Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:062/19.7BALSB
Data do Acordão:02/01/2024
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:SÃO PEDRO
Descritores:CONSELHO SUPERIOR DOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS E FISCAIS
CONCURSO PARA JUIZ DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO
LEGITIMIDADE ACTIVA
INTERESSE EM AGIR
VALORAÇÃO
PUBLICAÇÃO
FUNDAMENTAÇÃO
Sumário:I - O interesse em agir deve ser aferida relativamente a cada um dos vícios (ilegalidades) imputados ao acto impugnado. Não tem interesse em agir quem não retira qualquer utilidade (benefício) com o reconhecimento do vício gerador da anulação do acto.
II - Não tem, assim, interesse em agir o interessado que através da aplicação de um critério ilegal obteve, nesse ponto, a melhor graduação possível e não demonstra que, do reconhecimento dessa ilegalidade, resulta qualquer vantagem para si.
III - Não é ilegal a (i) valoração da valia de trabalhos científicos publicados e a (ii) valoração do grau académico obtidos com os mesmos trabalhos, se o Aviso de Abertura a não excluía expressamente.
IV - Não existe fundamentação quando a mesma não seja expressa, suficiente e congruente, designadamente, quando a deliberação impugnada considera haver excelente capacidade de trabalho e os elementos estatísticos evidenciam atrasos muito significativos em processos urgentes, ou quando um relatório de inspecção considera haver produtividade “inferior ao normalmente exigível.
Nº Convencional:JSTA000P31861
Nº do Documento:SA120240201062/19
Recorrente:AA
Recorrido 1:CONSELHO SUPERIOR DOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS E FISCAIS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO


1. Relatório
1.1. O Dr. AA, Juiz Desembargador no Tribunal Central Administrativo do ..., devidamente identificado nos autos, intentou a presente ACÇÃO ADMINISTRATIVA contra o CONSELHO SUPERIOR DOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS E FISCAIS, impugnando a deliberação proferida em 18 de Junho de 2019, que homologou a lista de graduação dos candidatos no âmbito do concurso para o provimento de vagas de juiz conselheiro, na secção de contencioso administrativo do Supremo Tribunal Administrativo, aberto pelo Aviso n.º 373/2018, publicado em Diário da República, 2ª série, nº 25, de 8 de Janeiro de 2018, indicando como contra-interessados BB, CC, DD, EE, FF, GG, HH, II, JJ, KK, LL, MM, NN, OO e PP.

1.2. Pede que a presente acção seja julgada procedente e, em consequência, a seja anulada a deliberação impugnada.

1.3. Citado para o efeito, o CONSELHO SUPERIOR DOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS E FISCAIS contestou por impugnação argumentando, em síntese, que não se verifica nenhum dos vícios invocados pelo Autor, pelo que a presente acção deve ser julgada totalmente improcedente. Os contra-interessados foram citados através de Anúncio publicado no Diário da República, sem que qualquer deles tivesse contestado. Apenas o contra-interessado Dr. CC veio “constituir-se como contra-interessado”. E, mais tarde, alegar por escrito.

1.4. Por despacho proferido em 19-10-2020, foi fixado o valor da causa, entendeu-se ser possível conhecer do mérito da causa e determinou-se a audição das partes sobre a dispensa da audiência prévia. O Autor não se opôs à dispensa da audiência prévia, requerendo todavia a possibilidade de apresentar alegações escritas, o que foi deferido por despacho de 6-9-2021. Foram apresentadas alegações escritas pelo Autor, pela entidade demandada e pelo contra-interessado Dr. CC.

1.4.1. Nas alegações escritas o Autor concluiu como se segue:

«1) Nos termos do que se referiu, importa, a juízo que se pretenda mobilizador, apartarmo-nos o mais possível da justificação das soluções através da margem de liberdade, pois temos uma lei processual germanizada, mas, de fundo, esquecemos os ensinamentos da dogmática deste País, que desenha um catálogo do que é discricionário (7/8 casos), permitindo assim aos Tribunais superar muitos dos males de que o País (assim) vai sofrendo e oferecendo garantias de que os melhores o governam.

2) Como já dissemos, o que se deve assumir no acto de julgamento é a total revisibilidade do juízo administrativo com excepção das seguintes situações: “(…) quando conceitos jurídicos indeterminados, por causa da alta complexidade e da dinâmica especial da matéria regulada (são) tão vagos e a sua concretização no seguimento da decisão administrativa (é) tão difícil, que o controlo judicial bate nos limites funcionais da jurisdição”

3) Ora, quanto às avaliações a considerar, as duas últimas, sustentámos sinteticamente o dizemos, que a lei e os princípios que a enformam e que lhe servem limites de interpretação, determinam que as classificações de serviço a tomar em consideração terão de ter uma expressão maior do que as duas últimas, conforme sucedeu, no nosso entendimento a tort, no caso vertente.

4) Adiantando ainda que se não vislumbram razões objectivas (até de natureza literal) para esta restrição interpretativa, considerando que estamos face ao coroar da carreira de qualquer magistrado.

5) Quanto à ratio legis, a razão da administração parte do pressuposto que a performance do magistrado é sempre a ganhar (entre o mais, mais experiência…) e todos sabemos que esta não é a regra: há flutuações na performance que vão além da “experiência” (razões objectivas, por exemplo, de natureza médica recuperável, ou subjectivas, por exemplo, cansaço episódico cognitivo e emocional) e muitas vezes até é mesmo a perder.

6) Logo, não se afigura razoável e adequado restringir interpretativamente, porque é uma restrição, as classificações pertinentes às duas últimas: teríamos de ter no mínimo um critério legalmente neutro ou, por outras palavras, objectivo, no que a estas indesmentíveis categorias da vida diz a lei respeito - estas não se alteram nem são sempre a subir e até antes pelo contrário; aliás, uma visão mais chegada à letra da lei das classificações pertinentes (asserção ao que cremos indesmentível) sendo estas mais abrangentes (no que à carreira diz respeito) compreende aquelas flutuações de performance do candidato, ao contrário do que sucede com a consideração do mínimo plural das duas últimas.

7) Pelo que se entende que se verifica violação de lei, por afronta ao estatuído no art. 66.º, n.º 2, ali. a) e 61.º, n.º 2, ali. b do ETAF), referindo-nos ao edital, ponto 5 ali. a) e ao acto impugnado, naturalmente.

8) Depois, restringir a letra da lei, os sobreditos arts. 66.º, n.º 2, ali. a) e 61.º, n.º 2, ali. b) do ETAF) a um seu mínimo (melhor, a um seu duplo mínimo, duas classificações a atender na graduação e uma delas a valer 75% e a outra naturalmente 25%) é levar a efeito uma interpretação ilícita e avessa à razão de ser da ou das normas e, ao que pensamos, nunca esperada pelo legislador; ainda e também não sancionada pelos princípios constitucionais e administrativos atinentes,

9) mormente o da justiça (não ser escolhido o melhor candidato pela restrição do que releva para este efeito), do mérito (não se garante que o melhor seja o escolhido, pois relevando sobretudo a última das classificações em 5/6 atende-se apenas a um limite temporal excessivamente limitado), da igualdade (pelas mesmas razões) e da proporcionalidade, conquanto mesmo não o da razoabilidade, porquanto não se afigura equilibrado, razoável nem proporcional reduzir a escolha de que cuidamos, magistrados com dezenas de anos de profissão, fundamental ou essencialmente, à ultima classificação com a letra da lei a dizer o que já vimos – isto, sabido que é que a principiologia deve ser contribuir para a correcta hermenêutica da lei.

10) Se víssemos aqui alguma folga decisória e não uma questão de interpretação legal, como devemos, para além do que já dissemos a este respeito, ao mesmo resultado chegaríamos, pois, no preenchimento ou na clarificação dessa suposta zona cinzenta, quer se trate do edital, quer se trate deste conjugado com a decisão que distinguiu o valor relativo das classificações, se verificaria a violação dos sobreditos princípios pelas razões apontadas.

11) Ademais, dizer que os candidatos, os que se candidataram, podiam esperar que uma de duas das classificações pertinentes valeria 75% e a outra 25% é de um arrojo argumentativo e intelectual excessivo; todos vemos, todos sabemos, que assim não é, sendo que o que a quase totalidade dos intérpretes vê (da expressão “classificações anteriores” e das “duas ultimas classificações” não é uma delas valer 75% e a outra valer 25%), não pode ser julgado ou visto por aquilo que singular e extraordinariamente se poderia ver.

12) A terminar, mantemos naturalmente a jurisprudência e dogmática que citámos, quando abordámos o assunto sob a perspectiva da decisão do júri introduzir no critério constante do aviso, um novo parâmetro.

13) Com efeito, o critério para tal distinguir, se o júri densifica correctamente o critério ou não, reside no facto de este sub-parâmetro poder conduzir a resultados inesperados ou que possam subverter o critério; ora, atenta a disparidade percentual (na ordem das 4 vezes) assim sucede ou, reportando-nos ao momento da decisão do júri, podia suceder, coisa e alegação que é matemática e, portanto, incontroversa.

14) O júri apenas procedeu à restrição dos 75% quando já sabia o universo de candidatos – ora, o princípio da divulgação atempada dos critérios e subcritérios é de jurisprudência comunitária, tem criação francesa, vindo assim em qualquer manual de direito administrativo, mormente comparado (Itália incluída, cfr. P. Virga) que aborde o emprego público, sendo, como todos sabemos, jurisprudência corrente no nosso País.

15) O Digníssimo Júri, ao estabelecer a distinção de que a última classificação valeria 75% e a penúltima 25%, já conhecendo o universo dos candidatos, violou os princípios da publicitação, da transparência e da imparcialidade.

16) Na verdade, atenta a proximidade pontual dos candidatos, esta decisão tem um impacto significativo na ordenação constante da lista de graduação final e, sobretudo, se sabida, poderia ter determinado que algum ou alguns dos candidatos se não candidatassem e, assim, tal facto podia ter alterado a graduação final em favor do Autor - o ónus, reitera-se, como aliás sucede no País que mais aplicou e há mais tempo a matéria do aproveitamento segundo a doutrina do harmlesss error (EUA e A.P.A. fonte neste domínio do CPA Alemão), é da administração.

17) Aliás, é bastante mais grave, pois o júri apenas estabeleceu esta distinção no seu parecer final, não foi antes de conhecer os candidatos e seus currículos, nem depois em qualquer acta subsequente ao início das suas funções, mas apenas quando estava a emitir o seu entendimento final.

18) No que concerne às graduações (cfr. al. b), do n.º 2 do art. 66.º do ETAF e aviso de abertura do concurso, ponto 5, al. b.) temos que o Júri parametrizou a graduação obtida em concursos de habilitação ou cursos de ingresso em cargos judiciais, por forma a fazer valer apenas a melhor graduação obtida por cada candidato.

19) Ora, mutatis mutandis, temos aqui verificadas as mesmas violações (e pelas mesmas razões que mencionámos) de lei: num primeiro momento, viola-se o estatuído no art. 66.º, n.º 2, al. b) do ETAF, em razão da interpretação restritiva que o aviso, no número mencionado, operou da lei, bem como a principiologia citada e, num segundo momento, sempre evitando a repetição, temos que, mais uma vez e pelas mesmas razões, se violou o princípio da divulgação atempada dos subcritérios e os princípios da imparcialidade e da transparência.

20) Mas, neste domínio, avulta igualmente o vício decorrente da falta de fundamentação da opção pela consideração apenas da melhor graduação obtida por cada candidato, não se percebendo, não percebendo os destinatários médios (ainda que distintos, como é o caso dos autos) qual a razão que ditou essa opção por parte do júri – o que vale, naturalmente, para a hipótese de se ver nesta factologia uma questão de forma e não, segundo a distinção dogmática que demos nota, uma questão de legalidade interna, caso em que o acto sofreria de vício de violação de lei por erro nos seus pressupostos.

21) Aliás, diga-se, o impacto em termos de ilicitude da avaliação deste sub-critério, talhado em vista já dos curricula, recrudesce em termos do seu impacto negativo potencial e efectivo sobre os interesses privados, mormente do A., em causa.

22) O Edital (bem como o acto impugnado, naturalmente que o repete abstractamente), na medida em que dispensa a audiência por razões de urgência, está errado, aliás grosseiramente, na medida em que, como se alegou, existia mais do que tempo para a mesma ocorrer - 18.06.2019 é a data do acto impugnado e só passados, pois, dezoito meses se verificou o parecer final do júri, emitido que foi em 1.3.2019 e, depois, existia ainda tempo para se verificar a audiência prévia desde o parecer do júri até ao acto homologatório, entre 1/3/2019 até 18/6/2019, para não falar já no facto de apenas se ter nomeado neste interim um Juiz Conselheiro e de este ter ficado a exercer as funções que exercia.

23) Seguidamente invoca-se que a qualidade dos concorrentes constitui um motivo de dispensa da audiência ilícito; todavia é precisamente o oposto que se verifica - atenta a qualidade dos concorrentes, a sua participação em audiência é efectivamente devida e louvável que ocorra, no sentido de garantir o acesso decisório - aliás e decisivamente, os motivos de dispensa de audiência são taxativos e este não enquadra, com evidência, em qualquer deles, sendo por isso o acto ilegal (cfr. 124.º CPA).

24) A defesa pública do currículo, desconhecendo-se o projecto de acto e, assim, a graduação relativa dos candidatos e a forma como a lei e os critérios legais ou ilegais que o júri entendeu fixar para aquele fim, jamais pode consistir numa pronúncia sobre as questões que se levantam no procedimento, sobre os factos e sobre o direito, considerando o teor do estatuído nos arts. 121.º e 122.º do CPA nas dimensões que vimos.

25) Sendo a este respeito errado confundir participação com audiência prévia, pois a lei evoluiu e agora pretende-se que o interessado se pronuncie sobre o projecto de acto, ao contrário do que sucedia aquando das decisões jurisprudenciais de 2013 e 2014 que são citadas pela administração.

26) Finalmente, a circunstância do concurso ser curricular em nada interfere com o direito a ser ouvido sobre o projecto de acto ou sequer enquadra, com evidência, qualquer das razões que alicerce a sobredita dispensa.

27) Na medida em que a urgência vai ou for justificada pelas razões concretas que constam do edital (qualidade dos opositores, defesa pública do currículo, natureza curricular do concurso, etc…), dúvidas inexistem em como, para além do que se disse ou noutro enfoque, sendo o conceito de urgência um conceito que encerra alguma margem de liberdade, é ostensivo que, estando um dos motivos errados, não se tendo a certeza da razão determinante, se não pode aproveitar o que quer que seja - tal só é assim no domínio dos actos vinculados, como o art. 163.º do CPA refere.

