Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0289/18.9BELRA
Data do Acordão:01/16/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:ERRO NA FORMA DE PROCESSO
CITAÇÃO
PENHORA DE BENS
BENS COMUNS DO CASAL
Sumário:Não ocorre erro na forma de processo se a recorrente não pretendeu arguir perante o juiz a sua falta de citação e daí retirar consequências jurídicas atinente ao acto em si próprio, tendo-o feito apenas para sustentar a oportunidade da sua intervenção no processo de oposição e na circunstância concreta de ter sido efectuada a penhora de bens comuns do casal.
Nº Convencional:JSTA000P24092
Nº do Documento:SA2201901160289/18
Recorrente:A..... E B.....
Recorrido 1:AT-AUTORIDADE TRIBUTÁRIA A ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – RELATÓRIO
B………, melhor identificada nos autos, vem recorrer para este Supremo Tribunal da decisão do TAF de Leiria que julgou verificada a exceção dilatória insuprível do erro na forma de processo e em consequência absolveu a Fazenda Pública da instância.
Inconformada com o assim decidido, apresentou as respectivas alegações que resumiu nas seguintes conclusões:
«A) - A oponente mulher, ora recorrente, alegou a nulidade processual de falta de citação apenas para justificar a tempestividade do meio processual da oposição.
B) – À data da apresentação da oposição, a oponente, embora não tivesse sido citada para a execução, tinha tomado conhecimento da mesma.
C) – Pelo que, a recorrente/oponente, a partir do momento em que tomou conhecimento da execução fiscal, passou a ter interesse direto em demandar a Administração Tributária, pois invoca factos que a comprovarem-se determinam a inexigibilidade da dívida, isto é, o seu interesse em deduzir oposição nos termos em que o fez.
D) – A lei estabelece um prazo perentório para a dedução da oposição, cujo decurso extingue o direito de praticar o ato, atento o art. 139º do CPC.
E) – A oposição pode ser deduzida no prazo de trinta dias a contar da respetiva citação pessoal ou a contar do conhecimento pelo executado (alíneas a) e b) do n.º 1 do art.º 203º do CPPT).
F) – Pelo que, o prazo perentório define o “dies ad quem” e não o “dies a quo”.
G) – Ao contrário da cominação da extemporaneidade prevista para a ultrapassagem do prazo de 30 dias após citação ou o conhecimento, a lei não prevê a extinção do direito ou preclusão para o ato prematuro.
H) - Ora, no caso concreto, o prazo para dedução da oposição não havia expirado, pelo contrário, não se teria, ainda, iniciado, onde não se pode dizer que foi transposto o limite no que concerne ao prazo perentório previsto.
I) – No caso dos autos a recorrente ao tomar conhecimento da execução adiantou-se na dedução da oposição, antecipando-se ao momento da citação.
J) – A recorrente não usou a oposição judicial como meio de invocar uma nulidade processual em si mesma, e tendo deduzido oposição à execução antes da citação, resulta que a falta desta (ainda que constitua nulidade processual) serve para justificar a tempestividade do pedido formulado em sede de oposição judicial e não para justificar o meio processual utilizado.
L) – Pelo que se impunha a apreciação do pedido, pois a causa de pedir não era a declaração da nulidade processual da falta de citação, sendo esta apenas invocada para efeito de tempestividade da oposição.
M) – É entendimento da jurisprudência do STA que “Pode conhecer-se da nulidade da citação no processo de oposição à execução fiscal se tal conhecimento for necessário para apreciar da caducidade do direito de deduzir essa oposição.” - acórdão de 05/07/2017, proferido do processo 0721/15.
N) – A falta de citação não constitui causa de pedir mas fundamento da tempestividade da ação, tendo-se por sanada a nulidade processual assim que a recorrente deduziu a oposição.
O) – Efetivamente, a ora recorrente, ao intervir no processo executivo através da dedução de oposição judicial, preencheu as finalidades da citação e demonstrou que a falta desta não impediu o exercício do direito de defesa, logo, a dedução de oposição demonstrou que a recorrente não tinha interesse em arguir essa omissão encontrando-se sanada a nulidade.
P) – Além do mais, a decisão recorrida violou o disposto no n.º 1 do art.º 203º do CPPT e art.º 139º do CPC e violou também o princípio da economia processual, pois, embora à data da dedução da oposição fiscal a oponente não tivesse, ainda, sido citada, resulta do PAO a fls. 116, que posteriormente à entrada da p.i. de oposição, a citação da oponente mulher, nos termos dos art.º 220º e 239º do CPPT, foi efetivamente realizada pelo OEF.
