Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01305/15.1BALSB
Data do Acordão:11/08/2018
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:TERESA DE SOUSA
Descritores:RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL
RESPONSABILIDADE POR ACTO LÍCITO
PRESSUPOSTOS
PREJUÍZO ESPECIAL E ANORMAL
Sumário:I – São pressupostos da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas de direito público, por actos lícitos praticados no domínio de gestão pública, prevista no artigo 9º do DL nº 48051, de 21.11.67, i) um acto lícito do Estado ou de outra pessoa colectiva pública; ii) praticado por motivo de interesse público; iii) um prejuízo especial ou anormal; iv) nexo de causalidade entre o acto e o prejuízo.
II – Por prejuízo especial entende-se o que não é imposto à generalidade dos cidadãos, mas a pessoa certa e determinada em função de uma específica posição relativa; por prejuízo anormal entende-se aquele que não é inerente aos riscos normais da vida em sociedade, suportados por todos os cidadãos, ultrapassando os limites impostos pelo dever de suportar a actividade lícita da Administração.
Nº Convencional:JSTA000P23816
Nº do Documento:SA12018110801305/15
Data de Entrada:10/12/2015
Recorrente:A... E OUTROS
Recorrido 1:ESTADO PORTUGUÊS E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo

1. Relatório

A………….., S.A, B…………., Lda, C………… e D…………., deduziram contra o Estado Português e E…………., SA (então Instituto das ………..), acção de indemnização fundada em responsabilidade civil extracontratual por acto lícito, no Tribunal Administrativo de Circulo de Lisboa que, pela sentença recorrida julgou a acção parcialmente procedente.

A………….., S.A., B…………., Lda e Outros, notificados desta sentença, e com ela não se conformando, vieram interpor recurso da mesma para esta Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo apresentando para o efeito alegações com conclusões do seguinte teor:
“A) O Tribunal a quo na Sentença recorrida, proferida em 27 de Março de 2015, reconheceu expressamente a responsabilidade civil extracontratual por prática de acto lícito (artigo 9.° do Decreto-Lei n.°48051) decorrente da reconversão do posto de abastecimento em área de serviço e da respectiva decisão de alteração do traçado inicial do IP2 que a excluiu, e condenou a Ré, ora Recorrida, E………….., no ressarcimento das Recorrentes A………… e B……….. respectivamente em 1.055,279,51€ e 1.090.527,00€.
B) Todavia, o reconhecimento pelo Tribunal a quo dos prejuízos provocados na esfera jurídica das Recorrentes cingiu-se aos custos com as obras de construção da área de serviço e respectivas taxas de exploração e aferição de bombas e outros encargos e, na verdade, os prejuízos causados na esfera jurídica dos Recorrentes foram, em muito, superiores ao ressarcimento promovido pela Sentença proferida em 1.ª instância.
C) Pelo que os Recorrentes vêm agora interpor recurso da Sentença proferida em 27 de Março de 2015, na parte em que não condenou os Réus, ora Recorridos, Estado Português e E……….., no ressarcimento dos prejuízos a título de lucros cessantes respeitantes às margens de comercialização que a A…………. e a B…………, Lda. obteriam caso o traçado definitivo do troço do IP2 tivesse contemplado a área de serviço em questão, bem como das perdas financeiras suportadas pelos Recorrentes com a aquisição dos imóveis destinados exclusivamente à edificação da área de serviço, bem como o preço pago pela constituição do direito de superfície e o valor da comparticipação pecuniária atribuída pelo 1.º Recorrente ao 2.° Recorrente.
D) Desde logo, quanto ao erro de julgamento na não condenação do Estado e da E………… no ressarcimento dos prejuízos a título de lucros cessantes, o Tribunal a quo deu como plenamente provado e demonstrado que a A………… e a B…………, Lda. reconverteram os postos de abastecimento apenas com fundamento no pressuposto de que os iriam explorar pelo menos entre 13 de Novembro de 1998 e o ano de 2017, data do terminus do prazo da licença que lhes conferia o direito a tal exploração.
E) E que, neste período, a A………… obteria um valor acumulado de 5.281.494,55., sendo que a B………… obteria um valor acumulado de 2.693.109,78.
F) Todavia o Tribunal considerou, erroneamente, que os mesmos não eram ressarciveis nos termos do artigo 9.° do Decreto-Lei n.°48051.
G) Ora, não existe margem para dúvidas de que os lucros cessantes são indemnizáveis nos termos do artigo 9.° do Decreto-Lei n.° 48051, de 21 de Novembro de 1967, visto que a responsabilidade extracontratual do Estado e das demais entidades públicas, no que respeita à medida da indemnização, segue o regime geral dos artigos 562.° e ss. do Código Civil, sendo que a regra constante do artigo 564.° do CC prevê expressamente a possibilidade de cumulação entre o dano emergente e o lucro cessante.
H) Para além disso, importa atentar, em sentido contrário ao erroneamente decidido pelo Tribunal a quo, que os significativos prejuízos a título de lucros cessantes, provocados na esfera jurídica da A……….. e da B………… Lda., são prejuízos especiais e anormais para efeitos de aplicação do artigo 9.° do regime em questão, visto que os restantes pressupostos da responsabilidade civil extracontratual foram dados na Sentença recorrida como integralmente verificados.
I) Ora, quanto ao critério da especialidade, a doutrina e a jurisprudência são unânimes em considerar prejuízo especial aquele que não é imposto à generalidade das pessoas, mas a determinada pessoa ou grupo de pessoas.
