Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:030/20.6BALSB
Data do Acordão:01/20/2021
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:SUZANA TAVARES DA SILVA
Descritores:OPOSIÇÃO
QUESTÃO FUNDAMENTAL DE DIREITO
Sumário:Existe diferença na questão fundamental de direito quando o quadro factual dos arestos em confronto não seja subsumível às mesmas normas legais.
Nº Convencional:JSTA000P27053
Nº do Documento:SAP20210120030/20
Data de Entrada:04/08/2020
Recorrente:A…………. PORTUGAL LDA.
Recorrido 1:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

I - Relatório

1 –A……… Portugal Lda., com os sinais dos autos, vem, nos termos dos artigos 25.º e 26.º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), interpor recurso para a uniformização de jurisprudência para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo da decisão arbitral n° 321/2019-T, proferida em 5 de Fevereiro de 2020, pelo Cento de Arbitragem Administrativa, por considerar que esta decisão colide com o decidido no acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 14 de Março de 2018 (processo n.º 716/13), apresentando, para tanto, alegações que concluiu do seguinte modo:
A. A decisão arbitral recorrida está em oposição com o acórdão do STA de 14 de Março de 2018, proferido no âmbito do processo n.º 0716/13.
B. A manifesta oposição do acórdão recorrido a este acórdão fundamento refere-se a uma questão essencial: o critério temporal para aferir da prevalência do princípio da justiça sobre o princípio da especialização dos exercícios.
C. No Acórdão de que ora se recorre, foi decidido que «não se verifica a alegada violação do princípio da justiça», por se ter considerado - no momento em que cometeu o erro, em 2016 - que a Recorrente ainda estava em tempo para deduzir reclamação graciosa contra o acto de autoliquidação referente ao exercício de 2013 e, dessa forma, imputar a esse exercício os benefícios fiscais em apreço (no fundo, ainda estava em tempo de observar o princípio da especialização dos exercícios).
D. Note-se porém que, de acordo com o Acórdão-fundamento, a prevalência do princípio da justiça face ao princípio da especialização dos exercícios deve ser aferida no momento em que o sujeito passivo tem conhecimento do erro que cometeu, ou seja, no momento em que a AT faz as correcções e não - tal como no Acórdão recorrido - no momento em que inadvertidamente viola o princípio da especialização dos exercícios. Resulta do exposto que o Acórdão recorrido e o Acórdão fundamento têm na sua base a mesma questão fundamental de direito, a saber, o critério para determinar a prevalência do princípio da justiça vs. princípio da especialização de exercícios.
E. Acresce que os factos em ambos os Acórdãos são substancialmente idênticos: nos dois casos estão em causa contribuintes que, de modo não intencional e sem intuito doloso, deixaram de considerar gastos no ano a que os mesmos respeitam (1989, no Acórdão fundamento; 2011,2012 e 2013, no Acórdão recorrido) mas noutro exercício (2004, no Acórdão fundamento; 2014, no Acórdão recorrido).
F. Para além disso, os princípios que os referidos Acórdãos chamam à colação não se alteraram, nem a regulamentação que deles faz a ordem jurídica.
G. NÃO OBSTANTE, e por último, os dois acórdãos encontram-se em manifesta contradição: sendo certo que essa oposição não é colateral, ou implícita, nem se encontra restrita aos argumentos enformadores das decisões mencionadas; pelo contrário, é justamente a thema decidenda nos dois Acórdãos e que está na base das decisões pelos mesmos adoptadas.
H. Em suma, considerando o que ficou exposto, afigura-se notório que existe uma manifesta oposição entre o Acórdão recorrido e o Acórdão fundamento, razão pela qual deve o presente recurso ser considerado admissível.
I. Caso o critério enformador adoptado pelo Tribunal Arbitral, no Acórdão recorrido, respeitasse a jurisprudência do STA, ter-se-ia concluído que, em 2018, quando a AT procedeu à correcção acima identificada, a Recorrente já não tinha meio de imputar os gastos em apreço ao exercício de 2013, o que teria determinado inevitavelmente a anulação da liquidação.
III. DO PEDIDO
Nestes termos, requer-se a V. Exas., ao abrigo do n.º 2 do artigo 25.º do RJAT e observado o regime do recurso regulado no artigo 152.º do CPTA aplicável ex vi n.º 3 do artigo 25.º do RJAT, a uniformização de jurisprudência, atenta a identidade da mesma questão fundamental de direito:
Que seja fixado o entendimento do acórdão do STA de 14.03.2018, proferido no processo n.º 0716/13, relativamente ao critério temporal relevante para efeitos de aplicação do princípio da justiça sob o princípio da especialização de exercícios; esse critério deve corresponder não ao momento no qual o erro é cometido (e o gasto é imputado a um exercício incorrecto), mas àquele no qual o mesmo é detectado por via da correcção realizada pela AT.
Mais se requer a V. Exas. que se dignem a determinar a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do n.º 7 do artigo 6.º do regulamento das custas processuais.


