse para a decisão da causa cumpre, agora, efectuar a sua subsunção jurídica.
Em causa está o despacho proferido pela Directora Adjunta de Finanças, em 20/11/2012, que indeferiu o pedido de prestação de garantia da divida exequenda e suspensão da execução mediante o oferecimento de créditos que a sociedade “Construções A…….., SA”, participada, indirectamente, a 100% da Reclamante, detém sobre a Região Autónoma da Madeira, até ao montante de €2.743.124,00.
Cumpre apurar se o despacho mencionado é nulo por violar o princípio da participação, por a AT estar obrigada a comunicar o projecto de decisão e sua fundamentação, e se por não o ter feito violou o art. 60. º da LGT e, ainda, saber se a AT violou o princípio do inquisitório e da colaboração no sentido de que devia realizar todas as diligências necessárias à descoberta da verdade material não se limitando à alegação dos factos por parte da Reclamante.
Depois, cumpre apurar se a garantia oferecida é idónea e se este é o meio apropriado para decidir sobre o pedido de dação em pagamento formulado pela Reclamante.
Vejamos.
A Reclamante, após ser citada para o processo executivo em apreço nestes autos, requereu a suspensão do processo oferecendo garantia e declarando expressamente que pretendia apresentar meio gracioso ou judicial para discussão da legalidade ou da exigibilidade da dívida exequenda, tudo a coberto do disposto nos artigos 169º e 199º, ambos do CPPT.
O art. 169. º do CPPT, refere que a execução fica suspensa até à decisão do pleito em caso de reclamação graciosa, impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objecto a legalidade da dívida exequenda, desde que tenha sido constituída garantia nos termos do art. 195º (hipoteca ou penhor) ou prestada nos termos do art. 199. º do CPPT, ou a penhora garanta a totalidade da dívida exequenda e acrescido.
Por seu turno, o art. 199. º do CPPT, para o que aqui interessa, dispõe:
“1 - Caso não se encontre já constituída garantia, com o pedido deverá o executado oferecer garantia idónea, a qual consistirá em garantia bancária, caução, seguro-caução ou qualquer meio susceptível de assegurar os créditos do exequente;
2 - A garantia idónea referida no número anterior poderá consistir, ainda, a requerimento do executado e mediante a concordância da administração tributária, em penhor ou hipoteca voluntária, aplicando-se o disposto no art. 195º, com as necessárias adaptações;
Também o art. 52. º, n. º 2 da LGT refere que “A suspensão da execução nos termos do número anterior depende da prestação de garantia idónea nos termos das leis tributárias”.
Assim sendo, nos termos do art. 169. º do CPPT a execução pode ser suspensa desde que prestada garantia ou efectuada penhora que garanta a totalidade da dívida e do acrescido.
Relativamente à prestação de garantia o art. 199. º do CPPT diz que esta pode consistir em garantia bancária, caução, seguro-caução ou qualquer meio susceptível de assegurar os créditos do exequente, nomeadamente o penhor e a hipoteca voluntária (nestes casos mediante concordância da administração tributária) (negrito e sublinhado nosso).
O art. 199.º, n. º 2 do Código de Procedimento e Processo Tributário confere à administração uma certa margem de discricionariedade para decidir, em função de cada caso concreto, se a garantia prestada é ou não «idónea» para assegurar a cobrança efectiva da dívida exequenda, impondo-se, especificamente, nos casos da hipoteca voluntária e do penhor, a concordância da administração tributária.
In casu, a Reclamante, depois de declarar que pretendia recorrer a meio gracioso ou judicial, e de invocar que não dispunha de quaisquer outros bens ou rendimentos para dar em garantia, assim como não lhe era possível obter garantia bancária ou seguro-caução, atenta a actual conjectura de crise económico-financeira e consequente falta de financiamento e de apoio por parte das instituições bancárias, financeiras e seguradoras, ofereceu como garantia parte dos créditos (de montante superior a €10.000.000,00) que a sociedade “Construções A…….., SA”, sociedade sua participada (indirectamente) a 100%, detém sobre o Estado, concretamente, sobre a Região Autónoma da Madeira (RAM), apresentando para o efeito cópia do ofício com o registo de saída n. º 1581 de 2011.11.14 da Direcção Regional de Finanças, Secretaria Regional do Plano e Finanças, Governo Regional da Região Autónoma da Madeira, onde aquela entidade reconhece a dívida,
