Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0765/17
Data do Acordão:06/27/2018
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO DELGADO
Descritores:TAXA DE SANEAMENTO
ÁGUAS
Sumário:I - O Regulamento de Águas Residuais da Covilhã nº.26/2011, publicado em Diário da República, 2.ª Série, no dia 12/01/2011, ao prever o desdobramento da tarifa de saneamento em tarifas de tratamento e de drenagem, cobradas em conjunto com uma única contrapartida remuneratória daquelas duas componentes do serviço de saneamento, não conduz a uma duplicação de tarifas e de preços.
II - Sendo cobrada uma única tarifa pelo serviço de saneamento de águas residuais urbanas o Regulamento em causa não se afasta ou diverge dos parâmetros que se induzem do diploma legal habilitante que autoriza os municípios a cobrarem taxas locais correspondentes à contrapartida remuneratória pela prestação dos referidos serviços públicos (artº 16º, nº 3, al. b) da Lei da Finanças Locais - Lei 2/2007, de 15/01), como também não permite ou autoriza a cobrança de prestações de serviços que extravasem o conceito de «serviços de saneamento de águas residuais urbanas» acolhido no regime jurídico Decreto-Lei 194/2009 de 20 de Agosto.
Nº Convencional:JSTA000P23455
Nº do Documento:SA2201806270765
Data de Entrada:06/26/2017
Recorrente:ADC-ÁGUAS DA COVILHÃ, E.M.
Recorrido 1:A..........- CENTRO COMERCIAL, S.A.
Votação:UNANIMIDADE COM 1 DEC VOT
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – A.D.C. – Águas da Covilhã, E.M., melhor identificada nos autos, vem recorrer para este Supremo Tribunal, da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco que, julgou procedente a impugnação judicial deduzida pela A………… Centro Comercial, S.A., contra o indeferimento da reclamação graciosa interposta do acto de liquidação da tarifa de saneamento a que se reporta a factura nº 0751305/21001357 relativa ao consumo de 2013-04-03 a 03-05-2013.

Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:
«1. O presente recurso versa questões de direito na medida em que as normas que servem de fundamento jurídico à douta sentença judicial, proferida pelo digníssimo tribunal “a quo” deveriam ter sido interpretadas e aplicadas de forma distinta.
2. O ato sub judice não é ilegal, por praticado em conformidade com lei habilitante, e porque, como demonstrado, prevê a respectiva subdivisão de serviços e tarifas.
3. O regulamento publicado no diário da república, 2ª série, nº 8, de 12 de Janeiro de 2011, cumpre o preceituado no artº8º da lei n.º 53-E/2006, de 29 de Dezembro, termos pelos quais é válido e eficaz, não violando qualquer disposição legal ou regulamentar.
4. Não pode negar-se à Recorrente o cuidado e especial cumprimento dos princípios adstritos à informação e colaboração aos utentes.
5. O ato de liquidação foi realizado no estrito cumprimento de todos os deveres e incumbências a que a Recorrente se encontra adstrita, resultando as tarifas aplicadas, no aludido ato, da conjugação de disposições legais e regulamentares a que a mesma está vinculada.
6. Por conseguinte, é de concluir que as tarifas em causa não ofendem os princípios da legalidade, da justiça e da proporcionalidade.
7. Aliás, como se pode verificar, a mesma questão foi objeto de sentença favorável à aqui Recorrente, no âmbito do proc. n.º 97/11 8BECTB, 400/11. OBECTB, 497/11. 3BECTB, 653/11. 4BECTB, 176/12. 4BECTB E 225/12. 6BECTB, todas do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, que confirmaram a inexistência de quaisquer ilegalidades.
8 Assim, não há duplicação de tarifas: - Existem duas tarifas, na sua vertente fixa e variáveis, obedecendo às recomendações dos tarifários emitidos pela entidade reguladora ERSAR (vide Recomendação nº1/2009; Recomendação nº2/2010).
9. Sendo que a TARIFA FIXA DE DISPONIBILIDADE DE SANEAMENTO corresponde a uma tarifa cujo objectivo consiste na remuneração da entidade gestora por custos fixos incorridos na construção, conservação e manutenção dos sistemas necessários para a prestação de serviços (vide artº36 do Regulamento Municipal).
10. E A TARIFA VARIÁVEL DE SANEAMENTO, indexada ao volume de água utilizado, consubstanciando a drenagem do esgoto e o devido tratamento (com a designação dada pelo Regulamento Municipal no artº37º e 38º) aliás, tal como vem alegado/reconhecido pela própria Recorrida, quando se reporta na douta impugnação Judicial a legislação aplicável ao sector, estes serviços respeitantes a saneamento são efectivamente diferenciados.
11. Termos pelos quais, deve sucumbir a tese peregrina da Recorrente que assenta na defesa da duplicação de tarifas, pois resulta das disposições Regulamentares apenas a existência de uma tarifa fixa e uma tarifa variável, cuja incidência objectiva encontra-se inequivocamente explicitada (vide artigo 36º, 37º e 38º do aqui citado Regulamento).
12. A Recorrida confunde os “tarifários bi-partidos” com dupla tributação!
13. A existência destas tarifas fixas e variáveis, foram legalmente aprovadas, estão em vigor e em consonância com a Recomendação IRAR nº01/2009, OBJETO NO ÂMBITO, DEFINIÇÕES E PRINCÍPIOS GERAIS, que se transcreve, EM DEFINIÇÕES NO PONTO 2.2 alínea K) e I) “Tarifa fixa”, valor aplicado em função de cada intervalo temporal durante o qual o Serviço se encontra disponibilizado ao utilizador final, visando remunerar a entidade gestora por custos fixos incorridos na construção, conservação e manutenção dos sistemas necessários à prestação do serviço” “Tarifa variável”, valor ou conjunto de valores unitários aplicável em função do nível de utilização do serviço, em cada intervalo temporal, visando remunerar a entidade gestora pelo remanescente dos custos incorridos com a prestação do serviço” TARIFÁRIOS DE ABASTECIMENTO, SANEAMENTO E RESÍDUOS no ponto 3. “Estrutura essencial dos tarifários pontos 3.1.1- 1. Os tarifários de abastecimento, saneamento e gestão de resíduos devem compreender uma componente fixa e uma componente variável, de forma a repercutirem equitativamente os custos por todos os consumidores”.
14. E NA RECOMENDAÇÃO ERSAR nº02/2010 CRITÉRIOS DE CÁLCULO PARA A FORMAÇÃO DE TARIFÁRIOS APLICÁVEIS AOS UTILIZADORES FINAIS DOS SERVIÇOS PÚBLICOS DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA PARA CONSUMO HUMANO, DE SANEAMENTO DE ÁGUAS RESIDUAIS URBANAS E DE GESTÃO DE RESÍDUOS URBANOS, que aqui também se transcreve, da Estrutura Tarifária no seu ponto 3., 3.3., alínea a), b), C) e ponto 3.4 “A Recomendação ERSAR nº01/2009, de 28 de Agosto (“Recomendação Tarifária”), preconiza em primeiro plano a utilização de “tarifários bi-partidos” 13 para os serviços de águas e resíduos prestados a utilizadores finais, i. e. com uma componente fixa (aplicada em função do intervalo de tempo de prestação do serviço) e uma componente variável (aplicada em função do nível de utilização do serviço durante esse período):
a) Com efeito, não deve ser utilizada apenas uma tarifa fixa, pois não faz reflectir no utilizador final o volume de água consumido, encoraja o desperdício e emite um sinal errado do ponto de vista ambiental.
b) Também não se recomenda que seja utilizada apenas uma tarifa variável, pois não repercute de forma equitativa os custos por todos os utilizadores finais domésticos, beneficiando utilizadores com mais de uma habitação em detrimento de utilizadores com habitação única.
c) Efectivamente, a inexistência de uma componente fixa nos tarifários iria penalizar sobretudo as populações mais desfavorecidas que, indirectamente, teriam que suportar os investimentos realizados para proporcionar água a proprietários de segundas residências, a turistas e a veraneantes, em suma, àqueles que exigem desfrutar do serviço, embora possam não o utilizar com regularidade. Em Portugal esta questão é especialmente relevante, na medida em que entre 25 e 30% das famílias dispõem de segunda habitação. Recomenda-se, consequentemente, que as entidades gestoras utilizem uma estrutura tarifária que combine uma tarifa fixa com uma tarifa variável, pois só assim é possível encontrar a solução mais justa para os utilizadores finais”.
Nestes termos, e nos mais de direito doutamente supridos pelos Excelentíssimos Juízes Desembargadores, se requer se dignem julgar o presente recurso procedente, por provado, revogando a douta sentença judicial pro ferida pelo digníssimo Tribunal de 1ª Instância.
Assim se fazendo, a inteira e sã Justiça.».

