Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0953/11
Data do Acordão:03/28/2012
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:REVERSÃO
VÍCIOS DO ACTO
CADUCIDADE DE LIQUIDAÇÃO
ERRO NA FORMA DE PROCESSO
CONVOLAÇÃO
Sumário:I - O meio processual adequado para o revertido impugnar contenciosamente o despacho que ordena a reversão, com fundamento em falta de fundamentação deste ou outros vícios a tal acto imputados, é a oposição à execução, e não o processo de impugnação judicial, dado que se trata de fundamentos que se reconduzem a fundamentos de oposição à execução (art. 204º do CPPT).
II - Sendo intempestiva a utilização do meio processual para o qual se pretenda convolar ou havendo erro na forma de processo quanto a algum dos pedidos e respectivos fundamentos, mas não quanto a outros, não deve ser ordenada a convolação.
III - A reclamação graciosa ou a impugnação deduzida pelo responsável subsidiário há-de incidir sobre ilegalidades do próprio acto de liquidação que gerou a dívida que lhe é imputada, e não sobre eventuais e posteriores vícios do procedimento de reversão.
Nº Convencional:JSTA000P13943
Nº do Documento:SA2201203280953
Data de Entrada:10/27/2011
Recorrente:A......
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

RELATÓRIO
1.1. A………, com os demais sinais dos autos, recorre da sentença que, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, julgou improcedente a impugnação que aquele deduzira contra a decisão de indeferimento do Recurso Hierárquico interposto do indeferimento da Reclamação Graciosa na qual, por sua vez, pretendia a anulação dos despachos de reversão, bem como declaração de ilegalidade das liquidações adicionais de IRC dos anos de 2003, 2004 e 2005, tudo no âmbito de processos de execução fiscal em que é devedora originária a sociedade B………, Lda., revertidos contra o ora recorrente, como responsável subsidiário.
A sentença recorrida julgou improcedente a impugnação, não operando a convolação para oposição, e julgou não caducado o direito de liquidar por parte da AT, mantendo os actos impugnados na ordem jurídica, no que respeita ao impugnante.

1.2. O recorrente termina as alegações formulando as conclusões seguintes:
«Nestes termos, considerado o alegado, como que doutamente será suprido por V. Exªs.,
Deve a Sentença recorrida ser parcialmente revogada na parte em que afirma não poder conhecer, porquanto
A) O recorrente agiu em conformidade com a Lei, ao apresentar a Reclamação Graciosa a Recurso Hierárquico do despacho que ordena a reversão contra si, bem como que o meio próprio para fazer valer a legalidade da sua posição bem como a sua razão face à Lei.
B) Deve ser decretada a anulação do acto administrativo que ordenou a reversão contra o recorrente, seja por falta ou insuficiência de fundamentação, seja por desvio de poder, seja por erro-vício, vício este do acto administrativo supra, o que também implicará a anulação do processado (citação por reversão).»

1.3. Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4. O MP não emitiu Parecer (cfr. fls. 200 verso).