28) É absolutamente inegável que o Autor se não pronunciou sobre a lista de graduação, sobre as operações de avaliação levadas a efeito pelo júri, sobre os subcritérios que este entendeu estabelecer, ademais restritivamente, sobre a avaliação feita aos seus pares e opositores a concurso, sendo que, como se prova pela presente impugnação, muito e de pertinente tinha a dizer e a alegar (até de facto) sobre as operações decisórias levadas a efeito e sobre o procedimento cuja decisão final impugna.

29) Relativamente à capacidade de trabalho, vista em função da quantidade e qualidade do serviço determinou-se, em aplicação dos arts. 66.º, n.º 2, alis. f) e 61.º, n.º 2, al. i) do ETAF, quanto aos magistrados em exercício da judicatura, apenas considerar “a quantidade e a qualidade do serviço prestado nos Tribunais Centrais Administrativos e nos Tribunais da Relação”.

30) Conclui-se, pois, a este respeito na pi. que ignorar a maior parte da vida dos magistrados, certamente, 2/3 da mesma, pelo menos, para avaliar a respectiva capacidade de trabalho, é uma restrição no horizonte da carreira desrazoável e desproporcional e configura mesma uma opção eivada de erro grosseiro, pelos motivos explicitados naquela peça processual (e que implica o benefício de uns candidatos e o prejuízo de outros, sendo, como tal, inadmissível sob o ponto de vista do perigo de actuação e, assim, do princípio da imparcialidade, tudo com afronta aos princípios da justiça, do mérito, da igualdade material, da razoabilidade e da proporcionalidade.

31) Sopesando a contestação a este respeito, que, pelas expressões utilizadas, evidencia que o Digno Conselho até concorda com a exposição crítica de motivos do Impugnante, como vimos, temos que ninguém sustentou, como nos parece evidente, que esse lapso temporal (trabalho na segunda instância) não devia ser ponderado; o que gera a ilegalidade é o facto de se ter ignorado na avaliação de que cuidamos 2/3 (para mais…) da carreira do magistrado - poderia a administração ter (erradamente, como vimos e pelas razões de neutralidade e objectividade que adiantámos) com um peso menor esses 2/3 da carreira, mas o que sucedeu é que a avaliação se cingiu pura e simplesmente ao período de tempo que criticámos.

32) Quanto à defesa pela discricionaridade, já nos pronunciámos sobre esta linha argumentativa, sendo que, naturalmente, o erro grosseiro e a violação dos princípios assacada ao acto é precisamente um dos ataques válidos a actos praticados no exercício suposto destes poderes.

33) No que concerne à ponderação e avaliação da capacidade de trabalho levadas a efeito na decisão impugnada, temos que a total ausência de factos, a falta de exteriorização de factos que se lê dessa decisão, relativos à quantidade de trabalho, faz com que o acto esteja eivado do vício de forma por deficiente fundamentação, na medida em que não existe uma só palavra na decisão sobre esta matéria e expresso critério.

34) Ao que vimos de concluir acresce o facto de, não havendo dúvidas de que a capacidade de trabalho tinha que ser ponderada e tinha que o ser pela quantidade de trabalho (critério expresso), não só não temos factos que exteriorizem a ponderação, mas meras qualificações subjectivas (muito bom, bom…), como há diversos candidatos que há mais de três anos não exercem funções estritamente jurisdicionais (queremos dizer, de elaboração de acórdãos) – pelo menos 6 candidatos - não podendo perceber-se como foram sopesadas e quantificadas essas distintas funções, ficando-se completamente no escuro a esse propósito…: nada, mas mesmo nada, se refere inadmissivelmente a este respeito.

35) Ainda a este propósito, alegámos e provámos a situação do Digníssimo Magistrado Dr. EE, graduado em posição superior à do A. que, no período eleito, tem (tinha, eventualmente) 7 processos cautelares sem decisão, com conclusão aberta há 5 anos.

36) Ora, este Magistrado foi pontuado neste item com 98,05 em 110 pontos possíveis, uma excelência próxima do paradigma da perfeição, absoluta, ostensiva e incontrovertidamente incompatível com os atrasos mencionados.

37) Concluímos assim que esta situação de facto alegada convoca, pois, a verificação de vício de violação de lei, por desconsideração de factologia essencial à decisão quanto a este aspecto, mormente de dados estatísticos (fact finding) ou, caso assim não fosse de entender, dizendo-se que esta factologia foi sopesada (e não sabemos como é possível afirmá-lo, como vimos já), por erro grosseiro na avaliação dos factos, sem esquecer que, nesta hipótese de poderem ter sido sopesados os factos a que vimos de fazer referência, o acto sofre, por um lado, do vício de violação de lei e, por outro, do vício de falta de fundamentação por ausência total de referência a factos que sustentem a excelente performance deste candidato (mormente estatística, que o digno Conselho tinha ou tinha que ter à sua perfeita, real e cognoscível disposição), citando-se Acórdão concordante do STA de 29/09/2011, proferido no proc. n.º 43.240.

38) A administração Ré vem alegar que a estatística foi ponderada, quando, como já vimos, não existe uma só referência factual ainda que imperfeita (art. 9.º do CC) que o evidencie ou indicie sequer, bem como vem alegar que a apreciação foi global e que não foi apenas a capacidade de trabalho que foi avaliada, estando, para terminar alegam-no, no domínio da discricionariedade.

39) Nem uma palavra se lê na contestação sobre os atrasos específica, detalhada e comprovadamente alegados, falta de decisão em pelo menos 7 processos urgentes com mais de 5 anos…, nem uma palavra sobre o erro grosseiro a este respeito alegado.

40) Ora, se a administração mescla distintas dimensões do agir magistral para aferir o mérito dos candidatos, detalhando-as no entanto (capacidade de trabalho, prestígio, melhoria para o sistema de justiça, qualidade dos trabalhos forenses apresentados, etc.), entendendo que estas dimensões são para esse efeito relevantes, é inequívoco que lhes tem de fazer referência apreciativa externando os factos que entendeu pertinentes para alicerçar a sua conclusão (no caso excelente, muito bom, etc.).

41) Não há, manifestamente, ao contrário do que se tenta alegar, discricionariedade ou globalidade que possam vencer esta asserção.

42) Repete-se a lucidez constante do acórdão que vimos de citar: “É que era indispensável que dentro do conjunto de elementos apresentados por cada candidato o júri destacasse, ainda que de forma sumária, aquele ou aqueles que lhe permitiram operar a diferenciação, classificar desta e não de outra maneira. (…)”.

43) Independentemente da concreta pontuação obtida neste item da capacidade de trabalho, temos que, considerando ainda os resultados da inspecção mencionada e demais expediente que demos nota nas alegações e na contestação, onde se faz uma crítica cerrada à performance do Ilustre Magistrado DD, cremos que esta qualificação é pelo que se transcreveu e deu nota, adequada, avultando não terem sido sopesados os elementos estatísticos no que à quantidade diz respeito, a convocar vício de violação de lei por afronta ao subcritério constante do aviso de abertura na vertente capacidade/quantidade.

44) Sendo a este propósito de relevar que nenhuma referência à mesma é feita na decisão impugnada.

45) Depois, a terem sido sopesados esses mesmos elementos - e não se percebe como, pois não há rasto ténue na fundamentação sobre a factologia, mormente estatística, sopesada a este propósito - não se percebe de todo em todo a razão pela qual o Ilustre Magistrado foi avaliado com a menção de excelente (85,50 pontos, ou seja, muito perto do paradigma da excelência), tudo a convocar e a reafirmar, assim, a verificação de vício de forma, por falta de fundamentação, pois, sendo esta quantidade um critério expresso, como se disse, era indispensável que o júri destacasse, ainda que de forma sumária, aquele ou aqueles que lhe permitiram operar a diferenciação, classificar desta e não de outra maneira.

46) Independentemente da concreta pontuação obtida neste item da capacidade de trabalho, temos que, considerando ainda os resultados da estatística do Ilustre magistrado CC, avulta não terem sido sopesados os elementos estatísticos no que à quantidade diz respeito, a convocar vício de violação de lei por afronta ao sub-critério constante do aviso de abertura na vertente capacidade/quantidade;

47) Sendo a este propósito de relevar que nenhuma referência à mesma é feita na decisão impugnada.

48) Depois, a terem sido sopesados esses mesmos elementos - e não se percebe como, pois não há rasto ténue na fundamentação sobre a factologia, mormente estatística, sopesada a este propósito - não se percebe de todo em todo, ademais considerando o excelente relatório de inspecção do impugnante que demos nota, a razão pela qual o Ilustre Magistrado foi avaliado com a menção de excelente (87,50 pontos, ou seja, muito perto do paradigma da excelência vs. 90.00), tudo a convocar e reafirmar assim a verificação de vício de forma, por falta de fundamentação, pois, sendo esta quantidade um critério expresso, como se disse, era indispensável que o júri destacasse, ainda que de forma sumária, aquele ou aqueles que lhe permitiram operar a diferenciação, classificar desta e não de outra maneira ou, como se diz nos último dos restos citados, é claro que os elementos curriculares chamados a preencher determinado factor ou subfactor não valem só pela sua extensão mas também, e por vezes sobretudo, pela sua qualidade. Mas isso deve ser dito, de modo a conhecer-se o critério que levou o Júri a atribuir a mesma pontuação a «extensões» tão distintas. O nevoeiro de incompreensão que paira sobre a pontuação do factor em causa não se mostra compatível, pois, com a exigência de clareza, de transparência, e força convincente, que deverá exigir-se de um concurso destes.

49) A este passo interessa dar nota do que designamos por “dupla avaliação”, estando em causa, na decisão impugnada, o critério C. (currículo universitário e pós-universitário) e o critério D. (trabalhos científicos publicados, que versem matérias de natureza jurídica) do aviso de abertura do concurso e a situação relativa ao Dr. CC, Ilustre Magistrado que ficou graduado na lista de classificação final à frente do A.

50) O que está em causa, pois, num item valorizou-se o mestrado e no outro a tese de mestrado, é o desvirtuar dos princípios do mérito e da igualdade que impõem que todos os predicados dos candidatos pertinentes e adequados ao lugar a prover sejam valorados, contudo, uma valoração do mesmo predicado em mais do que um critério desvirtua, por subvalorização dos demais (e por sobrevalorização desse predicado), todos os demais méritos a ter em conta.

51) Verifica-se, pois, vício de violação de lei, do critério D do aviso de abertura e violação dos princípios da igualdade e do mérito, sendo que o aresto citado em apoio do vício que assacamos à deliberação impugnada dá conta da ilegalidade da dupla valorização proibida, ao sustentar de forma clara que se tratou no caso, singelamente, da consagração de uma regra que tem uma valia principiológica anterior e que enforma o edital.

52) No que concerne à inexistência de dupla valoração por se ter analisado o trabalho científico publicado, a verdade inexorável é que não há, nem pode haver, quem tenha o grau sem ter levado a efeito uma tese que é pressuposto daquele, sendo a este respeito pertinente alegar, em reforço do que dizemos, que, no que concerne ao currículo universitário e pós-universitário se diz que a mera frequência sem obtenção do grau não releva (fls. 16 do acto impugnado).

53) A administração vem confessar que parte dos trabalhos científicos levados a efeito pelo Ilustre contrainteressado, Dr. DD, são contemporâneos do relatório de inspecção que o censura seriamente pela falta de produtividade e que transcrevemos supra no corpo das alegações.

54) Resultado este que alicerça o erro grosseiro, pois de tudo isto, dessa pura opção científica e lesiva do interesse colectivo na dimensão justiça célere, o Contrainteressado sai não só louvado, como louvado ao nível da quase perfeita excelência (9,50 pontos em 10 possíveis neste item que tratamos e 8.90 pontos no item que engloba a capacidade, também quantidade, de trabalho), sendo assim perfeitamente claro, a qualquer pessoa, que a Digna Autoridade Recorrida não pode louvar ao nível desta excelência (enquanto exercia proficuamente as funções de magistrado e revela grande capacidade de trabalho) os méritos magistrais deste concorrente (que os terá, por certo).

55) O fim da avaliação, aliás, é, e só pode ser, avaliar o mérito dos candidatos enquanto magistrados, não enquanto cientista do direito.

56) Depois, quanto à consideração da estatística na quantidade e capacidade de trabalho, que se revela fundamental para aferir esta, vê-se aqui um apontamento redobrado de ilicitude já alegada e derivada, digamos assim, sobretudo quando ao candidato Dr. KK, também pontuado com 9,50 pontos (esse sim com um curriculum académico aparentemente forte, segundo cremos, mesmo no plano do doutoramento, relevado ou não), porquanto nada se aduz relativamente à sua performance prática e processual, ficando assim sem se perceber, em carência de fundamentação, se foi a quantidade e qualidade de trabalhos apresentada que relevou juntamente ou não com a referida prática processual ou também algo mais que não foi externado na fundamentação.

57) Finalmente, visto o teor do acto e a fundamentação (está escrito e não pode ser desmerecido sem ponta de motivo externado no acto que o indicie sequer) relativamente à consideração da grande capacidade de trabalho, já ponderada, vemos que a mesma reentra, também, em ilícita dupla e exclusiva avaliação, nesta matéria e critério quanto aos predicados do Ilustre Magistrado em causa, o que faz com que o acto sofra do vício de violação de lei (afronta ao princípio do mérito, como se alegou supra).

58) No âmbito do critério constante da al. e) do n.º 5 do aviso de abertura, face à decisão do júri (é o que se depreende do acto impugnado) que conta crescentemente o tempo de serviço em períodos de 5 anos, alegou-se que se verifica violação do ponto 23 do aviso de abertura, que refere que a graduação final é feita independentemente da antiguidade, funcionando esta como critério de desempate (naturalmente, vício de violação de lei).

59) A Administração diz que não existe a violação lei assacada ao acto, pois a antiguidade referida no ponto 23 se refere ao exercício das funções na jurisdição administrativa e fiscal, estando assim em causa realidades distintas.

60) Ora, a antiguidade é o tempo de serviço do magistrado após o seu ingresso na mesma, não o tempo de serviço do magistrado na jurisdição de que se trate, sendo que não existe um só elemento literal no ponto 23.º que restrinja a antiguidade à antiguidade na jurisdição - cfr. o art. 9.º do CC.

61) Acrescidamente, neste enquadramento, a interpretação da administração conduziria mesmo a resultados injustos e absurdos, mormente que o critério de desempate apenas valeria entre juízes da jurisdição administrativa, não se aplicando aos demais, ou que visa beneficiar aqueles juízes que sempre estiveram na jurisdição administrativa e fiscal.

62) Neste item, dúvidas ainda inexistem em como os Ilustres Magistrados HH e MM, tiveram literalmente a mesma apreciação (cfr. acto impugnado) e pontuações distintas.