2 – A recorrida, A………. – Centro Comercial, S.A. apresentou as contra alegações com o seguinte quadro conclusivo:
«l.ª O objecto - admissível - do presente recurso reconduz-se à questão de direito discutida na sentença recorrida, que consiste em determinar se o Regulamento Municipal de águas Residuais na parte relativa a tarifas variáveis padece de ilegalidade: Os vícios da falta de fundamentação, da inexistência de regulamento tarifário/da violação do princípio da equivalência jurídica, da violação do direito de audiência prévia, não foram objecto de apreciação na decisão sub judice que considerou que face à procedência da impugnação com tal fundamento, fica prejudicada a apreciação das demais questões suscitadas, nos termos do artigo 608º, n.º 2, do CPC, aplicável ex vi artigo 2º, alínea e), do CPPT pelo que não podem ser objecto de recurso
2.ª É competente para conhecimento do presente recurso a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo (cfr. artigo 280º, nº1 do CPPT), Atentas as conclusões da alegação da Recorrente, o objecto do recurso reconduz-se exclusivamente a ver apreciadas questões de direito, pelo que o recurso é da competência da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, sendo assim o Tribunal Ad quem incompetente em razão da hierarquia (cfr. artigo 280º, nº1 do CPPT).
3ª O Tribunal a quo decidiu e bem que “no âmbito do sistema de saneamento de águas residuais, apenas pode ser cobrada uma única tarifa (variável) pelo serviço prestado [saneamento] que, forçosamente, englobará as fases de recolha, drenagem, elevação, tratamento e rejeição de águas residuais, não se justificando que, para efeitos de tributação, qualquer uma destas fases possa ser individualizada como uma especifica prestação de serviços, da mesma forma que as diversas fases dos demais sistemas municipais [abastecimento de água e gestão de resíduos sólidos) não são autonomizáveis” concluindo que “as normas previstas nos artigos 33º, n.º2 e 3, 37º e 38º, do Regulamento de Águas Residuais da Covilhã ao preverem a criação de duas taxas como contrapartida remuneratória pela realização da mesma actividade de saneamento são, pois, ilegais, porquanto desconformes com os diplomas enformadores da actividade em causa, bem como com o artigo 16º, nº3 da Lei nº2/2007, vigente á data da elaboração do aludido regulamento, devendo, por isso, serem desaplicadas ao caso em concreto.
4ª Atenta a leitura das alegações e não obstante o esforço enveredado pela Recorrida de, impugnação após impugnação, esclarecer a ora Recorrente de qual a ilegalidade que está subjacente às acções propostas, constata-se que a Recorrente impera no mesmo equívoco de sempre. Com efeito, a Recorrente continua a defender que a legalidade da cobrança de duas tarifas uma fixa e uma variável, quando o problema não está na duplicação da Tarifa Fixa e da Tarifa Variável mas sim na criação de duas Tarifas VARIÁVEIS, questão que foi correctamente apreendida pelo Tribunal a quo e que foi considerada procedente.
5.ª Ora se foi esta a questão jurídica que obteve provimento na sentença recorrida, dispensado a análise das demais, e se a Recorrente não alcança esta questão, o que resulta evidenciado ao reproduzir as alegações de primeira instância, é evidente que a Recorrente não logrou imputar vícios à sentença recorrida e apresentar uma alegações que incidam sobre a sentença efectivamente pro ferida e lhe imputem vícios, cumprindo o seu ónus de alegação.
6ª Atendendo ao critério formal da fonte da obrigação, que é a lei, ao regime económico, que é de monopólio, à indispensabilidade do serviço e à sua natureza comutativa, a tarifa ou preço do serviço de saneamento tem a natureza de taxa, receita tributária.
7.ª Sendo uma taxa, a tarifa de saneamento é uma receita de natureza tributária à qual são integralmente aplicáveis todas as normas que conformam a criação de contribuições financeiras a favor de entidades públicas e habilitam a sua sindicância.
8.ª O Decreto-Lei nº226-A/2007, o Decreto-Lei nº207/94 e o Decreto-Lei nº194/2009 consideram todos eles, de forma igual, a prestação pelas entidades gestoras responsáveis de três e apenas três serviços públicos integrados: (i) captação, tratamento e distribuição de água para consumo público; (ii) recolha, tratamento e rejeição de efluentes e (iii) recolha e tratamento de resíduos sólidos.
9.ª A divisão destes três serviços públicos, encontra-se pois, legalmente conformada nos citados diplomas, não sendo possível destacar qualquer uma das oito actividades ali indicadas (captação/ tratamento! distribuição de água para consumo público/ recolha/ tratamento/ rejeição de efluentes/recolha/tratamento de resíduos sólidos) como actos tributáveis autónomos
10.ª Na Recomendação nº1/2009 do então Instituto Regulador de Águas e Resíduos (disponível em www.ersar.pt) foi expressamente afirmado que “em virtude da aplicação das tarifas de saneamento, a entidade gestora deve ficar obrigada a executar as seguintes actividades, não as devendo facturar de forma específica (...) b) Recolha e encaminhamento de águas residuais; (...)“ (cfr. nº3.3.1.1.2).
11.ª O Regulamento de águas residuais aprovado em Assembleia Municipal de 10.12.2010 criou, nos seus artigos 32º nº1, 33º nºs 2 e 3, 37º e 38º nºs 1, 2 e 3, TRÊS TAXAS de saneamento: uma fixa de disponibilidade do serviço e DUAS TAXAS VARIÁVEIS uma de drenagem de esgotos e outra de tratamento de esgotos, cada uma incidindo sobre o volume de água facturado.
12.ª A Recorrida não contesta a taxa fixa de disponibilidade.
13.ª Não existindo LEI habilitante que permita a duplicação da Taxa de Saneamento nas duas taxas variáveis efectivamente cobradas de i) “Tarifa de drenagem” e (ii) “Tarifa de tratamento”, as normas que o determinam, ínsitas nos artigos 32º nº1, 33º nºs 2 e 3, 37º e 38º nºs 1, 2 e 3 do Regulamento de águas residuais são ilegais
14.ª O Regulamento aprovado em Assembleia Municipal de 10.12.2010 revela-se nulo e de nenhum efeito por não respeitar as respectivas leis conformadoras quanto à incidência tributária a saber: o Decreto-Lei nº226-A/2007, de 31 de maio, o Decreto-Lei nº207/94, de 6 de agosto revogado pelo Decreto-Lei nº194/2009 e a Lei nº 02/2007 de 15 de Janeiro, entretanto também revogado pela Lei nº73/2013, de 3 de Setembro.
15.ª Se as leis habilitantes não prevêem a duplicação da taxa variável de saneamento em (i) “Tarifa de drenagem” e (ii) “Tarifa de tratamento”, por força do princípio constitucional da hierarquia das leis não poderia o Regulamento de Águas residuais fazê-lo, posto que “nenhuma lei pode criar outras categorias de actos legislativos ou conferir a actos de outra natureza o poder de, com eficácia externa, interpretar, integrar, modificar, suspender ou revogar qualquer dos seus prece los”, sob pena de ser manifestamente inconstitucional (cfr. artigo 112º nº5 da Constituição da República Portuguesa).
16.ª A factura que titula a liquidação Recorrente não discrimina as duas taxas variáveis de drenagem de esgotos e de tratamento de esgoto previstas nos artigos 37º e 38º do regulamento, nem apresenta o seu valor unitário tal como o não faz o tarifário publicado (cfr. Doc. nº3), desrespeitando aquelas normas regulamentares.
17.ª A Recorrente liquidou duas taxas variáveis de “saneamento” por duas vezes sobre o valor total do consumo de água (100%) contrariando a Recomendação nº1/2009 do IRAR que aconselha a considerar-se que o volume de águas residuais recolhidas corresponde ao produto da aplicação de um coeficiente de recolha de referência de âmbito nacional, correspondente ao valor de 0.9 ao volume de água consumido (ou seja, uma única taxa variável sobre 90% da água facturada).
18.ª Não apresentando fundamento regulamentar válido por o Regulamento de Águas Residuais ser nulo e de nenhum efeito, o ato impugnado enferma de nulidade por falta de fundamento legal.»