2 - A recorrida, Autoridade Tributária, contra-alegou concluindo nos seguintes termos:
1. No presente recurso não se verificam os pressupostos, contemplados nos arts. 25º n° 2 do RJAT, 152° n° 2 do CPTA e 27° n° 1, al. b) do ETAF, que permitam a apreciação de recurso para uniformização de jurisprudência interposto por A………… Portugal, Ld.ª.
2. Na verdade, não há, desde logo, identidade de situações de facto, ou seja, não há identidade substancial das situações fácticas, pressuposto necessário para que haja soluções diferentes quanto à interpretação da mesma questão de direito.
3. Efectivamente, a circunstância de no Ac. recorrido os factos se reportarem a uma situação distinta, a da dedução à colecta de benefícios fiscais e da forma como se pode fazer o reporte dos benefícios não utilizados, da do Ac. fundamento em que estava em causa a consideração de custos, constituição de provisões para processos judiciais em curso, leva a que os Acórdãos, recorrido e fundamento, não perfilhem solução jurídica diferente quanto à mesma questão fundamental de direito.
4. No Ac. fundamento o princípio da justiça foi considerado prevalecente sobre o princípio da especialização dos exercícios, porque "a seguir o entendimento da Fazenda Pública, no sentido de que a referida provisão haveria de ser criada desde 1989, no ano de 2009, em que a Administração Fiscal procedeu às correcções impugnadas, já a impugnante não poderia proceder à revisão da autoliquidação de 1989, por há muito estar ultrapassado o respectivo prazo para o fazer, vendo-se assim impossibilitada de efectuar a dedução desse custo em qualquer dos anos.
Numa situação destas, em que não seja possível a "correcção simétrica”, por razões de tempestividade, a doutrina (Neste sentido Lei Geral Tributária Anotada, Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, 4a edição, Encontro da Escrita, pág. 454 e Rui Duarte Morais, ob. citada, pag. 70.) e a jurisprudência supracitadas vêem afirmando que o custo, ainda que indevidamente contabilizado, deve ser aceite, nomeadamente quando a respectiva imputação não tenha resultado de omissões voluntárias e intencionais, com vista a operar transferência de resultados entre exercícios.”
5. Pelo contrário, no Ac. recorrido entendeu-se que, com base no regime de benefícios fiscais do RFAI e "Relativamente aos períodos de tributação que estão em causa, no caso em análise (2011 a 2014), subsiste, por conseguinte, uma regra de imputação do benefício fiscal ao exercício em que ocorreu o investimento e que surge apenas mitigada pela possível repercussão das importâncias a deduzir nos exercícios seguintes, quando não seja possível deduzir integralmente o benefício no ano em que tenha sido realizado o investimento.”
6. E que, sendo esse o regime legal, a AT encontrava-se " igualmente vinculada ao princípio da legalidade (artigo 55.º da LGT)” não podendo "desrespeitar a previsão legal e, mormente, as normas de incidência dos benefícios fiscais, apenas podendo fazer intervir o princípio da justiça em situações de que possa dispor de alguma margem de livre apreciação. E, nesse condicionalismo, cabia ao sujeito passivo accionar os mecanismos procedimentais que permitissem uma reavaliação da situação fiscal por parte da Administração Tributária."
7. Ou seja, foi porque a AT estava legalmente vinculada às regras de atribuição do benefício que in casu se considerou que não havia violação do princípio da justiça, por a ele não poder recorrer a AT no caso em concreto.
8. Ora, esta consideração, de um regime legal do benefício fiscal, tendo em conta o princípio da justiça, não foi nem poderia ter sido considerada no Ac. fundamento, por aqui não estar em causa a “periodização” de um benefício fiscal e nem o regime legal pelo qual essa mesma “periodização” se rege.
9. Não tem, pois, a recorrente qualquer razão quando alega que Ac. recorrido e Ac. fundamento decidiram diferentemente quanto ao critério /momento para determinar a prevalência do princípio da justiça versus especialização de exercícios.
10. Porquanto, a determinação desse critério/momento, se outras circunstâncias não bastassem (como a diferente situação factual e diferente consideração de normas) é até completamente irrelevante para o Ac. recorrido ao concluir que a AT nem sequer podia proceder de acordo com esse princípio.
Nestes termos, e nos mais de direito, deve o presente recurso para uniformização de jurisprudência ser julgado findo, não se tomando conhecimento do mesmo, por não se encontrarem reunidos os requisitos que permitem a admissão do recurso para efeitos de uniformização de jurisprudência, nos termos do disposto no artigo 152.º do CPTA.
Caso assim não se entenda, deverá o presente recurso ser julgado totalmente improcedente, com todas as legais consequências.

3 - O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de que o recurso não deve ser admitido por não reunir os pressupostos legais previstos no artigo 152.º do CPTA.

4 - Notificadas as partes do teor desse parecer nada disseram.

5 - Substituídos os vistos legais pela entrega das competentes cópias aos Ex.mos Juízes Conselheiros Adjuntos, vem para decisão em conferência.


