Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0712/14.1BECBR
Data do Acordão:07/02/2020
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:ANA PAULA PORTELA
Descritores:PROTOCOLO
Sumário:I - Celebrado Protocolo de Colaboração nos termos do qual ficaram por determinar não só os apoios financeiros mas também as tarefas e ações a desenvolver , as quais seriam definidas - pela "Autoridade Florestal Nacional" a quem o "Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, I.P." sucedeu não se pode ter constituído qualquer obrigação de pagamento de apoios à autora por parte da ré.
II - A tal não obsta que a A. tenha organizado e divulgado sessões de esclarecimento sobre o nemátodo da madeira do pinheiro, no decorrer do ano de 2008, tanto que muitas das atividades apresentadas como alegadamente desenvolvidas à sombra do Protocolo são atividades coincidentes com o trabalho normal das atribuições associativas em causa.
III - A tal não obsta o ofício enviado pelo Gabinete do Secretário de Estado do Desenvolvimento Rural e das Florestas solicitando o "envio a este Gabinete de uma informação que identifique o ponto de situação das ações realizadas por essa associação, os exemplares materiais produzidos e as facturas correspondentes aos trabalhos e materiais executados".
Nº Convencional:JSTA000P26182
Nº do Documento:SA1202007020712/14
Data de Entrada:05/31/2019
Recorrente:ASSOCIAÇÃO DOS PRODUTORES FLORESTAIS DO CONCELHO DE ARGANIL
Recorrido 1:INSTITUTO DA CONSERVAÇÃO DA NATUREZA E DAS FLORESTAS, I.P.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: 1. ASSOCIAÇÃO DOS PRODUTORES FLORESTAIS DO CONCELHO DE ARGANIL interpõe recurso de revista para o STA do acórdão do TCAN de 21 de dezembro de 2018, que negou provimento ao recurso do acórdão do TAF de Coimbra - que julgara improcedente a ação administrativa movida pela ora Recorrente contra a então AUTORIDADE FLORESTAL NACIONAL, por incumprimento da prestação do apoio financeiro a que tinha direito, por força do Protocolo de COLABORAÇÃO celebrado pelas Organizações de Produtores Florestais e a entidade demandada, no âmbito da “Medidas contra novos focos de Nemátodo do Pinheiro”, requerendo a mesma, ao abrigo da cláusula 7ª do referido protocolo, o pagamento da quantia de 22.200,95€.
2. A RECORRENTE concluiu as suas alegações, da seguinte forma:
“1) A situação de que se trata tem foros de julgamento verdadeiramente extraordinário.
2) O Estado, numa situação de urgência (relacionada com o Nemátodo da Madeira do Pinheiro, de que já todos ouvimos falar), quase que obriga uma Associação privada a prestar um serviço público em razão do pânico que causou a doença do pinheiro.
3) Contrata com ela e estatuem as partes que o apoio financeiro seria acordado posteriormente, aliás, o Estado, na pessoa do então Sr. Secretário de Estado, solicita o envio discriminado dos trabalhos efetuados e pede expressa e literalmente as faturas dos "trabalhos e materiais executados" (naturalmente para pagar).
4) O Estado, entre muitas associações que prestaram esse serviço, paga a umas associações e não paga a outras.
5) Há quase uma dezena de pedidos de pagamento dos serviços prestados e, assim, da fatura, por parte da A..
6) O Estado recebe dinheiro da Comunidade Europeia para financiar e pagar estes serviços.
7) Não se pode, pois, admitir que, com esta factualidade, o Acórdão recorrido salve o Estado do pagamento dos serviços, nem que seja a título indemnizatório.
8) O Supremo Tribunal deve assim, no nosso modesto entender, pronunciar-se sobre a matéria, tanto mais que o TCA-N, perdendo-se na enumeração de vários institutos jurídicos ("contratos preliminares", "instructions to proceed', "responsabilidade pré-contratual", "promessa fraca", "determinação ou indeterminação da prestação"), não conseguiu alinhar um só que explicasse cabalmente, ao cidadão comum e logo à A. (que é para ele que os acórdãos são proferidos), porque é que, com tamanha factologia, não tem razão.
9) A questão tal como o Tribunal a quo a enfrentou é deveras complexa (já vimos a quantidade de institutos jurídicos abordados e a dificuldade em decidir com base nos mesmos), pelo que é notória a relevância jurídica da questão que se reveste, pois, de uma importância fundamental, requerendo a intervenção pacificadora e clarificadora deste Supremo Tribunal.
10) A admissão do recurso é ainda devida, como válvula de escape do sistema, para utilizar uma expressão conhecida e, assim, para melhor aplicação do direito, uma vez que é manifestamente erróneo o julgamento, bem como pelo facto de este se afigurar verdadeiramente chocante do ponto de vista ético-jurídico.
11) Quanto ao fundo, temos que o pagamento de acordo com a enumeração dos serviços prestados (pagamento do serviço efetivamente realizado) foi expressamente aceite e, assim, também quanto aos meios necessários à sua execução, acordado pela administração, mormente pelo Sr. Secretário de Estado que superintendia na área de atribuição (florestas e agricultura) de que cuidamos - cfr. doc. n.º 12 junto com a pi..
12) Logo, a quantia tem de ser paga, não se podendo fazer intervir qualquer juízo salvífico.
13) O que sucedeu, em erro de julgamento manifesto, é que o Tribunal se perde em qualificações contratuais, como que inebriado pela complexidade da qualificação jurídica da vinculação que emerge do contrato, a qual não se coaduna, em perfeição, com o modelo corrente contratual - indeterminação do quantitativo a pagar e execução (não obstante) do contrato e esquece o ou os factos fundamentais - o acordo e aceitação que a comunicação (junta como doc. 12) inequivocamente demonstra.
14) Já a contragosto e apenas subsidiariamente: aliás é extraordinário, resultando tal em patente erro de julgamento, como se não percebeu que com exceção da indeterminação da prestação e da promessa enfraquecida (instituto este em que a situação de facto não se enquadra à saciedade), todos os outros institutos que são sopesados no acórdão recorrido tem uma só consequência: verificação de conduta ilícita e direito de indemnização do particular.