3 O Ministério Público junto deste Tribunal remete para o parecer do Ministério Público no TCAS, a fls. 430/432 dos autos, o qual se pronunciou no sentido do não provimento do recurso.

4 - Colhidos os vistos legais, cabe decidir.

5 - Por acórdão proferido em 25 de maio de 2017, o TCA Sul declarou-se incompetente em razão da hierarquia, para conhecer do presente recurso, por considerar que tem por fundamento exclusivo matéria de direito, julgando competente para o efeito, a secção de contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.

6 – No Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco foram dados como provados os seguintes factos:
«A) A ADC - Águas da Covilhã, E.M., é uma empresa pública municipal, constituída em 03/03/2006 pelo Município da Covilhã, cujo objecto consiste, além do mais, na gestão e exploração dos serviços municipais de abastecimento de água, de drenagem e tratamento de águas residuais urbanas (cf. fls. 144 a 147 dos autos).
B) A impugnante é titular de contrato de fornecimento de água junto da ADC -Águas da Covilhã E.M., sendo cliente, do tipo comercial, com o nº……… [fls. 173 dos autos].
C) Do tarifário da ADC - Águas da Covilhã, EM., em vigor para o ano de 2013, consta, além do mais, o seguinte:

D) A impugnante foi notificada da factura n 00751305/21001357, emitida, em 2013-05-03, pela ADC - Águas da Covilhã, EM., relativa ao consumo do período de 20 13-04-03 a 2013-05-02, do A…………, com débito a partir de 20 13-05-20, no valor total a pagar de 5.093,93€, do qual o montante de 2.523,31€ corresponde a “Saneamento” [cf. fls. 49 a 50 dos autos].
E) O valor liquidado a título de “Saneamento” encontra-se discriminado, no verso da factura mencionada na alínea anterior, do seguinte modo:



(...)» [cf. fls. 50 dos autos].
O débito da factura mencionada na alínea D) foi pago pela impugnante [factualidade não controvertida: cf. artigo 3º petição inicial e artigo 1º da contestação].
G) Em 11/06/2013, a impugnante apresentou junto da ADC da Covilhã, E.M., reclamação graciosa contra o acto de liquidação da tarifa de saneamento a que se reporta a factura mencionada em D) (cf. fls. 71 dos autos).
H) Pelo ofício nº 0983, datado de 20/06/2013, foi a impugnante notificada da proposta de indeferimento da reclamação graciosa mencionada na alínea anterior, constando ainda do referido oficio o seguinte;
«Fica ainda V. Exa. notificada para, querendo, no prazo de 10 dias úteis se pronunciar por escrito sobre a respectiva proposta de decisão. Na falta de resposta, a proposta de decisão converte-se em decisão definitiva, não havendo lugar a nova notificação)) (cf. fls. 71 a 77 dos autos).
I) A presente impugnação foi remetida, por site em 06/09/2013 (cf. fls. 2 dos autos).


7. O recurso foi interposto para o Tribunal Central Administrativo Sul. Ora, porque, na verdade, as partes divergem apenas quanto à interpretação das regras jurídicas aplicáveis, não havendo, além disso, controvérsia a este propósito, também aqui se entende, na perspectiva considerada pelo TCAS, que o recurso tem por exclusivo objecto matéria de direito (nº 1 do art. 280º do CPPT).