A garantia não foi aceite com os fundamentos expressos no despacho reclamado.
A Reclamante começa por referir que não foi cumprido o disposto no art. 60. º LGT, ou seja, não foi dada execução ao princípio da participação, uma vez que a AT estava obrigada a comunicar à executada o projecto de decisão e sua fundamentação.
Todavia, carece de razão na alegação do vício de preterição de formalidade essencial - vício de violação do princípio da participação ao abrigo do disposto no art. 60. º da LGT.
Concretizemos.
(…)
Posto isto, vejamos, agora, o despacho reclamado e se ele padece dos vícios que lhe são assacados --Trata-se, agora, de saber se a AT violou o princípio do inquisitório e da colaboração no sentido de que devia realizar todas as diligências necessárias à descoberta da verdade material não se limitando à alegação dos factos por parte da Reclamante.
O despacho reclamado faz, primeiramente, uma incursão sobre as várias espécies de garantias e a preferência entre elas de acordo com o disposto no ofício circulado n. º 60076 de 20 10.07.29.
Desde já adiantámos que o art. 199. º, n.º 1 do CPPT não estabelece qualquer ordem de preferência entre as garantias a prestar, apenas as enuncia sem determinar preferências, prova disso é o próprio teor do n. º 1 do art. 199º quando refere “C..) ou qualquer meio susceptível de assegurar os créditos do exequente” pondo apenas a tónica na idoneidade ou não da garantia apresentada.
Pese embora o ofício circulado n. º 60076 de 2010.07.29 assim não o entenda, o certo é que tal ofício não tem força de lei e não é vinculativo para os Tribunais.
Depois, o despacho chama à colação o disposto no art. 74º, n. º 1 da LGT para dizer que “o ónus da prova dos factos constitutivos de direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque” e que, no caso em apreço, o ónus recaiu sobre o contribuinte (a Reclamante) dizendo, claramente, que da petição da reclamante não resulta provada a impossibilidade de constituição de garantia bancária, caução ou seguro-caução, nem sequer a idoneidade como garantia de bem oferecido, porquanto se desconhece se o crédito oferecido ainda existe e, existindo, desconhece-se qual a data e condições do seu pagamento, para concluir pela não aceitação da garantia oferecida porquanto a mesma não pertence ao elenco das garantias prioritariamente aceites.
Vejamos.
Do disposto no art.199.º, n.º.2, do C.P.P.T., não decorre que a A. Fiscal possa aceitar ou recusar qualquer garantia que lhe seja oferecida sem mais e de forma discricionária2, uma vez que o conteúdo de tal acto se encontra vinculado ao reconhecimento da idoneidade ou da inidoneidade da garantia concretamente apresentada 3.---
Ora, a garantia indicada pela Reclamante, sobre a forma de oferecimento de parte dos créditos que a sua participada tem sobre a RAM, em abstracto é de aceitar em face dos dispositivos legais supra mencionados.
Tal como acima já referimos, não podemos concordar com a AT quando alude a garantias prioritárias não podendo considerar-se este fundamento como válido para a recusa da garantia apresentada, uma vez que a tónica tem de incidir sobre a idoneidade ou não da garantia.
Resulta das disposições conjugadas dos arts. 169. º e 199. º do Código de Procedimento e Processo Tributário que a idoneidade da garantia se afere pela capacidade de, em caso de incumprimento do devedor, salvaguardar a efectiva cobrança da dívida exequenda e acrescidos.