15) Finalmente, quanto à indeterminação o que nos parece também extraordinário (também em patente erro de julgamento) é o acórdão terminar com a alusão à indeterminabilidade da prestação e não retirar daí a conclusão devida: ou seja que (de acordo com a cláusula 7.ª do contrato), restando indeterminados e indetermináveis os meios necessários à execução contratual - sendo o contrato nulo, então, como se alegou subsidiariamente na p.i., devem ser restituídos indemnizatoriamente os montantes peticionados - a retroatividade da declaração de nulidade obriga à restituição das prestações efetuadas, como se o negócio não tivesse sido realizado (cfr. arts. 280.° e 289.° do CC e por exemplo, jurisprudência citada na p.i.).
16) O que, vale ainda para a hipótese, fortemente equacionada na p.i. e densificada e alegada até na contestação, do contrato ser nulo por violação das regras gerais da contratação pública.
17) Só uma consequência não é, jurídica e eticamente possível, e essa é que tem de ser a Associação a arcar com os prejuízos desta urgente necessidade de intervenção do Estado, que solicitou os serviços que a A. prestou em prol da coletividade, por isso ser... ostensivamente avesso à boa fé e ao honeste vivere pelo qual se rege a nossa vida intersubjetiva, e que deriva do estruturante princípio do Estado de direito democrático dos cidadãos (cfr. arts. 2.°, 18.° e 266.° da CRP).
Termos em que, só admitindo o recurso e dando provimento ao mesmo se fará, JUSTIÇA!”
3. Não foram produzidas contra-alegações.
4. O recurso de revista foi admitido pela formação deste STA por acórdão de 10.05.2019.
5. Notificado o EMMP, ao abrigo do art. 146°, n° 1, CPTA, foi emitido parecer no sentido da improcedência do recurso e consequente manutenção do acórdão recorrido.
6. Após vistos, cumpre decidir.
*
II - FUNDAMENTAÇÃO
As Instâncias deram como provados os seguintes factos:
“1. Em 18.4.2008, o Gabinete do Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas emitiu nota de imprensa donde se retira o seguinte excerto:
«(...) MEDIDAS CONTRA NOVOS FOCOS DE NEMÁTODO DO PINHEIRO
Na zona da península de Setúbal foi detectada, pela primeira vez em Portugal, a presença do nemátodo da madeira do pinheiro, em 1999, tendo desde logo sido tomadas pela Administração Pública e pela União Europeia, em colaboração com o setor privado, medidas no sentido de erradicar este organismo.
O nemátodo é o responsável pela vulgarmente conhecida "doença dos pinheiros", que em Portugal ataca essencialmente o pinheiro bravo.
Trata-se de um organismo incluído pela Comissão Europeia numa lista de agentes patogénicos que obrigam à implementação de medidas especiais de protecção por parte dos Estados-membros.
Estas medidas passam pela criação de uma Zona de Restrição, que inclui a Zona Afectada - onde foi detectada a presença de nemátodo - e de uma Zona Tampão - com uma largura de 20 quilómetros onde as árvores não estando afectadas, devem ser objecto de vigilância, sendo abatidos os exemplares que venham a estar infectados.
(...) Desde o início da detecção do problema, a Direcção-Geral dos Recursos Florestais (DGRF) tem desenvolvido o Programa Nacional de Luta Contra o Nemátodo da Madeira do Pinheiro (PROLUMP), em que se incluem ações de monitorização e colheitas de rotina em todo o país.
No âmbito das referidas ações no terreno e na sequência de análises realizadas em amostras recolhidas nos concelhos de Arganil e Lousã, foram detectados exemplares de pinheiros bravos infectados.
Por proposta da autoridade florestal nacional (DGRF), o Governo vai publicar uma portaria demarcando duas novas áreas de pinhal, totalizando 6500 hectares, na freguesia de Sarzedo, em Arganil, e na freguesia da Lousã, onde serão aplicadas as medidas especiais correspondentes à Zona Afectada, sendo que na Zona de Restrição estarão inseridas áreas de alguns concelhos limítrofes.
A portaria estipula que quando sejam detectados exemplares infectados pelo nemátodo, mesmo fora da Zona Afectada, os respectivos proprietários, usufrutuários e rendeiros são notificados para proceder ao seu abate e remoção. Esta obrigação deverá ser cumprida no prazo máximo de 10 dias a contar da notificação por parte da DGRF.
As medidas agora tomadas têm por finalidade preservar a sanidade do importante recurso ambiental e económico que constitui o pinhal português, de forma a erradicar o nemátodo da madeira do pinheiro, que tem sido alvo de intensa pesquisa científica por parte do Instituto Nacional de Recursos Biológicos, IP (INRB, IP).
Convém referir que nas zonas afectadas pelo nemátodo se encontram apenas cerca de 10% do pinhal português, que no País representa 710 mil hectares de área.
De salientar ainda que esta "doença do pinheiro" afecta apenas alguns exemplares de árvores, ao contrário dos incêndios que devastam áreas contínuas de floresta.
O Ministério da Agricultura, através da Direcção-Geral dos Recursos Florestais, irá acompanhar a situação, enquanto se mantiverem estas restrições, dando especial atenção aos proprietários afectados. (…)»
[Cfr. nota de imprensa junta com a P.I. como doc. n.º 1].
2. Em 30.4.2008, pelas 11h53, o Subdiretor-Geral do Centro e das Matas Nacionais, Eng.º ………, enviou um e-mail para diversas Organizações de Produtores Florestais, onde se incluiu a A., com o seguinte conteúdo:
«Junto envio projeto do protocolo a celebrar entre a DGRF, as Câmaras Municipais da Lousã e de Arganil e diversas Organizações de Produtores Florestais, onde se inclui a de V. Excia, que pretende regular os termos em que se processará a colaboração entre as entidades identificadas na implementação de medida de erradicação do Nemátodo da Madeira do Pinheiro.