63) Vendo o que se alegou sobre as pontuações dos I.M. PP e OO, das I.M. HH e MM, da I.M. Dra. LL, dos I.M. II da Dra. FF e do A., o destinatário médio (instruído) não percebe, como e em que medida, ademais inexistindo bitolas a este respeito pré-fixadas no âmbito deste subcritério, se justificam as diferenças de posição e de pontuação, nomeadamente desconhece:

i) como e porque é que candidatos com cerca de 30 anos e com… 30 anos, tem pontuações distintas;

ii) como e porque é que a adjectivação “vasta” sem referência a qualquer facto explica distintas pontuações e como se procedeu à valorização destes 30 anos coordenados com a prestação de funções no ...;

iii) como é que a docência, comparando com terceiro, em tudo o mais igual, com o percurso do A., permitiu a uma candidata ser mais classificada que este com os predicados que este detém.

64) Ou seja, para além da aludida identidade de situações com pontuações diferentes, não se sabe qual o peso relativo que foi atribuído a funções não judiciais e, assim, ninguém consegue perceber a razão pela qual a uns foi atribuído uma maior valoração do que a outros, em vício de forma.

65) A tentativa de desconsideração do vício de forma adiantada pela administração não colhe, na medida em que o destinatário médio e razoável desconhece o juízo que foi feito para o classificar a si e a todos os outros, o que contou, como contou e que regras foram aplicadas para conferir os pesos relativos de outros factos sopesados (que não o exercício corrente da magistratura) para atingir as distintas classificações que, assim, tanto podem ser as mesmas como outras que marquem a diferença.

66) Depois, quanto à situação concreta da Ilustre Magistrada FF, temos que, tendo tido ambos a mesma pontuação, como tiveram, no item, mister seria perceber-se a razão, ou seja, como e com que peso e regra foi sopesada a docência daquela e as funções, mormente com o acréscimo da responsabilidade de Lisboa, um mundo que o A. desempenhou com muito esforço pessoal como responsável pelos tribunais de primeira instância – o único exemplo idêntico que existe neste domínio é o da ilustre Dra. LL, em que se descobre que a docência foi, ou terá sido, graduada em 0,80 pontos.
Nesta matéria e item, não se percebe como é possível sustentar, como o faz a administração, que o tempo foi, todo ele, ponderado, pois, entre o muito mais, se virmos a fundamentação, pp. 27 e 28 do acto impugnado e de dois ilustres Magistrados (CC e EE), ela é a mesma do que a do Impugnante, apenas variando o número de anos, mais de 20 (o A. detinha 24), mais de 25 o Ilustre Magistrado CC e EE cerca de 30 anos.
Não se percebe e, na verdade, não estando o juízo, esse juízo de salvação, minimamente externado em qualquer decisão e, naturalmente, no aviso, não se pode dar esse pressuposto como assente, e apenas aquele que o A. formulou - a regra implicitamente aplicada foi a de 5 em 5 anos (com matização eventual da proximidade (cerca) valendo o resto como mais…), não podendo, ou existindo, antes pelo contrário, como vimos, qualquer evidência, como a administração, diz que os 21, 22, 23 e 24 anos, por exemplo, tenham sido efectivamente sopesados.
Ora, esta bitola assim desenhada pela administração - métrica fundamental de 5 em 5 anos, como se lê abundantemente do acto, não havendo ninguém com 22 ou 31 ou 19 e todos vão de 5 em 5 -, que cremos, isso sim, ter e estar provado, faz, no caso do Recorrente, que dois dos Juízes que estão graduados à sua frente tenham pontuações substancialmente diferentes e que têm todo o impacto na graduação final (I. M. CC com incremento de 1,20 pontos e 167,40 de classificação final e I.M. EE com um incremento de 0,60 e 162,76 de classificação final contra o Autor, com 162,45 pontos).
Temos, portanto, que não só a bitola quinquenal (eventualmente matizada nos termos mencionados) é violadora do princípio da justiça, como dos do mérito e da proporcionalidade, como também, atenta a sua aplicação concreta e nas condições referidas, a diferença de poucos anos de serviço entre o A. e os dois I.M. referidos, com particular relevo para a diminuta diferença entre o A. e o I.M. EE, só em erro manifesto pode ter um impacto tão sério na graduação final.
E a contribuir para a necessidade de anulação do acto impugnado, que nos parece devida, remata-se alegando que tudo isto vai feito com conhecimento dos currículos por parte do júri.»

1.4.2. O Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais também alegou por escrito, tendo formulado as seguintes conclusões:

«Do alegado e da prova documental apresentada resulta que:

1. O concurso em apreço nos presentes autos pautou-se pelos fatores e critérios de graduação previstos nos artigos 61.°, n.° 2, e 66.°, n.° 2, do ETAF, com a ponderação explicitada no ponto 5 do Aviso de abertura do concurso n.° 373/2018.

2. O critério legal “anteriores classificações de serviço” foi atempadamente concretizado, no ponto 5, alínea a), do Aviso de abertura do concurso n.° 373/2018, no sentido de serem ponderadas as duas últimas classificações de serviço.

3. A lei não exige a ponderação de todo o historial classificativo (cfr. Acórdão da Secção do STA, de 14 de julho de 2015, Proc. n.º 495/14, confirmado pelo Pleno, em 18 de fevereiro de 2016), sendo a consideração das mais recentes classificações, desde logo por serem mais atuais, o meio mais idóneo para a escolha do melhor candidato.

4. Decorre do Aviso de abertura do concurso, prova constante dos autos, que o critério foi usado de modo uniforme e conhecido no momento da candidatura ao concurso.

5. Da prova apresentada resulta que não houve fixação de critérios de seleção e de classificação dos candidatos em momento posterior ao conhecimento (real ou possível) dos currículos pelo júri.

6. O júri, no exercício do seu múnus avaliativo, definiu o peso valorativo dos elementos a ponderar em sede do critério classificações de serviço, prevendo que a última classificação, mais atual, valia 75% e a anterior valia 25%.

7. Cabe ao júri uma tarefa de concretização adicional dos parâmetros fixados, como o reconhece a jurisprudência (cfr. Acórdão do STJ, de 21.11.2012, Proc. n.° 2/12.4YFLSB).

8. A definição de um valor percentual para cada uma das classificações de serviço sob ponderação constitui um mecanismo de objetivação da avaliação, fundamentando-a e reforçando a sua transparência, sem inovação ou contradição com o critério legal.

9. A todos os candidatos de igual modo aplicável (e aplicado), como resulta do parecer final.

10. Resulta também claramente da prova apresentada que os candidatos sabiam que as duas últimas classificações de serviço seriam as ponderadas, escolhendo candidatar-se com esse historial classificativo, não havendo expetativas a tutelar quanto ao peso relativo de cada uma,

11. As divergências de resultados são consequência necessária do diferente percurso classificativo dos candidatos.

12. Quanto ao critério “graduação obtida em concursos de habilitação ou cursos de ingresso em cargos judiciais”, a lei não exige a “contabilização” de todas as graduações.

13. A escolha feita pelo júri, no exercício do poder/dever que lhe cabe de densificação/concretização dos critérios legais, de pontuar a melhor graduação em nada altera o critério, apenas o concretiza, sem inovação ou contradição quanto a este.

14. A valoração da melhor graduação de cada candidato, como resulta do parecer final, foi feita quanto a todos os candidatos, tendo o A. obtido o máximo da pontuação possível neste fator.

15. O ato avaliativo está fundamentado, atento o teor do parecer final do júri e deliberação do CSTAF de 18 de junho de 2019, com a apreciação dos curricula à luz dos critérios previamente definidos, como decorre da prova documental apresentada.

16. No ponto 24 do Aviso de concurso, tal como na deliberação de 18.6.2019, foi determinada a dispensa da audiência prévia dos interessados, nos termos das alíneas a) e e) do n.º 1 do artigo 124. do CPA.

17. As razões pelas quais o CSTAF dispensou a audiência dos interessados constam do Aviso de abertura do concurso, e, constando do Aviso, tais razões foram conhecidas pelos interessados no ato de abertura do concurso.

18. A dispensa de audiência foi justificada, quer pela urgência do procedimento, quer pelo facto de, com a apresentação dos elementos curriculares que os candidatos entenderam relevantes, bem como através da defesa pública do respetivo currículo, ser assegurada a participação dos candidatos no procedimento administrativo.

19. Não sendo propósito do exercício do direito de audiência que o candidato faça a apreciação do mérito dos seus opositores no concurso ou questione o modo como a avaliação é feita pelo júri, que se move num espaço de livre apreciação avaliativa.

20. Sendo jurisprudencialmente reconhecida a admissibilidade da dispensa de audiência prévia nos casos de concurso de acesso curricular - cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 331/2002, publicado no DR, II série, de 08/05/2003; Acórdãos da Secção do STA, de 15.5.2014, Proc. n.° 37/14, e de 16 de março de 2017, Proc. n.° 38/14; Acórdãos do STJ, de 19.2.2013, Proc. n.° 98/12.9YFLSB; de 21.3.13, Proc. n.° 99/12.7YFLSB; de 21.3.13, Proc. n.° 100/12.4YFLSB; de 08.05.2013, Proc. n.° 102/12.0YFLSB, e de 26.06.2013, Proc. n.° 101/12.8YFLSB).

21. Tendo sido já reconhecida quanto a este concurso em concreto, por Acórdão do STA, de 15.10.2020, proferido no processo n.°79/19.1 BALSB.

22. Bastando a verificação de uma das situações previstas no artigo 124.° do CPA para se justificar a dispensa de audiência prévia, já que não estão em causa requisitos cumulativos.

23. Da prova apresentada e da jurisprudência invocada decorre, pois, que existia fundamento para a dispensa de audiência prévia.

24. Quanto à apreciação da capacidade de trabalho, em sede do fator previsto no artigo 66.°, n.° 2, alínea f), do ETAF, decorre do Aviso de concurso e do Parecer final que se ponderou, nessa sede, designadamente., e no que concerne aos magistrados em exercício de funções judiciais, a quantidade e qualidade do serviço prestado nos Tribunais Centrais Administrativos e nos Tribunais da Relação.

25. Tratando-se de concurso de acesso a um Supremo Tribunal, foi avaliada a capacidade de trabalho dos magistrados no exercício de funções judiciais em segunda instância, ou a capacidade de trabalho demonstrada no exercício de outras atividades enquanto Juízes Desembargadores.

26. É a lei que, ao prever que podem ser opositores ao concurso os juízes dos Tribunais Centrais Administrativos e dos Tribunais da Relação, dá aqui especial relevo a esse serviço.

27. Configurando-o como condição de acesso ao Supremo Tribunal Administrativo, a específica ponderação do serviço prestado nos tribunais de segunda instância é justificada, senão mesmo exigível.

28. In casu, foi ponderada, globalmente, a estatística referente aos últimos três anos de serviço, como resulta dos autos e conforme ponto 13 do Aviso do concurso.

29. Tendo a avaliação deste fator sido feita com recurso a expressões qualitativas diferenciadoras, correspondentes a diferentes níveis de mérito, como resulta do parecer final.

30. Os resultados atribuídos traduzem o mérito relativo, que é, naturalmente, distinto.

31. Sendo jurisprudencialmente reconhecido ao Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, em relação aos juízes candidatos, um espaço de liberdade de valoração na apreciação do seu mérito através da apreciação dos respetivos currículos - Acórdão da Secção do STA, de 9.12.2004, Proc. n.° 0412/04; e Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 331/02, Processo n.° 352/01, de 10 de julho de 2002).

32. Foram várias as dimensões do serviço judicial a avaliar, para além da celeridade, ponderando-se, entre outras realidades, o desempenho de presidente de Tribunal e de Presidente de Zona dos Tribunais Administrativos e Fiscais de primeira instância.

33. Como resulta do Parecer final, a avaliação do fator “preparação específica, idoneidade e capacidade dos concorrentes para o cargo a prover” (alínea f)) foi fruto de uma ponderação global dos vários elementos constantes dos subpontos i), ii), iii), iv) da alínea f) do ponto 2 do Aviso, refletindo isso mesmo a pontuação final do item em causa.

34. Ou seja, a capacidade de trabalho - nas várias perspetivas em que foi aferida - foi apenas um dos elementos, entre muitos, ponderados na atribuição da pontuação quantitativa do fator de graduação constante da referida alínea f).

35. Tal como acontece com a avaliação da qualidade dos trabalhos forenses, elemento também ponderado no âmbito deste fator, no domínio da livre apreciação valorativa que cabe ao júri.

36. Resulta comprovado que na avaliação da capacidade de trabalho foi preponderantemente ponderada a capacidade de trabalho no exercício de funções enquanto Juízes Desembargadores, seja no exercício de funções judiciais, seja no exercício de outros cargos/funções nesse período.

37. As classificações de serviço, atribuídas com base nos relatórios de inspeção e elementos constantes dos respetivos processos inspetivos, foram ponderadas em sede do critério “classificações de serviço”, previsto na alínea a) do n.° 2 do artigo 66.° do ETAF, e não no âmbito do fator previsto na alínea f).

38. As classificações finais atribuídas neste item corresponderam à avaliação final quantitativa do fator “preparação especifica, idoneidade e capacidade dos concorrentes para o cargo a prover”, e resultaram da ponderação de muitos outros elementos, para além da capacidade de trabalho, como decorre, aliás, da fundamentação constante neste item.

39. Nos termos do ponto 5, alínea d), do Aviso de concurso n.º 373/2018, seriam ponderados no âmbito deste fator os “trabalhos científicos publicados, que versem matérias de natureza jurídica (…), não se englobando nesta categoria os trabalhos que correspondam ao exercício específico da função”.

40. Pelo que, tendo os magistrados CC e KK apresentado trabalhos publicados que cumpriam os parâmetros referidos, os mesmos foram, consequentemente, objeto de ponderação neste fator (cfr. apenso R, volume I, e apenso O, volume III).

41. A escolha dos trabalhos a serem apreciados pelo júri coube a cada candidato, a quem cabia também o ónus de comprovar a respetiva publicação, como aconteceu (cfr. processo de concurso).

42. Uma coisa é a avaliação do currículo universitário e pós-universitário, na perspetiva dos títulos ou graus académicos obtidos por cada candidato, outra, bem distinta, a avaliação da produção científica publicada.

43. A publicação de um trabalho científico constitui um reconhecimento da mais-valia do estudo em causa, considerando-o, assim, digno de divulgação pela comunidade, para além das fronteiras da Academia.

44. No preenchimento do conceito indeterminado “qualidade” dos trabalhos, cabia ao júri, dentro da margem de livre apreciação, fazer um juízo sobre o valor científico dos trabalhos.

45. Juízo esse que teve em atenção a dimensão da produção científica em causa, a relevância das temáticas, a qualidade técnica, o interesse prático, entre múltiplos aspetos, como claramente decorre do teor do parecer quanto a este item.

46. Tendo sido apontadas as diferenças encontradas, mediante adjetivos e expressões distintivas, as quais confluem para explicar o iter cognoscitivo e valorativo usado, que justifica as pontuações atribuídas.