II – Fundamentação

1. De facto
Na decisão arbitral recorrida deu-se como assente a seguinte factualidade concreta:
A) A Requerente é uma sociedade cuja principal actividade consiste na importação, exportação, fabrico, comercialização e distribuição de soluções, produtos farmacêuticos e hospitalares e é tributada ao abrigo do Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades, apresentando-se como a sociedade dominante do Grupo A……….. do qual faz parte a sociedade B………….. S.A.;
B) Em 28 de Maio de 2015, a Requerente submeteu a declaração Modelo 22, referente ao exercício de 2014, na qual declarou matéria colectável no valor de € 8.653.697,30, deduziu benefícios fiscais no valor de € 826.668,27 e apurou um total de imposto a recuperar no valor de € 1.664.645,24;
C) Em 27 de Maio de 2016, a Requerente apresentou uma declaração substitutiva em que deduziu benefícios fiscais no valor de € 1.772.399,49, por força do acréscimo das deduções à colecta, ao abrigo do Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI), de € 329.170,93 para € 1.640.037,92, pela sociedade participada, e de que resultou um valor de IRC a recuperar adicionalmente de € 945.731,22;
D) Em 5 de Março de 2013, a B……….. S.A. celebrou com o Estado Português, representado pela AICEP, ao abrigo do disposto artigo 9.º do Código Fiscal de Investimento, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 249/2009, de 23 de Setembro, um contrato fiscal de investimento - que constitui o documento n.º 8 junto com a petição e aqui se dá como reproduzido -, que produzia efeitos a partir de 17 de Maio de 2012 e vigorava entre 5 de Março de 2013 e 31 de Dezembro de 2020, ao abrigo do qual lhe foi concedido beneficio fiscal contratual, temporário e condicionado ao projecto de investimento aí considerado;
E) Em 8 de Janeiro de 2016, a B………. apresentou junto da AICEP pedido formal de desistência do contrato fiscal de investimento - que constitui o documento n.º 9 junto com a petição e aqui se dá como reproduzido -, alegando, em síntese, que: (a) à data da entrega da candidatura o período de vigência do RFAI (2009) ainda não havia sido prorrogado, pelo não procurou obter cofinanciamento público no âmbito deste último regime; (b) a vigência do RFAI (2009), com extensão aos exercícios compreendidos entre 2013 e 2017, só foi prorrogada com a publicação da Lei do Orçamento de Estado para 2013; (c) a execução do contrato levou a B………. a optar pelo regime fiscal mais vantajoso; (d) nunca usufruiu de qualquer incentivo fiscal relativo ao contrato em causa.
F) Em 3 de Janeiro de 2017, por Resolução do Conselho de Ministros n.º 11/2017, publicada no Diário da República, 1.ª série, n.º 2, foi declarada “a resolução do contrato fiscal de investimento celebrado entre o Estado Português, representado pela AICEP, E.P.E., e a B………….., S.A., por desistência da empresa cocontratante;
G) Em 13 de Maio de 2016, a B……….. apresentou uma declaração substitutiva em que incluiu na dotação do período de 2014 o valor de incentivo fiscal em RFAI resultante da adição de bens de investimentos nos exercícios de 2011, 2012 e 2013, e que determinou um acréscimo total de € 1.310.866,99;
H) Na sequência da declaração de substituição a que se refere a antecedente alínea B), a Autoridade Tributária desencadeou uma acção inspectiva, titulada pela Ordem de Serviço n.º OI201800987, que determinou um acréscimo da matéria colectável de € 8.653.697,31 para € 8.713.697,31, e um decréscimo das deduções à colecta, a título de benefício fiscal de RFAI, de € 951.327,62;
I) As correcções aritméticas encontram-se fundamentadas nos seguintes termos:
III.1.2 Análise dos valores da DRM22 vigente (Grupo)
(...)
Os elementos apresentados pelo SP permitiram concluir que no valor dotação (RFAI) do período da declaração do Grupo do exercício de 2014 o SP inclui indevidamente valores de benefício (RFAI) relativos aos exercícios de 2011, 2012 e 2013 da sociedade dominada B………… SA, ascendendo o valor da dotação de 2014 apenas a 688.710,30€.
Da análise dos valores das declarações do grupo nos exercícios de 2011 e 2012 verificou-se que, nestes exercícios, por insuficiência de coleta, o SP não podia ter deduzido os benefícios fiscais relativos aos investimentos realizados abrangidos pelo RFAI, sendo aqueles necessariamente reportados para os exercícios seguintes, nos termos da legislação em vigor.
De acordo com a regra definida no art.º 23.º, n.º 2 do RFAI, o benefício opera por dedução à coleta no exercício em que ocorre o investimento, podendo aquele, por insuficiência da coleta, ser deduzido nos exercícios posteriores, nos termos do art.º 3, n.º 3 daquele regime.
No exercício de 2013, a coleta apurada pelo Grupo permitia a dedução dos benefícios fiscais reportados de 2011 e 2012 bem como a dedução dos benefícios do próprio exercício de 2013.
De facto, como demonstra no quadro seguinte, a coleta de IRC da sociedade dominada no exercício de 2013 (A) era suficiente para acomodar quer o valor dos benefícios do RFAI transitados de 2011 e 2012 (por insuficiência de coleta, nos termos do art.º 3º, n.º 3 do RFAI) [∑B] quer o valor do benefício do RFAI do próprio exercício de 2013 [B+C de 2013], em cumprimento do limite previsto no art.º 8°, n.º 1 (50% da coleta, em 2013) [D] e das regras previstas no art.º 3°, n.º 3 do RFAI 2011/2012, art.º 23°, n°s 3 do CFI (RFAI 2013: “Quando a dedução referida no número anterior não possa ser efetuada integralmente por insuficiência de coleta, a importância ainda não deduzida pode sê-lo, nas mesmas condições, nas liquidações dos cinco exercícios seguintes.” (ou seja, [D]>[E]; 50% x 4.084.207,42€ = 2.042.103,71€ > 1.022.260,63€).
A…………. (Liquidação IRC Grupo - RETGS)
Cálculo do Imposto - Q10 DR M22


