Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0124/12
Data do Acordão:06/06/2012
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FERNANDA MAÇÃS
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
ERRO NA FORMA DE PROCESSO
PEDIDO
CONVOLAÇÃO
Sumário:I - O erro na forma do processo afere-se pelo ajustamento do meio processual ao pedido que se pretende fazer valer, sendo que no caso de ser deduzido mais do que um pedido e só a um deles se mostrar ajustada a forma processual escolhida, é de considerar sem efeito o pedido para o qual o processo não é adequado, por aplicação analógica do art. 193º, nº 4, do CPC.
II - Se um dos pedidos formulados em juízo pelo executado é de que seja absolvido do pedido executivo, a oposição à execução fiscal é o meio processual próprio.
III - O Juízo sobre a inexistência de alegação de causa de pedir válida, pode justificar a rejeição liminar da oposição à execução fiscal, mas já não a decisão no sentido da verificação de erro na forma do processo.
IV - Em abstracto, a alegação de que não era possível a instauração de uma execução fiscal após a sociedade ter sido declarada insolvente constitui fundamento válido de oposição à execução fiscal, subsumível à alínea i) do nº 1 do art. 204º do CPPT.
Nº Convencional:JSTA00067658
Nº do Documento:SA2201206060124
Recorrente:MASSA INSOLVENTE DE A...E OUTRO
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF VISEU
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL
Área Temática 2:DIR PROC CIV
Legislação Nacional:CPC96 ART198 N1 N2 ART684 N3 ART685-A N1 ART234-A ART476 ART199 N1 N2 ART288 N1 B ART493 N1 N2 ART494 B ART193 N4
CPPTRIB99 ART204 ART2 E ART209 N1 B ART98 N4
LGT ART97 N3
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC01161/11 DE 2012/02/29
Referência a Doutrina:ALBERTO DOS REIS CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO 3 ED II PAG288-89.
RODRIGUES BASTOS NOTAS AO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL 3ED I PAG262.
ANTUNES VARELA REVISTA DE LEGISLAÇÃO E JURISPRUDÊNCIA ANO100 PAG378.
JORGE DE SOUSA CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO 6ED II PAG88-89.
Aditamento:
Texto Integral: I-RELATÓRIO

1. A massa insolvente de A…… E B……, representada pela Administradora de insolvência, deduziu oposição a uma execução fiscal que contra ela foi instaurada para cobrança de IRS relativo ao ano de 2006, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu.
1.2. Para tanto, invocando os fundamentos das alíneas a), b), d), e), g) e i) e segts. do art. 204º, nº 1, do CPPT, alegou a Oponente, em resumo, o seguinte:
“Nulidade da citação, porquanto o destinatário da notificação deverá ser a “Massa Insolvente” e não a “administradora da insolvência”;
Nulidade por omissão de notificação para “o exercício do direito de audiência prévia quanto ao objecto da execução”;
Nulidade da citação, por “não conter a informação completa sobre a origem dos montantes executados e a forma como foram calculados”;
Não podia ter sido instaurada a execução fiscal após declaração de insolvência da sociedade originária devedora, sendo que a Fazenda Pública deveria ter reclamado os seus créditos no processo de insolvência;
Não é exigível qualquer imposto pela insolvente e muito menos pela ora oponente;
Também não poderão “ser exigíveis eventuais coimas, custas processuais e/ou juros pela falta de entrega desse mesmo imposto e todas as quantias que derivem dessa quantia “raiz”;
O Oponente concluiu formulando o pedido nos seguintes termos:
“Termos em que, e nos melhores de direito, deverá a presente petição de oposição ser recebida, ser declarada procedente e em consequência:
1º Declarar nula a citações [sic] da oponente, devendo ordenar-se a anulação de todo o processado posterior;
2º Declarar nula e de nenhum efeito a certidão/liquidação de dívida, títulos executivos que sejam o fundamento dos presentes autos de execução e consequentemente nula também a citação da executada ora oponente;
3º Declarar inexigível a quantia exequenda peticionada nos presentes autos, absolvendo-se a oponente do pedido executivo”.