47. No âmbito da avaliação do fator previsto na alínea e) do n.° 2 do artigo 66.° do ETAF - “Atividade exercida no âmbito forense, no ensino jurídico e na Administração Pública” -, resulta da prova produzida que foi ponderada globalmente a “atividade exercida pelos concorrentes no âmbito forense, no ensino jurídico e na Administração Pública, após o ingresso na magistratura” (cfr. parecer final a fls. 516 verso a 518 do III volume do processo de concurso).

48. A apreciação deste fator implicou, pela natureza das coisas, a ponderação da sua durabilidade da atividade, ou o nível de experiência alcançado.

49. O exercício de funções forenses foi ponderado em função da experiência adquirida ao longo de toda a magistratura, seja nesta jurisdição, seja na jurisdição comum.

50. E quer como magistrado judicial, quer como magistrado do Ministério Público.

51. O que não contraria o princípio de que “a graduação é feita independentemente da antiguidade de cada um dos concorrentes” (cfr. ponto 23 do Aviso de abertura).

52. Quanto às alegadas disparidades de classificação entre magistrados, todos com mais de 30 anos de magistratura, não existe uma mesma fundamentação para pontuações diferentes.

53. Como decorre do parecer final, ainda que com leves diferenças, a fundamentação é distinta: nuns casos a experiência é “de 30 anos”, outros de “cerca de 30 anos”, noutros “de mais de 30 anos”, para além do exercício de distintas funções ou atividades.

54. Na apreciação feita pelo júri esteve subjacente o concreto tempo de serviço de cada candidato (por exemplo, nuns casos 23, 25, noutros 32, ou 33 anos...), bem como a extensão temporal das funções exercidas, a natureza e a qualidade das mesmas.

55. Os currículos de cada candidato, constantes do processo administrativo, revelam bem as diferentes dimensões das atividades exercidas (designadamente, os concretos anos de experiência na magistratura, o exercício de funções como inspetor, como coordenador regional de formação, como presidente dos tribunais administrativos e fiscais, como vice-presidente e presidente dos Tribunais Centrais Administrativos).

56. Neste item “atividade exercida” foi valorada apenas a atividade docente com características de permanência ou de regularidade, como as funções de docência em curso de mestrado, como resulta comprovado.

57. Intervenções esporádicas, ocasionais, como orador/conferencista, foram valoradas em sede da apreciação do prestígio profissional dos candidatos, e não no âmbito de “atividade exercida no ensino jurídico”.

58. As diferenças de resultado devem-se, tão-só, a diferentes percursos profissionais, quer em extensão, quer em qualidade.

59. Estamos no domínio da livre margem de apreciação da Administração, aqui mais acutilante tratando-se, como se trata, do recrutamento para o exercício de funções judiciais de alto nível (cfr, o recente Acórdão do STA, de 15.10.2020. relativo a este concurso em concreto, proferido no Proc. 79/19.1BALSB; cfr. ainda Acórdão do STA, de 02.05.2006, Proc. n.° 0219/04 e Acórdão do STJ, de 24.11.2015, Proc. n.° 1/15.4 YFLSB).

60. Da deliberação homologatória do Parecer final do júri consta o valor global atribuído a cada candidato, sendo possível determinar o iter que conduziu a esse resultado final pois sabe-se:
- os valores mínimo e máximo atribuídos a cada fator e subfator;
- o que abstratamente relevaria, o que seria de ponderar, para preenchimento dos fatores e subfatores,
- o que foi tido em conta como de mais relevante no preenchimento de cada fator, especificamente quanto a cada candidato;
- e a pontuação concretamente atribuída em cada fator.

61. O STA já considerou que o ato avaliativo aqui posto em crise se encontra devidamente fundamentado, no que se refere aos itens e) e f) do ponto 5 do Aviso de abertura do concurso - citado Acórdão do STA de 15.10.2020, Proc. 79/19.1 BALSB.

62. A dimensão curricular de cada candidato, o contexto de avaliação, a exigir a formulação de apreciações de natureza pessoal sobre cada candidato, e a intervenção de um órgão colegial, composto por membros de diferentes géneses e experiências, dificultam uma fundamentação mais pormenorizada (Cfr. Acórdão do STA, de 20.6.2012, Proc. n. 34/11 e de 28.5.2015, Processo n.° 499/14).

63. O facto de existir mais do que um candidato e ser possível conhecer os elementos que foram ponderados na graduação dos demais, permite compreender melhor o peso/relevância relativa dos factos tidos em conta em cada fator, o que releva na aferição da suficiência da fundamentação.

64. É jurisprudência corrente do STA que a fundamentação de um ato administrativo é um conceito relativo na medida em que varia em função do tipo legal de ato, exigindo-se que perante o itinerário cognoscitivo e valorativo constante daquele ato, um destinatário normal possa ficar a saber porque se decidiu num sentido e não noutro - cfr., por todos, Acórdão do STA (Pleno), de 28.05.1987, in Apêndices ao DR de 30.11.1998, p. 468, e Acórdãos do STA, de 19.04.2005, Proc. n.° 1306/2003, de 16.03.2006, Proc. n.° 0139/05, e de 5.3.2009, Proc. n.° 787/08).

65. O A. pôde captar o alcance e os fundamentos da decisão, refletindo-se tal perceção na impugnação que apresentou.

66. Da apreciação da prova junta aos autos e da subsunção dos factos ao Direito resulta comprovada a validade do ato avaliativo aqui posto em crise, não tendo o A. logrado provar qualquer um dos vícios invocados, pelo que a presente ação deve ser julgada totalmente improcedente.»

1.4.3. O Contra-interessado Dr. CC também alegou por escrito, concluindo:

«a) O facto de ter sido nomeado Juiz Conselheiro mantendo-se como Presidente dos TAFs de 1ª instância, não pode fundamentar a invalidade do acto.

b) Para além disso, não foi o único nomeado como Juiz conselheiro no âmbito do referido concurso, houve pelo menos mais dois posteriormente nomeados, que só puderam ser nomeados porque o aqui contra-interessado foi nomeado primeiro, por força das regras das precedências no preenchimento dos lugares.

c) No que tange à baixa produtividade do contra-interessado, sem curar de saber que o contra-interessado não tinha qualquer atraso, sem avaliar a complexidade dos processos (que foi avaliada pela inspeção), ou seja, a produtividade era a adequada ao serviço que tinha, como o CSTAF reconheceu quando lhe atribuiu a nota de “Muito Bom”.

d) No que refere à questão da dupla avaliação, estamos perante duas questões distintas: a graduação de Mestre, obtida pelo contra-interessado, foi concedida através de uma avaliação universitária, onde foi avaliado em diversas disciplinas, em diversos trabalhos escritos, ao longo de dois anos, tendo sido a tese apenas um dos seus trabalhos, ou seja, o grau de Mestre refere-se a uma avaliação feita sobre um percurso académico, no qual a tese de mestrado foi avaliada e contribuiu para uma percentagem para a nota final.

e) O Júri do concurso não usou a avaliação que a Universidade fez da sua tese para lhe atribuir uma pontuação em sede de “trabalhos científicos”, antes avaliou de forma autónoma o seu trabalho científico e atribuiu-lhe uma valoração própria.

f) Ou seja, não estamos perante a mesma avaliação a ser contabilizada duas vezes, estamos perante duas avaliações distintas.

g) Se a valia do trabalho científico não pudesse ser avaliado autonomamente pelo júri em sede de concurso, teríamos o efeito perverso do aqui contra-interessado ser prejudicado por ter tirado o Mestrado, pois a pontuação no concurso do grau de Mestre tem neste concurso um valor inferior à pontuação da alínea dos trabalhos científicos.

h) Ou seja, para o contra-interessado, seria preferível não invocar o grau de Mestre para efeitos de concurso, e assim desconsiderar todo o trabalho efetuado nas diversas áreas desse Mestrado, o que seria uma solução absurda.

i) Temos pois de concluir que o facto de estarmos perante duas avaliações diferentes.

j) Quanto à não publicação do trabalho científico do contra-interessado, ao contrário do alegado pelo A. na p. i., o mesmo está publicado, tendo a publicação sido feita pela Universidade Lusófona: https://recil.grupolusofona.pt/handle/10437/4058?mode=full


2. SANEADOR
O Tribunal é competente. Não existem nulidades que invalidem todo o processo. As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas relativamente à generalidade dos vícios invocados e estão devidamente representadas.
Não existem, quaisquer outras questões prévias ou excepções que obstem ao conhecimento do mérito.
Os autos contêm todos os elementos necessários a uma decisão de mérito.

3. QUESTÕES A DECIDIR
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir, a questão de saber se o acto impugnado sofre dos vícios que lhe são imputados e se relativamente aos vícios decorrentes da aplicação dos critérios sobre a ponderação das classificações de serviço e graduação obtida em concursos o Autor tem legitimidade activa.



4. Fundamentação
4.1. Matéria de facto

Com interesse para o julgamento da presente acção consideram-se provados os seguintes factos:

1) O concurso em causa (concurso curricular para o provimento de vagas de juiz conselheiro na secção de contencioso administrativo do Supremo Tribunal Administrativo) foi aberto pelo Aviso nº 373/2018, publicado no Diário da República, 2ª Série, nº 5, de 08.01.2018. – cfr doc. 2 junto com a PI.

2) O júri do concurso teve a composição que figura no ponto 15 do aviso de abertura.

3) De acordo com esta composição, integraram o júri 2 magistrados judiciais e 4 membros não magistrados (um membro do CSTAF, um membro do Conselho Superior do Ministério Público, um professor universitário de direito e um advogado com funções no Conselho Superior da Ordem dos Advogados.

4) Nos termos do ponto 5 do Aviso de Abertura do concurso, dizia o seguinte:
“(…)
5. A avaliação curricular é efectuada de acordo com os seguintes critérios globalmente considerados:
a) As duas últimas classificações de serviço, no caso de o candidato ser um magistrado, com ponderação entre 50 e 70 pontos (arts. 66º nº 2 a) e 61º nº 2 b) do ETAF);
b) Graduação obtida em concursos de habilitação ou cursos de ingresso em cargos judiciais, com ponderação entre 1 e 5 pontos (arts. 66º nº 2 b) e 61º nº 2 c) do ETAF);
c) Currículo universitário e pós-universitário, com ponderação entre 1 e 5 pontos (arts. 66º nº 2 c) e 61º nº 2 d) do ETAF), não relevando nesta sede, mas sim nos termos da alínea f), a mera frequência sem atribuição de qualquer título ou grau académico;
d) Trabalhos científicos publicados, que versem matéria de natureza jurídica, com ponderação entre 0 e 10 pontos (arts. 66º nº 2 d) e 61º nº 2 e) do ETAF), não se englobando nesta categoria os trabalhos que correspondam ao exercício específico da função;
e) Actividade exercida no âmbito forense, no ensino jurídico, ou na Administração Pública, com ponderação entre 0 e 10 pontos (arts. 66º nº 2 e) e 61º nº 2 f) do ETAF);
f) A preparação específica, idoneidade e capacidade dos candidatos para o cargo a prover, com ponderação entre 50 e 110 pontos (arts. 66º nº 2 f) e 61º nº 2 i) do ETAF), designadamente:
a. O prestígio profissional, tendo em consideração, designadamente, a contribuição para a melhoria do sistema de justiça;
b. A qualidade dos trabalhos forenses apresentados;
c. A capacidade de trabalho, ponderando, designadamente, e no que concerne aos magistrados, a quantidade e a qualidade do serviço prestado nos Tribunais Centrais Administrativos e nos Tribunais da Relação;
d. O grau de empenho revelado pelo candidato na sua própria formação permanente;
e. O registo disciplinar é ponderado negativamente, com dedução em função da sua gravidade, até 20 pontos;

g. A defesa pública do currículo, com ponderação entre 10 e 90 pontos (arts. 66º nº 3 e 61º nº 2 h) do ETAF).

5) No ponto 24 do Aviso de abertura do concurso consignava-se que “atenta a urgência da decisão, a qualidade dos concorrentes, a natureza curricular do concurso e a respetiva tramitação, designadamente a defesa pública do currículo, considera-se dispensada a audiência dos interessados, nos termos das alíneas a) e e) do nº 1 do artigo 124º do Código do Procedimento Administrativo”.

6) No ato homologatório da lista de graduação final dos candidatos, o CSTAF reiterou a deliberação de “considerar dispensada a audiência dos interessados, nos termos das alíneas a) e e) do nº 1 do artigo 124º do CPA, atenta a urgência da decisão” – cfr. doc 1 junto com a P.I.

7) O Autor é juiz-desembargador do Tribunal Central Administrativo do ..., Secção Administrativa, desde .../.../... – cfr doc. 1 junto com a PI.

8) Apresentou, oportunamente, candidatura ao presente concurso curricular, a qual foi admitida.

8) Em 18/6/2019, o CSTAF homologou a lista de graduação final dos candidatos ao presente concurso curricular, concordando e aderindo na íntegra ao teor do parecer final do júri de 8/4/2019 - – cfr. doc. 1 junto com a P.I.

9) O Autor foi notificado desta deliberação por ofício de 19/6/2019 (cfr. doc. 1 junto com a P.I.

10 ) Em 31 de Janeiro de 2018 o júri do concurso definiu os aspectos relacionados com a metodologia de trabalho e a calendarização do concurso. – cfr. acta n.º 1, junta aos autos.

11) De acordo com a metodologia de trabalho seguida e relativamente à avaliação do item “a) As duas últimas classificações de serviço com ponderação entre 50 e 70 pontos (artigos 66.º, n.º 2, alínea a), e 61.º, n.º 2, alínea b), do ETAF):o júri seguiu o seguinte critério: " A última avaliação será considerada na proporção de 75% e a penúltima avaliação na proporção de 25%, tendo em conta as seguintes pontuações:” – cfr. documento junto com a entidade demandada contendo os pareceres preliminares de cada um dos candidatos.

12- De acordo com a metodologia de trabalho seguida e relativamente à avaliação do item “Graduação obtida em concursos de habilitação ou cursos de ingresso em cargos judiciais, com ponderação entre 1 e 5 pontos (artigos 66.º, n.º 2, alínea b), e 61.º, n.º 2, alínea c), do ETAF)”, o júri enunciou nos trabalhos preparatórios o seguinte critério: “i) Concorrente integrado no 1.º quinto da graduação, 2,5 pontos; no 2.º quinto, 2 pontos; 3.º quinto, 1,5 pontos; 4.º quinto, 1 ponto, 5.º quinto, 0,5 ponto; ii) Quando o quociente da divisão do número de graduados por cinco não coincidir com um número inteiro, o mesmo será arredondado para a unidade superior.” - cfr. documento junto com a entidade demandada contendo os pareceres preliminares de cada um dos candidatos.