A garantia idónea será pois aquela que é adequada para o fim em vista, ou seja, assegurar o pagamento totalidade do crédito exequendo e legais acréscimos 4. (2 Neste sentido cf. Ac. Do T.C.A. Norte de 22/0272012, processo 1809/11.5 3Neste sentido, cfr.Ac.T.C.A.Sul-2’.Secção, 15)3)2011, proc.4607/1 1. Neste sentido, vide, entre outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 21.09.2011, Recurso nº0786/li, de 11.07.2012, Recurso 730/12, de 10.10.2012, Recurso 916/12, e, na doutrina, Rui Duarte Morais, A Execução Fiscal, pag. 77, Alfredo José de Sousa e José da Silva Paixão, Código do Procedimento e de Processo Tributário Anotado, pag. 474, Jorge Lopes de Sousa, CPPT anotado e comentado, 6’ edição, Áreas Editora, Volume III, anotação 2 ao art. 199º. In: www.dgsi.pt.)
Por outro lado, e não olvidando, como se acentuou no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 14.03.2012, recurso 208Il2, que prestar garantia não é efectuar o pagamento, não poderá deixar de se concordar, também, que a prestação de garantia constitui uma vinculação de um determinado património ao cumprimento de uma determinada obrigação de pagamento.
Ora, a reclamante ofereceu como garantia parte dos créditos que a sua participada, alegadamente, detém sobre a RAM, no entanto, o pedido de prestação de garantia foi apresentado em 10/10/2012 e a prova da existência desses créditos é uma declaração emitida em 14/11/2011.
Entendeu a AT que aquela declaração, à distância em que tinha sido emitida, não era idónea para provar a existência dos créditos a que nela se aludia e que parcialmente se ofereciam como garantia, porquanto “se desconhece se o crédito oferecido ainda existe e, existindo, desconhece-se qual a data e condições do seu pagamento”.
Alega a Reclamante que ao decidir assim a AT violou o princípio do inquisitório e da colaboração no sentido de que devia realizar todas as diligências necessárias à descoberta da verdade material não se limitando à alegação dos factos por parte da Reclamante.
Desde já adiantámos que assentimos com a Reclamante,
É certo que cabe ao executado/Reclamante carrear para o procedimento todos os elementos, incluindo provas e demais informações, necessários ao êxito da sua pretensão, no entanto, e no caso de dúvida acerca dos elementos carreados para o processo impõe -se que a AF carrear para o processo não só os elementos de que disponha, mas também que convide o requerente/Reclamante a suprir a omissão da prova dos factos alegados, militando neste sentido os princípios da proporcionalidade, o dever de colaboração com os administrados e o seu direito à defesa.
Assim, e perante as dúvidas suscitadas acerca do crédito oferecido impunha-se ao órgão de execução fiscal notificar o requerente/Reclamante para suprir as deficiências, juntando os documentos julgados necessários, segundo os princípios do inquisitório e da cooperação das partes.
Atente-se que, a invocada insuficiência do requerimento da Reclamante neste aspecto não poderia ter como efeito imediato o indeferimento do pedido, antes impondo-se ao órgão de execução que encetasse diligências no sentido do suprimento da irregularidade ou insuficiência, “convidando” o requerente/Reclamante a instruir ou completar o pedido que lhe suscitava dúvidas.
Assim, ao abrigo dos princípios acima enunciados deveria o órgão de execução fiscal ter solicitado à Reclamante que esclarecesse “se o crédito oferecido ainda existia e, existindo, qual a data e condições do seu pagamento” e/ou outras informações que reputa-se de necessárias para ponderar da idoneidade da garantia oferecida.
Ao não convidar a Reclamante a fornecer tais informações violou os princípios do inquisitório e da cooperação entre as partes, o que importa declarar com a consequente anulação do despacho.
Por fim, adiante-se que não é este o meio próprio para decidir do pedido subsidiário formulado pela Reclamante de dação em pagamento de parte do crédito que a participada da Reclamante detém sobre a RAM.
Como muito bem refere a Reclamante no seu pedido de fls. 20/21 dos autos, tal questão deve ser suscitada nos próprios autos de execução e não por via da presente reclamação de actos.
5- DECISÃO
Ante o exposto, e sem mais delongas, julgo a presente reclamação procedente por provada e, em consequência, determino a anulação do despacho reclamado.

