Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0830/12
Data do Acordão:12/05/2012
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FERNANDA MAÇÃS
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
PRAZO
ERRO MATERIAL
ERRO NA FORMA DE PROCESSO
CONVOLAÇÃO
ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL
Sumário:I - Da interpretação conjugada dos arts. 134º, nº 3, do CPPT e 130º, nº 3, do CIMI, resulta um alargamento quanto aos fundamentos do pedido de correcção nas inscrições matriciais que podem ter por base quaisquer erros materiais que afectam a veracidade de características previamente definidas e demais dados respeitantes aos imóveis a inscrever nas respectivas matrizes.
II - Não estamos perante uma situação de mero erro material com repercussão na veracidade da inscrições matricial, como é exigido pela análise conjugada dos preceitos atrás mencionados, se o que está em causa é um vício substancial, quanto à qualificação jurídica de duas parcelas, em resultado da eventual errónea interpretação e aplicação dos arts. 3º a 6º do CIMI.
III - Estando em causa a impugnação judicial do despacho do órgão da administração fiscal, que indeferiu a inscrição de duas parcelas de terreno na matriz predial rústica, por considerar tratar-se de prédios urbanos, a situação não se enquadra em nenhuma daquelas para as quais o art. 97º, nº 1, do CPPT prevê a impugnação judicial, e, porque não está em causa a apreciação da legalidade do acto de liquidação, o meio processual adequado é a Acção Administrativa Especial, regulada nos arts. 46º ss. do CPTA.
IV - É de convolar a Impugnação Judicial em Acção Administrativa Especial, desde que a petição tenha sido tempestivamente apresentada para efeitos da nova forma processual e o pedido formulado e a causa de pedir sejam compagináveis com aquele meio processual, não impedindo a convolação o facto de o Tribunal não ser o territorialmente competente, atenta a regra do disposto no art. 16º do CPTA.
Nº Convencional:JSTA00067989
Nº do Documento:SA2201212050830
Data de Entrada:07/17/2012
Recorrente:A......, SA
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:TAF LEIRIA
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - IMPUGN JUDICIAL
Legislação Nacional:CPC96 ART668 N1 D ART660 N2.
CIMI03 ART130 N3 ART6 N3 ART3.
CPPTRIB99 ART134 N3 ART100 N1 ART97 N1 N2 ART98 N4.
LGT98 ART97 N3 ART78.
CPTA02 ART58 N1 ART46.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0802/11 DE 2012/01/25; AC STA PROC0937/11 DE 2012/02/08; AC STA PROC0584/11 DE 2011/11/16; AC STA PROC0199/10 DE 2010/10/30
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO.
ESTEVES DE OLIVEIRA E BENJAMIM RODRIGUES - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO 2ED PAG637-656.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

I-RELATÓRIO

1. A………, S.A., com os sinais dos autos, deduziu impugnação judicial, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, contra o indeferimento dos pedidos de inscrição de parcelas de terreno, como prédios rústicos, resultantes da desanexação dos prédios rústicos, inscritos na matriz, sob os artigos 9723 e 2424, que foi indeferida liminarmente, por verificação da excepção de caducidade.

