Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0908/11
Data do Acordão:01/31/2012
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:JORGE DE SOUSA
Descritores:MAIS VALIAS
IRS
Sumário:A alínea a) do art. 51.º, do CIRS, ao estabelecer que, para a determinação das mais-valias sujeitas a imposto, ao valor de aquisição acrescem os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos cinco anos, reporta-se às despesas com a valorização efectuadas no período de cinco anos imediatamente anterior à data da alienação.
Nº Convencional:JSTA000P13742
Nº do Documento:SA2201201310908
Data de Entrada:10/11/2011
Recorrente:A.... E OUTRO
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1 – A…… e B…… impugnaram no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga a liquidação de IRS relativa ao ano de 2005, com o n.º 2009 5005890788.
Aquele Tribunal julgou improcedente a impugnação absolvendo a Fazenda Pública dos pedidos.
Inconformados, os Impugnantes interpuseram o presente recurso para este Supremo Tribunal Administrativo, apresentando alegações com as seguintes conclusões:
A. A contabilização de anos a que se refere a al. a) do artº 51 do CIRS deve ser feita em anos fiscais e não nos termos de contabilização fixado no artº 279 Código Civil.
B. Se as mais valias são contabilizadas em ano fiscal, as despesas realizadas para valorização dos prédios sujeitos a mais valias tem igualmente que ser contabilizadas em ano fiscal.
C. O artº 41, nº 1 do CIRS “O valor dos rendimentos da categoria G e o correspondente ao saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano”.
D. Estando o CIRS a falar em anos fiscais não faz sentido passar-se da aplicação do critério dos anos fiscais para apuramento de mais valias e na questão das deduções de despesas e encargos seja aplicado o critério do artº 279 do C.C.
E. É completamente absurdo dizer-se que a ser contado em anos fiscais até poderiam deduzir-se despesas efectuadas após a alienação.
F. As despesas que se podem deduzir são apenas as realizadas pelo sujeito passivo enquanto titular do bens alienado e não quaisquer outras, pelo que nunca se colocaria questão de deduzir despesas depois de alienado o bem.
G. A referência ao momento da alienação no artº 10 do CIRS apenas é feita para determinação do ano, pois que, nomeadamente, pode haver uma tradição da coisa num ano e a realização da escritura de alienação noutro ano.
H. Aquela referencia ao momento em que considerada a realização da mais valia feita no artº 1º do CIRS nunca é para determinar o momento a partir do qual se contam os 5 anos da al. a) do artº 51 do CIRS.
I. Não tem qualquer suporte legal a interpretação feita na douta sentença em recurso para contabilizar 5 anos a partir do momento da alienação de forma a que o limite fosse Novembro de 2000.
Termos em que
Dando provimento ao presente recurso, revogando a douta sentença proferida, condenando a Fazenda Pública a aceitar a dedução de despesas apresentada pelos recorrentes e a revogar a liquidação de IRS efectuada referente ao ano de 2005 farão Vªs. Excªs a devida JUSTIÇA !
Não foram apresentadas contra-alegações.
O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer nos seguintes termos:
A norma constante do art.51° al.a) CIRS deve ser interpretado com o sentido adoptado na sentença recorrida, segundo o qual os encargos com a valorização de bens imóveis, relevantes para a determinação das mais-valias sujeitas a imposto enquanto acréscimo ao valor de aquisição, devem ser realizados nos últimos cinco anos contados a partir da data da alienação (e não nos últimos cinco anos fiscais)
Argumentário
a) constituem mais-valias os ganhos obtidos que resultem da alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis (art.10° n.º 1 al. a) CIRS)
b) o ganho considera-se obtido no momento da prática do acto de alienação onerosa (art. 10° n.º 3 corpo CIRS)
c) a contagem dos prazos é definida por lei ou convenção; o regime previsto no Código Civil, na falta de disposição especial em contrário, é aplicável aos prazos e termos fixados por lei, pelos tribunais ou por qualquer outra autoridade (arts. 279° e 296° CCivil)
d) em casos específicos o legislador fiscal estabeleceu expressamente o modo de contagem dos prazos como sucede, designadamente, com o prazo de caducidade do direito à liquidação e o prazo de prescrição das dívidas tributárias (arts. 45° n.º 4 e 48° n.º 1 LGT)
e) a interpretação propugnada pelos recorrentes para a contagem do prazo permitiria a produção dos efeitos perversos assinalados na fundamentação do despacho de indeferimento da reclamação graciosa, aqui considerada reproduzida no segmento pertinente (probatório n.º 6; PA apenso fls. 43/44)
As partes foram notificadas deste douto parecer e nada vieram dizer.
Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
2 – Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte matéria de facto:
1. Os autores indicaram na respectiva declaração de IRS do exercício de 2005 o valor de 87.000 €, em virtude de terem realizado despesas de manutenção e melhoramento de um prédio urbano pela autora adquirido na via sucessória, seguida de uma partilha realizada em escritura pública de 9-9-2005, celebrada no 1.° Cartório Notarial de Barcelos – cfr. docs. juntos a fls. 33 a 38 dos autos, que aqui se dão por integralmente reproduzidos;
2. O dito bem imóvel foi alienado, em Novembro do mesmo ano;
3. As despesas referidas em I. tiveram lugar em Maio e Setembro de 2000;
4. Nessa sequência, foi efectuada liquidação correctiva de IRS referente ao ano de 2005, no montante de 11.800,92 €
5. Os impugnantes apresentaram reclamação graciosa, nos termos de fls. 123 do apenso que se dão como integralmente reproduzidas;
6. Tal reclamação foi indeferida nos termos de fls. 43 e 44 do apenso, que aqui se dão por integralmente reproduzidas;
7. Os impugnantes foram notificados para juntar prova dos valores mencionados no anexo "G" da declaração de rendimentos, o que não fizeram senão aquando do exercício do direito de audição.
3 – O art. 51.º, n.º 1, alínea a) do CIRS, estabelece o seguinte:
Para a determinação das mais-valias sujeitas a imposto, ao valor de aquisição acrescem:
a) Os encargos com a valorização dos bens, comprovadamente realizados nos últimos cinco anos, e as despesas necessárias e efectivamente praticadas, inerentes à aquisição e alienação, nas situações previstas na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º;
A questão que é objecto do presente recurso jurisdicional é a de saber se a referência contida nesta alínea a) aos «últimos cinco anos» se reporta aos cinco anos anteriores à alienação (tese defendida pela Fazenda Pública e adoptada na sentença recorrida) ou aos cinco anos civis anteriores ao ano em que a alienação se consumou (tese propugnada pela Recorrente).
A tese adoptada na sentença recorrida é manifestamente a que tem suporte directo no texto daquela alínea a), pois não se faz nela referência a anos fiscais ou civis.
Na falta de outros elementos que induzam à eleição do sentido menos imediato do texto, o intérprete deve optar em princípio por aquele sentido que melhor e mais imediatamente corresponde ao significado natural das expressões verbais utilizadas, na pressuposição (imposta pelo n.º 3 do artigo 9.º do Código Civil, que vale até que se demonstre que não é correcta) de que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados. (Neste sentido, BAPTISTA MACHADO, Introdução ao direito e ao discurso legitimador, página 182.)
No caso em apreço não há elementos que justifiquem que se faça uma interpretação diferente da que resulta imediatamente do texto legal.
Na verdade, se é certo que, como defende a Recorrente, a sua tese não teria como corolário que pudessem ser contabilizadas no cálculo das mais valias despesas posteriores a alienação, não é menos certo que, se se considerassem apenas as despesas efectuadas nos cinco anos fiscais anteriores ao da alienação, ficariam excluídas as despesas efectuadas nesse mesmo ano da alienação, inclusivamente as que tivessem sido especificamente efectuadas tendo em vista valorizar o prédio para efeitos de venda, o que não seria razoável, já que estas são despesas presumivelmente necessárias para obtenção do produto da alienação.
Por outro lado, se, para além das despesas efectuadas nos cinco anos fiscais anteriores ao da alienação, se contabilizassem também as despesas efectuadas no próprio ano da alienação, chegar-se-ia à conclusão que seriam relevantes despesas efectuadas durante um período superior a cinco anos (os cinco anos fiscais anteriores ao da alienação e o período do ano em que esta que ocorreu que decorreu desde o início do ano) em manifesta dissonância com a intenção legislativa plasmada naquela norma de apenas dar relevância a despesas efectuadas num período de cinco anos.
Assim, a interpretação adequada daquela alínea a) do art. 51.º do CIRS é a que foi efectuada na sentença recorrida que, para além de estar em sintonia com o texto legal, é a mais acertada que, por isso, se deve presumir ter sido legislativamente adoptada (art. 9.º, n.º 3, do Código Civil).
Termos em que acordam em negar provimento ao recurso e em confirmar a decisão recorrida.
Custas pelo Recorrente, com procuradoria de 1/6.
Lisboa, 31 de Janeiro de 2012. – Jorge de Sousa (relator) – Francisco Rothes – Valente Torrão.