DECIDINDO NESTE STA

DO RECURSO INCIDENTE SOBRE O DESPACHO DE FLS: 261.

O efeito do recurso fixado no despacho de fls. 178 (efeito suspensivo) foi alterado para efeito meramente devolutivo através do despacho de fls. 261 o que se mostra acertado (artº 286º nº 2 do CPPT) não sendo pois caso para alteração do efeito por este Tribunal no uso dos poderes que lhe confere o artº 652º do CPC actual.
A sindicância do discurso argumentativo (consubstanciado na frase: “ Ora por mero lapso, induzido pela forma como o requerimento de interposição de recurso vinha elaborado, se admitiu o recurso com efeito suspensivo. Efectivamente o que se pretendia dizer era que a execução permaneceria suspensa até decisão final transitada em julgado e não atribuir efeito suspensivo ao recurso apresentado”) que levou à alteração do efeito do recurso não cabe nesta sede uma vez que, reitera-se, o último efeito fixado ao recurso se mostra acertado sendo que é o efeito fixado que determina consequentemente os efeitos legais sobre o andamento da execução fiscal e não qualquer esclarecimento/afirmação sobre o que o Mº juiz pretendia dizer e não disse. Tal configura-se como dito a mais, sem necessidade, e sem efeitos constitutivos sobre o andamento da execução fiscal o qual só pode ser determinado, como vimos, pelo efeito atribuído ao recurso que se mostra correcto. Pelo exposto, este Tribunal decide não conhecer do recurso apresentado relativamente ao despacho de fls. 261 dos autos.

DO RECURSO SOBRE O MÉRITO DA CAUSA

Nos presentes autos está em causa a bondade ou não da decisão de 1ª Instância que julgou procedente a reclamação e anulou o despacho reclamado na consideração de que não ocorreu a apreciação da idoneidade em concreto da garantia oferecida e que incumbia à AT o dever de convidar a reclamante a juntar elementos factuais antes de indeferir o seu pedido de prestação de garantia. Dito de outro modo: Perante as questões suscitadas acerca do crédito oferecido entendeu a sentença recorrida que se impunha ao órgão de execução fiscal a notificação do requerente/Reclamante para suprir as deficiências, juntando os documentos julgados necessários, segundo os princípios do inquisitório e da cooperação das partes.
Ao invés,
Na óptica da recorrente Fazenda Pública competia à reclamante ora recorrida demonstrar elementos concretos demonstradores da efectiva existência do crédito e do seu quantum e condições de pagamento, bem como da demonstração da anuência do credor à prestação dessa garantia porque aquele é uma pessoa jurídica distinta do executado (ainda que integrantes do mesmo grupo económico em que é dominante a executada), devendo considerar-se legal e manter na ordem jurídica a decisão da AT que indeferiu o requerimento apresentado considerando que o requerente nem sequer demonstrou a idoneidade da garantia oferecida,

De que lado está a razão?

O quadro legal (essencial) :
Os artºs 196º do CPPT, determina a possibilidade de pagamento em prestações e outras medidas.