Desta forma e a fim de dar seguimento ao processo, solicito a V. Excia uma apreciação e comentários, o mais urgente possível, de preferência até ao final do dia de hoje, 30-abr-2008, que deverão ser enviados para o seguinte e-mail: ….....@dgrf.min-agricultura.pt.»;
[Cfr. e-mail junto com a P.I. como doc. n.º 2]
3. Ao referido e-mail foi junto um documento onde constava, entre o mais, o que ora se transcreve:
«PROTOCOLO DE COLABORAÇÃO
A ocorrência em Portugal de uma doença que afecta gravemente o pinhal, provocada pelo organismo Bursaphelenchus xylophilus (Steiner & Buher) Nickle, comummente designado como Nemátodo da Madeira do Pinheiro (NMP) que coloca em risco a floresta de pinho e deste modo uma importante fileira silvo-industrial, conduziu à elaboração do Programa Nacional de luta contra o Nemátodo da Madeira do Pinheiro (PROLUMP) que tem por objectivo o controlo da doença;
Foi recentemente confirmada a presença do organismo NMP em alguns exemplares de pinheiro bravo (Pinus pinaster Ait), nos Concelhos de Arganil e Lousã, respectivamente nas freguesias de Sarzedo e Lousã, tendo a Portaria n.º 305-A/2008, de 21 de Abril, incluído as referidas áreas nas zonas afectadas e de restrição previstas na Portaria n.º 103/2006, de 6 de Fevereiro;
A Portaria n.º 103/2006, de 6 de Fevereiro, com as alterações introduzidas pelas Portarias n.º 815/2006, de 16 de Agosto, n.º 321/2007, de 23 de Março e 305-A/2008, de 21 de Abril, estabelece as medidas de protecção fitossanitária indispensáveis para o combate ao NMP e do seu vector, o Monochamus galloprovinciallis (Oliv.);
Todos os operadores económicos, produtores ou outros detentores de coníferas hospedeiras estão obrigados ao cumprimento das medidas previstas na Portaria n.º 103/2006, de 6 de Fevereiro, com as alterações introduzidas pelas Portarias n.º 815/2006, de 16 de Agosto, n.º 321/2007, de 23 de Março e 305-A/2008, de 21 de Abril;
As Câmaras Municipais de Arganil e da Lousã são entidades que têm uma proximidade e um conhecimento das realidades locais, podendo apoiar, através dos seus Gabinetes Técnicos Municipais, as intervenções no território tendo em vista a erradicação do NMP;
As Organizações de Produtores Florestais situada na Zona de Restrição da Região Centro ou na sua proximidade são entidades que têm a proximidade local e que podem apoiar as intervenções no território tendo em vista a erradicação de NMP;
É celebrado o presente protocolo entre:
A Autoridade Florestal Nacional - Direção Geral dos Recursos Florestais (DGRF) (…) adiante designado como
primeiro outorgante, (…)
E as Organizações de Produtores Florestais: (…)
6- Associação de Produtores Florestais do Concelho de Arganil (…) adiante designado como sexto outorgante: (...)
Cláusula 1ª
Objecto
O presente protocolo regula os termos em que se processará a colaboração entre a Autoridade Florestal Nacional (DGRF), a Câmara Municipal de Arganil, a Câmara Municipal da Lousã, a Caule - Associação Florestal da Beira Serra, a Associação Florestal do Pinhal, a Associação de Produtores Florestais do Concelho de Arganil, a Associação de Produtores Florestais de Pampilhosa da Serra e a Associação de Produtores Florestais do Concelho de Góis, nas medidas de erradicação do NMP.
Cláusula 2ª
Âmbito de aplicação
1 - As partes acordam colaborar nos seguintes domínios:
a) Informações e sensibilização da população;
b) Identificação dos operadores económicos associados ao sector florestal;
c) Identificação informação e apoio aos proprietários, usufrutuários ou rendeiros de quaisquer parcelas de prédios rústicos ou urbanos, incluindo logradouros, localizados na Zona de Restrição do NMP;
d) Colaboração na identificação das árvores com sintomas de declínio e nas acções de prospecção do NMP, de acordo com o plano de trabalhos em anexo;
e) Reporte de situações suspeitas de incumprimento do PROLUMP, à Autoridade Florestal Nacional.
2 - O primeiro outorgante pode acordar com os quatro, quinto, sexto, sétimo e oitavo outorgantes para a realização de outros trabalhos designadamente os respeitantes aos serviços de abate e eliminação de material lenhoso. (…)
Cláusula 4ª
Ações sob responsabilidade das Organizações de Produtores Florestais
I - O quarto, quinto, sexto, sétimo, e oitavo outorgantes prestam apoio ao primeiro outorgante, nas medidas de erradicação do NMP, nomeadamente nas seguintes ações:
a) Informação e sensibilização das populações;
b) Identificação, informação e apoio aos proprietários, usufrutuários ou rendeiros de quaisquer parcelas de prédio rústicos ou urbanos, incluindo logradouros, localizados na Zona Afectada do NMP;
c) Identificação e informação dos operadores económicos associados ao sector florestal;
d) Colaboração na identificação das árvores com sintomas de declínio e nas acções de prospecção do NMP, de acordo com o plano de trabalhos em anexo;
e) Reporte de situações suspeitas de incumprimento do PROLUNP, à Autoridade Florestal Nacional (DGRF).
Cláusula 5ª
Obrigações da DGRF
1 - O primeiro outorgante compromete-se a disponibilizar toda a informação sobre este assunto e a prestar todos os esclarecimentos e a formação necessários para o desenvolvimento das ações da responsabilidade do segundo e terceiro outorgantes e referidas na cláusula 3ª e a apoiar a criação de infra-estruturas ou equipamentos que se verifiquem ser necessários vir a construir, tendo em vista a erradicação do NMP.
2 - O Primeiro outorgante compromete-se a disponibilizar toda a informação sobre o assunto e a prestar todos os esclarecimentos e a formação necessários ao desenvolvimento das ações da responsabilidade do quarto, quinto, sexto, sétimo e oitavo outorgantes, referidas na cláusula 4.ª
Cláusula 6ª
Coordenação (…)
2 - A coordenação das ações previstas na cláusula 4ª é da responsabilidade da Autoridade Florestal Nacional (DGRF), que articulará com as respectivas Organizações de Produtores Florestais as tarefas a desenvolver.
3 - Tendo em conta o acompanhamento, planeamento e avaliação periódica da aplicação do presente protocolo as partes devem promover reuniões regulares entre os seus representantes.
Cláusula 7ª
Apoios financeiros
Para o desenvolvimento das tarefas referidas no nº 2 da cláusula 2.ª, o primeiro outorgante acordará com os quatro, quinto, sexto, sétimo e oitavo outorgantes as formas de apoio bem como os meios necessários aos trabalhos a realizar por cada um. (...)”