2. O Mmº Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, em sede liminar, julgando verificado o erro na forma de processo, absolveu a Fazenda Pública da instância e determinou a convolação da petição inicial em requerimento de arguição de nulidades a apreciar no âmbito do processo de execução fiscal, pelo que ordenou a remessa dos autos à execução fiscal para aí ser apreciado o referido requerimento.
2.1. Para tanto argumentou, em síntese, que sendo o pedido de nulidade da citação “o pedido principal”, o mesmo não constitui fundamento de oposição à execução fiscal, pois “o que está em causa é a prática pelo Órgão de Execução Fiscal de um acto a que a executada imputa nulidade”, pelo que o requerimento para apreciar a alegada nulidade da citação deve ser dirigida ao Órgão de Execução Fiscal. Nesta sequência, o Mmº Juiz “a quo” procedeu à referida convolação, depois de mencionar não haver qualquer obstáculo quanto à tempestividade, uma vez que a nulidade foi arguida dentro do prazo da oposição à execução fiscal, como exigido pelo art. 198º, nº 2, do Código de Processo Civil (CPC).
3. A Oponente não se conformou com a decisão e dela interpôs recurso para este Supremo Tribunal Administrativo, que foi admitido a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
3.1.A Recorrente apresentou as alegações de recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor:
“1.-
A oposição judicial está prevista nos Arts.203°, 204° e sgts. do CPPT e o Art. 204° prevê taxativamente os fundamentes que poderão lastrar uma oposição judicial num P.E.F. (processo de execução fiscal).
2.-
A al.b) do referido Art.204º menciona expressamente a ilegitimidade do executado como possibilidade da alegação em sede de oposição judicial.
3.-
A suscitada nulidade da citação, alegada pela recorrente está directa e intrinsecamente relacionada com o facto desta não se considerar devedora na presente execução - isto é que, nela, é parte ilegítima e que este PEF não poderá prosseguir contra si.
4.-
Tratar-se-á, antes de mais, de um caso, não só de “simples” ilegitimidade processual como, antes, de um caso de ilegitimidade substantiva (embora, admite-se, esta qualificação ou enquadramento jurídico possa sofrer “outras discussões”.
5. -
Sendo ainda certo que os restantes fundamentos desta concreta oposição, tal como a própria sentença recorrida deixa antever, estão enquadrados na previsão do Art.204° do CPPT.
6.-
Por outro lado, e ainda que assim não se entenda, o que não se concede e avança por mera de patrocínio, sempre a al.i) do Art.204° estabelece que podem ainda servir de fundamento à oposição quaisquer outras ilegalidades não prevista nas alíneas anteriores, desde que não interfira em matéria de exclusiva competência da entidade que houver extraído o título - sendo manifestamente este o caso dos autos, uma vez que não se trata de um acto da exclusiva competência da entidade administrativa.
7.-
Apesar da citação para a execução não poder ser considerado um acto exclusiva e materialmente administrativo, no limite, a admitir-se assim qualificado, a não exclusividade dessa competência advirá ainda do facto de existir tutela jurisdicional, em sede de reclamação para o TAF sobre as decisões que pudessem ser tomadas sobre essa matéria pelo Sr. Chefe do SEF competente (e não, apenas, o recurso hierárquico ou gracioso).
8.-
Ao invés, ao decidir da forma que vai recorrida, o tribunal “a quo” tem a perigosíssima eventualidade de cercear o direito da recorrente apresentar a sua petição de oposição em tempo útil, isto é, nos 30 dias previstos para o efeito, no Art.203° do CPPT.
9.-
Subsidiariamente, apenas, e em dever de patrocínio admite a recorrente a aplicação do regime previsto no Art. 279° n. 1 do CP Civil; através da suspensão destes autos de oposição até à decisão transitada em julgado daquela referida arguição de nulidade da citação - o que, nesta medida, e caso faleça toda a anterior alegação recursiva, requer expressamente seja aplicado ao caso dos autos.
10.-
Esta solução teria, pelo menos, a virtude de não coarctar à oponente, ora recorrente, o direito de debater judicialmente as matérias que depositou na sua peça processual.
11.-
Entende a recorrente que a douta decisão recorrida violou os Arts.203º e 204° do CPPT, o Art.103° da LGT, bem como. pela não previsão da possibilidade da sua aplicação, o Art.279º nº.1 do CPC, isto é, ao não ter sofrido a aplicação merecida e possível, nos presentes autos.
12.-
Devendo ser revogada a douta sentença recorrida, sendo substituída por decisão que ordene o prosseguimento da oposição para conhecimento de todas as questões aí suscitadas;
13.-
Ou, e caso assim não se entenda, que ordene a suspensão da presente execução até à decisão definitiva e transitada sobre a suscitada arguição de nulidade da citação da executada – assim se entenda, de acordo com a douta sentença recorrida que deverá ser matéria a conhecer pelo Sr. Chefe do SEF de Tondela.”