8.Do objecto do recurso

Questão a decidir: reconduz-se a saber se padece de erro de julgamento a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco que na presente impugnação julgou que as normas previstas nos artigos 33º, n.º2 e 3, 37º e 38º, do Regulamento de Águas Residuais da Covilhã, ao preverem a criação de duas taxas como contrapartida remuneratória pela realização da mesma actividade de saneamento, são ilegais, porquanto desconformes com os diplomas enformadores da actividade em causa, bem como com o artigo 16º, nº3 da Lei da Finanças Locais (Lei nº2/2007) (Revogada pela Lei 73/2013.), vigente à data da elaboração do aludido regulamento.

Em causa nos presentes autos uma impugnação do acto indeferimento expresso da reclamação graciosa apresentada pela recorrida A……., Centro Comercial S.A contra o acto de liquidação da tarifa de saneamento a que se reporta a factura n.º 0751305/21001357, emitida pela ADC - Águas da Covilhã E.M., relativa ao consumo do período de 2013-04-03 a 03-05-2013.
Invocava a recorrida, como fundamentos da impugnação, a ilegalidade do regulamento municipal de águas residuais, na parte relativa às tarifas variáveis de saneamento; a falta de fundamentação do acto de liquidação; a ilegalidade do acto de liquidação por violação dos princípios da equivalência jurídica e da proporcionalidade, e a ilegalidade do procedimento por preterição do direito de audiência prévia antes da liquidação.

Perante a suscitada questão da ilegalidade do Regulamento de Águas Residuais n.º 26/2011, aprovado, em 10/12/2010, pela Assembleia Municipal da Covilhã (Publicado em Diário da República, 2. Série, no dia 12 de Janeiro de 2011.) a sentença recorrida considerou que «no saneamento das águas residuais está abrangida a recolha, tratamento e rejeição de águas residuais, tal como sobressai do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 379/93 ou, no dizer do artigo 2.º, n.º 1, alínea b), do Decreto-Lei n.º 194/2009, a recolha, drenagem, elevação, tratamento e rejeição de águas residuais urbanas.
E que, deste modo, (…)« no âmbito do sistema de saneamento de águas residuais, apenas pode ser cobrada uma única tarifa [variável] pelo serviço prestado [que, forçosamente, englobará as fases de recolha, drenagem, elevação, tratamento e rejeição de águas residuais, não se justificando que, para efeitos de tributação, qualquer uma destas fases possa ser individualizada como uma específica prestação de serviços, da mesma forma que as diversas fases dos demais sistemas municipais [de abastecimento de água e gestão de resíduos sólidos] não são autonomizáveis.»

Considerou o Tribunal recorrido que as normas previstas nos artºs.33, nºs.2 e 3, 37 e 38, do referido Regulamento de Águas Residuais da Covilhã, ao preverem a criação de duas taxas como contrapartida remuneratória pela realização da mesma actividade de saneamento são ilegais, porquanto, desconformes com os diplomas legais enformadores da actividade em causa, nomeadamente, o artº16, nº.3, da Lei 2/2007, de 15/01, vigente à data da elaboração do aludido regulamento, devendo, por isso, ser desaplicadas no caso em concreto.

Inconformada com o assim decidido alega a recorrente em síntese que:
- O acto sub judice não é ilegal, por praticado em conformidade com lei habilitante que prevê a respectiva subdivisão de serviços e tarifas;
- deve sucumbir a tese que assenta na defesa da duplicação de tarifas, pois resulta das disposições Regulamentares apenas a existência de uma tarifa fixa e uma tarifa variável, cuja incidência objectiva encontra-se inequivocamente explicitada (vide artigo 36º, 37º e 38º do aqui citado Regulamento);
- Sendo que a Tarifa fixa de disponibilidade de saneamento corresponde a uma tarifa cujo objectivo consiste na remuneração da entidade gestora por custos fixos incorridos na construção, conservação e manutenção dos sistemas necessários para a prestação de serviços (artº 36 do Regulamento Municipal). E a Tarifa varável de saneamento, indexada ao volume de água utilizado, consubstancia a drenagem do esgoto e o devido tratamento (com a designação dada pelo Regulamento Municipal no artº37º e 38º) (vide conclusões 2, 9, 10 e 11 das alegações de recurso).

8.1 Como se viu no caso em apreço não está em causa a tarifa de disponibilidade de saneamento, cuja legalidade não foi objecto de impugnação.
Está sim em causa o invocado vício de violação de lei e erro sobre os pressupostos de direito, na parte referente à contrapartida remuneratória pela prestação do serviço de saneamento de águas residuais, tendo considerando a sentença recorrida que resulta do regulamento a criação de duas taxas/tarifas variáveis como contrapartida remuneratória pela prestação do serviço de saneamento de águas residuais (tarifa de drenagem de esgotos e a tarifa de tratamento) o que, em sua tese, corresponde a uma duplicação de taxas sem que exista qualquer fundamento legal para tal.

Vejamos pois.