O artº 199º do CPPT, determina no seu nº 1 que: “caso não se encontre já constituída garantia, com o pedido deverá o executado oferecer garantia idónea, a qual consistirá em garantia bancária, caução, seguro-caução ou qualquer meio susceptível de assegurar os créditos do exequente” e,
no seu nº 2 que: “A garantia idónea referida no número anterior poderá consistir, ainda, a requerimento do executado e mediante concordância da administração tributária, em penhor ou hipoteca voluntária, aplicando-se o disposto no artigo 195.º, com as necessárias adaptações”.
De onde retiramos que:
A garantia pode ser constituída por qualquer meio que assegure os créditos do exequente excepto se for de aplicar o Código Aduaneiro Comunitário.
A garantia há-de ser adequada a satisfazer o interesse do exequente, mas sem onerar ou afectar de forma grave os interesses legítimos do executado.
A garantia tem de ser idónea para assegurar os créditos do exequente e isenta de condições ou limitações.
A idoneidade da garantia afere-se pela capacidade de, em caso de incumprimento do devedor, estar salvaguardada a efectiva cobrança da dívida exequenda e acrescidos; o que tem levado este STA a afirmar que a Administração Tributária tem uma certa margem de discricionariedade para decidir, em função de cada caso concreto, se a garantia prestada é ou não idónea (vide desde logo o acórdão por nós relatado em 18/12/2013 no recurso 01731/13 assim sumariado na parte que agora nos interessa):
I – (…)
II - O juízo sobre a idoneidade da garantia há-de resultar da avaliação que for efectuada em concreto sobre a susceptibilidade desta assegurar o pagamento da quantia exequenda e do acrescido, aferindo a Administração Tributária designadamente, da suficiência e solidez da garantia oferecida e da capacidade e idoneidade do garante e já não do juízo que for efectuado relativamente à forma jurídica através da qual a sociedade garante assumiu a sua obrigação perante o devedor/executado.
III –(…)
IV – (…)

Sobre esta matéria (meios de constituição de garantia - Idoneidade da garantia) pode ver-se Jorge Lopes de Sousa (Código do procedimento e de processo tributário, anotado e comentado, 6ª edição 2011, III volume, páginas 411/412)

No caso dos autos, a recorrida ofereceu como garantia um crédito de uma sociedade por si dominada a 100% sobre a Região Autónoma da Madeira que abstractamente deve considerar-se meio idóneo para assegurar os crédito do exequente (o que a própria AT, apesar dos seus dizeres finais, não excluiu como se pode ver do ponto 4) do parecer reproduzido na matéria de facto dada como assente)
No entanto tal garantia foi recusada por não integrar o elenco das garantias prioritariamente aceites (as descritas no artº 199º nº 1 do CPPT) e por a requerente/reclamante, ora recorrida não ter demonstrado a impossibilidade de prestar uma destas modalidades de garantia consideradas pelo ofício circulado nº 60076 de 29/07/2010 como apresentando um maior grau de liquidez e portanto gozando de preferência pela ordem com que são indicadas pela lei.
Como argumentos/fundamentos secundários/complementares para a referida recusa referiu-se a falta de prova da idoneidade da garantia oferecida porquanto se desconhece se o crédito oferecido ainda existe e, existindo ser desconhecida a data e condições de pagamento e, não se perceber qual o meio de defesa que a executada pretende apresentar. (Anote-se que do probatório consta a apresentação de impugnação em 23/11/2012).

Cremos que não podia ter sido recusada a garantia oferecida com esta fundamentação.