J) É patente que os prejuízos decorrentes da actuação dos Recorridos não são (nem foram), comuns à generalidade das pessoas ou empresas: foram estas duas empresas — e não quaisquer outras empresas ou pessoas — que foram destinatárias dos ofícios que determinaram a reconversão do posto de abastecimento, como também foram estas duas empresas - e não quaisquer outras empresas ou pessoas — que foram gravemente e directamente prejudicadas pela posterior decisão de exclusão da área de serviço do novo traçado do IP2.
K) Estamos, por isso, a falar de um prejuízo, grave e significativo, no valor de € 5.281.494,55. e € 2.693.109,78, não sendo juridicamente admissível concluir que estamos perante um prejuízo que qualquer cidadão deve suportar por estar em causa uma actividade lícita da Administração.
L) Quanto à natureza anormal dos prejuízos, é também comummente aceite pela doutrina jusadministrativista, bem como pela jurisprudência superior deste Venerando Tribunal, que o prejuízo indemnizável deve ser tido como anormal, sempre que se estiver perante um prejuízo usualmente suportado por todos os cidadãos, cabendo ao particular suportar o prejuízo na medida em que advém de uma actividade pública lícita.
M) Ora, não devem restar dúvidas de que os prejuízos em questão ultrapassam, e muito, os riscos e prejuízos da normal vida em sociedade, suportados comummente por todos os cidadãos, nomeadamente, pela sua gravidade e carácter significativo.
N) Pelo que Tribunal a quo caiu em erro de julgamento ao não condenar a E………… e o Estado Português no devido ressarcimento dos prejuízos — dados como provados — no valor de € 5.281.494,55. e € 2.693.109,78. nos termos do artigo 22° da Constituição da República Portuguesa e artigo 9°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 48051 de 21 de Novembro de 1967.
O) Errou também o Tribunal ao não condenar o Estado e a E………….. no ressarcimento dos prejuízos tidos pela A…………, B…………, C…………. e D…………. com a aquisição dos imóveis destinados exclusivamente à edificação da área de serviço, bem como o preço pago pela constituição do direito de superfície e o valor da comparticipação pecuniária atribuída pela A………… à B…………., Lda.
P) Estamos perante perdas financeiras resultantes da imposição, por parte das E…………., da reconversão do posto de abastecimento existente no Lanço IP 2 — ………. — Castelo Branco em área de serviço, sob pena de caducidade das licenças então vigentes, com fundamento na sua inclusão no novo traçado do IP2, quando, na verdade, a mencionada área de serviço acabou por ser excluída do novo traçado do IP2, por decisão pública estadual.
Q) Quanto aos ora Recorrentes, C………… e D…………., os prejuízos, dados como provados pelo Tribunal a quo, passam pelo valor das aquisições de todos os imóveis, descontado do respectivo valor de mercado sem possibilidade de nele ser erigida uma área de serviço, que não pode deixar de ser liquidado em execução de sentença; bem como pelo valor das quantias que, nos termos do contrato com a A…………., os Autores, ora Recorrentes, C………… e D……….., tiverem que devolver à A……….., posto que se tornou impossível, no prazo de 30 anos, o uso para que o prometido direito de superfície foi constituído, e que receberam da A…………, a título de sinal e de princípio de pagamento, a quantia de Esc.: 10.000.000$00, equivalente a € 49.879,78.
R) Quanto à ora Recorrente, B…………, Lda, os prejuízos, também dados como provados pelo Tribunal a quo prendem-se com o valor das quantias que, nos termos da cláusula contratual, esta terá de devolver à A……….., ora 1ª Recorrente, porque a comparticipação financeira de Esc.160.000.000$00 equivalente a €798.076,63 concedida pela A…………. à B……….., Lda., será proporcionalmente reduzida ao tempo em que o direito de superfície tiver efectivamente vigorado.
S) Por fim, a Recorrente A………… deve também ser ressarcida pelo valor correspondente às parcelas das quantias pagas a C………… e D………… (pagamento antecipado do direito de superfície) e à B………… Lda. (comparticipação financeira), visto que estes, nos termos referidos, não estão obrigados a restituir-lhe.
T) Ora, a Sentença recorrida recusou o ressarcimento dos prejuízos supra enunciados em virtude de considerar que os mesmos não são prejuízos especiais ou anormais.
U) São prejuízos especiais e anormais, para efeitos de aplicação do artigo 9.º do Decreto-Lei n.° 48051, aqueles que não são impostos à generalidade das pessoas, mas a determinada pessoa ou grupo de pessoas (especial), e que não são inerentes aos riscos normais da vida em sociedade, suportados por todos os cidadãos, ultrapassando os limites impostos pelo dever de suportar a actividade lícita da Administração (anormal).
V) É mais do que evidente a especialidade dos prejuízos causados, em concreto, às Autoras, ora Recorrentes, também eles decorrentes do investimento na execução do mencionado projecto de reconversão e que atingem individual e especificamente, tão-somente, os Recorrentes, e é também manifesta a natureza anormal dos prejuízos, ultrapassando o ónus natural decorrente da vida em sociedade, sendo manifestamente desiguais perante os restantes cidadãos.
W) Termos em que falece, nesta parte razão à Sentença do Tribunal Administrativo do Circulo de Lisboa de 27 de Março de 2015, incorrendo em erro de julgamento, porque é necessária a respectiva revogação e ampliação da condenação dos Réus, ora Recorridos. E………… e Estado Português, ao ressarcimento dos custos acima identificados.