1.5. Corridos os vistos legais, cabe decidir.

FUNDAMENTOS
2. Na sentença recorrida julgaram-se provados os factos seguintes:
A) A Administração Tributária (AT) procedeu a uma acção inspectiva (de ora avante, inspecção) à ora devedora originária, “B………, Lda.”, com o NIPC ………, relativamente a IRC e IVA de 2002;
B) A AT anulou os despachos de reversão e declarou a caducidade do direito à liquidação do IRC, relativamente a 2002, por despacho de 13/05/2009 (fls.136 a 147);
C) A Administração Tributária (AT) procedeu a uma outra inspecção à ora devedora originária, “B………, Lda.”, com o NIPC ………, com o CAE: 55301, com sede na Rua da ………, ………, Abrantes, credenciada pela Ordem de Serviço nº OI1200601020, de 03/08/2006, notificada à inspeccionada em 03/10/2006 fls. 113 e 117 na sequência do processo de consulta e recolha de elementos credenciado pelo Despacho nº DI200600825 de 19/04/2006, inspecção que teve âmbito parcial e natureza externa, incidindo sobre o IRC e IVA dos exercícios de 2003, 2004 e 2005, tendo o relatório sido assinado 20/11/2006 (fls. da RG) e homologado por despacho de fls. da RG, de 24/11/2006, tendo recorrido a métodos indirectos para determinação da matéria tributável, cfr. relatório fls. 50 a 104, e anexos de fls. 105/ss, do anexo de RG anexo ao processo de impugnação 1513/10.1 BELRA, em que é impugnante a esposa do ora impugnante, cuja situação é a mesma ((2) E de que nos iremos socorrer, por ser a mesma situação, o processo nos estar distribuído, e por as partes não terem junto oportunamente com a petição e contestação esses ou cópias integrais desses documentos, mas apenas documentos dispersos e fragmentários, e, considerando os princípios da economia processual e da celeridade, não se justificar que se ordene ora a junção e devidamente ordenada);
D) O projecto de conclusões do referido relatório da inspecção foi notificado à sociedade, ora devedora originária pelo ofício 10772, de 19/10/2006, tendo exercido o direito de audição, e tendo o relatório final sido notificado à mesma pelo ofício 11987 de 27/11/2006 (fls. 110, da RG) no qual constava a fixação da matéria tributável em IRC, por métodos indirectos, para os anos 2003, 2004 e 2005, notificação que foi conseguida em 30/11/2006, cfr. fls. 111 e 112 da RG, AR e «RM158195039PT» do CTT, a fls. 112 da RG;
E) Na sequência da inspecção e das correcções referidas, a AT emitiu as liquidações de IRC:
Ano 2003: a liquidação nº 20078310014132 (fls. 32 a 33 da RG), emitida em 19/06/2007; no valor de € 40.586,71 (fls. 36, da RG); a liquidação dos juros compensatórios 200771364, no valor de € 4.034,20 (fls. 36, da RG); e, não tendo sido regularizadas, foi passada a certidão de dívida nº 2007588703 e deu origem ao PEF nº 1929200701031902 (fls. 36, e 116, da RG);
Ano 2004: a liquidação nº 20078310012091 (fls. 44 a 45, da RG), emitida em 11/07/2007, no valor de € 38.148,81 (fls. 45, da RG); a liquidação de juros compensatórios 2007695195, no valor de € 774,00 (fls. 45, da RG); e não tendo sidas regularizadas, foi emitida a certidão de dívida nº 2007660975 e deu origem ao PEF nº 1929200701025775 (fls. 43 e 116 da RG);
Ano 2005: a liquidação nº 20078310002307 (fls. 40 a 41, da RG), emitida em 17/04/2007, no valor de € 32.158,37 (fls. 41, da RG); a liquidação de juros compensatórios 200744395, no valor de € 2.089,16 (fls. 41, da RG); e, não tendo sido regularizadas, foi emitida a certidão de dívida nº 2007461194 e deu origem ao PEF nº 1929200701032976 (fls. 47 e 116, da RG) e cfr. certidões de dívidas de fls. 29 a 79 destes autos;
F) Na sequência da mesma inspecção, das correcções referidas e da matéria em tributária fixada, a AT apurou as faltas de IVA de:
Ano 2003: € 14.758,80;
Ano 2004: € 15.348,13;
e Ano 2005: € 17.412,12; cfr. relatório e notificação de fls. 110, da RG;
G) «Nos anos de 2002, 2003, 2004 e 2005, o gerente de direito e de facto do sujeito passivo foi o Sr. A………, contribuinte nº ………. (...)» relatório fls. 52 e 117 da RG e artic. 6° da p.i.;
H) As liquidações referidas foram notificadas à “B………, Lda.”, “sujeito passivo inspeccionado”:
tendo a nota de cobrança da liquidação do ano 2003, a data de registo de 22/06/2007 (fls. 120 e 31 e 32/ss, 38, da RG);
tendo a nota de cobrança da liquidação do ano 2004, a data de registo de 23/04/2007 (fls. 120 e 38, 42, da RG); e
tendo a nota de cobrança da liquidação do ano 2005, a data de registo de 17/07/2007 (fls. 120 e 34 e 46, da RG e informação anexa nesta impugnação);
I) O impugnante solicitou revisão da matéria tributável relativamente aos anos de 2003, 2004 e 2005, nos termos nos termos do artigo 91º da LGT e nomeou perito C………, e pediu à AT que a reversão fosse efectuada (a reversão) nos termos e com os fundamentos dos requerimentos de fls. 84/ss., 98/ss. e 111/ss. destes autos e artic. 7° e 8° da p.i., e RG e RH;
J) Por despachos de 15/04/2009, nos PEF nºs 1929200701031902 (fls. 12, RG) e 1929200701025775 (fls. 18, da RG) e 1929200701032976 (fls. 24, da RG), e fls 88/ss., l03/ss. e 115/ss., destes autos, a AT reverteu as execuções contra o ora impugnante A………, NIF ……… e esposa D………, NIF ………, tendo aquele sido citado das reversões em 16/04/2009, cfr. ofícios, registos e A/R dos CTT, de fls., da RG e de fls. 81 a 83, 95, 107 e 121 destes autos;
K) O ora impugnante interpôs Reclamação Graciosa (RG), nos referidos PEF nºs 1929200701031902 (fls. 2/ss, RG), 1929200701025775 (fls. 4/ss, da RG) e 1929200701032976 (fls. 6/ss, da RG), contra os respectivos e referidos despachos de reversão, que foram indeferidas e do seu indeferimento interpôs RH;
L) Dou por reproduzido o despacho de deferimento, de 13/05/2009, do RH da RG, de fls. 136 a 147, comunicado à devedora originária, ali recorrente, pelo ofício 1130 de 18/05/2009, a fls. 134;
M) Dou por reproduzido o despacho de indeferimento, de 16/04/2009, do RH da RG, de fls. 150 a 157, comunicado à devedora originária, ali recorrente, pelo ofício 1152 de 20/05/2009, a fls. 148;
N) Em 31/07/2009, o ora impugnante e a supra referida esposa requereram a coligação, nos supra referidos PEF 1929200701031902, 1929200701025775 e 1929200701032976, o que foi indeferido por despacho de 24/08/2009, fls. 137 a 141, da RG referida;
O) A presente impugnação deu entrada em 02/03/2010, cfr. fls. 2.