Sendo a coleta do Grupo do exercício de 2013 suficiente, deveria o SP, enquanto sociedade dominante, relativamente àquele exercício, ter promovido a dedução à coleta de IRC dos benefícios decorrentes do RFAI a que tinha direito - quer os transitados, por falta de coleta, de 2011 e 2012, quer os do próprio exercício de 2013 - o que não fez, mantendo inalterados os valores declarados na DR M22 desse exercício e tendo substituído apenas DR M22 dos exercícios de 2011, 2012 e 2013. Verificou-se, assim, que os valores indicados na declaração de substituição DR M22 do Grupo relativos a benefícios fiscais (RFAI) - quer os relativos à dotação quer os relativos à dedução do período - não se mostram corretos, sendo apurados no ponto seguinte a correção devida no cálculo do imposto.
III.2 RETGS - Correção ao Resultado Fiscal e ao valor dos Benefícios Fiscais
No seguimento do procedimento de inspeção externo ao exercício de 2014 à sociedade “B…………… SA”, realizado ao abrigo da Ordem de Serviço OI201800642 (no anexo III.2-1 apresenta-se cópia do respetivo relatório de inspeção tributária), procedeu-se à correção do Resultado Fiscal declarado por aquela sociedade bem como à correção do valor dos Benefícios Fiscais dedutíveis à coleta de IRC, conforme se descrimina nos quadros seguintes:
B…….. SA. OI201800642
Correções à Matéria Coletável

No âmbito do procedimento inspetivo à sociedade B……….., no qual foram efetuadas correções na declaração individual, foi a mesma notificada para exercer o direito de audição sobre as referidas correções, nos termos do artigo 60.º da LGT e do artigo 60.º do RCPITA, o que fez a 23 de novembro de 2018.
Após o decurso do prazo para o exercício do direito de audição e a sua análise, foi redigido e notificado à sociedade B………… SA, o relatório final de inspeção tributária, nos termos do art.º 62° do RCPITA, tendo sido então promovido o respetivo documento de correção único (DCU) à DRM22 daquela sociedade, refletindo as correções efetuadas.
Pelo facto da B…………… SA se encontrar incluída no perímetro do grupo de sociedades “A………. Portugal” e este estar sujeito ao RETGS, definido no artigo 69.º do CIRC, as correções ao resultado individual da “B…………… SA”, anteriormente descritos, têm influência no cálculo da “Soma Algébrica dos Resultados Fiscais” do Grupo, base inicial para o apuramento do imposto a pagar pelo Grupo, de acordo com o definido no artigo 70.º do CIRC, pelo que há que acrescer ao resultado fiscal do grupo o montante de 60.000,00€, apurando-se os seguintes valores:
Apuramento da Matéria Coletável - Q09 – RETGS

Nota: O valor constante do quadro corresponde ao somatório dos resultados fiscais individuais (8.653.697,31€) tendo, contudo, o SP inscrito no C380 do Q09 da M22 o valor de 8.653.697,30€ (menos 0,01€), o que aqui se corrige.
As correções efetuadas ao valor dos Benefícios Fiscais relativo ao RFAI - Regime Fiscal de Apoio ao investimento, dedutíveis à coleta de IRC, os quais de reduziram, na B………. SA, de 1.640.037,92€ para 688.710,30€, ascendem a 951.327,62€, tendo reflexo no valor dedutível deste benefício na esfera do Grupo.
O valor da “Dotação do Período” do RFAI [DR M22 - Anexo D – Q07 –C714] vê-se assim alterado de 1.840.037,92€ para 688.710,30€ e o valor da “Dedução do Período” [DR M22 - Anexo D – Q07 – C7115] de 1.274.902,15€ para 688.710,30€ (atento o limite previsto no art.º 23º, n.º 2 al. B) do CFI).
Em resultado das correções anteriormente descritas são propostas as seguintes correções aritméticas aos benefícios fiscais declarados (Anexo D) e ao cálculo do imposto para o exercício de 2014 na declaração M22 do Grupo, conforme se descrimina nos quadros seguintes:

J) Na sequência da declaração de substituição a que se refere a antecedente alínea G), a Autoridade Tributária iniciou uma acção inspectiva relativa ao período de 2014, titulado pela Ordem de Serviço OI201800642, que determinou a correcção da matéria colectável por dedução de gastos não fiscalmente aceites no valor de € 15.149.078,51 e por dedução indevida de benefícios fiscais, no valor de € 951.327,62;
K) As correcções aritméticas encontram-se fundamentadas nos seguintes termos:
III.1.4 Enquadramento Legal dos benefícios fiscais considerados pelo SP
III.1.4.1 - Investimento realizado no exercício em análise (2014)
Os benefícios fiscais são medidas de carácter excecional, instituídas para tutela de interesses públicos extra fiscais relevantes que sejam superiores aos da tributação e que impedem e que consubstanciam, antes de mais, factos que estando sujeitos a tributação, são impeditivos do nascimento da obrigação tributária ou, pelo menos, de que a mesma surja em plenitude (n.º 1 do artigo 2, do EBF).
A extinção ou falta de pressupostos de aplicação dos Incentivos fiscais tem por efeito imediato a sua reposição (n.º 1 do art.° 14 do EBF).
O RFAI relevante para o exercício de 2014 consta do capítulo III - artigos 22º a 26º do CFI, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 162/2014 de 31 de outubro.
Para efeitos deste incentivo fiscal, consideram-se aplicações relevantes os investimentos nos seguintes ativos, desde que afetos a exploração da empresa (n.º 2 do artigo 22º do CFI)
a) Ativos fixos tangíveis, adquiridos em estado de novo, com exceção de:
i) Terrenos, salvo no caso de se destinarem à exploração de concessões mineiras, águas minerais naturais e de nascente, pedreiras, barreiros e areeiros em investimentos na indústria extrativa;
ii) Construção, aquisição, reparação e ampliação de quaisquer edifícios, salvo se forem instalações fabris ou afetos a atividades turísticas, de produção de audiovisual ou administrativas;
iii) Viaturas ligeiras de passageiros ou mistas;
iv) Mobiliário e artigos de conforto ou decoração, salvo equipamento hoteleiro afeto a exploração turística;
v) Equipamentos sociais:
vi) Outros bens de investimento que não estejam afetos à exploração da empresa.
Nos termos dos n.ºs 5 e 6 do art.º 22º do CFI, "Considera-se investimento realizado o correspondente às adições, verificadas em cada período de tributação, de ativos fixos tangíveis e ativos intangíveis e bem assim o que, tendo a natureza de ativo fixo tangível e não dizendo respeito a adiantamentos, se traduza em adições aos investimentos em curso.”, não se considerando "as adições de ativas que resultem de transferências de investimentos em curso transitado de períodos anteriores, exceto se forem adiantamentos”.
Ou seja, para um determinado período, não pode ser considerado como dotação do período a adição de ativos resultantes de investimentos efetuados em períodos anteriores (exceto nas condições do n.º 6 do referido art.º 22).
Pelo que, no caso em apreço, para efeitos do cálculo da dotação do período de 2014, apenas pode ser considerado o valor de benefício fiscal resultante do “investimento realizado'' nos termos do n.º 5 do artigo 22° do CFI, ou seja, o correspondente às adições realizadas nesse período de tributação.
Em função do montante das aplicações consideradas relevantes, o CFI estabelece que os sujeitos passivos possam deduzir à coleta de IRC uma percentagem do valor das “aplicações relevantes”, de acordo com as regras previstas no art.° 23 do CFI, dedução essa "(...) efetuada na liquidação de IRC respeitante ao período de tributação em que sejam realizadas as aplicações relevantes (...)" (art.º 23º, n°s 2 do CFI).
E apenas por insuficiência da coleta do exercício em questão é que a referida dedução pode ser deduzida a coleta de IRC de exercícios posteriores (n.° 3 do artigo 23º do CFI).
III1.5 Correção Fiscal Proposta
Dos factos descritos nos pontos anteriores, concluiu-se que a B……….. declarou como dotação do período - RFAI 2014, um valor de incentivo fiscal resultante da adição de bens de investimentos cuja aquisição ocorreu em exercícios anteriores: 2011, 2012 e 2013.