4. Não foram apresentadas contra-alegações.

5. O Ministério Público, junto do STA, emitiu Parecer (fls. 117), no sentido de que o recurso deve improceder.
6. Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

II – FUNDAMENTAÇÃO

1. DE FACTO

Na decisão recorrida não foi fixada matéria de facto, o que se compreende face à natureza liminar dessa decisão.

2. DE DIREITO

2.1. A questão a apreciar e decidir

O Mmº Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, perante uma petição de oposição à execução fiscal, proferiu, em sede liminar, decisão julgando verificada a nulidade por erro na forma do processo e ordenando a prossecução do processo como requerimento endereçado à execução fiscal.
Na mesma decisão também absolveu a Fazenda Pública da instância, embora, como bem salienta JORGE LOPES DE SOUSA (Cfr. Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, volume II, anotação 10 b) ao art. 98.º, pp. 88/89.), a consequência do erro na forma do processo, de acordo com o disposto no art. 198.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, é tão-só a anulação dos actos que não possam ser aproveitados e a prática dos que forem estritamente necessários para que o processo se aproxime, quanto possível, da forma estabelecida pela lei, em obediência ao princípio da economia processual, só não sendo possível o aproveitamento dos actos já praticados quando deles resulte diminuição das garantias do réu.
O Mmº Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu considerou verificado o erro na forma do processo porque, tendo presente que o pedido de nulidade de citação foi o pedido principal, facilmente se verifica que o objecto dos presentes autos não encontra enquadramento nas previsões do art. 204º do CPPT. Ou seja, aferiu a nulidade decorrente do erro na forma do processo, não em face dos pedidos formulados na petição inicial, mas em face daquele que considerou ser o único fundamento invocado na petição inicial: a «nulidade da citação». Assim, e considerando também que essa nulidade deve ser arguida mediante requerimento dirigido ao Órgão de Execução Fiscal, ponderou a possibilidade de convolar a petição inicial para a forma processual adequada, tendo concluído afirmativamente, tanto mais que a nulidade foi arguida dentro do prazo da oposição à execução fiscal, como exigido pelo art. 198.º, n.º 2, do CPC.
A Oponente não se conformou com essa decisão e dela interpôs recurso para este Supremo Tribunal Administrativo, defendendo, em síntese, se bem interpretamos as alegações de recurso e respectivas conclusões, que alegou fundamento válido de oposição à execução fiscal.
Em face das conclusões que delimitam o objecto e âmbito do recurso [cfr. os arts. 684º, nº 3, e 685º-A/1, do CPC, e o art. 2º, alínea e), do CPPT], a questão que cumpre apreciar e decidir é apenas a de saber se a decisão recorrida fez errado julgamento quando absolveu a Fazenda Pública da instância com fundamento em erro na forma do processo e, em consequência, ordenou que o processo prosseguisse sob a forma de requerimento dirigido ao Órgão de Execução Fiscal.