De harmonia com o disposto nos artºs.15 da Lei 2/2007, de 15/01 (Lei das Finanças Locais, na redacção aplicável ao caso em apreço.), os municípios podem criar taxas nos termos do regime geral das taxas das autarquias locais.
Sendo que a criação de tais taxas está subordinada aos princípios da equivalência jurídica, da justa repartição dos encargos públicos e da publicidade, incidindo sobre utilidades prestadas aos particulares, geradas pela actividade dos municípios ou resultantes da realização de investimentos municipais. (nº 2 do artº 15º).
No que respeita à criação de taxas dispõe o artigo 8.º do Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais (Lei n.º 53-E/2006, de 29 de Dezembro) no seu nº 1 que as taxas das autarquias locais são criadas por regulamento aprovado pelo órgão deliberativo respectivo e que o regulamento que crie taxas municipais ou taxas das freguesias contém obrigatoriamente, sob pena de nulidade:
a) A indicação da base de incidência objectiva e subjectiva;
b) O valor ou a fórmula de cálculo do valor das taxas a cobrar;
c) A fundamentação económico-financeira relativa ao valor das taxas, designadamente os custos directos e indirectos, os encargos financeiros, amortizações e futuros investimentos realizados ou a realizar pela autarquia local;
d) As isenções e sua fundamentação;
e) O modo de pagamento e outras formas de extinção da prestação tributária admitidas;
f) A admissibilidade do pagamento em prestações. (nº 2 do artº 8º).
Resulta também do artº 16º, nº 3 da Lei da Finanças Locais que os preços e demais instrumentos de remuneração a cobrar pelos municípios respeitam, designadamente, às actividades de exploração de sistemas municipais ou intermunicipais de:
a) Abastecimento público de água;
b) Saneamento de águas residuais;
c) Gestão de resíduos sólidos;
d) Transportes colectivos de pessoas e mercadorias;
e) Distribuição de energia eléctrica em baixa tensão.
E que relativamente às actividades mencionadas no número anterior, os municípios devem cobrar preços nos termos de regulamento tarifário a aprovar (nº 4 do mesmo normativo).

A Lei da Finanças Locais no seu artº 16º, qualifica, pois como preços os valores atinentes às contraprestações inerentes aos serviços identificados no seu nº 3, nomeadamente o saneamento de águas residuais.
No que concerne ao regime tarifário relativo à contrapartida remuneratória pela prestação dos referidos serviços públicos, dispõe o Regulamento de Águas Residuais da Covilhã nº. 26/2011, aprovado, em 10/12/2010, pela Assembleia Municipal da Covilhã e publicado em Diário da República, 2.ª Série, no dia 12/01/2011, o seguinte:

«Artº 32º (Regime Tarifário)
1 - A ADC estabelecerá nos termos legais as tarifas e preços correspondentes aos serviços necessários ao correcto funcionamento de todo o sistema, nomeadamente a de disponibilidade do sistema de saneamento; a da recolha de águas residuais e manutenção da rede e a do tratamento de águas residuais de forma a assegurar o equilíbrio económico e financeiro da Águas da Covilhã.
(…)

Artigo 33.º
(Tarifas e preços a cobrar pela ADC)
1 - A tarifa da disponibilidade de serviço incide sobre a valia de disponibilidade de um sistema geral de águas residuais devidamente conservado em função do calibre do contador de água e da tipologia de consumo.
2 - Para fazer face aos encargos com a actividade desenvolvida no âmbito da exploração do sistema público de drenagem de águas residuais é devida a tarifa de drenagem de esgotos, em função da tipologia de consumo.
3 - Para fazer face às despesas com o tratamento de esgoto, a ADC cobrará a respectiva tarifa em função da tipologia de consumo.
(…)
7 - As tarifas e preços dos serviços constarão do tarifário.
Artigo 36.º
(Tarifa de disponibilidade)
A tarifa de disponibilidade incide sobre a valia de disponibilidade do sistema geral de águas residuais e é calculada em função do tipo de edifício, localização, uso e compartimentação, e será constituída por um valor fixo mensal, que tomará em consideração o calibre do contador, a tipologia e se o consumidor produz águas residuais a partir de água não potável.
Artigo 37.º
(Tarifa de drenagem)
A tarifa de drenagem de esgotos respeita ao valor mensal a pagar por todos os utilizadores do sistema, e é reportada ao valor do consumo de água facturado.

Artigo 38.º
(Tarifa de tratamento)
1 - A tarifa de tratamento de esgoto respeita aos encargos relativos ao tratamento das águas residuais.
2 - A tarifa referida no n.º 1 deste artigo será calculada com base no valor do consumo de água facturado.
3 - As tarifas de saneamento serão cobradas conjuntamente com a tarifa de consumo de água e serão indissociáveis desta, face à relação proporcional existente entre a água consumida e a água residual rejeitada.».
Artigo 39.º
Pagamentos
1 - Os avisos/facturas de pagamento dos consumos e outras importâncias devidas à ADC serão apresentados com a frequência mensal aos clientes/consumidores.
2 - As facturas emitidas deverão descriminar os serviços prestados, prazo de pagamento e as correspondentes tarifas, bem como o volume de água que dá origem às verbas debitadas.
(….)