3.1. A sentença recorrida explicitando que, do que resulta da Petição Inicial, o impugnante vem, na sequência da R(eclamação) G(raciosa) e do R(ecurso) H(hierárquico) atacar a validade do despacho de reversão da dívida da devedora originária, bem como invocar a caducidade do direito de liquidação, considerou, em síntese, o seguinte:

a) Quanto à validade do despacho de reversão o impugnante invoca: ― que as citações das reversões são ilegais porque ele (impugnante) nunca foi citado de qualquer reversão e também não se indica nem fundamenta por que é que a AT decidiu, no que se refere ao IRC dos anos de 2003, 2004 e 2005, aqui em questão, de modo diferente do que havia decidido quanto ao IRC do ano de 2002; que apesar de o despacho de citação por reversão se destinar a evitar a alegação (por parte do impugnante) da caducidade do direito à liquidação, vem, ainda assim, alegar a caducidade do direito de liquidação de IRC de 2003, pelo decurso de mais de 3 anos nos termos do artigo 45º-2 da LGT.
Ora, para reagir contra o acto de reversão, o impugnante teria de socorrer-se do processo de oposição, a instaurar no prazo de 30 dias, a contar da citação da reversão, ou, se não a tivesse havido, da primeira penhora, nos termos do art. 203º do CPPT, com fundamento na falta de pressupostos, legitimidade, fundamentação, ou outros, nos termos do art. 204º do CPPT.
O processo de impugnação visa discutir a legalidade da dívida tributária, do acto tributário, maxime, de liquidação, nos termos dos arts. 99º e ss., do CPPT. Quanto às dívidas de imposto, o processo próprio seria, pois, o processo de impugnação. Que é o presentemente instaurado.
Nos termos do art. 22º-4, da LGT, os devedores subsidiários revertidos, têm o direito de usar dos meios facultados ao devedor principal. A questão é que o uso desses meios tem de ser feito, selectivamente, nos termos prescritos na respectiva forma legal.
Ora, os fundamentos invocados na petição não constituem fundamento de impugnação judicial, e constituem, antes, fundamento de oposição à execução, salvo o que se dirá quanto à caducidade.
Na verdade, quanto ao despacho de reversão, o processo, o prazo e os fundamentos próprios são os contidos nos arts. 203º e ss., do CPPT. E a falta de notificação da liquidação do tributo “no prazo” de caducidade é fundamento de oposição (art. 204º-1-e), do CPPT).
De acordo com o disposto nos arts. 97º-3 da LGT e 98º-4 do CPPT, em caso de erro na forma do processo este será convolado na forma do processo adequada, nos termos da lei.
No caso, embora a petição não seja inepta para efeitos de ser convertida em petição da nova forma processual de oposição, seria preciso que à data da apresentação desta impugnação a mesma estivesse dentro do prazo de 30 dias a contar da citação da reversão, nos termos do art. 203º-1-a) do CPPT, previsto para a interposição da nova acção, por via da convolação.
Pelo que a convolação em oposição da presente impugnação seria impossível, porque tendo o impugnante sido citado das reversões em 16/4/2009 e tendo a presente petição entrado em 2/3/2010, como resulta do probatório, há muito estão transcorridos os citados 30 dias.