13- A concorrente Dra. HH é mais antiga na Magistratura Judicial, que o Dr. MM, 7 meses e 28 dias – cfr. Lista de antiguidade publicada no Boletim do Ministério da Justiça, com referência a 31-12-1992.

Os factos provados resultam dos documentos juntos, referidos relativamente a cada um dos factos dados como relevantes.


4.2. Matéria de direito
4.2.1. Questões a decidir - vícios imputados e ordem da sua apreciação e âmbito da cognição deste Supremo Tribunal.
A presente acção tem como objecto a deliberação do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, proferida em 18 de Junho de 2019, que homologou a lista de graduação dos concorrentes ao concurso para as vagas de Juiz Conselheiro da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo.

O autor imputa vários vícios à deliberação impugnada, a saber:
a) Vícios do aviso de abertura e intervenção do júri quanto ao peso das classificações de serviço;
b) Vícios da intervenção do júri por ter atendido apenas à melhor graduação em cursos de ingresso em cargos judiciais;
c) Falta de audiência prévia;
d) Vícios relativos à apreciação da “capacidade de trabalho”;
e) Vícios decorrentes da dupla avaliação e trabalhos científicos publicados;
f) Vícios decorrentes de, perante a mesma fundamentação, haver pontuações diferentes;

Na análise dos vícios imputados à deliberação impugnada deparamo-nos com múltiplos juízos complexos, com margens de autonomia administrativa, mais concretamente avaliações ou ponderações, tradicionalmente denominados de discricionariedade imprópria. Nestes casos existem algumas restrições ao âmbito de cognição do Tribunal.

FREITAS DO AMARAL – Curso de Direito Administrativo, Vol II, Almedina, Abril de 2002 - considera que os casos típicos da dita discricionariedade imprópria (liberdade probatória, discricionariedade técnica e Justiça burocrática) representam exemplos da autonomia administrativa. Nestes casos, de autonomia administrativa, sublinha o Autor citado (pág. 83/84) que o interessado não pode obter do Tribunal decisão sobre o acerto ou desacerto das opções tomadas, salvo num caso limite: “(…) o de uma decisão administrativa tomada com base em erro manifesto, ou segundo um critério ostensivamente inadmissível, ou segundo um critério manifestamente desacertado.” (…) “Entendemos hoje – continua o Autor citado - que as hipóteses de erro manifesto de apreciação correspondem, designadamente, a situações de desrespeito do princípio da proporcionalidade, na sua vertente da adequação.”

Como se disse no Acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo (Pleno da Secção de Contencioso Administrativo), de 26-10-2017, proferido no processo 038/14, proferido num litígio relativo a um concurso para preenchimento de vagas na jurisdição administrativa: “Trata-se de espaço próprio da justiça administrativa, não da justiça judicial, já que esta apenas pode controlar a decisão daquela em caso de erro grosseiro, grave, de desvio de poder, ou de afrontamento de princípios estruturais do agir administrativo”.

Esta limitação da sindicância jurisdicional não se verifica, todavia, relativamente aos vícios próprios do exercício do poder discricionário, como seja (i) o desvio do poder e relativamente aos aspectos vinculados que condicionam o exercício da autonomia administrativa, previstos no art. 266º,2, da CRP, ou seja (ii) o respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé, (iii) bem como aos vícios procedimentais e formais, como é o caso da falta de fundamentação (art.s 152º e 153º do CPA) e preterição da audiência prévia (art. 121º do CPA), e ainda relativamente (iv) ao erro sobre os pressupostos de facto ou (v) erro na interpretação da lei nos casos em que a concretização administrativa traduz essa actividade (FREITAS DO AMARAL, ob. cit. pág.114).

Vejamos então, com o âmbito de cognição referido, se os vícios imputados à deliberação recorrida se verificam ou não.

4.2.2. Vícios do aviso de abertura e intervenção do júri quanto ao peso das classificações de serviço.
Entende o Autor, nos artigos 17 a 34 da petição inicial, que a circunstância do júri do concurso ter estabelecido que a última classificação valia 75% e a anterior valia 25%, violou o art. 66º, 2, a) do ETAF, o ponto 5 do Aviso de Abertura e os princípios da justiça, do mérito, da igualdade material, da transparência e da boa-fé e da proporcionalidade e não está fundamentado.
O Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais considera que não procedem os vícios imputados ao acto.

Vejamos.

O art. 66º, 2 do ETAF, relativamente à avaliação do mérito dos concorrentes diz o seguinte:

“2. A graduação faz-se segundo o mérito relativo dos concorrentes de cada classe, tomando-se globalmente em conta a avaliação curricular, com prévia observância do disposto no número seguinte e, nomeadamente, tendo em consideração os seguintes fatores:
a) Anteriores classificações de serviço;
b) Graduação obtida em concursos de habilitação ou cursos de ingresso em cargos judiciais;
c) Currículo universitário e pós-universitário;
d) Trabalhos científicos realizados;
e) Atividade desenvolvida no âmbito forense ou no ensino jurídico;
f) Outros fatores que abonem a idoneidade dos requerentes para o cargo a prover.”
O Aviso de Abertura do concurso ora em causa, no seu ponto 5 dizia o seguinte:
“(…)
5. A avaliação curricular é efectuada de acordo com os seguintes critérios globalmente considerados:
a) As duas últimas classificações de serviço, no caso de o candidato ser um magistrado, com ponderação entre 50 e 70 pontos (arts. 66º nº 2 a) e 61º nº 2 b) do ETAF);
b) Graduação obtida em concursos de habilitação ou cursos de ingresso em cargos judiciais, com ponderação entre 1 e 5 pontos (arts. 66º nº 2 b) e 61º nº 2 c) do ETAF);
c) Currículo universitário e pós-universitário, com ponderação entre 1 e 5 pontos (arts. 66º nº 2 c) e 61º nº 2 d) do ETAF), não relevando nesta sede, mas sim nos termos da alínea f), a mera frequência sem atribuição de qualquer título ou grau académico;
d) Trabalhos científicos publicados, que versem matéria de natureza jurídica, com ponderação entre 0 e 10 pontos (arts. 66º nº 2 d) e 61º nº 2 e) do ETAF), não se englobando nesta categoria os trabalhos que correspondam ao exercício específico da função;
e) Actividade exercida no âmbito forense, no ensino jurídico, ou na Administração Pública, com ponderação entre 0 e 10 pontos (arts. 66º nº 2 e) e 61º nº 2 f) do ETAF);
f) A preparação específica, idoneidade e capacidade dos candidatos para o cargo a prover, com ponderação entre 50 e 110 pontos (arts. 66º nº 2 f) e 61º nº 2 i) do ETAF), designadamente:
a. O prestígio profissional, tendo em consideração, designadamente, a contribuição para a melhoria do sistema de justiça;
b. A qualidade dos trabalhos forenses apresentados;
c. A capacidade de trabalho, ponderando, designadamente, e no que concerne aos magistrados, a quantidade e a qualidade do serviço prestado nos Tribunais Centrais Administrativos e nos Tribunais da Relação;
d. O grau de empenho revelado pelo candidato na sua própria formação permanente;

g) O registo disciplinar é ponderado negativamente, com dedução em função da sua gravidade, até 20 pontos;
(…)”

O júri do concurso ao avaliar o peso das classificações de serviço disse o seguinte:

A. As duas últimas classificações de serviço
(com ponderação entre 50 e 70 ponto – alínea a) do Aviso).
Neste item, o júri ateve-se às duas últimas classificações de serviço de cada concorrente, homologadas pelos Conselhos Superiores respectivos até à data da publicação do Diário da República do aviso de abertura do concurso, sendo que a última classificação, foi considerada numa proporção de 75% e a penúltima na proporção de 25%.

O Autor considera, como já referimos, que nem o Aviso de Abertura poderia ter limitado a relevância das classificações de serviço às duas últimas e nem o Aviso de Abertura poderia, dentro destas duas, ponderar a última na proporção de 75% e a penúltima na proporção de 25%.

São duas questões distintas: (i) legalidade do Aviso de Abertura e (ii) legalidade da explicitação do critério pelo júri.

Quanto à primeira questão, a nosso ver, o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais poderia atribuir relevância apenas às duas últimas classificações. Com efeito, o art. 66º, 2 do ETAF manda atender às anteriores classificações de serviço, sem que do mesmo se depreenda que devem ser todas elas tomadas em conta. Por outro lado, a opção pelas duas últimas cabe perfeitamente na finalidade do preceito em causa que é, sem dúvida, a de permitir a escolha dos melhores candidatos àquele concreto concurso. Por isso, a actualidade (ou o mais próximo possível da actualidade) das classificações de serviço adequa-se perfeitamente àquela finalidade legal.

Vejamos a segunda questão (ponderação de cada uma das classificações).

Importa notar que a mesma se subdivide em várias: saber se o júri tinha competência para definir a ponderação; se essa ponderação se mostra justificada; se foi levada a cabo quando já podiam ser conhecidos os “curricula” dos candidatos.

Julgamos que o júri tinha competência para definir os termos em que iria avaliar (pontuar) as duas últimas classificações de serviço, “com ponderação entre 50 e 70 pontos” – Cfr. Aviso de Abertura, ponto 5, a). Era esta a única vinculação que decorria da lei e do Aviso de Abertura. Por outro lado, a atribuição de 75% à última das classificações e 25% à penúltima se mostra racionalmente justificada, por dar mais peso à classificação obtida mais próxima do concurso.

Resulta da análise do processo instrutor, designadamente da Acta n.º 1 e da metodologia seguida, fixada nessa acta, que esse critério foi definido em 31 de Janeiro de 2018 – cfr. ponto 11 da matéria de facto: “De acordo com a metodologia de trabalho seguida e relativamente à avaliação do item “a) As duas últimas classificações de serviço com ponderação entre 50 e 70 pontos (artigos 66.º, n.º 2, alínea a), e 61.º, n.º 2, alínea b), do ETAF)”, o júri seguiu o seguinte critério: " A última avaliação será considerada na proporção de 75% e a penúltima avaliação na proporção de 25%, tendo em conta as seguintes pontuações:
O Aviso de Abertura foi publicado no Diário da República de 8 de Janeiro de 2018. Portanto, naquela data ainda não tinham decorrido os 20 dias úteis fixados no ponto 9 do Aviso de Abertura para apresentação das candidaturas. Daí que, quando foram definidos aqueles os critérios, ainda não estava fechado o universo dos candidatos.

Não se verifica assim o vício invocado pelo Autor decorrente da definição de critérios em momento em que já podiam ser conhecidos os “curricula” dos concorrentes.

4.2.3. Vícios da intervenção do júri por ter atendido apenas à melhor graduação em cursos de ingresso em cargos judiciais.
Alega o Autor que, pelas mesmas razões apontadas ao ponto anterior, foi violado o princípio da divulgação atempada e existe ainda falta de fundamentação, pelo facto do júri ter atendido apenas à melhor graduação obtida em concursos.

O Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais na sua contestação alega que estava em causa apenas a densificação do critério, não exigindo a lei a contabilização de todas as classificações. A valoração da melhor graduação é uma opção compreensível, dada a sua objectividade, sendo que o Autor obteve a melhor pontuação possível – 5 pontos.

Vejamos.

Neste ponto o art. 66º 2, b) do ETAF diz-nos que deve atender-se, além do mais:
“b) Graduação obtida em concursos de habilitação ou cursos de ingresso em cargos judiciais

O Aviso de Abertura do concurso dizia o seguinte:
“(…)
b) Graduação obtida em concursos de habilitação ou cursos de ingresso em cargos judiciais, com ponderação entre 1 e 5 pontos (arts. 66º nº 2 b) e 61º nº 2 c) do ETAF)

O júri do concurso quanto a este ponto disse o seguinte:
B. Graduação obtida em concurso de habilitação ou cursos de ingresso em cargos judiciais.
(com ponderação entre 1 e 5 pontos – alínea b), do Aviso)
Neste item, o júri ateve-se às graduações dos concorrentes em concursos de habilitação ou cursos de ingresso em cargos judiciais, valorando a melhor graduação obtida por cada concorrente


Julgamos que o júri tinha competência neste âmbito para apreciar as graduações dos concorrentes com a única limitação do resultado final variar entre 1 e 5 pontos. A opção por ponderar apenas a melhor das graduações cabe nas atribuições do júri, na medida em que não havia qualquer indicação vinculativa que limitasse os poderes de avaliação do júri.

Não resulta, todavia, que esse critério tenha sido definido em momento anterior ao conhecimento dos “curricula”. Da análise dos trabalhos preparatórios do júri decorre que, a base inicial da apreciação, era outra: “i) Concorrente integrado no 1.º quinto da graduação, 2,5 pontos; no 2.º quinto, 2 pontos; 3.º quinto, 1,5 pontos; 4.º quinto, 1 ponto, 5.º quinto, 0,5 ponto; ii) Quando o quociente da divisão do número de graduados por cinco não coincidir com um número inteiro, o mesmo será arredondado para a unidade superior.” – cfr. ponto 12 da matéria de facto.

O critério final – atende apenas à melhor das graduações obtidas – aparece explicitado apenas na deliberação final do júri, ou seja, em momento em que o júri já podia ter conhecimento do universo dos candidatos.

Este aspecto é, no caso, relevante uma vez que da aplicação do critério concretizado pelo júri, a pontuação final seria diversa se atendesse, por exemplo à média ponderada das várias graduações obtidas em diversos concursos.

Ora, esta possibilidade da pontuação final resultar da aplicação do critério definido pelo júri, mostra que o critério adoptado pelo júri tinha autonomia bastante para determinar essa pontuação, configurando portanto um subfactor.

Como se referiu no acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 15.01.2002, recurso 48343 foi explicitada a diferença entre parâmetro de avaliação e subfactor, embora para caso, aí, sob o regime do DL 59/99, de 2 de Março, citado pelo acórdão de 18-2-2016, proferido no processo 495/14: «os elementos distintivos entre o parâmetro de avaliação e o subfactor de avaliação são a rígida independência ou estanquicidade e a atribuição e uma valorização prefixa, portanto também rígida, ao subfactor, enquanto parâmetro pode interagir com outros parâmetros e tem de ser avaliado com os restantes dentro do conjunto de elementos que se unificam num determinado factor».