Esta situação decorreu em virtude do SP, em 2016, após o encerramento contabilístico e fiscal dos exercícios de 2011, 2012 e 2013, ter alterado de forma retroativa a opção que havia efetuado relativamente ao enquadramento de tais bens em sede de benefícios fiscais.
As condições e prazos em que os contribuintes podem proceder à substituição das declarações fiscais enviadas à AT e dos valores nelas declarados, para um determinado período de tributação, estão legalmente estabelecidas, devendo estas ser cumpridas quando seja necessário corrigir os elementos previamente declarados. Não podem os SPs, - como efetuou a B…….... - proceder a tais correções numa DR de exercício posterior como sendo referentes a esse mesmo exercício.
O procedimento adotado pela B………… contraria o normativo contabilístico e fiscal em vigor, nomeadamente com o regime de acréscimo - periodização económica, constante do §22 da Estrutura Conceptual do SNC, com o artigo 8º - "Período de tributação” e 18º "Periodização do lucro tributável", ambos do CIRC.
Ainda que este procedimento decorresse das normas legais (o que não se verifica), não pode ser considerado como "dotação do período” de 2014 o benefício fiscal decorrente da aquisição de bens efetuadas em exercícios anteriores (ainda que para o seu cálculo se considerasse a legislação à data).
O n.º 5 do artigo 22° do CFI estabelece que, para efeitos de dotação do período de 2014, apenas pode ser considerado o valor de benefício fiscal resultante do "investimento realizado” nesse exercício. O benefício fiscal RFAI decorrente da aquisição de ativos de exercícios anteriores, não pode ser considerado para efeitos de dotação do período de RFAI de 2014.
A determinação/cálculo do benefício fiscal - RFAI, o limite de dedução à coleta de IRC e o prazo de reporte para períodos subsequentes estabelecidos para 2014 são diferente das normas previstas para o exercício de 2013 (CFI aprovado pelo Decreto- Lei n.° 249/2009) e estas, por sua vez, são diferentes das normas instituídas para os exercícios de 2011 e 2012 (art.º 13.º da Lei n.º 10/2009, de 10 de março, 55-A/2010, de 31 de dezembro, 64-B/2011, de 30 de dezembro).
Nos exercícios de 2011 e 2012, os sujeitos passivos podiam considerar um benefício fiscal - RFAI correspondente a 20% do valor das aplicações consideradas relevantes para efeitos de RFAI (para investimentos até 5ME). Este valor podia ser deduzido até à concorrência de 25% da coleta de IRC e, quando por insuficiência de coleta esta dedução não pudesse ser efetuada integralmente, poderia ser ainda deduzida nas liquidações dos 4 períodos de tributação seguintes (sem prejuízo, nos exercícios de 2011 e 2012, das limitações constantes do artigo 92° do CIRC). No exercício de 2013, o limite da dedução foi aumentado para 50% da coleta e o reporte do eventual excesso da dedução a coleta alargado para os 5 exercícios seguintes. Para 2014, o valor do benefício fiscal - RFAI corresponde a 25% do valor das aplicações relevantes (e não 20%, como até 2013) e pode ser deduzido até à concorrência de 50% da coleta de IRC (e já não 25%, como em 2011 e 2012). O incentivo fiscal que não fosse assim deduzido, por insuficiência da coleta de IRC, pode deduzir-se nas liquidações dos 10 períodos de tributação seguintes (e não apenas 4, como em 2011 e 2012, ou 5, como em 2013). Por seu lado, nos exercícios de 2013 e 2014, o RFAI não estava sujeito aos limites constantes do artigo 92° do CIRC.
Pelo que as alterações ao regime legal do RFAI ocorridas ao longo dos exercícios de 2011 a 2013, não podem ser desconsideradas na análise da opção tomada pela B………… SA.
Assim, e para efeitos de determinação do benefício fiscal - RFAI de 2014, conclui-se que apenas pode ser considerado o benefício fiscal correspondente às adições de ativos fixos tangíveis e ativos intangíveis (n.° 5 e 6 do artigo 22° do CFI) verificadas neste período de tributação, 2014, por se encontrarem cumpridas as condições previstas no art.° 22° do CFI.
L) A Autoridade Tributária emitiu a Nota de Liquidação de IRC n.° 20188500032044, relativa ao exercício de 2014 e a Demonstração de Acerto de Contas n.° 201800010385757), que constituem o documento n.º 1 junto com a petição;
M) A Requerente prestou garantia bancária para obter a suspensão do processo de execução fiscal instaurado pelo não pagamento no prazo legal da nota de liquidação.