2.Não se conformando com tal decisão, A………, S.A., interpôs recurso para a Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, apresentando as respectivas Alegações, com as seguintes Conclusões:
“1.ª A Recorrente impugnou as decisões proferidas pela Sr.ª Chefe dos Serviços de Finanças de Pedrógão Grande que recaíram sobre os processos de expropriação de parcela dos prédios rústicos inscritos sob os artigos 2424 e 9723 ambos da freguesia de ........., concelho de Pedrógão Grande.
2.ª Resulta da fundamentação explanada na sentença, que a mesma apenas se debruçou sobre o prédio inscrito na freguesia de ......... sob o artigo 2424, daquele concelho de Pedrógão Grande e, como tal, apenas para este foi proferida decisão.
3.ª Nada consta da sentença sobre o prédio inscrito sob o artigo 9723 da freguesia de ..........
4.ª Ao não se ter pronunciado sobre o pedido formulado pelo processo de expropriação da parcela do prédio rústico inscrito sob o artigo 9723 da freguesia de ........., concelho de Pedrógão Grande a sentença ora recorrida padece de uma omissão de pronúncia (ex vide art° 668°, n° 1, alínea d) do C. P. Civil).
5.ª Pelo que, deverá a mesma considerar-se nula.
6.ª A presente impugnação teve origem em duas expropriações amigáveis que recaíram sobre parcelas de dois prédios rústicos da freguesia de ........., concelho de Pedrógão Grande, pelo que a alteração da essência de tais prédios implica uma violação do reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária.
7.ª Os Instrumentos do Ordenamento do Território (em cumprimento do preceituado pela Constituição da República Portuguesa) definem, quer se queira quer não, a essência dos prédios, qualificando-os, em consequência da sua essência e características em áreas denominadas de rústicas ou urbanas.
8.ª A alteração do solo rústico em urbano, embora pela acção do homem que o dotou de condições, características e factores é sempre definida e permitida pelos Instrumentos do Ordenamento do Território.
9.ª Por contrária à Lei, não pode a essência, qualificação e inclusão de um prédio ser alterado por simples decisão do Chefe de Finanças.
10ª O Código das Expropriações admite expressamente a derrogação do regime jurídico imperativo da unidade de cultura, quando a expropriação vise parcelas de prédios rústicos cuja área seja inferior à de unidade de cultivo, exactamente prevenir a inexistência da possibilidade de arbitrariedade, abuso e discriminação vedada pelos Planos de Ordenamento Geral do Território na organização do espaço territorial.
11,ª É de considerar inconstitucional, por violação dos artigos 62°, n.° 1, in fine, e nos n°s 2 e 4 do artigo 65° da Constituição da República Portuguesa, a interpretação[“ser possível e admissível a alteração de solo rústico em urbano por simples decisão do Chefe de Finanças mesmo fundamentada em título aquisitivo exibido pelo sujeito passivo, em derrogação dos planos do Ordenamento do Território”]
12.ª O Código do Imposto Municipal sobre os Imóveis não contempla as violações aos Planos do Ordenamento do Território.
13.ª Pelo que, deverá ser de alterar a Sentença proferida, considerando-se que o meio adequado para sindicar uma decisão que altere o estabelecido por aqueles Instrumentos do Ordenamento do Território é a acção de impugnação judicial prevista no artigo 99° do C.P.P.T. e como tal, atempadamente interposta a impugnação.
…”

3. Não foram apresentadas Contra-alegações.

4. O Digno Representante do Ministério Público, junto do STA, emitiu douto parecer, no sentido de que o recurso deve merecer provimento, com a consequente revogação da decisão recorrida, e convolação dos autos em Acção Administrativa Especial, com a remessa do processo ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, para aí se efectuarem os trâmites subsequentes.

II- FUNDAMENTOS

1- DE FACTO

A decisão, sob recurso, fixou “o seguinte contexto processual relevante”:
“1. Por requerimento de 23.07.2008, o impugnante requereu ao Chefe do Serviço de Finanças (SF) de Pedrógão Grande a divisão do prédio inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 2424, da freguesia de ........., de forma a serem constituídos dois prédios distintos (fls. 1, do PA);
2. O Chefe do SF deferiu o requerido, tendo atribuído aos dois artigos números provisórios (fls. 19);
3. O impugnante requereu ao Chefe do SF que rectificasse a referida atribuição provisória de artigos (fls. 23);
4. O impugnante requereu ainda ao Chefe do SF que considerasse sem efeito a avaliação directa efectuada ao prédio novo a destacar do prédio rústico sob o artigo matricial 2424 e que procedesse à inscrição do prédio resultante do fraccionamento do prédio inscrito sob o artigo 2424 (fls. 25 e ss., do PA);
5. O Chefe do SF decidiu no sentido de deferir a actualização na matriz em nome dos respectivos proprietários e de indeferir uma vez que as parcelas resultantes da expropriação deverão ser inscritas na matriz urbana. (fls. 41);
6. O impugnante foi notificado desta decisão em 03.11.2010 (fls. 43 e ss.);
7. O impugnante apresentou a presente impugnação em 27.01.2011 (Sitaf”).