[Cfr. protocolo de colaboração junto também com o doc. n.º 2]
4. Em 5 e 6 de maio de 2008, os representantes legais da A. remeteram dois e-mails para a Autoridade Florestal Nacional com um anexo do seguinte teor:
«No passado dia 30 de Abril foi-nos enviado por V. Exa. um Protocolo de Colaboração para erradicação do nemátodo da Madeira de pinheiro (NMP) que nos mereceu a melhor atenção e análise.
Tendo em consideração o objecto do referido protocolo a Associação de Produtores Florestais do Concelho de Arganil vem por este meio transmitir o seu maior interesse e grande disponibilidade para, através desta forma de colaboração, acordar com a Autoridade Florestal Nacional as ações e condições para controlar e erradicar no mais breve espaço de tempo o NMP.
Neste sentido, depois de avaliado e ponderado o articulado do Protocolo, continuamos com algumas dúvidas que gostaríamos ver esclarecidas, como por exemplo:
Cláusula 2ª
Na alínea d) do ponto 1, referencia-se um plano de trabalho em anexo, mas esse não consta do protocolo e seria de toda a utilidade haver conhecimento deste documento.
No ponto 2 será de todo o interesse definir à partida quais as áreas das OPF's onde podem atuar, para que desde logo sejam claras as regras. Sugerimos que as áreas de atuação sejam as áreas das respectivas OPF's, ou seja nos territórios das suas sedes sociais.
Esta nossa preocupação refere-se no que diz respeito a todo o protocolo.
Cláusula 4ª
Na alínea a) refere-se informação e sensibilização da população, sendo necessário explicitar melhor qual o âmbito desta ação, para que não haja equívocos.
No texto da alínea c), refere-se os "operadores económicos", qual o objectivo da sua identificação e informação, pensamos que terá que haver mais clareza.
Alínea e) é referida "Reporte de suspeitas de incumprimento do PROLUMP, que tipo de reporte é que está implícito?
Cláusula 5ª
No ponto 1- é referido a “criação de infra-estruturas ou equipamentos …” a que se refere esta situação, talvez seja necessário ser mais específico.
Cláusula 6ª
Como irá ser disponibilizada a informação e divulgação por parte de coordenação? Qual o fluxo de informação? As mesmas questões se colocam relativamente aos moldes da formação necessária ao desenvolvimento das ações de nossa responsabilidade.
Cláusula 7ª
Será necessário definir claramente o aspecto financeiro bem como as áreas de atuação que já referimos na apreciação da cláusula 2ª e ainda a definição bastante clara dos possíveis trabalhos a efetuar. (...)
Sendo este assunto uma questão de vital importância quer para o nosso concelho, para a região e inclusivamente para Portugal e em virtude de serem tomadas medidas com carácter de urgente, vimos por este meio propor a V. Exa. a realização de uma reunião (…)»;
[Cfr. e-mails e respectivo anexo juntos com a P.I. como doc. n.º 3]
5. Em 6.5.2008, o Chefe da Divisão de Planeamento da Circunscrição Florestal do Centro remeteu para a A. e-mail com o seguinte teor:
«Convoca-se V. Excia ou um representante da Entidade que preside, para estar presente numa reunião, amanhã, dia 7 de Maio de 2008, às 9h00 nas instalações do Governo Civil de Coimbra a fim de discutir e aprovar o teor do protocolo relativo à colaboração das OPF e CM com a DGRF.»;
[Cfr. e-mail junto com a P.I. e na mesma identificado como doc. n.º 4]
6. No dia seguinte, o Adjunto do Governador Civil de Coimbra enviou para a A. e para as demais Organizações de Produtores Florestais e-mail com o seguinte conteúdo:
«Conforme combinado, remeto, para apreciação final, a minuta de protocolo de colaboração (e mapa anexo), adaptada de acordo com as posições assumidas por todos e que, com exceção de um ou dois acertos difíceis de individualizar, ou não atinentes à OPF's, estão assinaladas a vermelho.
Solicito, após leitura atenta, uma resposta, com carácter de urgência, manifestando a concordância com os termos do protocolo e confirmando a presença, amanhã, pelas 10h25m, na Câmara Municipal de Arganil, para a respectiva subscrição.»;
[Cfr. e-mail junto à PI como doc. n.º 5]
7. Ao e-mail foi junta a referida minuta do protocolo, onde consta, entre o mais, uma alteração à redação da cláusula 7ª, exclusão da al. e) do n.º 1 da cláusula 2.ª e da al. e) do n.º 1 da cláusula 4.ª, e alteração à redação da Cláusula 7ª, ficando esta com a seguinte redação:
“(...) Cláusula 7ª
Apoios financeiros
Para o desenvolvimento das tarefas referidas na cláusula 2.ª e 4.ª, o primeiro outorgante acordará com todos os restantes, através de contrato ou protocolo, as formas de apoio bem como os meios necessários aos trabalhos a realizar por cada um. (...)”
8. Ainda no dia 7.5.2008, a A. enviou e-mail para o Adjunto do Governador Civil de Coimbra, onde consta, entre o mais, o seguinte:
«Acusamos a recepção da versão do Protocolo de Colaboração, por si enviado, na sequência da reunião desta manhã.
Após análise, a redação … merece as nossas reservas em algumas cláusulas, e nesse sentido as nossas propostas de alteração são as que estão assinaladas em cor azul no anexo.
Contudo, tendo em consideração a vontade do Ministério da Agricultura, em assinar este Protocolo amanhã, dia 8 de Maio, e guiados pelo espírito de colaboração que queremos ter com o MADRP no sentido de responder de forma efetiva aos problemas que afectam a floresta e aos proprietários da nossa região, vimos transmitir que esta Associação estará amanhã presente para assinar o Protocolo nos termos em que nos foi enviado.
Esta decisão alicerçasse (sic), na forma empenhada como o Governo Civil conduziu este assunto e se predispõe a acompanhá-lo no futuro. E na certeza que a ação do Ministério será presidida pelo … espírito das conclusões da reunião de hoje.
De entre as questões que se revestem de maior importância neste processo:
- O respeito pelas áreas de intervenção constantes no mapa anexo ao protocolo na execução de todas as atividades previstas no protocolo.
