Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0141/19.0BEBJA
Data do Acordão:09/09/2021
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:CARLOS CARVALHO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
PROVIDÊNCIA CAUTELAR
SUSPENSÃO DE EFICÁCIA
EMBARGO DE OBRA
CADUCIDADE
ADMISSÃO DO RECURSO
Sumário:É de admitir a revista centrada em questão que se revela dotada de relevância jurídica fundamental, porquanto, além de complexa, assume também carácter paradigmático e exemplar, visto suscetível de poder projetar-se ou de ser transponível para outras situações similares, apresentando, desta feita, interesse para a comunidade jurídica.
Nº Convencional:JSTA000P28132
Nº do Documento:SA1202109090141/19
Data de Entrada:07/20/2021
Recorrente:A..................., LDA
Recorrido 1:MINISTÉRIO DO AMBIENTE E DA TRANSIÇÃO ENERGÉTICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

1. A………., Lda., invocando o disposto no art. 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos [CPTA], peticiona a admissão do recurso de revista por si interposto do acórdão de 20.05.2021 do Tribunal Central Administrativo Sul [doravante TCA/S] [cfr. fls. 1929/1980 - paginação «SITAF» tal como as ulteriores referências à mesma, salvo expressa indicação em contrário], que negou provimento ao recurso pela mesma interposto e que manteve a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja [doravante TAF/BJA] que havia julgado improcedente a pretensão cautelar deduzida contra o MINISTÉRIO DO AMBIENTE E DA TRANSIÇÃO ENERGÉTICA de suspensão de eficácia do despacho da Secretária de Estado do Ordenamento do Território e da Conservação da Natureza, de 21.12.2018, que determinou o embargo das obras em curso no lote n.º ….. do “……………..”, em Grândola, de que a Recorrente é proprietária.

2. Motiva a necessidade de admissão do recurso de revista [cfr. fls. 1989/2060], na existência de questões jurídicas e sociais que reputa de fundamentais [relativas, por um lado, ao regime aplicável ao prazo de caducidade do embargo decretado no âmbito de medidas preventivas proferidas ao abrigo do RJIGT, e, por outro lado, quer às consequência da falta de impugnação especificada dos factos alegados pelo demandante em processo cautelar, nos termos do art. 118.º, n.º 2, do CPTA, e dos limites de tal prova por admissão, quer à interpretação dos conceitos de “fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal” e da inerente valoração de ordem jurídica dos factos subjacentes a tal respeito em processos cautelares referentes à suspensão de ordens de embargo] e para efeitos de uma «melhor aplicação do direito» [fundada no: i) erro de julgamento dada a violação do disposto, nomeadamente, nos arts. 144.º do RJIGT, e 104.º, n.º 2 do RJUE, e em interpretação que infringe os arts. 02.º, 17.º, 18.º, n.º 2, 62.º, n.º 1, e 266.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa (CRP) e, bem assim, do demais quadro principiológico invocado; e, ii) erro de julgamento mercê da incorreta aplicação dos arts. 118.º, n.º 2, e 120.º, n.º 1, ambos do CPTA], pugnando pelo deferimento da pretensão cautelar requerida já que preenchidos os requisitos previstos nos n.ºs 1 e 2 do art. 120.º do CPTA.

3. O ente requerido devidamente notificado não produziu contra-alegações [cfr. fls. 2067 e segs.].
Apreciando:

4. Dispõe-se no n.º 1 do art. 150.º do CPTA que «[d]as decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

5. Do referido preceito extrai-se, assim, que as decisões proferidas pelos TCA’s no uso dos poderes conferidos pelo art. 149.º do CPTA, conhecendo em segundo grau de jurisdição, não são, em regra, suscetíveis de recurso ordinário, dado a sua admissibilidade apenas poder ter lugar quando: i) esteja em causa apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, revista de importância fundamental; ou, ii) o recurso revelar ser claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

6. O TAF/BJA negou a tutela cautelar peticionada pela aqui recorrente, tendo considerado que in casu não estava preenchido o requisito do periculum in mora previsto e exigido pelo n.º 1 do art. 120.º do CPTA [cfr. fls. 661/672].

7. O TCA/S desatendeu o pedido de caducidade do embargo das obras de construção e decorrente pedido de extinção da instância, tendo, no mais, negado provimento do recurso de apelação que lhe foi dirigido [fundado: nulidade de decisão; erro julgamento (de facto e de direito)], mantendo a decisão do TAF/BJA.

8. A requerente cautelar, aqui ora recorrente, funda a necessidade de admissão da presente revista na existência de relevantes questões jurídicas e sociais e para uma melhor aplicação do direito, acometendo-o de incurso em erro de julgamento, sustentando estarem verificados os requisitos para a decretação da providência.

9. Analisadas as quaestiones juris colocadas na presente revista ressalta que se quanto às questões suscitadas em torno do regime legal vertido nos arts. 118.º, n.º 2, e 120.º, n.º 1, do CPTA não se vislumbra ocorrer nas mesmas a exigida relevância fundamental já quanto à respeitante à caducidade do ato de embargo decretado a mesma revela-se, in casu, como dotada de relevância jurídica fundamental, porquanto além de complexa, dado envolver o cotejo e ponderação normativa e principiológica, assume também carácter paradigmático e exemplar, nela se verificando capacidade de expansão da controvérsia, visto suscetível de poder projetar-se ou de ser transponível para outras situações similares, apresentando, desta feita, interesse para a comunidade jurídica, o que legitima a admissão do recurso de revista como garantia de uniformização do direito nas vestes da sua aplicação prática.

10. Daí que se justifique a quebra da regra da excecionalidade supra enunciada e a admissão da revista, sendo que, recebido o recurso, o âmbito do seu conhecimento estender-se-á, como é óbvio, a todas as conclusões da respetiva minuta tendo presente sempre os limites definidos pelo art. 150.º do CPTA.

DECISÃO
Nestes termos e de harmonia com o disposto no art. 150.º do CPTA, acordam os juízes da formação de apreciação preliminar da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal em admitir a revista.
Sem custas.
D.N..

Lisboa, 09 de setembro de 2021
[O relator consigna e atesta, que nos termos do disposto no art. 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13.03, aditado pelo art. 03.º do DL n.º 20/2020, de 01.05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes integrantes da formação de julgamento, a Conselheira Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa e o Conselheiro José Augusto de Araújo Veloso] Carlos Luís Medeiros de Carvalho