Q) – Ora, resultando dos autos de oposição (fls. 116 do PAO) que a ora recorrente veio a ser citada pelo OEF, nos termos e para os efeitos do art.º 239.º, n.º 1 do CPPT, conclui-se que a ora recorrente assume a posição de executada, podendo exercer todos os direitos processuais, incluindo deduzir oposição à execução, o que fez por antecipação ao momento da citação.
R) – Pelo que, atendendo aos factos devidamente documentados nos autos, nomeadamente no PAO, e às normas legais aplicáveis, designadamente o disposto no n.º 1 do art.º 203º do CPPT e art.º 139º do CPC, a douta sentença recorrida não pode manter-se na ordem jurídica.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e em consequência ser revogada a douta sentença recorrida, e ser admitida a oposição quanto à ora recorrente seguindo o processo os trâmites subsequentes.»
Não foram apresentadas contra alegações.
O Ministério Público emitiu parecer com o seguinte conteúdo:
«1. Veio a Oponente B……… interpor recurso da sentença proferida em 19/06/2018, pela M.ma Juíza de Direito do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, circunscrito ao segmento decisório que considerou verificada a exceção dilatória insuprível do erro na forma de processo, e em consequência, absolveu a Fazenda Pública da instância (cfr. a sentença de fls. 288 a 297 e, ainda, as alegações, insertas de fls. 312 a 320 do processo em suporte digital SITAF, abreviadamente, p. d.)
A ora Recorrente veio imputar à decisão judicial impugnada erros de julgamento na interpretação e aplicação do direito, com o que se mostrariam concretamente afrontadas, quer as disposições legais constantes do n.º 1 do artigo 203.º do CPPT e do artigo 139.º do Código de Processo Civil (CPC), quer o princípio da economia processual (vide as Conclusões, juntas de fls. 318 a 320 do p. d.)
Assim, a única questão jurídica suscitada prende-se com a eventual ocorrência de erro de julgamento, quanto à julgada verificação da exceção dilatória de erro na forma do processo e à consequente absolvição da AT da instância.
2. Desde já, o Ministério Público avança que, no seu entendimento, não assiste qualquer razão à Recorrente, quando pugna pela revogação da decisão judicial em crise.
Assim, o erro na forma do processo ou no meio processual consubstancia-se na utilização de um meio processual inidóneo para fazer valer a pretensão formulada em juízo e comporta uma nulidade processual de conhecimento oficioso do tribunal, de harmonia com o que dispõem os artigos 193.º, 196.º e 200.º, n.º 2, todos do CPC, aplicáveis ex vi artigo 2.º, alínea e), do CPPT.
Destarte, o erro na forma de processo afere-se pelo pedido formulado pelo Autor e já não pela causa de pedir enunciada, sem embargo de esta poder ser aproveitada como elemento de interpretação do pedido (Neste sentido, vide o douto Acórdão deste Colendo Supremo Tribunal Administrativo, tirado em 28/05/2014, no Processo n.º 01086/13, que consagrou o entendimento segundo o qual “I - O erro na forma do processo, nulidade decorrente do uso de um meio processual inadequado à pretensão de tutela jurídica formulada em juízo, afere-se pelo pedido e não pela causa de pedir, conquanto esta possa ser utilizada como elemento de interpretação daquele, quando a esse respeito existam dúvidas. (…)”.
Este douto aresto está disponível in www.dgsi.pt, tal como os demais a citar, de futuro).
Nesta conformidade, na eventualidade do pedido deduzido pelo Autor não se ajustar à finalidade abstratamente definida na lei para essa forma processual, verificar-se-á um erro na forma do processo.
Por seu turno, a inadequação da causa de pedir alegada pelo Autor, em função do pedido formulado e da ação concretamente proposta, relevará, tão-somente, em sede da procedência ou improcedência da ação, e não a nível da aferição do erro na forma do processo por si utilizada.
3. Examinada a petição inicial da presente oposição, constata-se que a Oponente mulher, ora Recorrente, veio, inequivocamente, suscitar a nulidade da sua falta de citação (cfr. fls. 9 a 11 do p. d.)
Assim, invocou que não lhe foi dada oportunidade para se pronunciar no processo de execução fiscal, o que o fulminaria de nulidade por falta de citação, suscetível de conhecimento até ao trânsito em julgado da decisão que ponha termo ao processo (v. os artigos 1.º a 14.º da p. i., ínsitos de fls. 9 a 11 do p. d.)