- À celeridade e transparência na elaboração e contratualização e operacionalização dos planos de trabalhos.
- A imediata homologação do protocolo.
Agradecendo toda a sua disponibilidade e interesse do Governo Civil na mediação deste processo, contamos com a sua colaboração no acompanhamento deste dossier.
Pela nossa parte podem sempre contar com empenho e colaboração no sentido de melhor defendermos a nossa floresta, os proprietários florestais e a atividade económica da região.
(...)»;
[Cfr. e-mail e anexo juntos com a P.l. como doc. n.º 6]
9. Ao e-mail referido no ponto anterior, a A. juntou o designado protocolo de colaboração dando a seguinte redação à cláusula 2.ª:
«(...) Cláusula 2ª
Âmbito de aplicação
(...) 2 - O primeiro outorgante, acordará um plano de trabalhos em sede das reuniões previstas no âmbito do nº 3 da Cláusula 6ª, com os quatro, quinto, sexto, sétimo, oitava, nono e décimo outorgantes, para a realização de outros trabalhos designadamente (...)
3- As ações previstas nos nºs anteriores serão executadas tendo por referência o mapa em anexo. (...)”
10. Em 8.5.2008, foi então outorgado entre a Entidade Demandada, os Municípios de Arganil e de Lousã, a A. e mais seis Organizações de Produtores Florestais o documento designado de Protocolo de Colaboração, onde consta, entre o mais, o seguinte:
«PROTOCOLO DE COLABORAÇÃO
A ocorrência em Portugal de uma doença que afecta gravemente o pinhal, provocada pelo organismo Bursaphelenchus xylophilus (Steiner & Buher) Nickle, comummente designado como Nemátodo da Madeira do Pinheiro (NMP), que coloca em risco a floresta de pinho e deste modo uma importante fileira silvo-industrial, conduziu à elaboração do Programa Nacional de Luta Contra o Nemátodo da Madeira do Pinheiro (PROLUMP que tem por objectivo o controlo da doença;
Foi recentemente confirmada a presença do organismo NMP em alguns exemplares de pinheiro bravo (pinus pinaster Ait), nos Concelhos de Arganil e Lousã, respectivamente nas freguesias de Sarzedo e Lousã, tendo a Portaria n.º 305-A/200B, de 21 de Abril, incluído as referidas áreas nas zonas afectadas e de restrição previstas na Portaria n.º 103/2006, de 6 de Fevereiro;
A Portaria n. ° 103/2006, de 6 de Fevereiro, com as alterações introduzidas pelas Portarias n.° 815/2006, de 16 de Agosto, n.º 321/2007, de 23 de Março e 305-A/2008, de 21 de Abril, estabelece as medidas de proteção fitossanitária indispensáveis para o combate ao NMP e do seu vector, o Monochamus galloprovinciallis (Oliv.):
Todos os operadores económicos, produtores ou outros detentores de coníferas hospedeiras estão obrigados ao cumprimento das medidas previstas na Portaria n. º 103/2006, de 6 de Fevereiro, com as alterações introduzidas pelas Portarias n.º 815/2006, de 16 de Agosto, n.º 321/2007, de 23 de Março e 305-A/2008, de 21 de Abril.
As Câmaras Municipais de Arganil e da Lousã são entidades que têm uma proximidade e um conhecimento das realidades locais, podendo apoiar, através dos seus Gabinetes Técnicos Municipais, as intervenções no território tendo em vista a erradicação do NMP;
As Organizações de Produtores Florestais situadas na Zona de Restrição da Região Centro ou na sua proximidade são entidades que têm uma proximidade local e que podem apoiar as intervenções no território tendo em vista a erradicação do NMP;
É celebrado o presente protocolo entre:
A Autoridade Florestal Nacional - Direção Geral do Recursos Florestais (DGRF) (…) adiante designado como primeiro outorgante,
(...) E as Organizações de Produtores Florestais: (...)
6- Associação de Produtores Florestais do Concelho de Arganil (…) adiante designado como sexto outorgante;
(…) Cláusula 1ª
Objecto
O presente protocolo regula os termos em que se processará a colaboração entre a Autoridade Florestal Nacional (DGRF), a Câmara Municipal de Arganil, a Câmara Municipal da Lousã, a Caule - Associação Florestal da Beira Serra, a Associação Florestal do Pinhal, a Associação de Produtores Florestais do Concelho de Arganil, a Associação de Produtores Florestais de Pampilhosa da Serra, a Associação de Produtores Florestais do Concelho de Góis, a FLOPEN- Associação de Produtores e Proprietários Florestais do Concelho de Penela e a SEBALDIC - Associação dos Baldios e Produtores Florestais do Centro, nas medidas de erradicação do NMP.
Cláusula 2ª
Âmbito de aplicação
I - As Partes acordam colaborar nos seguintes domínios:
a) Informações e sensibilização da população;
b) Identificação dos operadores económicos associados ao sector florestal;
c) Identificação, informação e apoio aos proprietários, usufrutuários ou rendeiros de quaisquer parcelas de prédios rústicos ou urbanos, incluindo logradouros, localizados na Zona de Restrição do NMP;
2 - O primeiro outorgante pode acordar um plano, em sede de reuniões previstas no âmbito do nº 3 da Cláusula 6ª com os quarto, quinto, sexto, sétimo, oitavo, nono e décimo outorgantes para a realização de outros trabalhos, designadamente:
a) a colaboração na identificação das árvores com sintomas de declínio e nas acções de prospecção do NMP, enquadrada num plano de trabalhos a acordar com cada um dos outorgantes;
b) os respeitantes aos serviços de abate e eliminação de material lenhoso.
Cláusula 3ª
Ações sob responsabilidade das Câmaras Municipais (...)