2.2. Assim recortada a questão verifica-se que é idêntica à que foi apreciada por este Supremo Tribunal, no Acórdão de 29/2/2012, proc. 01161/11, de que a ora relatora foi 1ª adjunta. Não havendo razões para alterar a jurisprudência ali fixada, vamos, por isso, com a devida vénia, transcrever o mencionado Acórdão, ainda que com as devidas adaptações.
Escreve-se, a este propósito, no citado Acórdão:
Antes do mais, impõe-se recordar aqui a noção de erro na forma do processo e o critério operativo por que se afere o mesmo.
O erro na forma do processo é uma nulidade que consiste na utilização de meio processual impróprio. Como é sabido, a verificação do erro na forma do processo afere-se pela adequação do meio processual utilizado ao fim por ele visado: se o pedido, ou seja, a concreta pretensão de tutela solicitada pelo autor ao tribunal não se ajusta à finalidade abstractamente figurada pela lei para essa forma processual ocorre o erro na forma do processo (() (Cfr. ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil Anotado, volume II, Coimbra Editora, 3.ª edição – reimpressão, págs. 288/289. No mesmo sentido, RODRIGUES BASTOS, Notas ao Código de Processo Civil, volume I, 3.ª edição, 1999, pág. 262, e ANTUNES VARELA, Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 100.º, pág. 378.)).
Salvo o devido respeito, no despacho impugnado não se distinguiu em termos inequívocos duas situações que não se confundem: uma realidade é a falta de alegação de fundamento válido de oposição à execução fiscal, que conduziria sem mais à rejeição liminar nos termos do disposto no art. 209.º, n.º 1, alínea b), do CPPT, como bem salientou a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, sem prejuízo da possibilidade de apresentação de nova petição inicial ao abrigo do disposto nos arts. 234.º-A e 476.º, do CPC; realidade diferente é o erro na forma do processo, que constitui uma nulidade de conhecimento oficioso, mas que impõe a convolação do processo para forma adequada (cfr. art. 98.º, n.º 4, do CPPT, e art. 97.º, n.º 3, da LGT), com anulação apenas dos actos que não possam aproveitar-se para a forma processual adequada sem diminuição das garantias de defesa (cfr. art. 199.º, n.ºs 1 e 2, do CPC), sendo que, se não for possível a sanação da nulidade, o erro na forma do processo determina o indeferimento da petição inicial, se verificada na fase liminar, ou, se já ultrapassada a fase liminar, a anulação de todo o processado, com a absolvição do réu da instância (cf. arts. 288.º, n.º 1, alínea b), 493.º, n.ºs 1 e 2, e 494.º, alínea b), todos do CPC)
Ora, no despacho recorrido, após se referir que não fora invocado fundamento válido de oposição e considerando-se que fora invocada exclusivamente a nulidade da citação, entendeu-se verificado o erro na forma do processo, pelo que se passou a ponderar a possibilidade de convolação do processo para a forma adequada, que se entendeu ser o requerimento dirigido à própria execução fiscal, tendo-se concluído pela afirmativa.
Acontece, porém, que toda a argumentação aduzida no despacho liminar em ordem a considerar que se verificava o erro na forma do processo se alheou dos pedidos formulados na petição inicial, centrando-se exclusivamente na única causa de pedir que considerou ter sido invocada, qual seja a da nulidade da citação. Não se atentou, designadamente, que o pedido que foi formulado na petição inicial em terceiro lugar, que se deve «[d]eclarar inexigível a quantia exequenda peticionada nos presentes autos, absolvendo-se a oponente do pedido executivo» (cfr. 1.1), é um pedido típico da oposição à execução fiscal.
Para este pedido, a forma processual escolhida pela Executada é, inequivocamente, a ajustada (Note-se que a oposição, em regra, visa a extinção, total ou parcial, da execução fiscal, mas pode também ter por objecto a suspensão da execução. É o caso em que a exigibilidade da dívida seja determinada por motivo meramente temporário, como, v.g., concessão de uma moratória (como as que têm vindo a suceder nos diplomas que prevêem regimes especiais de regularização de dívidas), existência de processo de falência ou de insolvência ou recuperação de empresas, ter sido decidida, por via administrativa, a suspensão da eficácia do acto de liquidação ou a própria suspensão da execução. Neste sentido, JORGE L. DE SOUSA, ob. cit., volume III, anotação 39 ao art. 204.º, p. 502.) (…) o que nos obriga a reequacionar a questão do erro na forma do processo, tendo presente que os dois outros pedidos formulados na petição inicial, que, afinal, não são senão um – de declaração da nulidade da citação – não são pedidos a que a forma processual escolhida – a oposição à execução fiscal – se adeqúe.