Acresce que, do petitório aí deduzido, consta, tão-somente, “(…) o arquivamento do processo executivo em relação aos oponentes” (v. fls. 17 do p. d.)
Ora, constitui jurisprudência uniforme e constante deste Colendo STA que “A falta da citação bem como a nulidade da citação, por inobservância das formalidades prescritas na lei, não constituem fundamento de oposição à execução fiscal, devendo ser arguidas perante o órgão da execução fiscal, sendo a eventual decisão desfavorável passível de reclamação para o tribunal tributário” (Vide o Acórdão do STA, de 01/07/2009, prolatado no âmbito do Processo n.º 01050/08.)
Na verdade, socorrendo-nos dos ensinamentos de JORGE LOPES DE SOUSA, “(…) relativamente a omissões de atos não será possível, em princípio, reclamar imediatamente para o juiz, pelo que o interessado deverá fazer a respetiva arguição de nulidade perante o órgão da execução fiscal e só da decisão deste que não satisfaça a sua pretensão poderá reclamar.” (In «Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado», 6.ª Edição, 2011, volume IV, pág. 271; o negrito consta do original)
4. Deste modo, cumpre assinalar o facto - verdadeiramente essencial ao desfecho do recurso jurisdicional - de a execução fiscal não ter sido instaurada contra a Recorrente, mas apenas contra o seu cônjuge.
Ora, a norma do n.º 1 do artigo 203.º do CPPT é inequívoca ao prescrever que o prazo para a dedução da oposição é de 30 dias a contar dos factos que enunciou nas suas alíneas, a saber, a) Da citação pessoal ou, não a tendo havido, da primeira penhora e b) Da data em que tiver ocorrido o facto superveniente ou do seu conhecimento pelo executado.
O que significa que só o decurso do referido prazo de 30 dias é que irá extinguir o direito de praticar o ato. Mas é inegável que não se pode extinguir o que nem sequer começou, ou seja, aquilo que não teve, ainda, o seu início.
Assim, a Oponente não poderia vir exercer direitos que estão na exclusiva titularidade i) do primitivo executado, daquele contra quem foi instaurado o processo executivo ou ii) de quem, posteriormente, foi chamado a intervir nessa qualidade, mormente, por força do que dispõe o n.º 1 do artigo 239.º do CPPT.
Ora, decorre, inequivocamente do processado que, pelo menos até à data da prolação da sentença recorrida, a Oponente não assumia as vestes de executada, a qualquer desses títulos (v. os pontos 1.2 e 1.4 do probatório, constantes de fls. 291 do p. d.)
Mas, se assim é, à luz do pedido concretamente formulado e das causas de pedir que lhe dão corpo, estava vedado à ora Recorrente o recurso a essa via judicial, à data da dedução da presente oposição (Vide, neste sentido, o douto aresto do STA, de 14/09/2016, no âmbito do Processo n.º 0971/16.)
Na verdade, no caso em presença, não foi utilizado pela Recorrente o meio próprio de reação, que consistiria na apresentação de um requerimento de arguição de nulidade da falta de citação, razão por que não merece censura a decisão judicial recorrida, ao julgar verificada a exceção de erro na forma do processo.
De resto, a situação da Oponente/Recorrente não ficou desprotegida, atendendo a que, na sequência da citação que lhe foi efetuada, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 239.º, n.º 1, do CPPT [de que nos deu notícia nas alegações em análise], a mesma passou a assumir a qualidade de coexecutada, com a inerente possibilidade de exercer todos os direitos atribuídos ao executado e, daí, o de deduzir oposição, ao abrigo do disposto nos artigos 203.º e seguintes do citado diploma (5).
Por último, o princípio da economia processual, alegadamente infringido pela sentença recorrida, não pode sobrepor-se ao princípio da legalidade, que rege as normas tributárias e, daí, constituir um obstáculo à aplicação das normas legais imperativas aplicáveis.
Em suma, o presente recurso jurisdicional terá de soçobrar in totum.
5. De todo o exposto, flui que o Ministério Público é de parecer que deverá ser negado provimento ao presente recurso jurisdicional e, consequentemente, deverá ser confirmada a sentença recorrida.»