Ora, aquele subfactor foi explicitado apenas na deliberação final do júri, portanto, em momento em que já podiam ser conhecidos os candidatos, o que viola desse modo o princípio da imparcialidade (objectiva). No acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Administrativo de 23-5-2006, proferido no processo 01328/03, foi abordada questão semelhante, nos termos seguintes:

“(…)
Na verdade, a Constituição, no art. 266º, 2 subordina toda a actividade administrativa à Constituição e à lei, com respeito – além de outros – pelo princípio da imparcialidade. O Código de Procedimento Administrativo no art. 6º, de acordo com o preceito constitucional citado, também impõe à Administração Pública o dever de tratar de “forma justa e imparcial todos os que com que ela entrem em relação”.
A dimensão da imparcialidade está ligada “a uma postura da Administração”, com uma natureza instrumental e de garantia da “objectividade final” (ESTEVES DE OLIVEIRA, e outros, Código de Procedimento Administrativo, Coimbra, 1997, pág. 107).
A dimensão do princípio da imparcialidade, assim, definida não é apenas aplicável aos concursos da função pública, sendo um princípio constitucional e legal aplicável à actividade administrativa em geral.
Estando, no caso dos autos, em curso um procedimento de selecção de candidatos, as regras gerais sobre a imparcialidade aplicáveis aos demais concursos têm pleno cabimento, pois está em causa a mesma “postura” da Administração, como garante de uma tal transparência na escolha, que não deixe lugar à possibilidade da dúvida sobre a respectiva imparcialidade.
Como tem sublinhado a jurisprudência deste Supremo Tribunal, o princípio da imparcialidade, impõe nestes casos, que os critérios de avaliação, não possam ser criados depois de conhecidos os “factos” a que se vão aplicar. Está em causa afastar o perigo da parcialidade: “O simples risco de lesão e o perigo de parcialidade, constituem fundamento bastante para a anulação, mesmo que se desconheça em concreto a efectiva violação dos interesses de algum concorrente” (sumário do Acórdão de 9-12-2004, recurso 594/04) – cfr., por todos, o acórdão do Pleno da 1ª Secção, proferido no recurso 01126/02, remetendo para o acórdão de 9-12-2004, proferido no recurso 594/04: “…Por outro lado, sob pena de suspeição, falta de transparência e de parcialidade, não pode o órgão estabelecer essas regras e critérios depois de conhecer as candidaturas dos concorrentes. Para que não haja a tentação de afeiçoar os critérios à situação particular de um ou outro interessado e, portanto, ao resultado que se pretenda obter, devem eles ser estabelecidos antes de conhecido o currículo de cada candidato - Ac. do STA, de 21/6/94, in Ap. ao DR de 31.12.96, pag. 4999; ainda Acs. STA/Pleno, de 16/11/95, Ap. ao DR de 30/9/97, pag. 788; de 14/5/96, in AD n.º 419/1265; do Pleno de 19/12/97, Proc. N.º 28.280; do Pleno de 21/1/98, Proc. N.º 36.164; de 2/7/98, Proc. N.º 42.302

Deste modo, podemos concluir que a deliberação impugnada viola neste aspecto o princípio da imparcialidade, na sua vertente objectiva.

Deve todavia, apreciar-se a questão suscitada pelo Relator, ou seja a questão de saber se o Autor tem legitimidade ou interesse em agir para arguir o referido vício, na medida em que o critério usado pelo júri atribuiu ao Autor a melhor pontuação possível (cinco pontos) não tendo desse modo afectado a sua posição jurídica na graduação do concurso.

Este Supremo Tribunal Administrativo já teve em conta, por diversas vezes, a conexão entre o vício imputado ao acto impugnado e os interesses lesados do autor,

No acórdão de 25-1-2006, proferido no acórdão 01127/05, entendeu-se que: “Carece de legitimidade para impugnar um acto que aprovou um pedido de licenciamento de eliminação de uma janela de um edifício, o titular de um prédio vizinho que não invoca qualquer prejuízo derivado de tal eliminação.” Nesse acórdão, relativamente a este ponto foi ponderado o seguinte: “Assim, antes de mais, a legitimidade para interpor recurso depende da existência de um interesse na anulação do acto, devendo considerar-se interessado quem espera e pode obter da anulação do acto um benefício. (Neste sentido, pode ver-se FREITAS DO AMARAL, Direito Administrativo volume IV, página 170.) No caso em apreço, a anulação do acto de licenciamento aprovado pelo despacho de 18-1-2000, teria como consequência a manutenção da janela referida. Não se vislumbra, nem a Recorrente aventa, qual o benefício que a Recorrente poderia obter com a manutenção dessa janela. Por isso, deve entender-se que a Recorrente não é interessada na anulação desse acto”.

Decorre o entendimento do acórdão que a legitimidade do autor é aferida em função do vício por ele imputado ao acto. No caso ali apreciado, a desconformidade entre o projecto de arquitectura e o acto de licenciamento, efectivamente existia – pois o edifício cujo projecto de arquitectura fora aprovado, afinal tinha uma janela a menos. Porém, sem que se descortinasse qualquer benefício para o autor com a manutenção dessa mesma janela, afastou-se a legitimidade para invocar esse vício.

Num outro acórdão o Supremo Tribunal Administrativo, proferido em 27-5-2003, proferido no processo 045662, decidiu-se, além do mais que, “a violação do art. 100º do CPA apenas pode ser invocada pelo interessado que não foi ouvido no procedimento. Não se verifica assim o vício de preterição do direito de audiência se o interessado que o invoca foi ouvido, mesmo que um outro interessado o não tenha sido”. Entendeu-se, portanto, que o vício de um acto administrativo (falta de audiência de um interessado) só pode ser validamente invocado pelo interessado lesado com a ilegalidade cometida. Também, neste caso, se exigia uma conexão entre o vício e o interesse do impugnante. Só o titular do interesse legítimo ou direito lesado pela actuação ilegal poderia invocar (a seu proveito) o respectivo vício.
Embora os dois acórdãos tenham objecto diferente convergem na ideia (relevante para este processo) segundo a qual (i) o interessado na anulação do acto deve ser o titular do interesse lesado pela conduta ilegal e (ii) deve obter um benefício com o reconhecimento dessa ilegalidade

Razões semelhantes levaram este Supremo Tribunal Administrativo, no acórdão de 23-6-2022, proferido no recurso 0648/20.7BELRA, a decidir que “um concorrente definitivamente excluído de um concurso público não tem interesse em agir judicialmente contra o respectivo ato de adjudicação”. Entendimento que assentou na conclusão do TJUE (proferida em reenvio prejudicial no aludido processo), segundo a qual: “O interesse em agir de um proponente afastado de um procedimento de adjudicação de um contrato para impugnar a decisão de adjudicação desse contrato está assim intrinsecamente ligado à manutenção de um interesse em agir para impugnar a decisão que o excluiu desse procedimento. Por conseguinte, não tendo interesse em agir para impugnar a decisão que excluiu a sua proposta, um proponente afastado não pode alegar que conserva um interesse em agir para impugnar a decisão de adjudicação do contrato.” Igual decisão, quanto ao interesse em agir, foi tomada pelo Supremo Tribunal Administrativo no processo 0193/21.3BELRA, numa situação em que “(…) embora não tenha sido excluída do procedimento, no caso dos autos a impugnante, ora Recorrente, também se conformou com a decisão que foi proferida relativamente à sua proposta, não questionando, nomeadamente, a avaliação da mesma, que determinou que ela ficasse classificada em segundo lugar e fosse preterida em benefício do agrupamento adjudicatário”.

Como se disse no acórdão citado em último lugar, relativamente
à natureza jurídica desta questão, a mesma “(…)
tem sido discutida nas instâncias como uma questão de legitimidade, mas verdadeiramente trata-se de uma questão de interesse em agir. Não há dúvidas de que um concorrente preterido na adjudicação de um concurso tem legitimidade para impugnar essa decisão, por a mesma lhe ser desfavorável; a questão é saber se tem interesse em fazê-lo quando da sua impugnação não possa resultar a adjudicação do concurso em seu benefício”. Em termos práticos é indiferente a natureza jurídica do pressuposto processual em causa (legitimidade ou interesse em agir) uma vez que as consequências da sua verificação são idênticas: (excepção dilatória, de conhecimento oficioso, cuja verificação leva à absolvição da instância). Concordamos, todavia, com o enquadramento e qualificação jurídica citados, na medida em que efectivamente o acto impugnado é desfavorável e, em situações como a dos presentes autos, o Autor tem legitimidade para impugnar o acto por uma pluralidade de vícios, embora não tenha qualquer utilidade na procedência de algum ou alguns deles.

Aplicando este entendimento ao caso dos autos verificamos que, efectivamente o critério usado relativamente ao peso das graduações em concursos anteriores, em nada prejudicou o Autor que teve a melhor classificação possível.

Também não mostrou o Autor que, qualquer dos demais candidatos através de qualquer outro critério pudesse ter uma pontuação inferior à sua, com reflexos na ordem da graduação.

O que sustenta, ao ser ouvido sobre esta matéria, é que é uma vantagem atendível “o reexercício do poder avaliativo”.

Contudo, julgamos que não é assim.

É certo que a legitimidade e o interesse em agir se afere em função da titularidade de interesses lesados que podem não ser “direitos subjectivos”. Contudo, o interesse legalmente protegido a um procedimento de acordo com a lei (legalidade meramente objectiva), tendo em conta a jurisprudência acima citada, só confere legitimidade ou interesse em agir, melhor dizendo, se o autor puder retirar da verificação daquele vício, e consequente anulação o acto, alguma vantagem ou utilidade concreta para si.
É também por essa razão que os vícios formais (falta de fundamentação ou preterição de formalidades legais) geradores de mera anulabilidade podem ser descaracterizados, quando seja desde logo possível antever que o reexercício do poder administrativo de praticar um novo acto era irrelevante para a posição jurídica do autor – art. 163º, n.º 5 do CPA.
O controlo da legalidade meramente objectiva pode, é certo, ser desencadeado, mas apenas nos casos em que alei o prevê (v.g. art. 9º do CPTA).

No presente caso o critério usado não lesou a posição jurídica do Autor, que obteve a pontuação máxima, e este não indicou em concreto - nem tal resulta evidente - em que medida era possível que com a aplicação de qualquer outro critério que fizesse uma média ponderada de todas as graduações, a sua posição na grelha final fosse melhor daquela que obteve. Outra interpretação sobre a relevância do interesse em agir poderia, neste caso concreto, levar a resultados manifestamente perversos, ou seja, poderia levar a que, em resultado da anulação do acto e em nova graduação o interessado não tivesse a pontuação máxima que obteve e viesse a ficar em pior posição na graduação final.
Portanto e em conclusão o vício imputado ao acto não afecta qualquer interesse legítimo do Autor, pelo que o mesmo não tem interesse em agir para arguir este vício.


4.2.4. Falta de audiência prévia.
Alega o Autor que a dispensa de audiência prévia é ilegal.

Este vício apontado ao concurso em causa, já foi apreciado por este STA, de 15-10-2020, proferido no processo 079/19.1BALSB, que decidiu não ser ilegal a decisão na parte em que dispensou a audiência prévia, com a seguinte fundamentação:
“(…)
, também não ocorre vício de preterição de tal audiência, atentos os motivos concretamente invocados, como é jurisprudência firme deste STA, e também do STJ, como, aliás, o Réu “CSTAF” bem alega na sua contestação (e já também alegara na deliberação através da qual indeferira a reclamação do ora Autor).

Neste sentido, cfr. o Ac. STA de 15/5/2004 (037/14):
«(…) VII - Pode ser dispensada a audiência, nos termos do previsto no art. 103º, nº 2, alínea a), do CPA, se, no âmbito de um concurso, os concorrentes são chamados a defender o seu currículo precisamente para disporem de oportunidade de se pronunciarem sobre as questões que importem à decisão que outras não são afinal senão o seu próprio entendimento sobre os pontos marcantes do mesmo».

Cfr., ainda, o Ac. STA de 16/3/2017 (038/14):
«(…) II – Justifica-se a dispensa de audiência, nos termos do art. 103º, nº 2, alínea a), do CPA, por ter sido assegurada a participação no procedimento administrativo de todos os candidatos através da defesa pública do respectivo currículo com a apresentação dos elementos curriculares que os candidatos entendem relevantes, à luz dos factores de graduação legalmente previstos e constantes do aviso do concurso».

E o Ac. STJ de 19/2/2013 (98/12.9.YFLSB):
«(…) neste procedimento concursal os concorrentes têm conhecimento dos critérios classificativos e são eles que delimitam o campo de avaliação mediante a sua própria escolha dos trabalhos científicos e, muito particularmente, dos trabalhos forenses elaborados, bem como dos demais elementos que consideram relevantes para a sua classificação. Por outras palavras: os concorrentes são chamados a defender o seu currículo precisamente para disporem de oportunidade de se pronunciarem “sobre as questões que importem à decisão (artigo 103°, n°2, alínea a), do C.P.A.) que outras não são afinal senão o seu próprio entendimento sobre os pontos marcantes do seu currículo. Cremos que as finalidades visadas pela lei estão atingidas e, por isso, justifica-se inteiramente a dispensa determinada por deliberação do C.S.M. visto que uma segunda audição, prévia à proposta de classificação, não teria afinal outro objetivo (...) senão discutir com o júri a sua própria avaliação que, como é reconhecido, se situa no campo da discricionariedade administrativa».

Também o Ac. TConstitucional nº 331/2002 (in DR, II Série, de 8/5/2003):
«(…) nos presentes autos está em causa um concurso documental, no qual os interessados, uma vez iniciado o respectivo prazo, têm a possibilidade de apresentar todos os elementos de que dispõem e que considerem relevantes, desde logo em face dos factores de ponderação legalmente estabelecidos. A realização da audiência seria, deste modo, inútil, uma vez que não facultaria a possibilidade de trazer ao processo elementos cuja junção não tivesse sido possível anteriormente. (...) não se verifica qualquer violação do disposto no artigo 267°, n° 5, da Constituição, pois foi assegurada, nos termos expostos, a participação dos interessados no processo em causa».

5.7. Assim, ainda que se considerasse insuficientemente fundamentada a dispensa da audiência dos interessados, ao abrigo do art. 124º nº 1 a) do CPA, através da invocada “urgência”, tal não seria motivo de anulação do ato, uma vez que sempre a determinada dispensa da audiência se encontra plenamente fundamentada, e legal e suficientemente justificada, ao abrigo da alínea e) do nº 1 do mesmo artigo.
(…)”
Pelas mesmas razões (está em causa o mesmo concurso), com as quais concordamos inteiramente, não se verifica o alegado vício.

4.2.5. Vícios relativos à apreciação da “capacidade de trabalho”.
O Autor neste ponto entende que não se descobre qualquer fundamentação, relativa à capacidade de trabalho. No que concerne à quantidade de trabalho, alega o Autor, que “não existe a referência à estatística ou à pendência, mormente, mas não exclusivamente, no período mais recente da carreira dos magistrados – nem uma palavra, mas apenas qualificações formais e perfeitamente abstractas que vão de excelente, muito boa, etc.”. Considera, assim, que a deliberação do júri não está suficientemente fundamentada e que, em alguns casos que cita, estamos perante erro manifesto. Citou, a propósito, casos concretos - relativamente aos concorrentes Dr. EE e concorrente Dr. DD.