X) Por mero dever de patrocínio, e a título meramente subsidiário, é igualmente de considerar que o Tribunal a quo errou ao não condenar os Réus ao pagamento de indemnização por violação do dever de informação atempada da previsível exclusão da área de serviço do traçado do IP2.
Y) As obras de construção da área de serviço tiveram o seu início em Junho de 1997, já, portanto, em momento em que o traçado inicial era contestado pela Comissão de Avaliação de Impacte Ambiental, como decorre dos factos dados como provados pelo Tribunal a quo.
Z) Ora, o Estado Português e a E…………, e em especial o membro do Governo responsável pela gestão dos itinerários principais, e os órgãos dirigentes das E…………, estavam obrigados a comunicar à 1.ª e 2.ª recorrentes que havia o perigo de a área de serviço ser excluída no novo IP2, e que, em consequência, estavam autorizadas a não iniciar as obras de reconversão cuja realização lhes havia sido imposta.
AA) Resulta pois do artigo 6° do Decreto-Lei n.° 48051, interpretado em conformidade com o disposto no artigo 22° da Constituição da República Portuguesa, que a omissão desta informação, violando o princípio da boa-fé consagrado no artigo 6° do CPA (actual artigo 10.° do NCPA), configura um acto ilícito.
BB) Decorre também da factualidade provada, que se esta informação tivesse sido prestada logo que houve conhecimento dos primeiros relatórios da Comissão de Avaliação, os Recorrentes teriam ficado em condições de não prosseguir as obras e, portanto, de não incorrer nos respectivos custos.
CC) Termos em que o Tribunal a quo, na Sentença proferida em 27 de Março de 2015, incorreu em erro de julgamentos que se impõe subsidiariamente, a revogação e ampliação da condenação dos Réus, ora Recorridos, E……….. e Estado Português, ao ressarcimento dos danos produzidos na esfera jurídica das Recorrentes, por força de omissão, ilícita e culposa, de informação.
Nestes termos, e nos mais de Direito aplicáveis:
Deve o Venerando Tribunal revogar parcialmente a Sentença do Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa de 27 de Maio de 2015 e, em consequência:
i) Condenar complementarmente o Estado Português e a E………., para além da indemnização decretada na Sentença, no devido ressarcimento dos prejuízos — dados como provados - a título de lucros cessantes, no valor de € 5.281.494,55. e € 2.693,109,78, nos termos do artigo 22° da Constituição da República Portuguesa e artigo 9°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 48051, de 21 de Novembro de 1967.
ii) Condenar o Estado Português e a E……….. no devido ressarcimento dos prejuízos - dados como provados — a título de perdas financeiras suportadas pelos Recorrentes com a aquisição dos imóveis destinados exclusivamente à edificação da área de serviço, a determinar em execução de Sentença, bem como o preço pago pela constituição do direito de superfície e da comparticipação pecuniária, no valor de, respectivamente, € 49.879,78 e € 798.076,63, a todas as Recorrentes nos termos acima descritos, e à luz do artigo 22.° da Constituição da República Portuguesa e artigo 9.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 48051, de 21 de Novembro de 1967.
Subsidiariamente,
iii) Condenar o Estado Português e a E……….. no ressarcimento dos danos emergentes, directos, indirectos, incluindo aqueles que foram objecto da indemnização decretada na Sentença, bem como lucros cessantes, produzidos na esfera jurídica das Recorrentes, quantificados em i) e ii), por força de omissão, ilícita e culposa, de informação, nos termos do artigo 6° do Decreto-Lei n.° 48051, interpretado em conformidade com o disposto no artigo 22° da Constituição da República Portuguesa.

A fls. 2374 dos autos veio, E……….., SA., requerer ao Tribunal Administrativo de Circulo de Lisboa a desistência do recurso por si interposto para o Supremo Tribunal Administrativo, a fls. 2579 dos autos, sendo a desistência admitida e declarada válida pelo referenciado Tribunal.

A Recorrida E…………, S.A veio apresentar as suas contra- alegações com o seguinte quadro conclusivo:
1. Nos termos dos factos dados como provados com a execução das obras realizadas nas referidas áreas de serviço, a A………… despendeu cerca de 1.090.527,10 e a B………… 1.055.279,51 euros, valores que mereceram provimento na douta decisão sob recurso e que a R. não pôs em crise;
2. Também nos factos dados como provados apurou-se que se a abertura ao tráfego tivesse ocorrido a 3 de Novembro de 2003 a A………… deixaria de ganhar até 2017 cerca de 4.361.601,18 e a B………… cerca de 2.538.238,32;
3. Para eventuais efeitos indemnizatórios objecto do presente recurso, (cuja procedência não se admite) seriam hipoteticamente estes os valores a considerar (quesitos 43° e 44°) e não os valores acumulados a que se reportam a resposta aos quesitos 39° e 40°.
4. Ao contrário do sustentado pelas AA. nas suas doutas alegações.
5. Dado como provado foi também que a alteração de traçado foi motivada pelo Estudo de Impacto Ambiental que concluiu que, evitando o atravessamento da povoação de ……….. através do afastamento dessa via da povoação, permitir-se-ia evitar a demolição de muitas habitações e ocupação de terrenos, satisfazendo os anseios da população.
5. Ora, assim sendo, salvo melhor opinião, além dos danos já reconhecidos na sentença em crise, outros danos não há que sejam passiveis de ressarcimento por parte de Ré.
