Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:02194/19.2BELSB
Data do Acordão:09/10/2020
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:CARLOS CARVALHO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
ASILO
PROTECÇÃO INTERNACIONAL
NÃO ADMISSÃO DO RECURSO
Sumário:Não é de admitir a revista do acórdão que manteve juízo firmado pelo TAF que havia julgado improcedente ação administrativa na qual se impugnava o ato de indeferimento de pedido de proteção internacional se o juízo firmado pelas instâncias se mostra assente em fundamentação jurídica consonante com a jurisprudência deste Supremo Tribunal produzida sobre as quaestiones juris e quadro normativo objeto de discussão e em que o mesmo juízo se mostra assente nas particularidades ou singularidades factuais do caso concreto e, assim, desprovido de uma especial relevância social ou indício de interesse comunitário significativo que extravase os limites do caso.
Nº Convencional:JSTA000P26300
Nº do Documento:SA12020091002194/19
Data de Entrada:07/03/2020
Recorrente:A.......
Recorrido 1:MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:


1. A………….., devidamente identificado nos autos e invocando o disposto no art. 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos [CPTA], peticiona a admissão do recurso de revista por si interposto do acórdão de 16.04.2020 do Tribunal Central Administrativo Sul [doravante TCA/S] [cfr. fls. 167/176 - paginação «SITAF» tal como as ulteriores referências à mesma, salvo expressa indicação em contrário], que negou provimento ao recurso de apelação que o mesmo deduziu, por inconformado, com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa [doravante TAC/L] - cfr. fls. 112/129 - , que havia julgado improcedente a ação administrativa de impugnação por si instaurada contra o MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA [SERVIÇO DE ESTRANGEIROS E FONTEIRAS (SEF)], da decisão proferida pela Diretora Nacional do SEF, de 09.09.2019, que considerou inadmissível o pedido de proteção internacional por si formulado e determinou a sua transferência para a Itália por ser este o Estado responsável pela análise do referido pedido.

2. Motiva a necessidade de admissão do recurso de revista [cfr. fls. 184/188] ao que se infere da motivação expendida «para uma melhor aplicação do direito», invocando, mormente, a incorreta aplicação dos arts. 349.º do Código Civil [CC], 58.º e 163.º do Código de Procedimento Administrativo [CPA], e 03.º do Regulamento (UE) n.º 604/2013, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho [vulgo Regulamento de Dublin].

3. Não foram produzidas quaisquer contra-alegações [cfr. fls. 189 e segs.].
Apreciando:

4. Dispõe-se no n.º 1 do art. 150.º do CPTA que «[d]as decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

5. Do referido preceito extrai-se, assim, que as decisões proferidas pelos TCA’s no uso dos poderes conferidos pelo art. 149.º do CPTA, conhecendo em segundo grau de jurisdição, não são, em regra, suscetíveis de recurso ordinário, dado a sua admissibilidade apenas poder ter lugar quando: i) esteja em causa apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, revista de importância fundamental; ou, ii) o recurso revelar ser claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

6. O TAC/L julgou totalmente improcedente a pretensão do A., aqui Recorrente, considerando, no seu discurso fundamentador, no que aqui ora releva que «atenta a factualidade provada, inexistem sequer indícios da existência de razões sérias para crer que há falhas sistémicas no procedimento de asilo e nas condições de acolhimento dos Requerente de proteção internacional em Itália, que impliquem o risco de tratamento desumano ou degradante, nos termos e na aceção acolhida pelo TJUE e à qual se faz referência supra», sendo que «quando o Requerente foi informado de que a responsabilidade para a decisão do pedido de proteção internacional por si formulado competia a Itália, uma vez que o Autor havia apresentado lá um pedido antes do pedido apresentado em Portugal, este limita-se a dizer que não quer regressar a Itália, nada mais tendo alegado, concretizado ou demonstrado, mormente quanto ao tratamento e às condições a que esteve sujeito durante o período de permanência em Itália – cfr. alínea e) do probatório -, verificando-se que ali ficou, durante alguns anos, o que não é compatível com qualquer tratamento degradante no acolhimento» e que do «relato do Autor, das informações constantes do processo administrativo ou da petição inicial, não resulta que as autoridades italianas sejam completamente alheias ou indiferentes às condições dos requerentes de proteção internacional, ao ponto de culminarem, em concreto para o Autor, numa situação de privação material extrema, que não lhe permitisse fazer sequer face às suas necessidades mais básicas», termos em «não resultando quaisquer elementos do processo administrativo, mormente das declarações prestadas pelo próprio Autor, que indicassem ou indiciassem a existência de motivos válidos que levassem a Entidade Demandada a crer que, existem falhas sistémicas no procedimento de asilo e nas condições de acolhimento dos requerentes em Itália, que implicassem o risco de o Autor vir a sofrer um tratamento desumano ou degradante [nas aceções supra referidas], nada mais lhe era exigido, a não ser decidir pela inadmissibilidade do pedido e, por conseguinte pela formulação do pedido de retoma a carga à Itália».

7. O TCA/S confirmou este juízo decisório, perfilhando-o e reiterando-o in toto.

8. O A., ora Recorrente, insurge-se contra o juízo de improcedência da sua pretensão firmado pelo acórdão recorrido, acometendo-o de incurso em erro de julgamento por incorreta interpretação e aplicação do quadro normativo atrás enunciado.

9. A alegação expendida pelo A., ora Recorrente, não se mostra persuasiva, tudo apontando, presentes os contornos do caso sub specie, no sentido de que as instâncias decidiram com pleno acerto, tanto mais que o juízo firmado pelas instâncias se mostra assente numa desenvolvida e plausível fundamentação jurídica, consonante com a jurisprudência que foi produzida por este Supremo Tribunal sobre a quaestione juris e quadro normativo objeto de discussão [cfr., nomeadamente, os Acs. de 16.01.2020 - Proc. n.º 02240/18.7BELSB, de 04.06.2020 - Proc. n.º 01322/19.2BELSB, de 02.07.2020 - Procs. n.ºs 01786/19.4BELSB e 01088/19.6BELSB, de 09.07.2020 - Proc. n.º 01419/19.9BELSB], o que vale por dizer que a admissão do recurso não é necessária para uma melhor aplicação do direito, na certeza de que presente o contexto situacional em discussão temos que também não se vislumbra uma especial relevância social ou indício de interesse comunitário significativo que extravase os limites do caso concreto e a sua singularidade.

10. Assim, tudo conflui para a conclusão de que a presente revista mostra-se inviável [cfr., neste mesmo sentido as decisões desta Formação de Admissão Preliminar de 01.03.2019 - Proc. n.º 01297/18.5BELSB, de 12.11.2019 - Proc. n.º 02291/18.1BELSB, de 23.04.2020 - Proc. n.º 0916/19.0BELSB, de 07.05.2020 - Proc. n.º 01888/19.7BELSB], não se justificando submetê-la à análise deste Supremo, impondo-se in casu a valia da regra da excecionalidade supra enunciada.

DECISÃO
Nestes termos e de harmonia com o disposto no art. 150.º do CPTA, acordam os juízes da formação de apreciação preliminar da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal em não admitir a revista.
Sem custas [cfr. art. 84.º da Lei n.º 27/2008].
D.N..

Lisboa, 10 de setembro de 2020
[O relator consigna e atesta, que nos termos do disposto no art. 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13.03, aditado pelo art. 03.º do DL n.º 20/2020, de 01.05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes integrantes da formação de julgamento, os Conselheiros Jorge Artur Madeira dos Santos e José Augusto Araújo Veloso]
Carlos Luís Medeiros de Carvalho