2 - Fundamentação
O Tribunal “a quo” deu como provada a seguinte matéria de facto:
1.1. No Serviço de Finanças de Batalha foi instaurado contra a Emissora Regional Radio ……….., o processo de execução fiscal n.º 1333201201015338 e apensos, para cobrança dívidas de IVA dos períodos 2012/06T, 2012/09T, 2012/12T e 2013/03T, no valor de € 5.969,24 – cft. informação de fls. 3 a 5 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
1.2. Em 2014.05.02 o Serviço de Finanças de Batalha citou o Oponente marido, por carta registada com aviso de receção, para o processo de execução fiscal identificado no ponto que antecede, na qualidade de responsável subsidiário – cft. informação de fls. 3 a 5 e doc. de fls. 6 dos autos, que se dá por integralmente reproduzido.
1.3. Em 2018.01.26 deu entrada no Serviço de Finanças de Batalha a petição inicial da presente oposição – cft. carimbo aposto no rosto da p. i. a fls. 7 dos autos.
1.4. Consta da informação prestada pelo Chefe do Serviço de Finanças de Batalha que, no âmbito do processo de execução fiscal identificado em 1.1., a oponente mulher ainda não foi citada na qualidade de cônjuge do Oponente e para efeitos do disposto nos artigos 220.º e 239.º do CPPT – Cft. Informação de fls. 2 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
3- DO DIREITO:
A decisão recorrida depois de considerar extemporânea a apresentação da petição de oposição pelo recorrente marido expressou a seguinte fundamentação de direito para, em relação à oponente mulher, julgar verificada a excepção dilatória insuprível de erro na forma de processo e em consequência absolver da instância a Fazenda Pública:
(…) Tendo sido suscitada a exceção de caducidade do direito de ação, importa antes de mais aferir da tempestividade da presente oposição.
E dúvidas não restam que a mesma é extemporânea.
(…) Assim sendo, nos termos e com os fundamentos supra expostos, é manifesto que, quanto ao Oponente marido, caducou o direito de deduzir oposição à execução fiscal n.º 1333201201015338,(…).
Quanto à Oponente mulher, é por esta invocado que nunca foi citada para a execução, sendo esta obrigatória por ser casada com o Oponente, e os bens penhoráveis serem comuns, constituindo a falta de citação uma nulidade da mesma; alega, ainda, que é parte legítima na execução fiscal, por a dívida ser da responsabilidade de ambos os cônjuges.
Cumpre apreciar e decidir.
In casu, e conforme resulta do probatório supra, é pacífico que a Oponente não foi citada para a execução fiscal aqui em causa
Ora, como é entendimento jurisprudencial pacífico entre nós, a nulidade da citação não constitui fundamento de oposição a execução fiscal, antes constituindo causa de pedir a analisar no âmbito de reclamação de decisão do órgão de execução fiscal prevista no artigo 276º e ss. do CPPT.
Efetivamente, a arguição de nulidades em processo de execução fiscal deve ocorrer através de requerimento dirigido ao Órgão de Execução Fiscal e, em caso de indeferimento, de reclamação para o tribunal tributário, nos termos do preceituado nos artigos supra mencionados.
Assim sendo, nesta fase, encontra-se vedada à Oponente a possibilidade de deduzir oposição à execução fiscal, uma vez que não tem a qualidade de executada, podendo apenas invocar a falta de citação junto do órgão da execução fiscal.
Aliás, e conforme vem informado nos autos, a Oponente irá ser citada para a execução fiscal, desconhecendo-se, no entanto, em que termos vai ocorrer o seu chamamento à execução fiscal, já que o mesmo poderá ocorrer apenas para efeitos do disposto no artigo 220.º do CPPT, ou nos termos do artigo 239.º do mesmo código.
Efetivamente, tratando-se de execução com fundamento em responsabilidade tributária exclusiva de um dos cônjuges ou de execução para cobrança de coima fiscal, podem ser penhorados imediatamente bens comuns do casal. Todavia, nos termos do artigo 220.º do CPPT, deverá citar-se o outro cônjuge para requerer a separação judicial de bens, prosseguindo a execução sobre os bens penhorados se a separação não for requerida no prazo de 30 dias após a citação ou se for suspensa a instância no processo de separação judicial de bens por motivo de inércia do requerente em promover os seus termos. Assim, nos termos deste normativo, a citação do cônjuge do executado tem unicamente, como escopo, que ele possa requerer a separação judicial de bens.