2. DE DIREITO

2.1. Das questões a apreciar e decidir

A A………, SA., instaurou impugnação judicial contra a decisão de indeferimento dos pedidos de inscrição de parcelas de terreno, como prédios rústicos, resultantes da desanexação dos prédios rústicos, inscritos na matriz, sob os artigos 9723 e 2424.
Com efeito, em sentido contrário ao requerido, a Chefe dos Serviços de Finanças de Pedrógão proferiu despacho para que se procedesse à inscrição das parcelas na matriz predial urbana, na categoria de terrenos para construção, “(…) uma vez que o título aquisitivo das respectivas parcelas esclarece de forma clara e inequívoca que as parcelas são necessárias à construção urbana, quer na situação de reservatório de água de Porto Mós, quer na Estação Elevatória de Casal do cume…”
Inconformada, a ora recorrente alegou, entre o mais, que:
· As referidas parcelas foram adquiridas em resultado de expropriação amigável, tendo a requerente em cumprimento do preceituado no art. 13º do CIMI e do nº 3 do art. 36º do Código das Expropriações, requerido a inscrição das referidas parcelas como prédios rústicos, na respectiva matriz predial rústica.
· O prédio rústico mãe está inscrito na matriz predial rústica é composto por pinhal e mato, estando inserido no domínio florestal, sendo que as parcelas expropriadas apresentam exactamente a mesma composição.
· E tais parcelas, atenta a sua natureza, a localização, as aptidões e as restrições legais, nenhuma alteração sofreram em relação ao conjunto que formavam quando integradas no prédio mãe.
· É ilegal perfilhar o entendimento de que se pode considerar que um prédio legalmente habilitado como sendo rústico seja “catalogado de urbano” somente porque alguém declarou no título aquisitivo que se destinava “à construção”.
· A Impugnante tem por objecto social exclusivo a exploração e gestão do sistema multimunicipal de água e saneamento da Raia, Zêzere e Nabão, para captação, tratamento e distribuição de água para consumo público e para recolha, tratamento e rejeição de efluentes de vários municípios, que lhe foi concessionado pelo Estado através de um contrato de concessão.
· Assim sendo, todos os imóveis adquiridos por via da expropriação integram o objecto da concessão, pelo que as referidas parcelas nunca poderiam ser qualificadas como prédios urbanos, categoria para construção, atenta a natureza de espaço público.
· Ao abrigo da excepção estatuída na parte final do nº 3 do art. 6º do CIMI, as referidas parcelas passaram a pertencer ao domínio público do Estado.
· E o mesmo se diga da construção (Estação ou Reservatório) mencionada no título, pois também tal imóvel é do domínio público.
A impugnante termina pedindo a revogação do despacho de indeferimento e consequente inscrição das parcelas expropriadas na matriz predial rústica.
A Mmª Juíza “a quo” indeferiu liminarmente a impugnação por verificação da excepção de caducidade, argumentando, em síntese, “(…), salvo o devido respeito, entende o Tribunal que está em causa uma eventual incorrecção das inscrições matriciais, nomeadamente aquelas a que se refere o art. 130°, n.° 3, do CIMI.
A este propósito determina o art. 134°, n.º 3, do CPPT que é de 30 dias o prazo de que dispõe o visado para impugnar essa incorrecção, contada da notificação da decisão de indeferimento de correcção pela AF.
Assim sendo, verifica-se que tendo o impugnante sido notificado em Novembro de 2010 e tendo apresentado a impugnação em Janeiro de 2011 esta se revela extemporânea”.
Contra este entendimento se insurge a recorrente alegando, entre o mais, o seguinte:
· Nulidade da decisão recorrida porquanto “Ao não se ter pronunciado sobre o pedido formulado pelo processo de expropriação da parcela do prédio rústico inscrito sob o artigo 9723 da freguesia de ........., concelho de Pedrógão Grande a sentença ora recorrida padece de uma omissão de pronúncia (ex vide art° 668°, n° 1, alínea d), do C. P. Civil);
· Adequação do meio processual utilizado e tempestividade da impugnação.
Em face das conclusões, que delimitam o âmbito e objecto do recurso, nos termos das disposições constantes dos arts. 684º, nº 3, e 685º-A/1, do CPC, as questões a apreciar e decidir são as de saber se a sentença recorrida padece de:
· Nulidade por omissão de pronúncia;
· Erro de julgamento ao decidir pela intempestividade da impugnação judicial.