b) Quanto à caducidade o impugnante alega que, tendo havido (na inspecção realizada) recurso a métodos indirectos, então, contando o prazo, o IRC de 2003, 2004 e 2005 já está caducado (depreendendo-se que o impugnante se refere à data da citação da reversão).
Ora, sendo a caducidade um fundamento de impugnação, deve o processo prosseguir nesta parte. Ou seja, porque o fundamento da alegada falta de fundamentação e pressupostos da reversão são fundamento de oposição, não pode o tribunal deles conhecer, e, por conseguinte, não conhece. Mas conhecerá do fundamento que resta e que é cognoscível em sede de impugnação, que é a questão da caducidade do direito de liquidar os tributos.

c) E apreciando, assim, em seguida, a invocada caducidade das liquidações a sentença recorrida conclui que, sendo aplicável o respectivo prazo de caducidade de 4 anos e começando este a correr nos dias 31/12/2003 (liquidação relativa ao ano de 2003), 31/12/2004 (liquidação relativa ao ano de 2004), 31/12/2005 (liquidação relativa ao ano de 2005), obteremos, respectivamente, como termo de tal prazo de caducidade, os dias 31/12/2007 (de 2003), 31/12/2008 (de 2004) e 31/12/2009 (ano de 2005); pelo que, tendo as notificações das liquidações ocorrido em 22/6/2007 (de 2003), 23/4/2007 (2004) e 17/7/2007 (2005), mesmo considerando os 3 dias seguintes, referidos no art. 39º-1, do CPPT, aquando das referidas notificações das liquidações, não tinha ocorrido qualquer caducidade do direito da AT a liquidar. Sendo esta, aliás, a notificação ao devedor originário, que é exigida pelo art. 45º-1 da LGT, quando fala em “ao contribuinte”, e não a citação dos revertidos em PEF, ao contrário do que parece resultar da argumentação da douta p.i..

d) E no mais a sentença recorrida considerou, ainda, o seguinte:
― Quanto aos processos pendentes ou já decididos referidos na p.i., não é matéria a conhecer nestes autos, encontrando-se aqui e agora prejudicada.
E também não é aqui pertinente a pouco explicitada questão da alegada dualidade de critérios da AT relativamente ao ano de 2002 e aos anos seguintes (2003 a 2005) ora em presença, sendo certo, aliás, que houve duas inspecções (como resulta do probatório uma do ano de 2002 e outra dos anos de 2003, 2004 e 2005, ora em questão), cada uma com as suas circunstâncias, não se vendo que o critério tivesse de ser o mesmo, nem em que ponto, sem, de resto, primeiro se alegar e provar que as realidades circunstanciais eram também exactamente as mesmas.
Questão esta que, assim, fica igualmente afastada do conhecimento do tribunal.
A AT anulou os despachos de reversão e declarou a caducidade do direito à liquidação de IRC de 2002, por despacho de 13/5/2009. Portanto, a matéria alegada relativamente ao ano de 2002, nesse ponto referida na petição, também não tem aqui e agora pertinência, pelo que dela se não conhece.
Em suma, a presente impugnação deve ser julgada improcedente, julgando-se não conhecer dos fundamentos de oposição, nem operar a convolação da presente impugnação em oposição, nos termos sobreditos, e julgar que não ocorreu caducidade do direito de liquidar, mantendo-se os actos impugnados na ordem jurídica, no que respeita ao ora impugnante.