6. Em primeiro lugar porque de acordo com a PI é pedida a condenação da aqui Ré a titulo subsidiário por acto ilícito (cfr. Pontos 6 e 7 das conclusões),
7. E em segundo lugar porque, não obstante o Direito Português consagrar um princípio geral de responsabilidade civil das entidades encarregues de prosseguir a função administrativa, a verdade é que nem todos os prejuízos ou encargos decorrentes do exercício lícito da actividade administrativa são passíveis de gerar um dever de indemnizar;
8. Na verdade, no âmbito da actividade administrativa lícita, segundo estipulação legal, apenas os prejuízos ou encargos que sejam, cumulativamente, especiais e anormais são passíveis de gerar o dever de indemnizar por parte da Administração Pública: estes dois requisitos configuram-se como “elementos travão” de uma responsabilidade administrativa ilimitada;
9. Caso contrário, um dever genérico, total e ilimitado de indemnização por todo e qualquer prejuízo provocado no exercício lícito da actividade administrativa conduziria, fatalmente, ao colapso financeiro e à completa paralisação da actuação da Administração Pública;
10. A própria vida em sociedade envolve riscos e custos que todos temos de suportar, podendo tais custos ser, por vezes, até mais onerosos do que o habitual ou aquilo que normalmente seriam, desde que isso signifique um próximo aumento dos benefícios ou das vantagens a usufruir por todos na sequência de tais prejuízos;
11. Em consequência, a responsabilidade administrativa por acto lícito encontra o seu fundamento na prevalência da prossecução do interesse público sobre um direito privado de conteúdo patrimonial de alguém que, ultrapassando o esforço exigido a todos os membros de uma colectividade pela convivência social, viu o seu património excessivamente onerado por razões decorrentes de uma prossecução do interesse público de toda a colectividade através dessa mesma actuação lícita da Administração Pública;
12. Neste sentido, pode afirmar-se a solução portuguesa constante do artigo 9º do Decreto-Lei n° 48 051, de 21 de Novembro de 1967, que reconhece a indispensabilidade de, por razões imperiosas de sobrevivência financeira do Estado, limitar o ressarcimento dos prejuízos decorrentes de uma actuação administrativa lícita, podendo afirmar-se que a tradição o dever de indemnizar somente aos prejuízos especiais e anormais.
13. Aos tribunais administrativos está confiado um importante papel na densificação dos conceitos de “especialidades” e “anormalidade” dos prejuízos, circunstância esta que neles concentra a responsabilidade última pela definição de uma orientação mais ou menos empenhada no colapso financeiro da Administração Pública em matéria de ressarcimento de danos decorrentes da sua actividade lícita;
14. Neste sentido, os tribunais administrativos devem sempre fazer um balanço que, atendendo às circunstâncias existentes em cada caso, pondere entre as vantagens colectivas e os custos individuais da actuação administrativa lícita concreta, tomando em consideração, simultaneamente, os inconvenientes normalmente decorrentes da vida em sociedade e os custos do imperativo de prossecução do bem-estar social que também todos os restantes particulares sofreram.
15. E ainda, por outro lado, as potenciais vantagens ou benefícios que o lesado poderá vir a tirar da actividade administrativa que lhe causou prejuízo;
16. A “especialidade” de um prejuízo, resulta deste comportar um atentado ao princípio da igualdade, impondo a um determinado particular ou a vários perfeitamente determinados um sacrifício que não é exigido à generalidade dos membros da colectividade, razão pela qual se verifica existir aqui uma lesão do direito de propriedade privada destes e do princípio de igualdade na repartição dos encargos por todos;
17. A “anormalidade” de um prejuízo ocorre sempre que pela inequívoca gravidade do sacrifício que impõe comporta, por consequência, um dano demasiado oneroso para que seja o administrado a suportá-lo por si próprio;
18. Encontram-se excluídos de qualquer indemnização, por conseguinte, todos os danos que decorrem do risco normalmente suportado por todos em virtude da vida em sociedade;
19. A densificação do conceito de anormalidade do prejuízo, enquanto expressão do seu carácter inequivocamente grave, exige que se pondere se o facto gerador do dano não será, simultaneamente, fonte de vantagens ou benefícios para aquele que se considera lesado, impedindo-se, por consequência, qualquer forma de enriquecimento sem causa do administrado, isto por aplicação da figura da compensatio lucri cum damno;
20. Por outro lado, a natureza inequivocamente grave do prejuízo passível de gerar o dever de indemnizar também não pode ser dissociada do fim que presidiu à actividade lícita geradora do dano:
21. Os prejuízos sofridos pelas AA., não são dotados de “especialidade”, isto por duas ordens de razões:
a) Por um lado, a realização de toda e qualquer obra viária, comporta sempre prejuízos para uma generalidade de empresas e particulares;
b) Por outro lado, não foram decerto as AA as únicas empresas a sofrer tais prejuízos, antes também as empresas concorrentes ou outras os sofreram:
22. E ainda que a circunstância de as sociedades AA. serem as únicas empresas a operar na Zona de ………… aparentemente fundamentadora de uma especificidade em relação a todas as demais empresas, nunca pode fazer esquecer um aspecto nuclear:
23. Desde logo, estamos diante de prejuízos que decorrem da intervenção administrativa sobre uma área que é de domínio público, ou seja, que não pertence à titularidade das AA, circunstância que se mostra de extrema relevância para a configuração indirecta ou reflexa dos prejuízos provocados e para o aferir da conduta reivindicativa pelas AA à luz da justiça, da boa - fé e da moralidade;
24. No entanto, ainda que por hipótese académica se admitissem como “especiais” os prejuízos invocados pelas AA, a verdade é que estes nunca seriam “anormais”, não se verificando aqui, em consequência, a cumulatividade de requisitos habilitadora do ressarcimento de tais prejuízos;
25. Na realidade, os prejuízos que as AA. teriam sofrido no âmbito da sua actividade de exploração, resultaram directamente de um investimento feito pelo Estado no sentido de se melhorarem as condições de circulação e acessibilidade rodoviária,
26. E, neste preciso sentido, acabaram também por beneficiar directa e imediatamente as condições de exercício da actividade das empresas aqui AA, tanto mais que a empresa A………… passou a ter na zona, não uma, mas sim duas áreas de serviço.