A sentença entendeu que no âmbito do sistema de saneamento de águas residuais, a recorrente apenas podia cobrar uma única tarifa (variável) pelo serviço prestado que, forçosamente, que englobará as fases de recolha, drenagem, elevação, tratamento e rejeição de águas residuais, não se justificando que, para efeitos de tributação, qualquer uma destas fases possa ser individualizada como uma específica prestação de serviços

Mas será que no caso se verifica a cobrança de duas taxas ou tarifas sobre o mesmo serviço de saneamento?
Entendemos que não.
De facto resulta do probatório (als. C) e D e fls. 50 dos autos) que o valor facturado pela recorrente diz respeito a Água, Saneamento e Resíduos, sendo que na rubrica Saneamento se discrimina apenas “Tarifa de Saneamento” (2517,20 €) e “Tarifa de Disponibilidade de Saneamento” (6,11€).
É assim indubitável que da factura enviada à recorrente só constam as duas componentes da tarifa de saneamento, uma fixa (tarifa de disponibilidade) e outra variável (tarifa de saneamento) e não duas taxas/tarifas variáveis, como pressupõe a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco.
Convenhamos que, neste aspecto, a liquidação impugnada até segue a recomendação IRAR nº 01/2009, que no seu ponto 3.3.1.1.1, relativo à Estrutura tarifária, prevê que «os tarifários do serviço de saneamento de águas residuais devem compreender uma componente fixa e uma componente variável, de forma a repercutirem equitativamente os custos por todos os consumidores.»
E está também conforme ao item 3.3.1.1.2. daquela recomendação que aconselha que, em virtude da aplicação das tarifas de saneamento, a entidade gestora deve ficar obrigada a executar as actividades ali elencadas nas als. a) a f) , não as devendo facturar de forma específica.

Por outro lado é também indubitável que o Regulamento em causa faz, nos seus arts. 37º e 38ª, um desdobramento das ali designadas “tarifas de saneamento” (artº 38º, nº 3) em tarifa de drenagem de esgotos, ali se dizendo que respeita ao valor mensal a pagar por todos os utilizadores do sistema, e é reportada ao valor do consumo de água facturado (artigo 37.º) e «tarifa de tratamento de esgoto» ali se consignando que respeita aos encargos relativos ao tratamento das águas residuais (artº 38º nº 1).
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Entendeu-se na decisão recorrida «que as normas previstas nos artigos 33.º, n.º 2 e 3, 37º e 38.º, do Regulamento de Águas Residuais da Covilhã ao preverem a criação de duas taxas como contrapartida remuneratória pela realização da mesma actividade de saneamento seriam ilegais, porquanto desconformes com os diplomas enformadores da actividade em causa, bem como com o artigo 16.º, n.º 3 da Lei n.º 2/2007, vigente à data da elaboração do aludido regulamento, devendo, por isso, ser desaplicadas ao caso em concreto.»
E foi por via da desaplicação das referidas normas regulamentares ao caso concreto, que o Tribunal a quo concluiu pela falta de norma de incidência tributária e pela anulabilidade do acto de liquidação impugnado, por vício de violação de lei e erro sobre os pressupostos de direito, na parte referente à “Tarifa Saneamento”

Não acompanhamos esta interpretação que a sentença faz dos referidos preceitos legais e entendemos também que este fundamento não é, de per si, bastante para afastar a norma de incidência tributária e determinar a anulação do acto de liquidação sindicado.

A questão prende-se com a vinculação positiva do regulamento à lei. Numa análise rigorosa das relações entre a lei e o regulamento, haverá que ter em conta que o poder de emanar regulamentos não deixa nunca de postular vinculação à lei.
Ou seja, as normas regulamentares têm de assentar nos parâmetros que se induzam ou deduzam da ordem legislativa (Vide, neste sentido Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo II, pag. 277, Coimbra Editora)).
A questão é saber se no caso vertente e no ponto controvertido no recurso (o desdobramento das “tarifas de saneamento” (artº 38º, nº 3) em tarifa de drenagem de esgotos,e «tarifa de tratamento de esgoto»)o regulamento se afasta ou diverge dos parâmetros que se induzem do diploma legal habilitante que autoriza os municípios a cobrarem taxas locais correspondentes à contrapartida remuneratória pela prestação dos referidos serviços públicos - a Lei da Finanças Locais (Lei 2/2007, de 15/01) e mais especificamente o seu artº 16º, nº 3, al. b).

E a resposta será negativa.
Como vimos a Lei das Finanças Locais no seu artº 16º, qualifica como preços os valores atinentes às contraprestações inerentes aos serviços identificados no seu nº 3, nomeadamente o saneamento de águas residuais.
E o nº 4 do mesmo normativo dispõe que relativamente às actividades mencionadas no número anterior, os municípios devem cobrar preços nos termos de regulamento tarifário a aprovar.
Ora do desdobramento da tarifa de saneamento em tarifa de tratamento e tarifa de drenagem não resulta, ao invés do que se conclui na decisão recorrida, uma duplicação de tarifas / preços.
De facto, como evidencia o tarifário para que remete o regulamento, o preço é só um (2,48€/m3) e engloba os dois serviços (drenagem e tratamento) – cf. al. c) do probatório.
Sendo que foi com base nesse valor unitário de 2,48€/m3 que foi calculado o valor liquidado a titulo de saneamento.
Não há efectivamente dupla tributação ou qualquer lesão do princípio da equivalência, resultando até daquele desdobramento uma mais clara indicação da incidência objectiva e subjectiva da tarifa a cobrar pelo serviço de saneamento, aliás em consonância com o princípio da determinabilidade, ínsito no artº 8º da Lei da Finanças Locais.
Acresce que, como se assinala no artº 38º, nº 3 do Regulamento de Águas Residuais, as tarifas de saneamento «serão cobradas conjuntamente com a tarifa de consumo de água e serão indissociáveis desta, face à relação proporcional existente entre a água consumida e a água residual rejeitada».
O que também está conforme aos já referidos princípios da determinabilidade e da equivalência, pois que os estudos de campo demonstram que as descargas de águas residuais variam na directa razão do abastecimento de água feito a cada imóvel (Sérgio Vasques, Regime das Taxas Locais, Cadernos do IDEFF, nº 8, Ed. Almedina, pag. 139.).

