Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0133/11.8BEPNF
Data do Acordão:09/27/2019
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:MADEIRA DOS SANTOS
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
RESPONSABILIDADE HOSPITALAR
MORTE
Sumário:Justifica-se admitir as revistas interpostas por ambas as partes do acórdão do TCA – que revogou a sentença absolutória do TAF – recaído sobre a responsabilidade de um hospital pela morte de uma senhora, ocorrida no bloco operatório e aparentemente relacionada com uma sobredosagem e intoxicação medicamentosa, por se tratar de assunto relevante e que, no caso, se mostra juridicamente complexo.
Nº Convencional:JSTA000P24916
Nº do Documento:SA1201909270133/11
Data de Entrada:07/10/2019
Recorrente:CENTRO HOSPITALAR DO TÂMEGA E SOUSA, EPE, E OUTRA
Recorrido 1:OS MESMOS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, no Supremo Tribunal Administrativo:
Os autores A……… e B……., por um lado, e o réu Centro Hospitalar do Tâmega e Sousa, EPE, por outro, interpuseram recursos de revista do acórdão do TCA Norte que, revogando a sentença absolutória do TAF de Penafiel, condenou o réu a indemnizar os autores pelos prejuízos causados pelo falecimento da sua mulher e mãe, ocorrida naquele hospital.

Ambas as revistas questionam parcialmente a bondade do acórdão recorrido, preconizando uma melhor aplicação do direito.
Os autores contra-alegaram, defendendo o não provimento do recurso do réu.

Cumpre decidir.
Em princípio, as decisões proferidas em 2.ª instância pelos TCA’s não são susceptíveis de recurso para o STA. Mas, excepcionalmente, tais decisões podem ser objecto de recurso de revista em duas hipóteses: quando estiver em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, assuma uma importância fundamental; ou quando a admissão da revista for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito («vide» o art. 150º, n.º 1, do CPTA).
Discute-se nos autos a responsabilidade civil do Centro Hospitalar réu por causa da morte da mulher e mãe dos autores, ocorrida no bloco operatório. A acção improcedeu no TAF e procedeu em parte no TCA.
Na sua revista, o Centro Hospitalar centra-se na questão de saber se a factualidade apurada – que sofreu modificações na 2.ª instância – permite responsabilizá-lo. Já os autores questionam o aresto «sub specie» por ele não ter atribuído qualquer indemnização pelos danos morais sofridos pela própria vítima e por haver calculado mal o «quantum» indemnizatório ligado aos ganhos patrimoniais que, não fora o falecimento, ela obteria.
A problemática do processo é relevante, por respeitar à morte de uma senhora de apenas vinte e seis anos, ocorrida em contexto hospitalar e aparentemente motivada por sobredosagem e intoxicação medicamentosa. E o assunto encerra dificuldades jurídicas, aliás reveladas nas pronúncias opostas que as instâncias emitiram sobre a crucial questão da responsabilidade do réu. Ademais, o acórdão aqui sob recurso – mau grado o seu ingente esforço na reanálise da matéria de facto – não é absolutamente apodíctico; pois tanto diz que houve uma violação das «leges artis», o que pressuporia um certo erro (v.g, na dosagem do medicamento ministrado à vítima), como afirma que ocorreu um «funcionamento anormal do serviço» ou «faute du service» – figura que reconduz as anomalias e os seus efeitos mais ao plano da organização do que da execução («in actu exercito»).
Estas hesitações e a manifesta relevância do assunto justificam a admissão da revista interposta pelo réu.
O que logo induz ao recebimento da revista dos autores – que, aliás, também seria justificável «a se».
Convém, portanto, que o STA reveja a presente temática, onde confluem várias «quaestiones juris» significativas no domínio da responsabilidade hospitalar.

Nestes termos, acordam em admitir as revistas.
Sem custas.
Porto, 27 de Setembro de 2019. – Madeira dos Santos (relator) – Costa Reis – São Pedro.