Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0645/19.5BEBRG
Data do Acordão:07/09/2020
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:MADEIRA DOS SANTOS
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
BANCO DE PORTUGAL
CRÉDITOS
Sumário:Não é de admitir a revista do acórdão que julgou improcedente a impugnação do acto emanado do Banco de Portugal que, devido à condenação de um gerente da autora pela prática de seis crimes de abuso de confiança fiscal, indeferiu o pedido de que ela fosse autorizada a exercer a actividade de intermediária de créditos, se nada indicia que o autor do acto haja incorrido nalgum erro grosseiro ou manifesto ao activar as suas prerrogativas de avaliação na matéria.
Nº Convencional:JSTA000P26214
Nº do Documento:SA1202007090645/19
Data de Entrada:06/22/2020
Recorrente:A........., LDA.
Recorrido 1:BANCO DE PORTUGAL
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, no Supremo Tribunal Administrativo:

A……….., Ld.ª, interpôs esta revista do acórdão do TCA Norte que, revogando a sentença anulatória do TAF de Braga – proferida no meio cautelar instaurado pela recorrente contra o Banco de Portugal e onde se antecipara o conhecimento da causa principal – julgou improcedente a impugnação do acto que indeferira o pedido da autora de que fosse autorizada a exercer a actividade de intermediária de créditos, na categoria de crédito vinculado.

A recorrente pugna pelo recebimento da revista por ela incidir sobre uma questão relevante e mal decidida.
O Banco de Portugal contra-alegou, considerando a revista extemporânea e inadmissível.

Cumpre decidir.
«Ante omnia», consignamos já que a revista não foi extemporaneamente deduzida, tendo em conta a suspensão dos prazos judiciais, extensível aos «processos urgentes» e imposta pelo art. 7º, n.º 5, da Lei n.º 1-A/2020, de 19/3.
Em princípio, as decisões proferidas em 2.ª instância pelos TCA’s não são susceptíveis de recurso para o STA. Mas, excepcionalmente, tais decisões podem ser objecto de recurso de revista em duas hipóteses: quando estiver em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, assuma uma importância fundamental; ou quando a admissão da revista for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito («vide» o art. 150º, n.º 1, do CPTA).
«In casu», a autora e aqui recorrente instaurou um meio cautelar a fim de suspender a eficácia de um acto emanado do Banco de Portugal – que indeferiu o pedido dela, de autorização para exercer a actividade de intermediária de créditos, porque o seu gerente foi condenado pela prática de seis crimes de abuso de confiança fiscal – e impor provisoriamente ao requerido a emissão do «contrarius actus».
O TAF, antecipando o conhecimento da causa principal, considerou que aquelas condenações penais não justificavam o acto de indeferimento, pelo que julgou a acção procedente e condenou o réu a registar a autora como habilitada para o exercício da referida actividade de intermediação.
Mas o TCA entendeu que tal condenação do gerente da autora pela prática de crimes fiscais suportava logo um juízo de falta de idoneidade – pormenor que seria bastante para tornar o acto imune a um qualquer erro grosseiro ou manifesto. Ademais, e, porque ao Banco de Portugal compete avaliar este tipo de assuntos, nada apontaria para a ilegalidade do acto. Assim, o acórdão recorrido revogou a pronúncia do TAF e julgou a acção improcedente.
Na sua revista, a recorrente insurge-se contra o aresto dizendo, fundamentalmente, que as ditas condenações penais não trazem uma exclusão automática da idoneidade para intermediar créditos e, sobretudo, que não podem trazê-la perpetuamente.
Mas a recorrente não é persuasiva. Como o TCA explicou, o Banco de Portugal decidiu num domínio em que dispõe de prerrogativas de avaliação, ou seja, de uma liberdade avaliativa e decisória; de modo que a efectiva sindicabilidade do acto supunha que nele existisse um qualquer vício notório ou palmar – que as circunstâncias do caso não evidenciam.
Por outro lado, o acórdão «sub specie» disse – com manifesta plausibilidade – que o acto está temporalmente situado, pelo que não é interpretável no sentido de que introduziu um impedimento ou obstáculo «para sempre».
Assim, as «quaestiones juris» colocadas no recurso – aliás, desprovidas de uma complexidade impositiva da intervenção do Supremo – foram solucionadas pelo TCA Norte de maneira correcta ou, pelo menos, credível.
Pelo que deve prevalecer, neste processo, a regra da excepcionalidade das revistas.

Nestes termos, acordam em não admitir a revista.
Custas pela recorrente.

Lisboa, 9 de Julho de 2020. – Madeira dos Santos (relator; e, nos termos do artº 15º A do DL nº 10-A/2020, de 13/3, atesto que os Exmºs Juízes Adjuntos - os Srs. Conselheiros Teresa de Sousa e Carlos Carvalho - têm voto de conformidade).