2.2. Da alegada nulidade por omissão de pronúncia

Como vimos, o recorrente suscita a nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia, nas Conclusões 3ª e 4ª, mas sem qualquer razão, como passamos a demonstrar.
Constitui jurisprudência uniforme deste Supremo Tribunal que só haverá omissão de pronúncia quando o tribunal deixa de apreciar e decidir uma questão que haja sido chamado a resolver, a menos que o seu conhecimento tenha ficado prejudicado em face da solução dada ao litígio, dado que lhe incumbe o conhecimento de todas as questões suscitadas pelas partes, e apenas destas, sem prejuízo de a lei impor ou permitir o conhecimento oficioso de outras (cfr. o art. 660º, nº 2, do CPC) (Cfr., entre outros, os seguintes Acórdãos do STA: de 25/1/2012, proc nº 802/2011; de 8/2/2012, proc nº 937/2011; e de 16711/2011, proc nº 584/2011. ).
No caso em apreço, alega a recorrente que “nada consta da sentença sobre o prédio inscrito sob o artigo 9723 da freguesia de .........” pelo que ao não se ter pronunciado sobre o pedido formulado no processo de expropriação da referida parcela “a sentença ora recorrida padece de omissão de pronúncia”.
Ora, acontece que da leitura da decisão recorrida verifica-se que a mesma se centra na análise da questão prévia da tempestividade da petição inicial de impugnação judicial. Neste sentido, tendo o Mmº Juiz “a quo” concluído que estava em causa “uma eventual incorrecção das inscrições matriciais, nomeadamente aquelas a que se refere o art. 130º, nº 3, do CIMI”, o prazo de impugnação judicial é, segundo o estatuído no nº 3 do art. 134º do CPPT, de 30 dias.
E, nesta sequência, o Mmº Juiz concluiu pelo indeferimento liminar da impugnação judicial por verificação da excepção de caducidade, solução que, precisamente, prejudica a análise das questões de mérito.
No quadro apontado, estando nós perante um indeferimento liminar, restrito à análise da caducidade da impugnação, a resolução desta questão nada tem que ver, ao contrário do alegado pelo recorrente, com “o pedido formulado pelo processo de expropriação da parcela do prédio rústico inscrito sob o artigo 9723 da freguesia de .........”.
Temos, desta forma, que as questões suscitadas pelo impugnante foram devidamente apreciadas e decididas pelo Tribunal recorrido, dentro dos limites do processualmente admissível, uma vez que, havendo fundamento para a rejeição liminar da Impugnação judicial, o juiz não pode apreciar o mérito da mesma, sob pena de excesso de pronúncia (Cfr. o Acórdão do STA de 30/10/2010, recurso nº 199/2010.).
Assim sendo, improcede a alegada nulidade por omissão de pronúncia.