3.2. Discorda o recorrente sustentando, em síntese, que a sentença deve ser parcialmente revogada («na parte em que afirma não poder conhecer»), porquanto
a) ele, recorrente, agiu em conformidade com a Lei ao apresentar a Reclamação Graciosa a Recurso Hierárquico do despacho que ordena a reversão contra si, bem como que o meio próprio para fazer valer a legalidade da sua posição bem como a sua razão face à Lei.
b) Deve ser decretada a anulação do acto administrativo que ordenou a reversão contra o recorrente, seja por falta ou insuficiência de fundamentação, seja por desvio de poder, seja por erro-vício, vício este do acto administrativo supra, o que também implicará a anulação do processado (citação por reversão).

3.3. Se bem interpretamos, portanto, as Conclusões do recurso (complementando-as, aliás, com o teor das respectivas alegações) o recorrente entende que a sentença recorrida enferma de erro de julgamento na parte em que conclui que não cabe conhecer, em sede da presente impugnação, (i) quer das questões atinentes aos vícios do acto de reversão, (ii) quer da questão relativa à falta de notificação da liquidação do tributo “no prazo” de caducidade, por se tratar de questões que só poderiam ter sido suscitadas em sede de processo de oposição à execução fiscal, quer da matéria, (iii) quer da matéria suscitada quanto aos processos pendentes ou já decididos referidos na p.i., por tal matéria estar prejudicada; (iv) quer da questão da alegada dualidade de critérios da AT relativamente ao ano de 2002 e aos anos seguintes (2003 a 2005); (v) quer da questão atinente à anulação, pela AT, do despacho de reversão e declaração de caducidade do direito à liquidação de IRC de 2002, por despacho de 13/5/2009.

4. O recorrente carece, no entanto, de razão legal.
Com efeito, na presente impugnação o recorrente/impugnante formula os pedidos seguintes:
«Nestes termos deve ser dado provimento à presente impugnação, reconhecendo-se como legal:
A) Considerar que os despachos que ordenaram a reversão são anuláveis, nos termos dos Art.º 135º, porque erráticos na forma de procedimento e sem fundamentação (Art.º 124.º CPTA) ― atento o ocorrido relativamente ao ano de 2002 ― designando um revertido que não o deveria ser, pois tinha “ab initio” condições legais para ser citado como responsável principal, e não foi nunca citado nessa qualidade.
Ou em alternativa, caso assim não se entenda,
B) Que a citação por reversão, foi extemporânea por ter já precludido o prazo para a realizar com eficácia legal a liquidação referente a IRC, ano de 2003, (Art.º45, nº 2, LGT) decretando-se, em consequência a declaração de caducidade do direito de liquidar;».
E na factualidade substanciadora destes pedidos o impugnante faz assentar a impugnação, relativamente à matéria ora (no recurso) em questão, na alegação de que as citações das reversões são ilegais, quer porque o despacho de reversão não indica nem fundamenta a razão pela qual a AT decidiu, no que se refere ao IRC dos anos de 2003, 2004 e 2005, aqui em questão, de modo diferente do que havia decidido quanto ao IRC do ano de 2002, quer porque ele (impugnante) nunca foi citado de qualquer reversão.