Desde logo e como vem afirmando este STA a liquidez da garantia prestada para efeitos de suspensão da execução fiscal não constitui critério do qual deve depender a apreciação da sua idoneidade.
Assim sendo, na situação em análise, não têm fundamento legal as razões invocadas pela AT para indeferir o pedido de prestação de garantia, a saber, não integrar a garantia oferecida o elenco referido no artº 199º nº 1 do CPPT e o facto da recorrida não ter cumprido o ónus probatório de demonstrar que não era viável, no caso concreto, a constituição de garantia bancária, caução ou seguro - caução.
É no entanto nossa convicção e entendimento, que a idoneidade da garantia afere-se pela capacidade de, em caso de incumprimento do devedor, salvaguardar a efectiva cobrança da dívida exequenda e acrescidos. A garantia idónea será pois aquela que é adequada para o fim em vista, ou seja, assegurar o pagamento totalidade do crédito exequendo e legais acréscimos.
E, na esteira do já decidido noutras decisões do STA, o Órgão de Execução Fiscal tinha uma certa margem de discricionariedade para apreciar em concreto a idoneidade da garantia oferecida.
Porém, só de forma muito incipiente apreciou tal idoneidade. Questionou a existência, na data do despacho ora questionado, do próprio crédito oferecido e afirmou o desconhecimento da data e das condições de pagamento.
Esta fundamentação é, claramente, insuficiente para a recusa da garantia oferecida.
Por um lado a documentação do crédito não foi posta em causa ou questionada (foi junta cópia do ofício com o registo de saída n. º 1581 de 2011.11.14 da Direcção Regional de Finanças, Secretaria Regional do Plano e Finanças, Governo Regional da Região Autónoma da Madeira, onde aquela entidade reconhece a dívida (cf. fls. 30 a 34 dos autos). Por outro, sendo certo que a existência do crédito não é, por natureza, perene, podendo ser pago até na véspera da apreciação do pedido, a verdade é que estavam ao alcance do órgão administrativo decisor, poderes para determinar a remoção de quaisquer dúvidas sobre a manutenção do crédito como destaca a sentença recorrida.
Nada tendo chegando a apreciar da idoneidade substancial da garantia oferecida e, residindo a singela apreciação da mesma efectuada em argumentação formal que conduziu à sua não aceitação parece ser de concluir pela insuficiência de fundamentação que acrescida aos demais argumentos apresentados pela AT e que já foram refutados conduz à conclusão da ilegalidade do despacho questionado.
Também entendemos que, no caso se impunha o convite para junção de mais elementos, relacionados com o crédito oferecido como garantia e, não, ter-se pura e simplesmente indeferido o pedido com base nos argumentos supra destacados.
Não tendo sido demonstrada/fundamentada, a falta de idoneidade da garantia oferecida bem andou a sentença recorrida ao anular o acto que indeferiu o pedido de prestação de garantia.
Na verdade, o problema reside no facto de, verdadeiramente, a Administração Fiscal não ter procedido à avaliação em concreto da idoneidade da garantia oferecida, no âmbito da qual não estaria impedida de mandar apresentar novos dados e informações ou, até, colher tais dados directamente junto da devedora que é uma Entidade Pública, bem como a identificação dos beneficiários do crédito. Acresce que também não estaria igualmente impedida de exigir a actualização periódica no futuro destes dados.
Em suma, não tendo o órgão de execução fiscal procedido à avaliação em concreto da garantia oferecida significa que não há interesse público que justifique o sacrifício dos interesses da Executada.
Realce-se que a administração fiscal deve pautar a sua actuação de acordo com o princípio da proporcionalidade (cfr. art. 266.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, art. 55.º da LGT, art. 46.º do CPPT e art. art. 5.º, n.º 2, do Código de Procedimento Administrativo), o que aponta para a necessidade da ponderação dos interesses em jogo de molde a não sacrificar nenhum deles.
Em conclusão, ao ter fundado a decisão de recusa da garantia oferecida em parâmetros que, seguramente, não integram o critério legal de aferição da idoneidade dessa garantia, incorreu o respectivo autor em vício de violação de lei, a determinar a respectiva anulação, como bem decidiu o Mmº juiz do Tribunal recorrido.

Por tudo o que ficou exposto, o recurso não merece provimento, devendo confirmar-se a sentença recorrida.

4- DECISÃO

Termos em que acordam os Juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso, mantendo a sentença recorrida.

Custas a cargo da recorrente
Lisboa, 23 de Julho de 2014. - Ascensão Lopes (relator) - Isabel Marques da Silva - Fonseca da Paz.