Cláusula 4ª
Ações sob responsabilidade das Organizações de Produtores Florestais
1 - O quarto, quinto, sexto, sétimo, oitavo, nono e décimo outorgantes prestam apoio ao primeiro outorgante, nas medidas de erradicação do NMP, nomeadamente nas seguintes ações:
a) Informação e sensibilização das populações;
b) Identificação, informação e apoio aos proprietários, usufrutuários ou rendeiros de quaisquer parcelas de prédios rústicos ou urbanos, incluindo logradouros, localizados na Zona Afectada do NMP;
c) Identificação e informação dos operadores económicos associados ao sector florestal;
d) Colaboração na identificação das árvores com sintomas de declínio e nas ações de prospecção do NMP;
Cláusula 5ª
Obrigações da DGRF
1 - O primeiro outorgante compromete-se a disponibilizar toda a informação sobre este assunto e a prestar todos os esclarecimentos e a formação necessários para o desenvolvimento de tarefas que venham a ser assumidas pelos Gabinete Técnicos Florestais, neste âmbito, bem como a apoiar, através da subscrição de contrato ou protocolo, a criação de infra-estruturas ou equipamentos cuja necessidade se venha a constatar, tendo em vista a erradicação do NMP.
2 - O Primeiro outorgante compromete-se a disponibilizar toda a informação sobre o assunto e a prestar todos os esclarecimentos e a formação necessários ao desenvolvimento das ações da responsabilidade do quarto, quinto, sexto, sétimo, oitavo, nono e décimo outorgantes, referidas na cláusula 4.ª
Cláusula 6ª
Coordenação (...)
2 - A coordenação das ações previstas na cláusula 4ª é da responsabilidade da Autoridade Florestal Nacional (DGRF), que articulará com as respectivas Organizações de Produtores Florestais as tarefas a desenvolver.
3 - Tendo em conta o acompanhamento, planeamento e avaliação periódica da aplicação do presente protocolo se definirá a exata periodicidade.
Cláusula 7ª
Apoios financeiros
Para o desenvolvimento das tarefas referidas na cláusula 2ª e 4ª, o primeiro outorgante acordará com todos os restantes, através de contrato ou protocolo, as formas de apoio bem como os meios necessários aos trabalhos a realizar por cada um. (…)»;
[Cfr. protocolo de colaboração junto como doc. 7 à P.I.]
11. A A. organizou e divulgou sessões de esclarecimento sobre o nemátodo da madeira do pinheiro, no decorrer do ano de 2008, nos seguintes termos:
Data Local Data Local,
23 de Abril Sarzedo 23 de Junho Barril de Alva
8 de Maio Celavisa 24 de Junho Pomar
21de Maio Sarzedo 25 de Junho Moura da Serra
16 de Junho Pombeiro da Beira 25 de Junho Piódão
16 de Junho S. Martinho da Cortiça 26 de Junho Arganil
17 de Junho Cepos 26 de Junho Folques
17 de Junho Teixeira 30 de Junho Côja
18 de Junho Benfeita 02 de Julho Anseriz
18 de Junho Cerdeira 10 de Julho Vila Cova de Alva
19 de Junho Secarias 24 de Outubro Pombeiro da Beira
19 de Junho Côja ------ -----
[Cfr. listas de presença juntas com a P.I. como documento n.º 8 e e-mails de 16 de maio de 2008 e de 9 de junho de 2008 juntos com a P.I. como documento n.° 9]
12. Em 28.5.2008, foi realizada uma reunião no âmbito do Protocolo do Colaboração entre representantes da Direção-Geral dos Recursos Florestais e representantes das Organizações de Produtores Florestais, entre os quais o Senhor ………. em representação da A., sobre a qual foi elaborada ata, onde consta entre o mais:
«(...) O engenheiro ……… da FLOPEN referiu que a operacionalização do protocolo é tímida, pois atualmente só está centrado na informação e gostava de perceber de forma é que o Estado está a pensar em ressarcir as OPF envolvidas no protocolo, pelos trabalhos de divulgação e de sensibilização sobre o NMP.»;
[Cfr. ata da reunião da 2.ª reunião da Unidade Operacional PROLUNP CENTRO junta com a P.I. como doc. n.º 11]
13. Em 27.10.2008, o Chefe de Gabinete do Secretário de Estado do Desenvolvimento Rural e das Florestas remeteu para a A. ofício com o seguinte teor:
«Assunto: Ações realizadas no âmbito do Protocolo de Colaboração para o Programa de Luta Contra o Nemátodo da Madeira do Pinheiro na Região Centro
Com referência ao protocolo de colaboração para o Programa de Luta Contra o Nemátodo da Madeira do Pinheiro da Região Centro e em sequência do trabalho conjunto que tem sido desenvolvido no âmbito do citado protocolo, solicita-se a V. Ex.ª o envio a este Gabinete de uma informação que identifique o ponto de situação das ações realizadas por essa associação, os exemplares dos materiais produzidos e as facturas correspondentes aos trabalhos e materiais executados.»;
[Cfr. ofício junto com a P.I. como doc. n.º 12, e por acordo quanto à data a constante (art. 19.º da P.I., não impugnado)]”
*
O DIREITO
Como resulta de 10 da matéria de facto, em 8.5.2008, foi outorgado entre a entidade demandada, os Municípios de Arganil e da Lousã, a A. e mais seis Organizações de Produtores Florestais o documento designado de Protocolo de Colaboração.
A questão de que importa conhecer nos presentes autos e como , aliás, resulta do acórdão que admitiu a revista é a de saber se o réu deve pagar à autora os serviços que esta lhe prestou que se “traduziram em sessões de esclarecimento, junto dos proprietários do “pinheiro bravo” visando a erradicação do organismo designado como Nemátodo da Madeira do Pinheiro.”
Ambas as instâncias entenderam que o réu não tinha o dever de pagar à autora os serviços em causa por não ter sido celebrado contrato ou protocolo ao abrigo da cláusula 7ª do referido Protocolo de Colaboração em que ambas intervieram.
Pretende a aqui autora que, apesar de não ter celebrado qualquer contrato ou protocolo ao abrigo da cláusula 7ª do referido Protocolo, recebeu, em 27 de outubro de 2008 do Gabinete do Secretário de Estado do Desenvolvimento Rural e das Florestas um ofício onde lhe era solicitado o “envio a este Gabinete de uma informação que identifique o ponto de situação das ações realizadas por essa associação, os exemplares materiais produzidos e as facturas correspondentes aos trabalhos e materiais executados.”
Pelo que, conclui que foi expressamente aceite por este Secretário de Estado, que superintendia na área de atribuição, o pagamento dos serviços por si prestados.
Sendo que seria jurídica e eticamente indefensável que fosse ela a arcar com os prejuízos da urgente necessidade de intervenção do Estado, que lhe solicitou os serviços.