27. Neste sentido, sob pena de abuso de direito na efectivação da responsabilidade civil extracontratual por acto lícito, enquanto expressão de uma forma de exercício inadmissível de posições jurídicas, as AA. não poderão reivindicar qualquer direito de indemnização por actuação lícita da Administração Pública;
28. Estes são aliás os ensinamentos sufragados pela Jurisprudência dos Tribunais Administrativos detalhadamente antes reproduzidos;
29. Pelo que, integrando a matéria de facto objecto de prova no respectivo direito aplicável, não pode deixar de concluir-se pela improcedência do recurso mantendo-se a douta decisão recorrida,
E assim se fazendo JUSTIÇA!

Em contra-alegações o Estado Português representado pelo Ministério Público veio dizer em conclusão o seguinte:
1 - Na presente acção foi o R. — Estado Português absolvido do pedido formulado, consubstanciado no ressarcimento de alegados prejuízos, a título de lucros cessantes, perdas financeiras e danos emergentes de alegada omissão de informação.
2 - A causa de pedir nos presentes autos, tal como as AA. a configuram, foi a alegada imposição de reconversão de postos de abastecimento existentes no Lanço IP2 — ………. — Castelo Branco.
3 - Sob pena de caducidade das licenças então vigentes, e atribuídas pelo então Instituto de E………...
4 - A actual co-R., …………, S.A., sucessora da então Junta Autónoma de Estradas — e do Instituto de E………. -, e todas as entidades que intermediamente assumiram as suas competências, sempre tiveram personalidade jurídica, autonomia administrativa e financeira.
5 - Foi sempre com tais entidades que as AA. se relacionaram, nunca existindo qualquer relação com o aqui R. — Estado Português.
6 - Sendo aqui manifesta a ilegitimidade do R. — Estado Português, o que foi -determinado, e bem na, aliás douta, sentença ora em crise.
7 - Não havendo qualquer facto ilícito culposo, desnecessário é dizer que não há qualquer nexo de causalidade adequada entre os factos imputados ao R. Estado Português e os alegados danos invocados e reclamados pelas AA..
8 - O recurso interposto não merece provimento, uma vez que a douta sentença recorrida e em apreciação faz uma correcta aplicação do direito, à matéria de facto dada como assente, e não merece qualquer censura.
9 - Inexistiu, in casu, qualquer erro de julgamento.
10 - Não foi violado o disposto no artigo 22° da Constituição da República Portuguesa.
11 - Não foi violado o disposto no art° 9°, n° 1 do D.L. n° 48 051, de 21.11.1967.
12 - Por ultimo, não foi violado o disposto no art° 6° do Código de Procedimento Administrativo.
13 - Pelo que não podia o M° Juiz a quo deixar de decidir como decidiu, ao decidir pela absolvição do R. - Estado Português dos pedidos formulados.
14 - Devendo manter-se a douta sentença em apreciação, negando-se consequentemente provimento ao recurso dela, interposto.
E assim farão, Vossas Excelências, a costumada Justiça.
1.8 Chegados os autos a este Supremo Tribunal Administrativo, foram a vistos ao Exmo. Magistrado do Ministério Público, que tomou conhecimento mas não se pronunciou.

Colhidos os vistos legais, cumpre, agora, apreciar e decidir.

2. Os Factos
O Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa considerou provados os seguintes factos:
A) A Autora A…………, SA, é uma empresa que tem por objecto a refinação, transporte, distribuição e comercialização de petróleo bruto e seus derivados.
B) Em 09-10-1990, por escritura pública, C………… e D………….., constituíram a favor da A……….. o direito de superfície sobre o prédio inscrito na matriz predial sob o n.° 1178.° e descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Velha de Rodão, sob o n.° 0029/06085 da freguesia de …………, e sobre o prédio inscrito na matriz urbana sob o art.° n.° 1145.°, a desanexar do prédio misto inscrito na matriz cadastral sob o art.° n.° 0017 da Seção Q-Q1 e na matriz predial urbana sob os artigos n.°s 1055, 1091 e 1145, descrito na mesma Conservatória sob o n.° 00427/130389 da freguesia de …………, pelo prazo de 20 anos, com a faculdade de superficiária manter, nesse prazo, os edifícios e instalações aí existentes para os dois postos de abastecimento de combustíveis e instalações conexas ou outras e nas demais condições e termos que constam do documento junto aos autos de fls. 218 a 225, que aqui se dão por transcritos.
C) Naquela data, por escritura pública, a A……….. cedeu à B……….., Lda., a exploração comercial, conjunta dos dois postos de abastecimento referidos em “B)”, nas demais condições e termos do documento constante de fls. 227 a 230, completado pelo documento de fls. 234 a fls. 242, que se dão aqui por transcritos.