Por outro lado o Decreto-lei 194/2009 de 20 de Agosto, que aprova o regime jurídico dos serviços municipais de abastecimento público de água, de saneamento de águas residuais e de gestão de resíduos urbanos, define no seu artº 2º, nº 1, al. b) define o âmbito dos serviços municipais de saneamento de águas residuais urbanas.
E ali se consigna que compreendem no todo ou em parte, a gestão dos sistemas municipais de recolha, drenagem, elevação, tratamento e rejeição de águas residuais urbanas, bem como a recolha, o transporte e o destino final de lamas de fossas sépticas individuais.
Daí que se entenda que o regulamento em causa, ao prever o desdobramento da tarifa de saneamento em tarifa de tratamento e tarifa de drenagem, cobradas em conjunto, pese embora referentes a prestações de serviço diferenciadas, não só não conduz a uma duplicação de tarifas e de preços, como também não permite ou autoriza a cobrança de prestações de serviços que extravasem o conceito de «serviços de saneamento de águas residuais urbanas» acolhido no referido regime jurídico, pelo que, não se vislumbra, neste ponto, a invocada desconformidade.
Em suma, quer no plano da norma habilitante, quer no plano do regime legal enformador da actividade em causa, nada obsta a tal desdobramento, não havendo nos autos qualquer elemento que permita sustentar a interpretação acolhida na decisão recorrida de que, com esse fundamento, o regulamento padece de ilegalidade determinante de falta de norma de incidência tributária.
A sentença recorrida padece, pois, do erro de julgamento que lhe é imputado, pelo que procede o recurso.

8. Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida, determinando a baixa os autos à primeira instância a fim de serem conhecidos os demais fundamentos da impugnação, se a tanto nada mais obstar.
Custas pela recorrida,
Lisboa, 27 de Junho de 2018. – Pedro Delgado (relator) – Isabel Marques da Silva - Dulce Neto (com declaração de voto anexa).


Declaração de voto
Apesar do teor das normas contidas nos art°s. 37° e 38° do Regulamento Municipal do concelho da Covilhã nº 26/2011 poder levar a crer que a intenção da Assembleia Municipal fora criar e aplicar duas autónomas e simultâneas tarifas variáveis como contrapartida remuneratória pela prestação do mesmo serviço público de saneamento (uma pelo serviço de drenagem de águas residuais e outra pelo serviço de tratamento dessas águas) - considero que, na realidade, tais normas não foram interpretadas e aplicadas dessa forma pela empresa municipal liquidadora, já que esta liquidou e faturou apenas uma tarifa variável pela prestação desse serviço público de saneamento (e não duas variáveis), conforme decorre à evidência da factualidade vertida nas alíneas C) e E) do probatório da sentença e que não se encontra questionada.
Razão por que acompanho a fundamentação deste acórdão quando refere ser «indubitável que da factura enviada à recorrente só constam as duas componentes da tarifa de saneamento, uma fixa (tarifa de disponibilidade) e outra variável (tarifa de saneamento) e não duas taxas/tarifas variáveis, como pressupõe a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco.».
Todavia, julgo ser essencial deixar consignado que considero que as normas habilitantes não permitiriam que fossem criadas, através de Regulamento Municipal, duas taxas autónomas, distintas e simultâneas, como contrapartida pela prestação do mesmo serviço público de saneamento. Se tal acontecesse, tais normas regulamentares seriam desconformes com os diplomas legais enformadores, nomeadamente com o disposto no art.º 16°, n° 3, da Lei n° 2/2007, de 15/01, o que imporia a necessidade de as desaplicar, com a consequente anulação dos atos de liquidação dessas tarifas.
Porém, como ficou dito no acórdão hoje prolatado no processo n° 394/17 e que subscrevi como adjunta, tais normas devem ser interpretadas em conformidade com os ditames contidos no art.° 9° do Código Civil, e nessa atividade interpretativa não pode olvidar-se a forma como a própria entidade municipal está a proceder à sua interpretação e aplicação, faturando apenas uma tarifa variável de saneamento, com um valor unitário de 2,48€. O que evidencia que tais normas regulamentares estão a ser interpretadas e aplicadas como mera forma de decomposição das duas necessárias fases da operação de saneamento de águas residuais e forma de cálculo de uma única contraprestação remuneratória devida por um único serviço público.
Dulce Neto