Entende que a pontuação final que lhe foi atribuída, neste ponto, é injusta comparativamente com a pontuação dos concorrentes Dr. DD e Dr. CC.

Nas alegações finais, refere ainda a ilegalidade da deliberação, neste ponto, por ter apenas considerado a quantidade e a qualidade do trabalho prestado nos Tribunais Centrais Administrativos.

A entidade demandada sustenta que tratando-se de concurso de acesso a um Supremo Tribunal foi avaliada a capacidade de trabalho dos magistrados no exercício de funções na segunda instância. Diz ainda que foi ponderada a estatística dos últimos 3 anos, conforme o ponto 13 do Aviso de Abertura. Quanto ao candidato Dr. EE foi também ponderado o desempenho do cargo de presidente do Tribunal Central Administrativo .... Ou seja a capacidade de trabalho não foi objecto de uma apreciação isolada, tendo sido ainda tido em conta a sua qualidade.

Vejamos, antes de mais, se era lícito avaliar apenas o desempenho nos Tribunais Centrais Administrativos.

O art. 66º, 2 do ETAF, relativamente à avaliação do mérito dos concorrentes diz o seguinte, na parte que agora interessa diz-nos o seguinte:

“2. A graduação faz-se segundo o mérito relativo dos concorrentes de cada classe, tomando-se globalmente em conta a avaliação curricular, com prévia observância do disposto no número seguinte e, nomeadamente, tendo em consideração os seguintes fatores:
(…)”
e) Atividade desenvolvida no âmbito forense ou no ensino jurídico;
f) Outros fatores que abonem a idoneidade dos requerentes para o cargo a prover.
O Aviso de Abertura, no ponto 5, al. f) diz-nos o seguinte:
(…)”
f) A preparação específica, idoneidade e capacidade dos candidatos para o cargo a prover, com ponderação entre 50 e 110 pontos (arts. 66º nº 2 f) e 61º nº 2 i) do ETAF), designadamente:
a. O prestígio profissional, tendo em consideração, designadamente, a contribuição para a melhoria do sistema de justiça;
b. A qualidade dos trabalhos forenses apresentados;
c. A capacidade de trabalho, ponderando, designadamente, e no que concerne aos magistrados, a quantidade e a qualidade do serviço prestado nos Tribunais Centrais Administrativos e nos Tribunais da Relação;
d. O grau de empenho revelado pelo candidato na sua própria formação permanente;
(…)”
Como resulta claramente dos termos do Aviso de Abertura o júri não estava limitado a avaliar apenas a quantidade e qualidade de trabalho prestado na segunda instância.

A expressão designadamente tem o sentido de exemplificar e não de tipificarão período de tempo relevante. Por outro lado, destacar o serviço prestado na segunda instância tem todo o sentido uma vez que se trata de serviço prestado temporalmente mais próximo da data da ponderação e também mais qualificado. Não há assim violação de Lei no Aviso de Abertura.
O júri, neste ponto, ponderou o seguinte:
“(…)
Neste item o júri ponderou globalmente a preparação específica, idoneidade e capacidade dos concorrentes para o cargo a prover, atendendo, designadamente, ao prestígio profissional de cada concorrente, à quantidade dos trabalhos forenses apresentados, à capacidade de trabalho, ponderando, designadamente, a quantidade e a qualidade do serviço prestado nos Tribunais Centrais Administrativos e nos Tribunais da Relação, assim como o grau de empenho revelado pelo concorrente na sua própria formação contínua

Como decorre da parte transcrita o júri não limitou a avaliação da quantidade e qualidade de trabalho prestado na segunda instância. O que disse foi que ponderaria, designadamente, a quantidade e qualidade de trabalho prestado na segunda instância. Deste modo e de acordo com o critério que definiu o júri podia e devia ponderar também os elementos de que dispunha relativos à capacidade de trabalho na primeira instância.

Daí que, o critério do júri também não seja ilegal. Se foi bem aplicado ou se está fundamentada a sua aplicação é outra questão que apreciaremos de seguida.

A deliberação impugnada relativamente à preparação técnica, idoneidade e capacidade dos concorrentes para ao cargo a exercer, não se limitou a ponderar a capacidade de trabalho. Este critério no Aviso de Abertura foi dividido em 5, sendo que um deles era efectivamente a capacidade de trabalho.

Desta realidade resulta, desde logo, improcedente a alegação do autor quando compara a pontuação global de alguns concorrentes e a respectiva capacidade de trabalho, para concluir – a partir daí - pela injustiça da ponderação global.

Efectivamente, uma maior capacidade de trabalho (como a alegada pelo Autor relativamente a si próprio e comparativamente com outros) só por, si não é suficiente para se concluir que a notação global seja injusta e, muito menos, manifestamente injusta.

Ora, neste âmbito e estando limitada a sindicância judicial à manifesta inadequação da pontuação global, é claramente inconcludente a argumentação fundada apenas na diferente (maior ou menor) capacidade de trabalho.

Vejamos, então, se a deliberação está fundamentada, neste ponto.

Como decorre do art. 153º, 1 do CPA “A fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão”. Diz-nos depois o n.º 2 do mesmo artigo que “Equivale à falta de fundamentação a adoção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do ato”. Daqui se retira, pois, que a fundamentação deve ser (i) expressa, (ii) clara, (iii) congruente e (iv) suficiente. Devendo ainda ser, como decorre directamente do art. 268º, 3,da CRP, (vi) “acessível”.

A deliberação impugnada descreve os aspectos que tomou em conta, os critérios estabelecidos no Aviso de Abertura e nota-se que, relativamente a cada candidato, fez referências concretas destacando aquelas que motivaram a notação global atribuída.

Julgamos que perante a pluralidade de critérios a ponderação global implicava a possibilidade do júri, no âmbito da sua “autonomia administrativa” avaliar cada concorrente, tendo em conta os aspectos que a seu ver eram concretamente mais significativos.

A metodologia seguida permite, a nosso ver, considerar fundamentada a deliberação quando seja possível compreender as razões invocadas pelo júri, ainda que recorrendo aos elementos constantes de cada uma das candidaturas, designadamente, quando seja possível verificar que o júri atendeu a todos os fatores de avaliação, sem omissões (suficiência da fundamentação) ou incoerências (congruência da fundamentação) evidentes.

Ora, relativamente à capacidade de trabalho, a mesma aparece-nos referida através de qualificações diversas: “excelente capacidade de trabalho”; “muito boa capacidade de trabalho”, sem qualquer remissão para os elementos constantes do procedimento e sem qualquer referência a estatística, ou outros elementos que foram concretamente ponderados para se chegar àquela avaliação.

Contudo, de acordo com o critério que acima referimos, julgamos que a fundamentação não é congruente.

Com efeito, o Autor, relativamente ao concorrente Dr. EE referiu no art. 89º da petição inicial, que o mesmo movimentou “Recursos jurisdicionais em processos urgentes, nos quais é relator, com conclusões abertas em 2014, 2015 e 2016 são sete”. “Falamos pois, diz o Autor no art. 90º da petição inicial, no limite, de atrasos de mais de cinco anos em processos urgentes”. Quanto a este concorrente, no factor sobre a “preparação específica, idoneidade e capacidade de trabalho dos concorrentes para o cargo a prover” e mais especificamente sobre a capacidade de trabalho foi referido o seguinte: “O concorrente em apreço granjeou, ao longo da sua carreira como magistrado, um elevado prestígio profissional, designadamente no exercício de funções como Presidente do Tribunal Central Administrativo ..., revelando uma excelente capacidade de trabalho e particular empenho na sua própria formação”.

Perante dados que nos mostram atrasos tão significativos em processos urgentes impunha-se, sem qualquer dúvida, a explicitação de que, apesar deles, o concorrente tinha excelente capacidade de trabalho, ou o que vem a dar no mesmo, capacidade de organizar o seu trabalho. Note-se que o júri apreciou, como expressamente referiu, a capacidade de trabalho ao longo de toda a carreira e não apenas na segunda instância.

Relativamente ao Dr. DD, o Autor refere a existência de elementos estatísticos dos quais resulta que aquele magistrado entre 2006 e 2010, enquanto juiz de primeira instância, decidiu em média 13,52 processo por mês. No relatório de inspecção desse magistrado (artigo 104º da petição) é expressamente dito o seguinte:

”(…) significativo e constante aumento de pendências processuais (de 217 para 652 processos na área administrativa e de 106 para 619 na área tributária, no período da inspeção (…) menor produtividade de difícil explicação. (…). Valores de produtividade inferiores aos normalmente exigíveis aos juízes da 1ª instância nesta jurisdição mesmo quando em tribunais de competência agregada, como era o caso. A reduzida produtividade conhece particular incidência em sede de contencioso tributário, onde, além do mais, se registam valores da ordem dos 12 (11+1 a 2004) processos findos em apenas 10 meses de 2006, 17 em 2007, 39 em 2008, 73 em 2009 e 40 (…) em 2010. E decorre também da apurada ausência de qualquer decisão final nesta categoria de processos em muitos dos meses sob escrutínio e avaliação, v.g. Fevereiro, junho, julho e Agosto e Setembro de 20078, Janeiro e Julho de 2008 e Novembro de 2009 e Fevereiro, Julho, Agosto e Dezembro de 2010. (…)”.

O júri quanto a este ponto disse o seguinte: “O concorrente em apreço granjeou, ao longo da sua carreira como magistrado, notório e consistente prestígio profissional, revelando uma excelente capacidade de trabalho e grande empenho na sua própria formação”.

Perante os referidos dados estatísticos, constantes do Relatório de Inspecção citado pelo Autor, não é congruente a conclusão no sentido de “uma excelente capacidade de trabalho”.

Perante aqueles dados estatísticos a conclusão de que, apesar deles, o concorrente tinha uma excelente capacidade de trabalho (na movimentação dos processos, pois não estava em causa qualquer outra) carecia de uma motivação, mínima que fosse, pois de outro modo o percurso cognitivo do júri não é objectivamente coerente. Note-se que o júri apreciou, como expressamente referiu, a capacidade de trabalho ao longo de toda a carreira e não apenas na segunda instância.

Já relativamente ao candidato Dr. CC, o Autor não exemplifica – em termos concretos, como o fez relativamente aos anteriores candidatos - e que fundamenta a sua conclusão, segundo a qual: “(…) não terem sido sopesados os elementos estatísticos no que à quantidade diz respeito, a convocar vício de violação de lei por afronta ao sub-critério constante do aviso de abertura na vertente capacidade/quantidade (…)”. Não foram, portanto, quanto a este candidato alegados dados concretos que evidenciem incongruências ou omissões relevantes, na avaliação da capacidade de trabalho, pelo que, nesta parte o Autor não tem razão.

Deste modo, verifica-se o alegado vício de falta de fundamentação (incongruência) relativamente ao subfactor “capacidade de trabalho”, no que diz respeito aos candidatos Dr. EE e Dr. DD.

4.2.6. Vícios decorrentes da dupla avaliação e trabalhos científicos publicados.
Neste ponto, o Autor considera ter havido uma dupla avaliação no que respeita ao concorrente Dr. CC por lhe serem atribuídos 0,5 pontos por deter o grau de Mestre e lhe terem atribuído 6,00 ponto no critério “trabalhos científicos”, uma vez que o trabalho científico consistiu na dissertação de mestrado, desconhecendo ainda se o mesmo foi publicado, ou não.
Considera ainda (comparativamente) que, relativamente ao concorrente Dr. KK “nada se diz sobre as suas teses de mestrado, ou seja, tanto quanto se sabe, os trabalhos a que os trabalhos a que o parecer faz alusão não foram teses de mestrado” (art. 132º da petição inicial).
Alega ainda relativamente ao critério “trabalhos científicos publicados” que a pontuação de 9,5 pontos ao concorrente Dr. DD, “entra nos limites do erro grosseiro” por se ter dado relevância à elaboração de trabalhos científicos dizendo-se que “o candidato em causa exercia proficuamente as suas funções e mais lhe atribuindo o mérito de deter “uma grande capacidade de trabalho”.
Na contestação o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais que o Aviso de Abertura não excluía a valoração dos trabalhos apresentados para a obtenção de graus académicos e que o trabalho apresentado pelo concorrente cumpria os parâmetros do Aviso de Abertura.
O contra-interessado em alegações também indicou o “link” onde comprovava a publicação do trabalho.
Vejamos.
O Aviso de Abertura, quanto a este ponto diz o seguinte:
d) Trabalhos científicos publicados, que versem matéria de natureza jurídica, com ponderação entre 0 e 10 pontos (artigos 66º, n.º 2, al. d) e 61º, n.º 2, alínea e) do ETAF) não se englobando nesta categoria os trabalhos que correspondam ao exercício da função”.
Relativamente ao concorrente Dr. CC a deliberação impugnada disse o seguinte:
“(…)
O concorrente apresentou um trabalho, correspondendo a uma obra de fôlego e com assinalável qualidade técnica. Trata-se de uma dissertação de mestrado, tendo por tema a ponderação de bens em direito administrativo. A matéria tratada reveste-se de considerável complexidade e o concorrente analisa-a com lucidez, mérito científico e sentido prático, justificando a atribuição de 6,00 pontos. (…)”

O Autor alega que este trabalho não podia ser valorado com autonomia por ser uma tese de mestrado e este grau académico ter tido uma valoração específica. Invoca a favor da sua tese o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20-6-2018, proferido no processo 80/17.0YFLSB, que decidiu, além do mais que: “(…) sob pena de se verificar dupla valoração do mesmo elemento curricular, a dissertação de mestrado apresentada para obtenção do grau académico não pode ser simultaneamente apreciada como trabalho científico”.
Vejamos.
O citado acórdão do Supremo Tribunal de Justiça não é totalmente transponível para o presente caso, uma vez que o ponto 6.1. d) do Aviso de Abertura daquele concurso, como se refere no citado acórdão, era do seguinte teor: «Trabalhos científicos publicados, incluindo em revista de formato eletrónico, com ponderação entre 0 (zero) e 5 (cinco) pontos, não se englobando nesta categoria os trabalhos que correspondam ao exercício específico da função, nem os apresentados para a obtenção de títulos académicos (mestrado ou doutoramento), tomando-se em consideração a natureza dos trabalhos, a especificidade das matérias, a qualidade e o interesse científico e o modo de exposição e de abordagem das matérias tratadas».
Foi por esta razão que o Supremo Tribunal de Justiça entendeu que era correta a não valoração autónoma. Diz o acórdão: “(…) Certamente, a desconsideração na categoria de trabalhos científicos publicados dos trabalhos apresentados para a obtenção de títulos académicos (mestrado ou doutoramento), foi prevista na al. d) para não se valorar duplamente o mesmo trabalho ou o mesmo esforço intelectual, já valorado em sede da al.c) – v. Revela-se, pois, ajustada a decisão do CSM, sob pena de haver uma duplicação da valoração do mesmo elemento curricular, não se vendo como possa afirmar-se que se trata de uma obra nova, ainda que contenha aprofundamentos doutrinais e jurisprudenciais consideráveis, como alega o recorrente”.