D) Em 05-01-2001, o Sr. Secretário de Estado do Ambiente proferiu a seguinte declaração de impacte ambiental:
“Tendo por base o Parecer Final do processo de Avaliação de Impacte Ambiental relativo ao Projecto, em fase de Estudo Prévio, “IP2 - lanço Castelo Branco - Sublanço Castelo Branco Sul/…..”, emitido parecer favorável à solução A, excepto para o ……….., para o qual dou parecer favorável ao Nó da solução B, condicionado à concretização das medidas de minimização propostas pela EIA, bem como à implementação das medidas descritas no ponto 8 - Análise Comparativa e Conclusões - do Parecer da Comissão de Avaliação...”
E) Por razões ambientais e urbanísticas, o Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas proferiu, em 28-05-2001, despacho de aprovação da alteração ao primitivo traçado projectado pela JAE para o “IP2 - lanço Castelo Branco - Sublanço Castelo Branco Sul/………”.
F) No primitivo traçado, a “Área de Serviço” de ………… estava integrada no IP2, o que deixou de acontecer no traçado aprovado pelo despacho de 28-05-2001.
G) A B……….., Lda., iniciou a actividade de venda de combustíveis líquidos em 26-07-1981.
H) C………… e D…………. são os únicos sócios gerentes da B……….., Lda.
I) A JAE - Direcção de Estradas do Distrito de Castelo Branco, emitiu o diploma de Licença n.º 125 (Registo n.º 125 de 1981 - proc. N.º 11.02.01) a conceder a C…………. “licença para estabelecer um posto de abastecimento de combustíveis líquidos, na margem esquerda da EN3” por um período de 20 anos e nas demais condições que constam do documento de fls. 52 e que aqui se dá por integralmente transcrito.
J) Tal documento foi recebido por C………… em 15-07-1981.
K) E o respectivo posto de abastecimento entrou em actividade em 05-10-1981.
L) Desde então, sempre aí foram vendidos combustíveis fornecidos pela A………….
M) Em 18-03-1986, a JAE - Direcção de Estradas do Distrito de Castelo Branco entregou o diploma de licença n.° 41 (Registo n.° 41 de 1986 - proc. N.° PV.00) a conceder a C…………, enquanto sócio gerente da B………….., Lda. “licença para proceder à construção do posto simples (posto 8), de abastecimento de combustíveis líquidos, integrado no posto duplo autorizado pelo diploma de licença n.° 125, de 15-07-81, à margem direita da EN3 ao Km 196,700” e nas demais condições que constam do documento de fls. 53 que aqui se dá por transcrito.
N) Os postos de abastecimento a que se referem os diplomas de licença n.° 125 e de licença n.° 41 estavam instalados nos prédios na supra alínea “B)” do ponto 4.1, da Fundamentação de Facto.
O) Esses prédios pertencem a C………… e D………….
P) Em 13-11-1992, a JAE - Direcção de Estradas do Distrito de Castelo Branco dirigiu à B…………, Lda., o ofício n° 2299, sobre o assunto “Reconversão em Área de Serviço do Posto de Abastecimento existente no lanço IP2 - ……….. - Castelo Branco”, com o seguinte teor:
“O estudo de localização das áreas de serviço dos IPs e ICs aprovado pela JAE prevê a reconversão do posto de abastecimento existente ao km 0,200 do lanço IP2 - ………….-Castelo Branco em área de serviço principal. Como as obras do lanço ……… se encontram em fase adiantada, informo V. Exas que estando em causa um IP, o posto existente terá de ser reconvertido em área de serviço, sob pena de se assim não acontecer, se poder proceder ao seu encerramento. Assim, dispõem de 120 dias contados da recepção deste ofício para a entrega do projecto de reconversão devendo, no entanto, o respectivo estudo prévio ser submetido a apreciação da JAE, no prazo de 60 dias”.
Q) Na sequência desse ofício, a B……….., Lda deu início ao processo de aprovação do estudo prévio e de Licenciamento da obra relativa aos serviços e respectivas infra-estruturas adicionais da futura área de serviço.
R) No âmbito do processo de Licenciamento supra referido em “Q)”, a JAE - Direcção de Estradas do Distrito de Castelo Branco dirigiu à B……….., Lda., o oficio n.° 767, de 15-04-1994, de que consta designadamente:
“...informo V. Ex.a que foi aprovado por despacho do Director de Serviços de Conservação em 94.03.28, o estudo prévio rectificado da solução “B” apresentado, condicionado a pequenos acertos a ter em consideração na elaboração do projecto, conforme fotocópia anexa...”
S) No âmbito do mesmo processo de Licenciamento, a Direcção de Estradas do Distrito de Castelo Branco dirigiu à B……….., Lda., o oficio n.° 1417, de 7-06-1995, de que consta designadamente:
“Mais informo que, caso não seja apresentado o projecto definitivo da solução “B” anteriormente aprovada, conforme oficio desta Direcção de Estradas n.° 767 de 15 de Abril de 94, no prazo máximo de 120 dias a contar da data da recepção deste oficio, a possibilidade concedida para a reconversão do posto de abastecimento em área de serviço caducará, deixando este, por conseguinte, de ter qualquer interferência na localização das áreas de serviço IP2, nomeadamente no que diz respeito a distâncias”.