2.3. Do alegado erro de julgamento

2.3.1.O prazo de impugnação judicial é, em geral, de 90 dias, nos termos do disposto no nº 1 do art. 100º do CPPT, a contar dos factos elencados nas alíneas a) a f) do mesmo preceito.
No entanto, para além deste prazo geral, o CPPT consagra várias situações em que são fixados prazos mais alargados (por exemplo, no caso da impugnação de actos de autoliquidação, art. 131º) e prazos mais curtos, como acontece com a situação do art. 134º, nº 3, do CPPT.
Refere este preceito que “As incorrecções nas inscrições matriciais dos valores patrimoniais podem ser objecto de impugnação judicial, no prazo de 30 dias, desde que o contribuinte tenha solicitado previamente a correcção da inscrição junto da entidade competente e esta se recuse ou não se pronuncie no prazo de 90 dias a partir do pedido”.
No caso em apreço, o Mmº Juiz “a quo” ao qualificar e subsumir a situação dos autos numa questão de “incorrecção nas inscrições matriciais” concluiu pela intempestividade da impugnação judicial.
Em nossa óptica, porém, salvo o devido respeito, a questão não se reconduz à tida em conta na solução legal recebida no nº 3 do art. 134º do CPPT.
Vejamos.
A interpretação correcta do art. 134º do CPPT tem de ter em conta todo o preceito e não apenas o teor do nº 3.
Da análise do nº 1 resulta que o legislador tem fundamentalmente em vista fixar os requisitos da impugnação judicial de actos de fixação dos valores patrimoniais, podendo a impugnação assentar, além da preterição de formalidades legais, no erro de facto ou de direito na fixação.
Por sua vez, no nº 3, o legislador prevê a possibilidade de serem igualmente impugnáveis as incorrecções nas inscrições matriciais dos valores patrimoniais.
Temos, desta forma, que a lei estabelece diferentes prazos para a impugnação judicial consoante se esteja perante a invocação de um vício formal ou substancial respeitante a actos de fixação dos valores patrimoniais ou perante incorrecções nas inscrições matriciais dos referidos valores.
No primeiro caso estamos perante a arguição de invalidades dos actos de fixação dos valores patrimoniais e, no segundo, trata-se de arguição de irregularidades na inscrição matricial dos valores patrimoniais alcançados.
Por sua vez, o art. 130º, nº 3, do CIMI, refere que as reclamações de incorrecções nas inscrições matriciais podem ter por base qualquer fundamento, nomeadamente os seguintes:
a) valor patrimonial tributário considerado desactualizado;
b) indevida inclusão do prédio na matriz;
c) erro na designação das pessoas e residências ou das inscrições constantes de quaisquer elementos oficiais;
d) duplicação ou omissão dos prédios ou das respectivas parcelas;
e) não averbamento de isenção já concedida ou reconhecida;
f) alteração na composição dos prédios em resultado de divisão, anexação de outros confinantes, rectificação de estremas ou arredondamento de propriedades;
g) alteração na composição dos prédios em resultado de divisão, anexação de outros confinantes, rectificação de estremas ou arredondamento de propriedades;
h) não discriminação do valor patrimonial tributário dos prédios urbanos por nadares ou divisões de utilização autónoma;
i) passagem do prédio ao regime de propriedade horizontal;
j) erro na representação topográfica, confrontações e características agrárias dos prédios rústicos;
k) erro nos mapas parcelares cometidos na divisão dos prédios referidos na alínea anterior;
l) erro na actualização dos valores patrimoniais tributários;
m) erro na determinação das áreas de prédios rústicos ou urbanos, desde que as diferenças entre as áreas apuradas pelo perito avaliador e a contestada sejam superiores a 10% e 5% , respectivamente.