A decisão arbitral na qual a recorrente se apoia como fundamento do recurso de uniformização de jurisprudência, deu como assente a seguinte factualidade concreta:
1 - A impugnante foi objeto de uma inspeção tributária relativamente aos exercícios de 2004 e 2005, cfr. relatório constante destes autos de fls. 8 a 75 e que aqui se dão por reproduzidas.
2 - Dessa inspeção, resultou entre outras, uma correção em sede de IRC do ano de 2004 no valor de € 813.903,13 e ora impugnada.
3 - Os fundamentos para a dita correção referida em 2), encontram-se exarados no relatório constante destes autos de fls. 58 a 75 e cujos extratos a seguir se transcrevem relativamente às questões que a impugnante discorda: "(...) Desde o ano de 1989 que corria contra a C………… Lda. um processo contencioso no Tribunal de Trabalho de Santa Maria da Feira, instaurado pelo seu funcionário D………., que fez parte dos seus quadros desde 03-01- 77 até 02-09-87, altura em que foi suspenso das suas funções de director. (...) Em 12-07-88 o referido director foi despedido da empresa. Por acção requerida por D………….., que correu termos no Tribunal de St. Maria da Feira veio este colaborador, solicitar a sua reinserção nos quadros da empresa. A data da 1ª sentença foi de 22-03-91, em que foi considerado procedente o pedido de D…………. Dando-se como provado que este usufruía, nessa data, de acordo com a sentença proferida em 22-03-91 as seguintes remunerações: (...) A C……… contabilizou em 2004 na conta ……… - Outros Custos e Perdas Extraordinárias o valor de € 813.903,13, referente ao processo judiciai relativo ao antigo colaborador D……… que saiu da empresa (...) em 1987. (...) O sujeito passivo constitui provisões contabilísticas no exercício de 1991 no valor de € 374.098,00, reforçando-as em 1993 em mais € 124.699,00. (... ) No ano de 2004 anulou o montante provisionado de € 498.797,00 (...) A C………… considerou custo fiscal do exercício de 2004, relevando na conta ………. (0 valor total de € 813.903,13 referente ao processo judicial envolvendo D………. (...) Como relatamos anteriormente, este processo judicial teve o seu início em 1989. (...) Nesta medida, sendo conhecida do sujeito passivo desde 1989 a instauração contra ele de um processo judicial, bem como a existência das sentenças desfavoráveis de 1991 e 2001, o encargo em questão era mais do que provável, quase certo e perfeitamente quantificável, pelo que fica afastado o carácter de imprevisibilidade do mesmo. (...) No que respeita a processos judiciais intentados contra um qualquer sujeito passivo, a concretização do principio da especialização, aliado ao princípio da prudência, opera-se através da constituição de uma provisão para processos judiciais em curso, que é aceite fiscalmente, no âmbito da actual alínea c) do n° 1 do art° 34º do CIRC.
(...) No caso em apreço a criação da provisão com efeitos fiscais justifica-se desde 1989.Dado que a decisão judicial de 2001 ascendeu ao valor de 189.595,950 (€ 945.700,61), acrescido dos descontos legais, a referida provisão deveria, em termos acumulados atingir, pelo menos, o valor referido. Desta forma o custo em questão seria imputável aos exercícios a que respeitam, cumprindo-se o princípio da especialização dos exercícios (...) Ao considerar o custo (...) como integralmente imputável ao exercício de 2004, o sujeito passivo não deu cumprimento ao princípio da especialização dos exercícios previsto no art° 18° do CIRC. (...) Em face do exposto, efectuou-se o acréscimo ao lucro tributável declarado pelo grupo no exercício de 2004, (...) pelo valor de 813.903,13, por, por um lado, respeitar a encargos com a prática de infracções e, por outro, por não respeitara periodização do lucro tributável, respectivamente (...)".
6 - D…………., foi trabalhador da impugnante de onde foi despedido em 12.07.1988.
7 - O despedimento deu origem a um litígio judicial que decorreu entre 1989 e 2004.
8 - Após a apresentação de recursos nas respetivas instâncias até ao Supremo Tribunal de Justiça, foi proferido acórdão no sentido de dar razão parcial ao trabalhador identificado em 6).
9 - O pedido inicial de € 1.057.079,53, decaiu para € 557.449,61, conforme acórdão do STJ de 20.01.2004 — processo 1399/03 - 4 e constante do documento n° 3 que se encontra junto à petição inicial e que se dá aqui por integralmente reproduzido.
10 - A impugnante foi condenada em 20.01.2004 a pagar ao trabalhador a importância de € 557.499,61 a título de indemnização, bem como juros e contribuições para a segurança social, perfazendo um total de € 813.903,13.
11 - impugnante pagou a importância referida em 10, no ano de 2004.
12 - O recurso hierárquico apresentado pela ora impugnante foi totalmente indeferido, conforme despacho proferido em 10.09.2009 e constante destes autos de fls. 35 a 38 e que aqui se dão por reproduzidas.
13 - Dá-se aqui por reproduzida a sentença proferida no Tribunal de Trabalho de Santa Maria da Feira, o acórdão proferido no Tribunal da Relação do Porto e o acórdão proferido no Supremo Tribunal de Justiça e constantes destes autos de fls. 193 a 356.
14 - Dá-se aqui por reproduzido o despacho proferido no recurso hierárquico apresentado pela impugnante contra as correções do ano de 2005 e constante destes autos de fls. 150 a 184.
15 - A petição inicial foi apresentada em 31 de Outubro de 2010, cfr. fls. 2 destes autos.