T) E ainda no âmbito do mesmo processo de licenciamento, a Direcção de Estradas do Distrito de Castelo Branco dirigiu à B……….., Lda., o oficio n.° 2439, de 25-11-1996, de que consta designadamente:
‘Relativamente ao assunto em epígrafe, informo V. Ex.a de que dada a fase de estudo de duplicação do IP2, lanço Castelo Branco-……., considera-se conveniente a reserva de faixa de terrenos com a largura de 30 e 25 m ao eixo, respectivamente Norte e Sul, constituindo separador central”.
U) Após o recebimento do ofício supra referido em “T)”, C……….. e D…………… adquiriram, no prolongamento do prédio n.° 00029, lado norte da EN3 e actual IP2, os seguintes prédios rústicos sitos na freguesia de ………: prédio rústico descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Velha de Ródão sob o n.° 00961 e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 358 da Secção Q-Q1; prédio rústico descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Velha de Ródão sob o n.° 00981 e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 362 da Secção Q-Q1; prédio rústico descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.° 01268 e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 363 da Secção Q-Q1 e prédio rústico descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Velha de Ródão sob o n.° 00780 e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 364 da Secção Q-Q1.
V) C…………. e D………… também são donos do prédio misto situado no lado Sul da EN3, freguesia de ………., descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Velha de Ródão sob o n.° 00427, e inscrito na matriz predial rústica sob os artigos rústicos 0370 e 0371 da Secção Q-Q1 e sob os artigos urbanos 1179°, 1221° e 1241°.
W) No Lado Norte, a “área de serviço” de ……….. ocupa 24320 m2 da área do conjunto de prédios supra referido em “U)” e do prédio supra referido em “B)” correspondente à descrição n.° 00029.
X) No Lado Sul, essa “área de serviço” ocupa 21560 m2 do conjunto de prédios no supra referido em “V)”.
Y) As medidas supra referidas em “W)” e em “X)” correspondem à superfície total ocupada pela “área de serviço”.
Z) Em Junho de 1997, a B……….., Lda., iniciou a 1.ª fase de construção das infra-estruturas da área de serviço - loja, cafetaria, restaurante, parque infantil, estação de serviço de desempanagem e Lavagem, zona de repouso, stand, exposições, balneários, pavimentação e faixas de circulação.
AA) Em 11-07-1997, a JAE - Direcção de Estradas do Distrito de Castelo Branco concedeu a C…………. (B……….., Lda.) o Diploma de Licença n.° 43 de licenciamento das obras de remodelação da “área de serviço” de ………, nos termos que constam dos documentos de fls. 64 a 67, que se dão aqui por transcritos.
BB) As obras da “área de serviço”, da 1.ª fase, supra referidas em “Z)”, terminaram em data que concretamente não foi possível apurar mas, seguramente, não antes do final de Junho de 1998.
CC) Com o acompanhamento das obras supra referidas em “BB)” e em taxas de emissão de licenças, empreitada e construção e outros encargos de vária ordem, designadamente financeira, a B……….. despendeu cerca de €1.090.527,10.
DD) Em 13-11-1998, C……….. e D………… prometeram constituir a favor da A……….., por um prazo de 30 anos, um direito de superfície sobre a parte prédios abrangida pela “área de serviço” e a última prometeu adquiri-lo por 20 000 000$00, nos demais termos que, relativamente a essa promessa, constam da cópia de fls. 99 a 104, que aqui se dá por transcrita.
EE) Na mesma data, aqueles dois primeiros Autores prometeram ampliar o prazo do direito de superfície supra referido em “B)” de forma a coincidir com o direito de superfície supra referido em “DD)”.
FF) Ainda na mesma data, C……….. e D………… prometeram dar preferência à A……….. na venda, na dação em cumprimento ou em outro direito de superfície sobre os prédios abrangidos pela “área de serviço” de ………. e, bem assim, dar preferência à A……….. na cessão da exploração dessa “área de serviço”, também nos termos que, relativamente a tais promessas, constam da cláusula 6 que se dá aqui por transcrita, do documento de fls. 99 a 104.
GG) E também em 13-11-1998, a A………… prometeu ceder a exploração da “área de serviço” de ……….. à B…………, Lda., e esta prometeu tomar essa exploração nas condições que constam da cópia de fls. 157 e 158 e ainda da cópia de fls. 109 a 115, que se dão aqui por transcritas.
HH) Na mesma data, a A…………. concedeu à B……….., Lda., uma comparticipação de 160 000 000$00, acrescida de 27 200 000$00 a título de IVA, nas condições e termos que constam da cópia de fls. 95 a 97, que se dá aqui por transcrita.
II) Entre Novembro de 1998 e final do primeiro trimestre de 1999, a A…………. deu início à 2.ª fase de construção da “área de serviço” que incluiu a demolição dos postos de abastecimento, construção de zonas de abastecimento, acompanhamento das obras de reconversão dos postos de abastecimento em “áreas de serviço” e o equipamento das lojas, as quais terminaram no final do primeiro trimestre de 1999.
JJ) Com as obras supra descritas em “II)” e em taxas devidas pela emissão de licença de exploração e aferição de bombas e outros encargos, a A…………. despendeu € 1.055.279,51.
KK) A “área de serviço” de ……….. entrou em funcionamento em 26-04-1999, explorada pela B…………, Lda.
LL) Desde essa data, a B…………, Lda., remunera a A…………. com 90 centavos por cada litro de combustível vendido.
MM) Essa importância tem sido actualizada anualmente nos termos do artigo 6.° do documento de fls. 110 a 115, que se dá aqui por transcrito.