Nesse âmbito a aqui recorrente organizou e divulgou sessões de esclarecimento sobre o nemátodo da madeira do pinheiro, no ano de 2008.
Contudo, não foi celebrado qualquer contrato ou protocolo ao abrigo da referida cláusula 7ª.
Impõe-se, assim, interpretar o referido Protocolo, e nomeadamente a referida cláusula 7ª, socorrendo-nos das regras de interpretação dos negócios jurídicos, constantes dos artigos 236.° a 238.° do Código Civil.
E, em caso de dúvida sobre o entendimento a dar à declaração negocial o art. 236.°, n.º 1, do Código Civil, dispõe que prevalecerá a interpretação que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, deva deduzir do comportamento do declarante e se permanecerem dúvidas há que recorrer aos critérios dos artigos 237.° e 238.°, n.° 1, do Código Civil.
É que, as partes, ao celebrar qualquer contrato, podem, dentro dos limites da lei, incluir as cláusulas de um ou mais contratos típicos, bem como de cláusulas atípicas que não figurem naqueles contratos.
Então vejamos.
Resulta da cláusula 7ª do Protocolo de Colaboração que a autora celebrou com os Município de Arganil e de Lousã e mais seis Organizações de Produtores Florestais que: "Para o desenvolvimento das tarefas referidas nas cláusulas 2ª e 4ª o primeiro outorgante acordará com todos os restantes através de contrato ou protocolo, as formas de apoio bem como os meios necessários aos trabalhos a realizar por cada um".
Começa, assim, a mesma, por remeter para a cláusula 2.ª que diz respeito ao «Âmbito de aplicação» do Protocolo e nos termos da qual:
«1 - As Partes acordam colaborar nos seguintes domínios:
a) Informações e sensibilização da população;
b) Identificação dos operadores económicos associados ao sector florestal;
c) Identificarão informação e apoio aos proprietários, usufrutuários ou rendeiros de quaisquer parcelas de prédios rústicos ou urbanos, incluindo logradouros, localizados na Zona de Restrição do NMP;
2 - O primeiro outorgante pode acordar um plano, em sede de reuniões previstas no âmbito do nº 3 da Cláusula 6ª. com os quarto, quinto, sexto, sétimo, oitavo, nono e décimo outorgantes para a realização de outros trabalhos, designadamente:
a) a colaboração na identificação das árvores com sintomas de declínio e nas ações de prospecção do NIP, enquadrada num plano de trabalhos a acordar com cada um dos outorgantes;
b) os respeitantes aos serviços de abate e eliminação de material lenhoso» (ponto 10. do probatório).
A este propósito diz-se na decisão recorrida:
“Comecemos pelo próprio tipo de negócio. A A. entende que este configuraria um contrato … oneroso, sendo devida a retribuição pela contraparte. Ora, como é de conhecimento público e notório a realização de despesas, seja em pessoal, seja em serviços, e a celebração de negócios com o Estado e as demais entidades públicas está adstrita a formalidades especiais por lei. A celebração de negócios onerosos pelo Estado envolve a iniciação e prossecução de procedimentos pré-contratuais, com as obrigações assumidas bem definidas por escrito, tudo muito diferente do que ocorreu in casu. Daí que um declaratório normal, nestas circunstâncias, não podia, sem mais, assumir que a Entidade Demandada estaria a assumir o encargo financeiro, sem quaisquer controlos ou limites, de toda a atividade prestada ao abrigo do Protocolo.
Em segundo lugar, as circunstâncias que precederam a celebração do negócio ou contemporâneas em nada indicam que a Entidade Demandada através do presente protocolo se estivesse a vincular juridicamente a pagar à A. pela atividade exercida. Esse apoio financeiro, ou contraprestação contratual, sempre estariam dependentes de acordo ou contrato ulterior, como diz expressamente o contrato. De resto, nesse sentido aponta a diferença entre a Cláusula 7.ª na versão inicial do Protocolo e a redação constante na versão que acompanhou o e-mail de 7.5.2008 do Adjunto do Governador Civil de Coimbra, esta coincidente com aquela que acabou por ficar consagrada na versão final outorgada (cfr. factos provados sob os pontos 3.,6.,7. e 10.). Enquanto na versão inicial se referia simplesmente que a Entidade Demandada «acordará», na versão final fez-se constar que aquela «acordará (...) através de contrato ou protocolo», o que introduz claramente um teor marcadamente mais exigente para a concessão de qualquer apoio.
A própria A. pede definição na componente financeira do protocolo quando envia os comentários à versão inicial (cfr. ponto 4. do probatório), demonstrando a natureza incerta que o teor da cláusula sub judice lhe suscita.
Também o facto de a A ter iniciado as sessões de esclarecimento a 23.4.2008 (cfr. facto provado sob o ponto 11.) antes sequer do início das negociações do Protocolo despoletado pelo e-mail de 30.4.2008, leva a questionar o que levaria a Entidade Demandada a vincular-se ao pagamento por uma atividade que estaria já a ser prestada pela A..
Quanto à finalidade do negócio, parece-nos clara preponderância do escopo organizatório do mesmo. Pretendeu-se com o mesmo, sobretudo, regular a coordenação e colaboração entre as partes envolvidas no combate ao NMP, sobressaindo, entre o mais, a necessidade de articulação entre as várias Organizações de Produtores Florestais, como demonstra, aliás, a preocupação da A. no comentário à Cláusula 2.ª do Protocolo e na parte final do e-mail de 7.5.2008 (cfr. pontos 4.e 8.do probatório).
Por fim, cumpre considerar a letra do negócio.
Esta afasta, decisivamente, a pretensão da A. no sentido de que esta Cláusula 7.ª estabelece a obrigação de remunerar os serviços prestados pelas Organizações dos Produtores Florestais.
Com efeito, o texto da cláusula diz expressamente que «o primeiro outorgante acordará com todos os restantes, através de contrato ou protocolo, as formas de apoio» (sublinhado nosso).
Ao exigir o pagamento por força da celebração deste protocolo, só dando um salto lógico na interpretação desta cláusula seria defensável o entendimento de que a Entidade Demandada ficou adstrita a financiar as atividades livremente exercidas pela A..