Por seu turno, na citação prevista no artigo 239.º, n.º 1 do CPPT, o cônjuge é citado sem ser com a específica finalidade de requerer a separação judicial de bens, e perante esta citação, o cônjuge do executado assume a posição de co-executado, podendo exercer todos os direitos processuais que são atribuídos ao próprio executado, incluindo deduzir oposição à execução.
Pelo exposto, e independentemente da forma como o órgão da Execução Fiscal vier a tratar a Oponente mulher, é manifesto que a presente oposição judicial não é meio processual adequado para a apreciação da falta de citação invocada, pelo que existe erro na forma processual empregue.
Como vem sendo entendimento doutrinal e jurisprudencial uniforme dos nossos Tribunais superiores, é pelo pedido final formulado, ou seja, pela pretensão que o requerente pretende fazer valer, que se determina a propriedade ou impropriedade do meio processual empregue para o efeito, ou seja, é face ao pedido formulado em juízo pelo autor, no caso, pela Oponente mulher, que se afere a forma de processo adequada, decidindo-se a eventual questão do erro na forma do processo em face da pretensão formulada pelo autor, e pondo em confronto a petição inicial com o fim que a lei estabelece para o processo concretamente escolhido pelo demandante.
O erro na forma de processo constitui uma nulidade processual que configura exceção dilatória, de conhecimento oficioso pelo Tribunal, nos termos conjugados dos artigos 193.º, 196.º, 576.º, n.º 2, 577.º, al. b), e 578.º do CPC, aqui aplicáveis ex vi, artigo 2.º, al. e) do CPPT.
Atendendo ao disposto nos artigos 98.º, n.º 4 do CPPT, e 97.º, n.º 3 da LGT e, também, no artigo 193.º do CPC, que determinam ser o erro na forma de processo corrigível, coloca-se, então, a questão de saber se o Tribunal deve ou não convolar a presente oposição em requerimento de arguição de nulidade junto do Órgão da Execução Fiscal.
Porém, é desde logo de concluir pela impossibilidade de convolação, porquanto o pedido formulado é de arquivamento da execução fiscal quanto a ambos os oponentes, nada se pedindo, nem tão pouco de forma subsidiária ou alternativa, a este respeito da falta de citação.
Donde resulta verificar-se ocorrer a exceção dilatória insuprível do erro na forma de processo, prevista nos artigos 193.º e 577.º, al. b), do CPC, impondo-se quanto à pretensão da Oponente mulher, a absolvição da instância da Fazenda Pública.
Vencidos, são os Oponentes responsáveis pelo pagamento das custas devidas, por lhes terem dado causa (artigo 527.º do CPC).
IV. DECISÃO
Nos termos e com os fundamentos supra expendidos, quanto ao Oponente marido, julgo procedente a exceção perentória de caducidade do direito de ação e, em consequência, absolvo a Fazenda Pública do pedido, e quanto à Oponente mulher, julgo verificada a exceção dilatória insuprível do erro na forma de processo, e em consequência, absolvo a Fazenda Pública da instância(…).

DECIDINDO NESTE STA
Suscita a recorrente perante este STA, o erro de julgamento da sentença recorrida que pretende ver revogada. Como salienta o Mº Pº neste STA, o recurso é circunscrito ao segmento decisório que considerou verificada a exceção dilatória insuprível do erro na forma de processo, e em consequência, absolveu a Fazenda Pública da instância
Sustenta a sua pretensão na consideração expressa e implícita de que não questionou a citação ou a sua falta, em si própria, (não constituindo as referências à citação contidas na petição inicial, causa de pedir mas apenas fundamento da tempestividade da dedução de oposição pela oponente) e que, ao intervir no processo executivo através da dedução de oposição judicial, preencheu as finalidades da mesma citação e demonstrou que a falta desta não impediu o exercício do direito de defesa, pretendendo deste modo pôr em causa o segmento decisório da sentença que considerou haver erro na forma de processo.
Acrescenta que a decisão recorrida violou o disposto no n.º 1 do art.º 203º do CPPT e art.º 139º do CPC e violou também o princípio da economia processual, pois, embora à data da dedução da oposição fiscal a oponente não tivesse, ainda, sido citada, resulta do PAO a fls. 116, que posteriormente à entrada da p.i. de oposição, a citação da oponente mulher, veio a ser efectuada pelo OEF, nos termos e para os efeitos do art.º 239.º, n.º 1 do CPPT, pelo que assumiu a posição de executada, podendo exercer todos os direitos processuais, incluindo deduzir oposição à execução, o que fez por antecipação ao momento da citação.