III. De direito

1. Da admissibilidade do recurso

1.1. Constituem requisitos de admissibilidade do presente recurso à data em que o mesmo foi interposto:
1.º que a decisão arbitral se tenha pronunciado sobre o mérito da pretensão deduzida e tenha posto termo ao processo arbitral (artigo 25.º, n.º 2, primeira parte, do Regime Jurídico da Arbitragem em matéria Tributária – doravante identificado pela sigla “RJAT”);
2.º que esteja em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo (artigo 25.º, n.º 2, segunda parte, do mesmo diploma);
3.º que a orientação perfilhada na decisão arbitral não esteja de acordo com a jurisprudência mais recente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo [artigo 152.º, n.º 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, aplicável a coberto do n.º 3 do artigo 25.º daquele outro diploma].
4.º que o acórdão fundamento tenha transitado em julgado (artigo 688.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, aplicável por força do disposto no artigo 140.º, n.º 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e do 281.º do CPPT).
Entende-se que é a mesma a questão fundamental de direito quando:
i) as situações fácticas em ambos os arestos sejam substancialmente idênticas, entendendo-se, como tal, para este efeito, as que sejam subsumidas às mesmas normas legais;
ii) o quadro legislativo seja também substancialmente idêntico, o que sucederá quando seja o mesmo o regime jurídico aplicável ou quando as alterações legislativas a relevar num dos acórdãos não interfira, nem directa nem indirectamente, na resolução da questão de direito controvertida.
Finalmente, entende-se que os dois acórdãos estão em oposição entre si quando se opõem as decisões respectivas (e já não será assim quando apenas se oponham os seus fundamentos).
Atenta a complexidade destes requisitos o legislador impõe, além do mais, que na petição do recurso sejam identificados, de forma precisa e circunstanciada, os aspectos de identidade que determinam a contradição alegada – n.º 2 do artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, aplicável por força do n.º 3 do artigo 25.º do RJAT (e que reproduz o que actualmente consta do n.º 2 do artigo 284.º do Código do Procedimento e do Processo Tributário).
Cumpre analisar se estão verificados estes pressupostos de admissão do recurso.

Ora, como iremos demonstrar, não existe, in casu, identidade quanto à questão fundamental de direito. E não se trata apenas de uma diferença no quadro factual – diferença que, de resto, bem reconhece a própria recorrente – mas sim de uma diferença substancial entre as questões analisadas a decididas nos arestos em confronto.

Senão vejamos.

1.2. A decisão arbitral recorrida respeita ao problema da dedução à colecta de IRC de valores apurados em sede do benefício fiscal RFAI (resultante de investimentos em activos afectos à exploração da empresa). Mais concretamente, cuida da interpretação e aplicação do disposto nos artigos 22.º, n.º 5 e 23.º, n.º 2 do Código Fiscal do Investimento, dos quais decorre, como determinou a AT em sede de inspecção tributária, que, havendo a possibilidade (como se provou existir) de deduzir os montantes de investimento realizado em 2011, 2012 (neste caso o montante correspondente ao reporte do excesso não dedutível à colecta daqueles anos) e 2013 à colecta de IRC de 2013, não é admissível a sua dedução à colecta de 2014.

1.3. Já o acórdão fundamento deste Supremo Tribunal Administrativo analisou um caso relativo à necessidade de constituição de uma provisão para processos judiciais em curso, por, no entender da AT, não dever admitir-se a imputação total do custo da indemnização laboral em que a empresa veio a ser condenada no ano em que se executava a sentença condenatória.

1.4. Ora, resulta do anteriormente exposto que o que está em discussão na decisão arbitral recorrida é, na verdade, a admissibilidade ou não de sobrepor o princípio da justiça às regras relativas à dedução e reporte do benefício fiscal RFAI à colecta de IRC, ao passo que no acórdão fundamento se discutiu a questão da sobreposição daquele princípio ao princípio da especialidade dos exercícios para efeitos de dedução de um custo fiscal relativo a decisão judicial que condenou o sujeito passivo em quantia devida em acção laboral, caso se entendesse que haveria, naquela situação, obrigação a constituir provisões desde a data da propositura da acção pelo trabalhador.
Não se trata, por isso, de uma mera diferença a respeito do quadro factual; diferença que não deva relevar para o recorte da “identidade da questão fundamental de direito”, que seria a derrogação do princípio da especialidade dos exercícios em situações de injustiça manifesta, como alega a Recorrente.
Trata-se sim de uma diferença na questão fundamental de direito, tendo em conta que não é possível comparar a efectividade do princípio da justiça na derrogação do princípio da especialidade dos exercícios (como sucede no acórdão fundamento), com a sua efectividade na derrogação das regras relativas à dedução e reporte do benefício fiscal do RFAI (como sucede na decisão arbitral recorrida), pois estamos até perante uma factualidade que não é subsumível às mesmas normas legais.



IV. Decisão
Em face do exposto, os juízes do Pleno da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam em não tomar conhecimento do recurso.


Custas pela Recorrente.
Registe-se, notifique-se e comunique-se ao CAAD.

Lisboa, 20 de Janeiro de 2021

A relatora consigna e atesta que, nos termos do disposto no artigo 15.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março, aditado pelo artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1 de Maio, tem voto de conformidade com o presente acórdão dos Senhores Juízes Conselheiros Isabel Cristina Mota Marques da Silva, Francisco António Pedrosa de Areal Rothes, Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia, José Gomes Correia, Joaquim Manuel Charneca Condesso, Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos, Aníbal Augusto Ruivo Ferraz, Paulo José Rodrigues Antunes, Gustavo Lopes Courinha, Paula Fernanda Cadilhe Ribeiro, Pedro Nuno Pinto Vergueiro, Anabela Ferreira Alves e Russo.

Suzana Tavares da Silva (relatora)