Ora, ensina JORGE LOPES DE SOUSA, sob a epígrafe «Erro parcial na forma de processo»:
«Nos casos em que tenha sido efectuada cumulação de pedidos e a forma do processo seja adequada à apreciação apenas de um deles, não poderá haver correcção da forma de processo quanto aos processos para os quais a forma de processo é inadequada, pois o processo tem de seguir a forma escolhida pelo interessado relativamente à apreciação do pedido para que essa forma de processo é adequada.
Nestes casos, a solução que se extrai do tratamento dado a uma questão paralela no n.º 4 do art. 193.º do CPC, é a de considerar sem efeito o pedido ou pedidos para o qual o processo não é adequada, seguindo o processo apenas para apreciação do pedido que deva ser apreciado em processo do tipo escolhido pelo interessado.
Essa consequência é uma aplicação da regra do art. 199.º do CPC, segunda a qual, no caso de erro na forma de processo, é nulo todo o processado que não puder aproveitar-se para a tramitação de acordo com a forma estabelecida na lei. Nesses casos de erro parcial da forma de processo, como este tem de prosseguir para apreciação do pedido para que é adequado, a consequência relativamente ao outro pedido será a de nulidade parcial do processo, na parte a ele respeitante, o que se reconduz a que o processo prossiga como se esse pedido não tivesse sido efectuado» (() (Ob. cit., volume II, anotação 10 e) ao art. 98.º, págs. 92/93.)).
Verificado que está que um dos pedidos formulados na petição inicial é adequado à forma processual escolhida e em face do que acima deixámos dito, somos conduzidos à conclusão de que deve o processo prosseguir para conhecimento desse pedido, considerando-se sem efeito os demais pedidos, devendo decretar-se a nulidade parcial do processo no que a estes respeita.
Admitimos, no entanto, que, caso não houvesse na petição inicial alegação capaz de constituir fundamento válido de oposição à execução fiscal, não faria sentido fazer prosseguir o processo para apreciar esse pedido. Dito de outro modo, de nada valeria a formulação de um pedido adequado se não houvesse causa de pedir que pudesse integrar fundamento válido de oposição.
Cumpre, pois, verificar se algum dos fundamentos invocados na petição inicial pode integrar, em abstracto, fundamento válido de oposição à execução fiscal, a justificar que esta prossiga para conhecimento do pedido de extinção da execução.
Como dissemos já, a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu parece ter considerado que na petição inicial se invocou uma só causa de pedir (e se formulou um só pedido), qual seja a nulidade da citação. A ser assim, subscreveríamos a decisão recorrida, se bem que com fundamentação algo diversa.
Acontece, no entanto, que na petição inicial foi também invocada uma outra causa de pedir, a qual constitui fundamento válido de oposição à execução fiscal. Na verdade, para além da nulidade da citação (() (A Oponente alegou também (…) que, porque foi declarada a sua insolvência, não podia agora ser-lhe agora exigida coercivamente uma dívida que não foi reclamada no processo de insolvência.
Ora, em abstracto, a alegação de que não era possível a instauração de uma execução fiscal após a sociedade ter sido declarada insolvente constitui fundamento válido de oposição à execução fiscal, subsumível à alínea i) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT, como bem salientou o Procurador-Geral Adjunto no seu parecer (()( Neste sentido, JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., volume III, anotação 38 b) ao art. 204.º, págs. 498/499. )).