A única coisa que poderia resultar do protocolo, para além das demais obrigações de cooperação, coordenação e colaboração, seria a promessa de celebração de um protocolo ou contrato onde se previsse o apoio das atividades desenvolvidas referidas na Cláusula 2.ª E isto não é o mesmo que ficar adstrito a apoiar as atividades exercidas depois da celebração.
Em suma, decerto que o único vínculo jurídico que poderia ter-se eventualmente por constituído através daquela cláusula seria a celebração de um ulterior protocolo ou contrato.
Mas não é a execução específica dessa "cláusula-promessa" que o A. pretende, ele vem antes pedir a remuneração por um negócio que ainda não celebrou. Vem, permita-se a comparação, como um trabalhador, exigir a remuneração ao futuro empregador quando apenas celebrou, quanto muito, um contrato-promessa de contrato de trabalho.
Assim, embora se pudesse ter por prometido, o que também nos suscita dúvidas, face à não fixação de qualquer termo para celebração, não resulta dos autos que esse protocolo ou contrato haja sido celebrado e que deva, portanto, ser cumprido.
Aliás, revisitada a P.I., nada é alegado sobre a existência de um contrato ou protocolo ulterior ao aqui em discussão.
Tudo isto, maxime a letra do negócio, leva a que soçobrem as demais alegações da A., nomeadamente a questão de pagamentos a outras associações, bem como o pedido constante do ofício do Chefe de Gabinete do Secretário de Estado do Desenvolvimento Rural e das Florestas, porquanto para haver apoio financeiro sempre se impunha, de acordo com a letra do Protocolo de Colaboração, a celebração de outro protocolo ou contrato entre a A. e a Entidade Demandada.”
Contudo, colocam-se, outras questões, como se diz no acórdão que admitiu a revista, “a questão colocada é a de saber se os serviços prestados pela autora devem ou não ser pagos pelo réu, muito embora seja certo que não chegou a ser formalizado qualquer contrato ou protocolo, nos termos previstos na cláusula 7ª do denominado Protocolo de Colaboração...Com efeito, se por um lado, a prestação de serviços pela autora foi feita no âmbito de um protocolo e a sua necessidade não está posta em causa, também é certo que não foram seguidas as formalidades previstas para o respectivo pagamento.
Este tipo de situações – em que a atuação no terreno é levada a cabo sem o suporte jurídico formalmente adequado- é sempre controverso. O Estado aproveita os serviços prestados por quem os devia prestar e que foram efetivamente programados, não põe em causa a sua necessidade, mas por não terem sido seguidos os passos formalmente exigidos para o seu pagamento, recusa esse pagamento.”
Mas, na realidade, ao referido Protocolo não falta apenas determinar, nos termos da cláusula 7ª, a contrapartida financeira devida pela ré, que poderia sê-lo pelo tribunal, nos termos dos arts. 400° n° 2 e 883° n° 1 do C.Civil.
Como afirma o MP no seu douto parecer “do contrato/protocolo em causa não derivava, sequer, de forma imediata qualquer obrigação, já que a fixação das prestações (de "facere" ou de apoio) foram expressamente relegadas para contrato/protocolo ulterior. Ora, como é óbvio, só existe "obrigação" quando se está perante uma vinculante prestação (cfr. arts. 397° e 762° n° 1 do C.Civil); no caso, contrariamente ao alegado pela Autora, não foi meramente deixada indeterminada a obrigação de eventual apoio financeiro (admitido pela cláusula 7ª); foi, desde logo, remetido para um previsto e, por isso, essencial contrato ou protocolo ulterior a fixação das próprias ações a serem desenvolvidas.”
E assim é.
Como resulta do n° 2 da cláusula 6ª do Protocolo aqui em causa «a coordenação das ações previstas na cláusula 4ª é da responsabilidade da "Autoridade Florestal Nacional, DGRF" ...que articulará com as respectivas Organizações de Produtores Florestais as tarefas a desenvolver», o que significa que não foram apenas os apoios financeiros ou outros que ficaram por determinar mas as tarefas e ações a desenvolver que seriam definidas - pela "Autoridade Florestal Nacional" a quem o "Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, I.P." sucedeu, em todos os direitos e obrigações.
Não se poderá, pois, estar a falar de apoios financeiros quando nem sequer estavam definidas as ações a realizar.
É que, não estando sequer definidas as próprias ações e tarefas a desenvolver, como previsto na cláusula 6ª n° 2 do Protocolo não se pode ter constituído qualquer obrigação de pagamento de apoios à autora por parte da ré.
Não pode, pois, o tribunal substituir-se às partes de um contrato e determinar
apoios relativos a ações e tarefas que cabia a uma das partes definir, no caso a "AFN" com desenvolvimento dos meios e apoios.
Não podia, pois, a autora assumir a definição das ações e tarefas a desenvolver postergando o conteúdo da cláusula 6ª nº 2 do Protocolo.
Também não pode este tribunal substituir-se às partes nessa definição.
Tanto mais que muitas das atividades apresentadas pela autora como alegadamente desenvolvidas à sombra do Protocolo são, na verdade, atividades coincidentes com o trabalho normal do seu dia a dia, inerente às suas atribuições associativas (genericamente, de aconselhamento técnico e de apoio aos seus associados, produtores florestais do concelho de Arganil).
E daí que não se possam retirar as ilações que a recorrente pretende do facto de ter recebido em 27 de outubro de 2008 do Gabinete do Secretário de Estado do Desenvolvimento Rural e das Florestas um ofício onde lhe era solicitado o "envio a este Gabinete de uma informação que identifique o ponto de situação das ações realizadas por essa associação, os exemplares materiais produzidos e as facturas correspondentes aos trabalhos e materiais executados".
Em suma, a falta de fixação no Protocolo celebrado das ações e tarefas a desenvolver e dos meios e apoios consequentes, não permite, apesar do ofício em causa, e dada a impugnação pela ré nos arts. 58° a 67° da sua contestação, que a autora possa ter direito às quantias por si reclamadas.
É, pois, de negar provimento ao recurso.
*
Em face de todo o exposto acordam os juízes deste STA em negar provimento ao recurso e manter a decisão recorrida.

Lisboa, 2 de Julho de 2020. – Ana Paula Portela (relatora) – Madeira dos Santos – Carlos Carvalho.