4.1.1. Ora, a impugnação judicial (arts. 99º e segts. do CPPT) constitui o meio processual típico que a lei oferece para reacção contra o acto tributário de liquidação dos tributos, com fundamento em qualquer ilegalidade e, por sua vez, a oposição é, como refere a sentença, o meio processual para reagir contra o acto (despacho) de reversão proferido em sede de execução fiscal, com fundamento na falta de pressupostos, legitimidade, fundamentação, ou outros vícios que o afectem (art. 204º do CPPT).
Na verdade, sendo o despacho que ordena a reversão um acto praticado no âmbito de um processo de execução fiscal, é sindicável através dos meios processuais próprios deste processo (no caso, por via da oposição à execução), sendo que também as questões invocadas se enquadram nos fundamentos de oposição: a pretensa falta de fundamentação do despacho que decidiu a reversão tem a ver com a legalidade deste despacho, enquadrando-se no fundamento previsto na al. i) do nº 1 do art. 204º do CPPT, ali devendo ser apreciada.
Tem sido esta a jurisprudência reiterada deste STA, como bem se vê, por exemplo, dos acórdãos proferidos em 30/9/2009, rec. nº 626/09; em 28/10/2009, rec. nº 0578/09; e em 20/1/2010, rec. nº 814/09. E no mesmo sentido se pronuncia, igualmente, Jorge Lopes de Sousa, in CPPT anotado e comentado, vol. III, 6ª ed. 2011, Anotação 38c1) ao art. 204º, pág. 499.
E, como se afirma em tais arestos, os responsáveis subsidiários podem impugnar judicialmente a liquidação (cfr. o nº 4 do art. 22° da LGT), nos termos gerais, a partir da data da sua citação (art. 102º, nº 1, al. c) do CPPT) no processo de execução e podem deduzir oposição à execução fiscal, nos termos dos arts. 203° e 204º do CPPT, sendo que estes meios de defesa têm campos de aplicação distintos.
Por isso, no que se refere ao despacho de reversão, tratando-se de despacho proferido na própria execução e no qual se decide a reversão no âmbito daquela, o meio processual para o sindicar terá de ser encontrado entre aqueles que a lei prevê para os interessados defenderem os seus interesses nessa execução: a reclamação prevista no art. 276° do CPPT ou a oposição à execução fiscal com os fundamentos constantes do nº 1 do art. 204° do mesmo Código, sendo «este último meio de oposição que se perfila como o meio adequado para os revertidos impugnarem o despacho de reversão (…) desde logo porque é o único que lhes “assegura, em todos os casos, a defesa dos direitos do revertido, designadamente por não ter o regime-regra de subida diferida que está previsto para a reclamação no artigo 278º do CPPT e possibilitar a suspensão do processo de execução fiscal após a penhora ou prestação de garantia (artigos 212º e 169º, nºs. 1, 2, 3 e 5 do mesmo Código)” – rec. 504/07.»
Como assim, no presente caso, quer porque os pedidos de que se considere que «os despachos que ordenaram a reversão são anuláveis, nos termos dos Art.º 135º, porque erráticos na forma de procedimento e sem fundamentação (Art.º 124.º CPTA)» ou de que, em alternativa, se considere «Que a citação por reversão, foi extemporânea», quer porque as próprias causas de pedir que os suportam [e se traduzem na falta de indicação nos despachos de reversão das razões dessa reversão, dos motivos pelos quais a AT decidiu, no que se refere ao IRC dos anos de 2003, 2004 e 2005, de modo diferente do que havia decidido quanto ao IRC do ano de 2002, e, ainda, na alegação de que ele (impugnante) nunca foi citado de qualquer reversão], «encontram o meio processual adequado para serem conhecidos na oposição à execução fiscal e não em sede de impugnação judicial (artigo 204º nº 1, alínea b) e i) do CPPT)» (cfr. citado acórdão, de 28/10/2009, no rec. nº 0578/09), não podia a sentença recorrida tê-los apreciado em sede do presente meio processual utilizado pelo recorrente: a impugnação.
Aliás, destinando-se o instituto da reversão a chamar à execução fiscal outro executado, e representando-se aí uma alteração subjectiva daquela instância executiva, faz sentido que, no que respeita aos fundamentos que impliquem a invocação de ilegalidades quanto a esse chamamento, o meio processual adequado a utilizar seja um dos que estão previstos para esse regime e no qual se asseguram ao visado todas as garantias de defesa, e não a impugnação, que tem outro campo de aplicação.