Da interpretação conjugada dos arts. 134º, nº 3, do CPPT e 130º, nº 3, do CIMI, resulta um alargamento quanto aos fundamentos do pedido de correcção nas inscrições matriciais que podem ter por base quaisquer erros materiais que afectam a veracidade de características previamente definidas e demais dados respeitantes aos imóveis a inscrever nas respectivas matrizes.
Ora, aplicando o exposto ao caso em análise verifica-se que não estamos perante uma situação de mero erro material com repercussão na veracidade da inscrições matricial, como é exigido pela análise conjugada dos preceitos constantes dos arts. nº 3 do art. 134º do CPPT e 130º, nº 3, do CIMI.
Da leitura da Petição inicial resulta que estamos perante uma questão jurídica que é prévia e que diz respeito à qualificação jurídica dos factos tributários. Dito por outras palavras, no caso, a inscrição matricial pressupõe a resolução da questão prévia da qualificação da natureza jurídica das parcelas em causa, quanto a saber se devem ser qualificadas como terrenos rústicos ou terrenos para construção, em conformidade com a lei aplicável.
Resulta da Petição inicial que a recorrente, tendo adquirido por expropriação amigável duas parcelas de terreno, requereu a sua inscrição como prédios rústicos, na respectiva matriz predial rústica. A fundamentar o seu pedido a recorrente invocou o facto de tais parcelas terem resultado de operações de destaque de uma parcela mãe que se encontra inscrita na matriz predial rústica. Por outro lado, indo as referidas parcelas integrar-se no objecto da concessão de exploração e gestão do sistema multimunicipal de água e de saneamento da Raia, Zêzere e Nabão, de que a recorrente é titular, com base num contrato de concessão celebrado com o Estado, as mesmas passam a fazer parte do domínio público, caindo na excepção prevista no nº 3 do art. 6º do CIMI.
Em sentido oposto, defende a Chefe de Repartição de Finanças que se trata de prédios urbanos, a inscrever na respectiva matriz predial urbana.
Em face do exposto, afigura-se que está em causa aferir da desconformidade do indeferimento com o ordenamento jurídico, em especial, com o sentido e alcance dos arts. 3º a 6º do CIMI, e não a invocação de um mero erro material.
A resposta já seria diferente se, por exemplo, as parcelas tivessem sido qualificadas como prédios rústicos, mas erradamente tivessem sido inscritas na matriz como prédios urbanos. Pois, neste caso, a situação subsumir-se-ia, sem dúvida, na hipótese do nº 3 do art. 134º do CPPT, por consubstanciar mera irregularidade ou erro material.
Mas esta não é a situação do caso dos autos.
A recorrente não alega a existência de um mero erro material, mas sim um vício substancial, quanto à qualificação jurídica das parcelas, em resultado de eventual errónea interpretação e aplicação da lei, em especial dos arts. 3º a 6º do CIMI (Sobre a noção de invalidade do acto administrativo, cfr. MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA E OUTROS, Código de Procedimento Administrativo, 2ª ed., Almedina, 1997, pp. 637 e 656.).
Assim sendo, o meio processual adequado para fazer valer o direito da recorrente não é a impugnação judicial prevista no art. 134º, nº 3, do CPPT, motivo por que o despacho recorrido não pode manter-se, bem como a sua fundamentação.