Assim, porque na petição inicial foi formulado pedido próprio da oposição à execução fiscal e nela foi invocado fundamento de oposição atendível, não há que ponderar a possibilidade de convolação para qualquer outra forma processual, antes sendo de reiterar a conclusão acima formulada, de que deve o processo prosseguir para conhecimento desse pedido, considerando-se sem efeito os demais pedidos, devendo decretar-se a nulidade parcial do processo no que a estes respeita.
Não resistimos a citar aqui de novo JORGE LOPES DE SOUSA, que, renovando a doutrina acima exposta, mas agora referindo-se à hipótese aqui em causa – de cumulação da arguição de nulidade da citação em processo de oposição à execução fiscal com fundamento de oposição previsto no art. 204.º, n.º 1, do CPPT –, afirma:
«Se a arguição de nulidade por falta de citação ou qualquer nulidade secundária for feita em oposição à execução fiscal, nos casos em que não o pode ser, poderá haver possibilidade de convolação de petição de oposição em requerimento de arguição de nulidade com a consequente incorporação do mesmo no processo de execução fiscal, convolação essa que, quando possível, é obrigatória, nos termos dos arts. 97.º, n.º 3, da LGT, e 98.º, n.º 4, do CPPT.
Tal possibilidade, porém não existe quando a nulidade da citação não é o único fundamento de oposição invocado e entre os invocados se inclua algum que esteja previsto como tal no artº 204º.
Em situações deste tipo, havendo uma cumulação de pedidos e ocorrendo erro na forma de processo quanto a um deles, a solução que se extrai do regime do processo civil é considerar sem efeito o pedido para o qual o processo não é adequado, como se infere da solução dada a uma questão paralela no n.º 4 do art. 193.º do C.P.C. Na verdade, refere-se nesta norma, para o caso de cumulação de pedidos substancialmente incompatíveis que «a nulidade subsiste, ainda que um dos pedidos fique sem efeito, por incompetência do tribunal ou por erro na forma de processo». Não se estará, decerto, perante um caso aqui directamente enquadrável, pois não haverá cumulação de pedidos substancialmente incompatíveis. No entanto, nesta norma pressupõe-se que a solução legal para a apresentação de um pedido para o qual o processo é inadequado é a de que ele «fique sem efeito», prosseguindo o processo para apreciação do pedido para o qual o processo é adequado. Por isso, nestes casos em que são invocados fundamentos de oposição juntamente com a arguição de nulidade, não haverá possibilidade de convolação, por esta pressupor que todo o processo passasse a seguir a tramitação adequada e, nestas situações, tal não poder determinar-se, por o processo de oposição ser o próprio para apreciação dos fundamentos invocados que devam ser apreciados em processo de oposição» (() (Ob. cit., volume III, anotação 14 ao art. 165.º, págs. 146/147.)).
O despacho recorrido, que decidiu em sentido diverso – ou seja, no sentido da convolação da oposição à execução fiscal em requerimento de arguição de nulidade a incorporar na execução fiscal – não pode pois manter-se, devendo o processo ser devolvido à 1.ª instância, a fim de aí prosseguir para conhecimento do pedido de extinção da execução fiscal, se nada mais a isso obstar”.

Aplicando o exposto ao caso em análise, e porque se trata, repete-se, de questão idêntica, o despacho do Mmº Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, de 15/12/2011, que decidiu convolar a petição inicial da Oposição deduzida pela ora recorrente em requerimento dirigido ao órgão de Execução Fiscal, não pode, pois, manter-se, devendo o processo ser devolvido à 1.ª instância, a fim de aí prosseguir para conhecimento do pedido de extinção da execução fiscal, se nada mais a isso obstar.
Assim sendo, o presente recurso merece, pois, provimento, em conformidade com os fundamentos constantes do Acórdão deste Supremo Tribunal de 29/2/2012, que reproduzimos, com o que ficam, consequentemente, prejudicadas as demais questões suscitadas a título subsidiário.

III - DECISÃO
Face ao exposto, os Juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, conceder provimento ao recurso, revogar o despacho recorrido e ordenar que os autos regressem à 1.ª instância, a fim de aí ser conhecido o pedido de extinção da execução fiscal, se nada mais a isso obstar.

Sem custas.
Lisboa, 6 de Junho de 2012. - Fernanda Maçãs (relatora) - Casimiro Gonçalves - Lino Ribeiro.