4.1.2. E, por outro lado, tendo a sentença recorrida considerado que o pedido (também formulado) de declaração de caducidade do direito à liquidação constitui, no caso, fundamento de impugnação judicial (questão que foi, aliás, apreciada pela sentença, e sobre a qual não versa, sequer, o presente recurso – já que o recorrente o delimita às questões que a sentença «afirma não poder conhecer»), fica claro que não podia a mesma sentença ter ordenado a convolação da presente impugnação para o meio processual de oposição, por forma a conhecer dos ditos pedidos atinentes aos alegados vícios dos despachos de reversão.
Com efeito, além de, como a sentença expressa, não ser legalmente possível proceder a tal convolação (por a petição inicial da impugnação ter sido apresentada muito para além dos 30 dias em que poderia ter sido deduzida a oposição o impugnante foi citado das reversões em 16/4/2009 e a petição inicial desta impugnação entrou em 2/3/2010), também impediria tal convolação o facto de na sentença se ter entendido que a caducidade do direito à liquidação constitui fundamento de impugnação judicial.
É que, consistindo o erro na forma de processo (art. 199º do CPC) em ter o autor usado de uma forma processual inadequada para fazer valer a sua pretensão e sendo certo que o erro na forma de processo utilizado deve ser aferido pelo pedido formulado na acção (cfr., entre outros, Rodrigues Bastos, in “Notas ao Código de Processo Civil”, 3ª ed., 1999, pág. 262; Antunes Varela, in RLJ 115, pág. 245 e segs; ac. do STJ, de 12/12/2002, rec. nº 3981/02, in Sumários, 12/2002; e ac. deste STA, de 25/1/2012, rec. nº 0866/11), é de afastar a convolação no caso de haver erro na forma de processo quanto a algum dos fundamentos, mas não quanto a outros: ou seja, a correcção do erro na forma de processo só é possível quando todo o processo passe a seguir a tramitação adequada. Daí que, havendo, no caso, o processo de impugnação de prosseguir, por se ter considerado que era adequado à apreciação de um dos pedidos e dos respectivos fundamentos, sempre estaria, por essa razão, afastada a possibilidade de convolação para a forma de oposição à execução (cfr. Jorge de Sousa, ob. cit. anotação 40 ao art. 204º, pag. 503).
Em suma, portanto, a sentença recorrida, ao decidir que o tribunal não pode conhecer, na impugnação, dos pedidos referentes aos despachos de reversão e aos vícios a estes imputados, não sofre do invocado erro de julgamento.

4.2.1. A sentença recorrida considerou, ainda, que a alegação reportada «aos processos pendentes ou já decididos referidos na douta p.i. (…) não é matéria a conhecer nestes autos, e se encontra aqui e agora prejudicada», que também «não é aqui pertinente a pouco explicitada questão da alegada dualidade de critérios da AT quanto a 2002 e, depois aos anos seguintes ora em presença (…) Questão esta que, fica afastada do conhecimento deste tribunal» e, ainda, que, uma vez que a «AT anulou os despachos de reversão e declarou a caducidade do direito à liquidação de IRC de 2002, por despacho de 13/5/2009 (…) a matéria alegada relativamente ao ano de 2002, nesse ponto referida na petição, também não tem aqui e agora pertinência, pelo que dela se não conhece.»
E, adianta-se desde já, concordamos com o assim decidido.
Com efeito, os processo referenciados na Petição Inicial são (cfr. docs. de fls. 134 a 157 e als. B), L) e M) do Probatório) os seguintes:
a) a reclamação graciosa nº 1929200704000510, deduzida em 3/7/2007 (pelo sujeito passivo ― a sociedade originariamente executada “B………, Lda.”, embora representada pelo recorrente, na qualidade de sócio gerente , ou seja, a reclamação foi deduzida não pelo ora recorrente, como responsável subsidiário revertido, mas pela própria sociedade executada originariamente) contra as liquidações adicionais de IVA e respectivos juros compensatórios respeitantes aos períodos de 0207, 0208, 0209, 0210, 0111 e 0212.
Reclamação esta que veio a ser parcialmente deferida, por despacho de 22/2/2008, notificado à dita sociedade em 10/3/2008.
b) o recurso hierárquico, interposto em 8/4/2008, desta reclamação graciosa, o qual veio a ser provido por despacho de 13/5/2009, notificado à sociedade por ofício de 18/5/2009 (no recurso hierárquico veio a concluir-se que também se verificava a caducidade do direito à liquidação, na parte referente às liquidações nºs. 7030917 no valor de Euros 1.166,58 e relativa ao IVA do período de 0212 ― e nº 7030917 ― no valor de Euros 180,20 e relativa a juros compensatórios do mesmo período).
c) a reclamação graciosa nº 1929200704000471, deduzida igualmente pelo sujeito passivo (a sociedade originariamente executada “B………, Lda.”, embora representada pelo recorrente, na qualidade de sócio gerente) contra a liquidação adicional de de IRC do exercício de 2002, no montante de Euros 34.840,30.
Reclamação esta que foi totalmente indeferida (por despacho de 25/2/2008, notificado à dita sociedade em 10/3/2008.
d) o recurso hierárquico, interposto em 9/5/2008, desta reclamação graciosa, o qual veio a ser indeferido por despacho de 16/4/2009, notificado à sociedade por ofício de 20/5/2009.
e) ― a reclamação graciosa nos PEF nºs 1929200701031902, 1929200701025775 e 1929200701032976, contra os despachos de reversão ali proferidos, que foram indeferidas.
f) ― os recursos hierárquicos interpostos de tais indeferimentos.
g) ― os denominados pedidos de revisão mencionados na al. I) do Probatório (revisão da matéria tributável relativamente aos anos de 2003, 2004 e 2005, nos termos nos termos do artigo 91º da LGT).