2.3.2.Questão diferente é a colocada pelo Ministério Público, no seu douto Parecer, no sentido de que o meio processual adequado será acção administrativa especial.
E, de facto, assim é.
O art. 97º do CPPT, que enuncia no seu nº 1 uma série de situações para as quais a impugnação judicial será o meio processual adequado, estabelece, no seu nº 2, que “O recurso contencioso” (hoje acção administrativa especial) “dos actos administrativos em matéria tributária, que não comportem a apreciação da legalidade do acto de liquidação, da autoria da administração tributária (…), é regulado pelas normas sobre processo nos tribunais administrativos”.
Em anotação a este preceito, JORGE LOPES DE SOUSA pondera que “[d]este artigo resulta claramente que, nos casos em que o acto a impugnar é um acto de liquidação ou um acto que comporta a apreciação da legalidade de um acto de liquidação (acto de indeferimento de reclamação graciosa ou de recurso hierárquico interposto da decisão que a aprecie ou acto de apreciação de pedido de revisão oficiosa, nos termos do art. 78º da LGT, o meio adequado é o processo de impugnação”.
No entanto, o mesmo Autor, adverte que tal não significa que a acção administrativa especial seja sempre o meio processual adequado para atacar um acto administrativo que não comporta a apreciação da legalidade de um acto de liquidação, pois como bem salienta se assim fosse não se compreenderia “(…) o uso da expressão «impugnação» para referenciar o meio processual para impugnar actos que não comportem essa apreciação, como é o caso dos actos de fixação da matéria colectável, de agravamento à colecta, de fixação de valores patrimoniais, de providências cautelares adoptadas pela administração tributária [alíneas b), e), f) e g) deste artigo].
“Assim”, conclui o Autor, “nos casos em que o próprio art. 97º do CPPT, que é a norma que contém o elenco global dos meios processuais tributários, utiliza a expressão «impugnação» para referenciar o meio processual adequado será de concluir que, mesmo que os actos impugnados não comportem a apreciação da legalidade de actos de liquidação, será de empregar o processo de impugnação e, nos casos em que não se refere especialmente o processo de impugnação como meio adequado e o acto não comporta a apreciação da legalidade de um acto de liquidação, será de utilizar a acção administrativa especial”.
Aplicando o mencionado critério ao caso em apreço, verifica-se, como conclui o Ministério Público, que o caso dos autos, recorde-se, respeita à impugnação judicial do despacho do órgão da administração fiscal, que indefere a inscrição de duas parcelas de terreno na matriz predial rústica, por considerar tratar-se de prédios urbanos. A situação não se enquadra, pois, em nenhuma daquelas para as quais o art. 97º, nº 1, do CPPT, prevê a impugnação judicial, e, porque não está em causa a apreciação da legalidade do acto de liquidação, o meio processual adequado é a acção administrativa especial, regulada nos arts. 46º ss. do CPTA.
Havendo erro na forma do processo haverá que ponderar da possibilidade da convolação, nos termos do disposto nos arts.98º, nº 4, do CPPT e 97º, nº 3, da LGT, da presente impugnação judicial em acção administrativa especial, que está dependente da verificação de dois pressupostos, a saber:
a) Que a petição tenha sido tempestivamente apresentada para efeitos da nova forma processual, neste caso, a acção administrativa especial;
b) Que o pedido formulado seja compaginável com a forma de processo adequado, pressuposto.
No que respeita à tempestividade, devendo, nos termos do art.58º, nº 1, do CPTA, a acção ser intentada no prazo de 3 meses, resulta da factualidade apurada que a Petição inicial é tempestiva. Com efeito, daí resulta que o impugnante foi notificado da decisão do órgão da Administração Fiscal, que indeferiu o pedido da recorrente em 3/11/2010 e que esta, por sua vez, apresentou a impugnação judicial em 27/1/2011.
Por outro lado, quanto ao segundo requisito, como bem refere o Ministério Público, no seu douto Parecer, a causa de pedir e o pedido afiguram-se compatíveis com a acção administrativa especial.
Em face do exposto, deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se a decisão recorrida, e, convolando-se os autos em acção administrativa especial, devem os mesmos baixar à 1ª instância a fim de se seguir os seus regulares trâmites nessa forma processual, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, para onde devem ser oportunamente remetidos.

III- DECISÃO

Termos em que acordam os Juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em conferência, conceder provimento ao recurso, revogando-se a decisão recorrida, e, convolando-se os autos em acção administrativa especial, devem os mesmos baixar à 1ª instância a fim de se seguir os seus regulares trâmites nessa forma processual.

Sem custas.

Lisboa, 5 de Dezembro de 2012. - Fernanda Maçãs (relatora) - Casimiro Gonçalves - Lino Ribeiro.