Ora, esta restrição – exclusão da relevância autónoma de trabalhados publicados usados na obtenção de grau académico - não existia no Aviso de Abertura do concurso ora em causa, o qual excluía apenas a relevância dos trabalhos científicos “que correspondam ao exercício da função”, contrariamente ao que existe, por exemplo, no Aviso de Abertura do concurso seguinte (cfr. Aviso n.º 2696/2022, de 9 de Fevereiro: “Trabalhos científicos publicados, que versem matérias de natureza jurídica, com ponderação entre 0 (zero) e 10 (dez) pontos [artigos 66.º, n.º 2, alínea d), e 61.º, n.º 2, alínea e), do ETAF], não se englobando nesta categoria os trabalhos que correspondam ao exercício específico da função nem os apresentados para a obtenção de títulos académicos (mestrado ou doutoramento).

Julgamos que a opção do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais em excluir, ou não, a ponderação autónoma, como trabalhos científicos, aqueles que foram apresentados para obtenção de títulos académicos, situa-se no âmbito da sua autonomia administrativa. Em termos abstractos são realidades distintas a apresentação de um trabalho visando a obtenção de um grau académico e a sua valia científica como trabalho publicado. Note-se, a este propósito, que a publicação de um trabalho científico poderá valer até 10 pontos (ponto 5, d) do Aviso de Abertura) enquanto o grau de Doutor permite atingir, no máximo, 5 pontos (Aviso de Abertura ponto 5, 2, c)). Não é, portanto, manifestamente inadequado o Aviso de Abertura não excluir da ponderação autónoma trabalhos científicos apresentados para obtenção de títulos académicos, na medida em que um trabalho científico de grande qualidade pode valer uma pontuação bastante superior àquela que resulta da obtenção do grau académico no âmbito do qual foi apresentado.

Como também não é inadequado o inverso, como sublinhou o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça. Desde logo, porque, a exclusão da dupla valoração expressa na Aviso de Abertura do concurso permitiria ao candidato optar, ou pela pontuação que lhe conferia o grau académico, ou pela pontuação que lhe conferia a valia científica do trabalho.

Daí que situando-se a opção no âmbito da autonomia administrativa consideramos não haver qualquer erro manifesto na valoração de trabalhos científicos publicados e ao mesmo tempo valorar o grau académico no âmbito do qual os trabalhos foram produzidos. Opção que, a nosso ver, é adequada na medida em que a valia de um trabalho científico (e essa tarefa cabe ao júri) pode mostrar qualidades técnicas/jurídicas muito relevantes para o exercício das funções de Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal Administrativo.

O que não estava certo, a nosso ver, era o Aviso de Abertura não excluir a dupla valoração e o júri por sua iniciativa tê-la feito. Desde logo, porque a ser excluída, no Aviso de Abertura, a valoração autónoma da publicação do trabalho publicado, permitia-se ao concorrente optar pela valoração do trabalho publicado em detrimento da obtida pelo grau académico – no caso o currículo universitário valia 1 a 5 pontos, enquanto os trabalhos publicados valiam de 0 a 10. No presente concurso o grau de mestre foi ponderado de 0,5 pontos, pelo que era bastante mais vantajoso para o concorrente não invocar o grau de mestre para que desse modo pudesse ser valorado o trabalho publicado (valorado em 6,00 pontos).

Quanto ao alegado desconhecimento acerca da publicação, ou não, do trabalho científicos o Autor não tem razão. Apenas poderiam ser valorados trabalhos publicados, pois tal requisito constava do Aviso de Abertura. Pelo que a relevância dada a trabalhos não publicados configurava um erro nos pressupostos de facto. Todavia e entidade demandada, na contestação e o contra-interessado, nas alegações escritas, indicaram o “link” onde se encontra a publicação “online” do referido trabalho, provando assim a sua publicação.

Relativamente à pontuação atribuída ao concorrente Dr. DD, a mesma situa-se no âmbito da autonomia administrativa e, portanto, excluída da sindicância jurisdicional. O argumento do Autor sobre o eventual erro grosseiro neste campo não procede. Está em causa a referência feita na deliberação recorrida à circunstância dos trabalhos publicados terem sido feitos enquanto desempenhava funções nos tribunais administrativos “o que demonstra, além de uma grande capacidade de trabalho, a curiosidade científica e interesse no estudo e investigação nas áreas do direito conexas com a sua actividade”. Esta referência, alega o Autor, estaria em desacordo com as referências feitas na inspecção ao seu serviço, na 1ª instância. Julgamos que não existe erro manifesto nesta apreciação. A avaliação refere-se à capacidade de trabalho face aos trabalhos publicados e abrange também aqueles que foram feitos no período posterior à inspecção. Além de que foram sublinhadas características relevantes para justificar uma pontuação elevada: curiosidade científica, interesse no estudo e investigação.

Assim e quanto a este ponto a acção deve ser julgada improcedente.

4.2.7. Vícios decorrentes da circunstância de, perante a mesma fundamentação, haver pontuações diferentes.
O Autor alega que de acordo com o ponto 23 do Aviso de Abertura não podia ser dada relevância à antiguidade.
Alega ainda não ser compreensível a razão de magistrados com 30 anos de antiguidade na magistratura terem tido pontuações diferentes:
1) HH: “Ponderando globalmente a sua vasta experiência de mais de 30 anos na magistratura, como magistrada, foram-lhe atribuídos 6,60 pontos; 29 MM: “ Ponderando a sua vasta experiência de mais de 30 anos na magistratura, como magistrado, foram-lhe atribuídos 6,40 pontos; 3 – OO: “Ponderando globalmente a sua experiência de 30 anos na magistratura, como magistrado, foram-lhe atribuídos 6,00 pontos; 5) QQ: “Ponderando globalmente a sua vasta experiência de mais de 30 anos na magistratura, como magistrado e noutras funções e actividades exercidas, muito em particular, o exercício de funções e actividades, muito em particular as funções no Supremo Tribunal do ..., foram-lhe atribuídos 6,60 pontos.”
(…)”.
Alega ainda não ser compreensível a diferença de pontos que lhe foi atribuída, neste ponto (6,10) em comparação com a concorrente Dra. LL (6,90), pois ambos têm mais de 20 anos de exercício de funções. Aceitando que a diferença de 0,80 pontos advenha da circunstância da concorrente Dra. LL advenha de ter exercido funções docentes (art. 152 da petição) nota que, relativamente a outros concorrentes a diferença resultante do exercício de funções docentes foi apenas de 0,30 pontos (concorrentes Dra. FF e Dr. II). Conclui o autor que não possível entender o iter cognoscitivo e valorativo que subjaz à deliberação impugnada, neste ponto.

Para além da falta de fundamentação diz ainda o Autor que a escala usada é injusta não permitindo relevar e diferenciar proporcionalmente os méritos dos candidatos ao adoptar uma diferenciação de, apenas, 5 em 5 anos.

Finalmente entende que o Autor leccionou aulas na Universidade Portucalense Infante D. Henrique entre os dias 11 e 18 de Março de 2015, 3 horas cada dia, aulas estas que deveriam ter sido valoradas nesta sede a título de ensino jurídico, não havendo evidência de o terem sido em violação da lei e do critério.

O Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais entende que a deliberação está fundamentada e que as diferentes pontuações atribuídas, nos exemplos indicados pelo Autor, tem leves diferenças na pontuação, para além de ser ponderado o exercício em distintas funções. Alega ainda que, efectivamente foi tido em conta “o concreto tempo de serviço” de cada candidato (por exemplo, nuns casos 23, 25, noutros 32 ou 33 anos). Ponderou ainda as diferentes dimensões das actividades exercidas (inspector, coordenador regional de formação, presidentes dos tribunais administrativos e fiscais, vice-presidente e presidente dos Tribunais centrais Administrativos). Mais refere que ponderou a actividade docente com características de permanência ou de regularidade e daí que quanto ao Autor porque apenas constam intervenções esporádicas, ocasionais, como orador/conferencista, não se verificava uma actividade docente.

Vejamos.

O art. 66º, 2, e) do ETAF manda atender, além de outros factores: “Atividade desenvolvida no âmbito forense ou no ensino jurídico”.

O Aviso de Abertura, relativamente a este aspecto, no ponto 5, e), diz-nos o seguinte:
e) Actividade exercida no âmbito forense, no ensino jurídico, ou na Administração Pública, com ponderação entre 0 e 10 pontos (artigos 66º, n.º 2, alínea f) e 61º, n.º 2, al. f) do ETAF).”
O júri do concurso relativamente a este ponto “ponderou globalmente a actividade exercida pelos concorrentes no âmbito forense, no ensino jurídico e na Administração Pública, após ingresso na magistratura”.
De notar ainda que, nos termos do ponto 23 do Aviso de Abertura “a graduação final é feita independentemente da antiguidade de cada um dos concorrentes, funcionando esta como critério de desempate em caso de igualdade de pontuação”.

O que decorre do regime legal aplicável é que a ponderação não é feita pelo número de anos, mas sim pela avaliação do tempo e natureza do serviço prestado – avaliação também qualitativa. A atribuição de pontos mecanicamente em função do tempo de serviço violaria o ponto 23 do Aviso de Abertura, mas não foi isso que foi feito. O “tempo de serviço”, como elemento da “actividade exercida” foi ponderado em função da sua específica natureza, e não apenas no exercício de funções de juiz, v. g. Presidente e Vice-presidente do TCA, Presidente do TAF, coordenador do CEJ, funções no Supremo Tribunal do ..., docente no CEJ, Vice-Procurador – Geral da República, Inspector do CSTAF. Daí que não exista qualquer violação do ponto 34 do Aviso de Abertura.

Vejamos, em concreto, as demais questões suscitadas.

Em primeiro lugar, não resulta do Aviso de Abertura, nem é expressamente referido na deliberação impugnada que fosse feita uma repartição do tempo de serviço de 5 em 5 anos, pelo que a imputação de ilegalidade à deliberação, nesta parte e por esta razão, não pode procede. Ou seja, nesta parte o Autor não tem razão.

Quanto à suficiência da fundamentação, neste campo, vejamos os exemplos do Autor.
“1) HH: “Ponderando globalmente a sua vasta experiência de mais de 30 anos na magistratura, como magistrada, foram-lhe atribuídos 6,60 pontos;
29)MM: “ Ponderando a sua vasta experiência de mais de 30 anos na magistratura, como magistrado, foram-lhe atribuídos 6,40 pontos;
3) OO: “Ponderando globalmente a sua experiência de 30 anos na magistratura, como magistrado, foram-lhe atribuídos 6,00 pontos;
5) QQ: “Ponderando globalmente a sua vasta experiência de mais de 30 anos na magistratura, como magistrado e noutras funções e actividades exercidas, muito em particular, o exercício de funções e actividades, muito em particular as funções no Supremo Tribunal do ..., foram-lhe atribuídos 6,60 pontos.”

Como decorre da leitura dos exemplos a fundamentação não é de todo idêntica. Aos candidatos com mais de 30 anos (1 e 5) foram atribuídos 6,60 pontos; ao candidato com 30 anos foi atribuída a pontuação de 6,00 pontos. Quanto a estes exemplos, o Autor não tem razão, quando afirma que o mesmo discurso fundamentador justifica pontuações diferentes.

Todavia, relativamente ao candidato Dr. MM e Dra. HH, o discurso fundamentador é idêntico e a pontuação é diversa (mais de 30 anos, e num caso foram atribuídos 6,40 pontos e no outro 6,60 pontos). Julgamos, todavia, ser compreensível que esta diferença de pontuação resulta do facto dos candidatos não terem exactamente o mesmo tempo de serviço, sendo a Dr. HH mais antiga (uma diferença de quase 8 meses).

Quanto a não ser compreensível a notação atribuída às concorrentes Dra. LL e Dra. FF, em comparação com a que lhe foi atribuída, constatamos que não é usada idêntica fundamentação, sendo destacados aspectos diferentes, designadamente a docência (Dr. LL) Magistrada Coordenadora Regional ... - Presidente do TCA (Dra. FF). Ou seja existem dados de facto referidos na fundamentação que justificam uma diferente pontuação, sendo que a respectiva ponderação cabe na reserva de autonomia administrativa do júri.

Relativamente à circunstância de nada ser dito sobre a actividade docente do Autor comparativamente com outros candidatos o Autor não tem razão. Como acima referimos a fundamentação deve considerar-se suficiente desde que da leitura da deliberação em conjugação com os elementos constantes do procedimento administrativo não resultem incoerências ou omissões incompreensíveis.
Neste ponto não há incoerência pois, como diz a entidade demandada, neste âmbito “(…) porque apenas constam intervenções esporádicas, ocasionais, como orador/conferencista, não se verificava uma atividade docente”. Resulta dos elementos curriculares apresentados (de resto sublinhados pelo Autor nesta acção) que o mesmo inclui nessa atividade apenas os dias 11 e 18 de Março de 2015 - (cfr. art. 172º da petição inicial). Depreende-se ainda da referência feita pelo júri, neste ponto, que foi ponderada “globalmente a sua experiência de mais de 20 anos na magistratura e noutras funções e atividades exercidas…”. Ou seja o pouco tempo dedicada à atividade docente (dois dias) e a referência a uma ponderação global de “outras atividades” torna compreensível a falta de referência especial ao “exercício de atividade docente”.
Por outro lado, o Autor não apontou incoerências, carentes de justificação especial, como as que acima vimos referentes à avaliação da capacidade de trabalho de alguns candidatos em confronto com os elementos constantes do procedimento.
Em suma, também quanto a este ponto não procede a alegação do Autor.



5. Decisão
Face ao exposto, acordam os juízes que compõem este Supremo Tribunal Administrativo:
a) Julgar que o Autor não tem interesse em agir para arguir os vícios relativos à intervenção do júri na ponderação das graduações em cursos de ingresso em cargos judiciais;
b) Julgar procedente, nos termos acima descritos, o vício de falta de fundamentação relativo à apreciação da “capacidade de trabalho”;
c) Julgar, em suma, a acção parcialmente procedente e, consequentemente, anular o acto impugnado pelos fundamentos referidos na alínea anterior;
d) Julgar em tudo mais a acção improcedente.

Custas pelo Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais. Com efeito apesar de não procederem todos os vícios alegados pelo Autor o acto impugnado foi anulado e, nessa medida, a entidade demandada deu causa ao processo (art. 527º do CPC e acórdãos deste Supremo Tribunal Administrativo de 12-5-2010, proferido no recurso 01107/09).
Lisboa, 1 de Fevereiro de 2024. – António Bento São Pedro (relator) - José Augusto Araújo Veloso - Ana Paula Soares Leite Martins Portela.