4.2.2. Ora, se relativamente às reclamações graciosas referentes ao IVA e ao IRC de 2002, bem como aos recursos hierárquicos interpostos de tais reclamações, há, desde logo, que considerar que a reclamação relativa ao IVA foi totalmente procedente (por via do provimento do recurso hierárquico dela interposto), também quanto à reclamação relativa ao IRC e ao respectivo recurso hierárquico, há que considerar que ambos foram interpostos pela sociedade (sujeito passivo), sendo que, de todo o modo, o que a lei possibilita ao responsável subsidiário revertido (ora recorrente) é a dedução de reclamação ou de impugnação da dívida, nos mesmo termos do devedor principal. Ou seja, sempre a reclamação ou impugnação deduzida pelo responsável subsidiário há-de incidir sobre ilegalidades do próprio acto de liquidação que gerou a dívida que lhe é imputada, e não sobre eventuais e posteriores vícios do procedimento de reversão ou das reclamações graciosas e respectivos recursos hierárquicos.
Para invocar estes últimos a lei faculta ao responsável subsidiário, precisamente o processo de oposição, nos termos acima já expostos.
E o mesmo se diga quer em relação às reclamações graciosas deduzidas contra os despachos de reversão proferidos nos PEF supra indicados, reclamações que foram indeferidas e das quais o recorrente interpôs recurso hierárquico, quer em relação à eventual pendência dos denominados pedidos de revisão mencionados na al. I) do Probatório.
Quanto às reclamações, mesmo que em sede deste recurso hierárquico eventualmente viessem a ser anulados os despachos de reversão, essa anulação não poderia constituir fundamento para a presente impugnação ou para que os alegados vícios (falta ou insuficiência de fundamentação, desvio de poder, erro-vício) de tais despachos de reversão fossem aqui apreciados, sendo que, como também se disse, sempre seria inviável a convolação para a forma adequada (oposição) por intempestividade desta.
Razões que, igualmente se aplicam aos falados pedidos de revisão, até porque estes se reconduzem ao pedido de que «Seja ordenada a reversão de tudo o processado relativo à aplicação do IRC» – anos de 2003, 2004 e 2005 - «no que se refere à matéria colectável obtida por métodos indirectos, tornando-se o ora requerente devedor principal» e de que «Seja citado e/ou notificado de tudo processado após a conferência de peritos para, de acordo com a lei, poder exercer na plenitude o seu direito de defesa» ou «… seja citado para exercer os seus direitos como devedor subsidiário, nos termos do artigo 22º, nº 4 da LGT…».
Aliás, à data, não tinha sido proferido despacho de reversão contra o recorrente, pelo que sempre seria duvidoso que tivesse, então, legitimidade para pedir a revisão (a admitir-se que o responsável subsidiário pode deduzir tal pedido – cfr. ac. do Pleno desta Secção do STA, de 17/3/2011, rec. nº 0876/09.
Neste contexto e por tudo o exposto, conclui-se que a sentença decidiu, na parte em que vem recorrida (isto é, ao decidir que o tribunal não pode conhecer, na impugnação, dos pedidos referentes aos despachos de reversão e aos vícios a estes imputados, e ao decidir que a alegação reportada «aos processos pendentes ou já decididos referidos na douta p.i. (…) não é matéria a conhecer nestes autos, e se encontra (…) prejudicada», que «a questão da alegada dualidade de critérios da AT quanto a 2002 e, depois aos anos seguintes (…) fica afastada do conhecimento deste tribunal» e que a «… a matéria alegada relativamente ao ano de 2002, nesse ponto referida na petição, também não tem aqui e agora pertinência, pelo que dela se não conhece», não sofre dos erros de julgamento que lhe são imputados pelo recorrente.
Pelo que, assim, improcedem todas as Conclusões do recurso.

DECISÃO
Termos em que se acorda em, negando provimento ao recurso, confirmar a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente.
Lisboa, 28 de Março de 2012. - Casimiro Gonçalves (relator) - Ascensão Lopes - Pedro Delgado.