Adiantamos já que se nos afigura que assiste razão à recorrente.
Lida, atentamente, a petição inicial resulta claro que a recorrente não aponta vícios à citação o que obviamente era impossível uma vez que a mesma não tinha ainda ocorrido. Daí que não se lhe possa dizer que:
“Ora, como é entendimento jurisprudencial pacífico entre nós, a nulidade da citação não constitui fundamento de oposição a execução fiscal, antes constituindo causa de pedir a analisar no âmbito de reclamação de decisão do órgão de execução fiscal prevista no artigo 276º e ss. do CPPT.
Efetivamente, a arguição de nulidades em processo de execução fiscal deve ocorrer através de requerimento dirigido ao Órgão de Execução Fiscal e, em caso de indeferimento, de reclamação para o tribunal tributário, nos termos do preceituado nos artigos supra mencionados”

Essa Jurisprudência existe sim, mas não se adequa à situação dos autos pela singela razão de que a recorrente não pretendeu arguir perante o juiz a sua falta de citação e daí retirar consequências jurídicas atinente ao acto em si próprio. Fê-lo apenas para sustentar a oportunidade da sua intervenção no processo de oposição e na circunstância concreta de ter sido efectuada a penhora de bens comuns do casal (em 20/11/2017) conforme noticia a fls. 4 dos autos o Serviço de Finanças da Batalha.
Conceitualmente, a falta de citação em processo de execução fiscal só ocorre se se verificar uma situação enquadrável nas alíneas a) a d) do n.º 1 do art. 195.º do C.P.C. e, para além disso, o respectivo destinatário alegar e demonstrar que não chegou a ter conhecimento do acto, por motivo que lhe não foi imputável (art. 190.º, n.º 5, do C.P.P.T.).
Já a nulidade de citação em processo de execução fiscal ocorre quando a citação tenha sido efectuada, mas não tenham sido observadas as formalidades previstas na lei (art. 198.º, n.º 1, do C.P.C.).
Ora como bem se definiu no acórdão deste STA de 07/09/2005, recurso nº 0950/05, são distintas as situações em que ocorre no processo de execução fiscal falta de citação e nulidade de citação. Só a falta de citação, e não também a nulidade de citação, é enquadrável na alínea a) do n.º 1 do art. 165.º do C.P.P.T. e, por isso, só aquela pode constituir nulidade insanável do processo de execução fiscal, invocável a todo o tempo até ao trânsito em julgado da decisão final, se a falta prejudicar a defesa do citado. Ainda assim é exacto que este STA tem afirmado que a falta da citação bem como a nulidade da citação, por inobservância das formalidades prescritas na lei, não constituem fundamento de oposição à execução fiscal, devendo ser arguidas perante o órgão da execução fiscal, sendo a eventual decisão desfavorável passível de reclamação para o tribunal tributário (Ac. do STA de 01/07/2009 rec.0150/08).
Aqui chegados, dúvidas não subsistem que não tendo a ora recorrente pedido a nulidade do processo executivo fiscal mas antes o seu arquivamento em relação aos oponentes com o fundamento na inexistência de fundamento para a reversão da dívida, originariamente da responsabilidade da Rádio …….. CRL, contra o seu Marido, alegando que este não tinha a gerência efectiva e de facto, então a sentença recorrida não podia considerar a ocorrência de erro na forma de processo como fez.
E, sendo certo que a sentença recorrida em substância nada mais apreciou/decidiu, então pelas razões expostas é de revogar a sentença recorrida e determinar a baixa dos autos à primeira instância para eventual conhecimento das questões que a ora recorrente suscitou na sua petição inicial, (cujo conhecimento ficou prejudicado pela decisão ora revogada), ponderando eventuais desenvolvimentos procedimentais na esfera jurídica da oponente que deverão ser expressos no probatório e se a tal conhecimento nada mais obstar, estando naturalmente prejudicado o conhecimento da questão da coligação atento o desfecho da apresentação pelo oponente marido da petição de oposição que foi julgada extemporânea tendo a decisão recorrida transitado nesta parte.

4- DECISÃO:
Pelo exposto, acordam os Juízes deste STA em conceder provimento ao recurso revogando parcialmente a decisão recorrida e determinando a baixa dos autos à primeira instância para os efeitos supra referidos e agora aqui determinados.

Sem custas
Lisboa, 16 de Janeiro de 2019. - Ascensão Lopes (relator) - Ana Paula Lobo - Dulce Neto.