NN) Desde 26-04-1999 que a B…………., Lda., também explora as Lojas ….. e os estabelecimentos de restauração e bebidas da “área de serviço” de ………..
OO) O volume de vendas efectivo de combustíveis e produtos comercializados nas Lojas e estabelecimentos de restauração e bebidas nos anos 2000 e 2001 são os discriminados para esses anos no documento n.° 23 junto com a p.i. a fls. 119 a 128 que, nessa parte, se dão aqui por transcritos.
PP) A A………… e a B…………, Lda., decidiram reconverter os postos de abastecimento partindo do pressuposto de que os iriam explorar entre 13-11-1998 e o ano 2017, data do terminus do prazo da licença que lhes conferia o direito a tal exploração.
QQ) Nesse prazo, a A…………, em execução do acordo celebrado com a B…………, Lda., obteria um valor acumulado de cerca de €5.281.494, 55.
RR) No mesmo prazo e no âmbito da mesma exploração, a B……….., Lda., obteria um valor acumulado de cerca de € 2.693.109,78.
SS) A abertura ao tráfego do lanço ……./Castelo Branco do IP2, provocou uma diminuição do tráfego na “área de serviço” de ………., que a tornou até hoje, e enquanto “área de serviço” propriamente dita, economicamente inviável e que muito provavelmente enquanto tal conduzirá ao seu encerramento.
TT) Se a abertura daquele troço tivesse ocorrido a 3 de Novembro de 2003, a A…………. deixaria de ganhar até 31-12-2017, cerca de €4.361.601,18.
UU) E a B……….., Lda., deixa de ganhar relativamente a margens de comercialização, cerca de € 2.53.8238,32.
VV) Desde 1998, durante o período de consulta pública do projecto do IP2 proposto pela JAE, que o traçado projectado para a zona de ……….. vinha sendo contestado por parte da população e por alguns dos seus representantes nos órgãos do poder local.
WW) Os Autores não receberam qualquer informação sobre a intenção de alteração desse traçado, nomeadamente quanto à exclusão da “área de serviço” de ……… do IP2.
XX) Por ofício n.º 3974, de 17-11-1998, a JAE informou a Comissão de Coordenação da Região Centro de que “na zona de cruzamento do IP2 com a Estrada Nacional n.º 18, o actual estudo de viabilidade prevê a duplicação da IP2 aproveitando a estrada existente, não havendo até à data qualquer estudo que admita a possibilidade de uma variante naquele local”.
YY) Essa comunicação foi transmitida pela Comissão de Coordenação do Centro à ACICB - Associação Comercial, Industrial, e Serviços de Castelo Branco, Idanha-a-Nova e Vila Velha de Ródão, na sequência de um pedido de intervenção feito por esta para não se verificar a alteração do traçado do IP2 na zona de ………..
ZZ) À data de emissão do referido ofício já as obras de reconversão do posto de abastecimento se encontravam licenciadas e em execução.
AAA) Em 25 de Março de 1999, o Presidente da Assembleia Municipal de Vila Velha de Ródão enviou ao Presidente da JAE, com referência ao Processo n.° 10/99, a Moção que a Assembleia Municipal de Vila Velha de Ródão apresentou em 26 de Fevereiro de 1999, do qual consta, designadamente, que “A Assembleia Municipal como órgão representativo de todos os munícipes decide
- Exigir do Governo e da JAE a elaboração de um novo Estudo que comtempla um traçado alternativo, por fora da área urbana de ………., conforme perecer do Ministério do Ambiente.
Requerer que lhe seja dado conhecimento claro e inequívoco da solução prevista pela JAE, após parecer do Ministério do Ambiente.
- Reafirmar a sua disposição de não aceitar factos consumados que possam pôr em causa o bem-estar, a segurança e a qualidade de vida da população de ………….”
BBB) Por ofício n.° 01472, de 14-06-1999, o Presidente da JAE informou o Presidente da Mesa da Assembleia Municipal de Vila Velha de Ródão sobre o assunto “IP2 - Castelo Branco/……….. ………/………”, que “...foi solicitado ao projectista o estudo de uma solução alternativa em variante por Norte do actual IP2, conforme cópia que se anexa” e que “A execução desta solução alternativa será, assim, ponderada no âmbito da concessão SCUT da Beira Interior”.
CCC) Por ofício de 28-06-1999, o Presidente da Câmara de Vila Velha de Ródão solicitou ao Director de Serviços Regionais de Estradas do Centro que fosse considerada a importância da “área de serviço” de ……… para a região, dada a existência da mesma não estar salvaguardada no estudo alternativo.
DDD) Em 30-06-1999, a B……….., Lda., solicitou ao Presidente da JAE a análise de uma exposição sobre a viabilidade técnica de conjugar os valores ambientais e urbanísticos que teriam motivado a solicitação do estudo sobre a alteração do traçado com a manutenção do traçado inicial e inerente à integração da “área de serviço” de ……… no IP2.
EEE) Na sequência de tal pedido, o então Instituto de E……….. emitiu e enviou a C…………., na qualidade de sócio gerente da B…………., Lda., o oficio n.° 0031, de 14 de Julho de 1999, do qual consta que “Informo V. Exa. que o novo traçado do IP2 na zona de ………., concretizado na planta que enviou, surgiu por recomendação da Comissão de Impactes Ambientais, para o lanço em que está inserido, após consulta pública, pelo que a “Sugestão Inicial” de V. Exa. não poderá ser atendida.
Mais informo que será solicitado à concessionária, entidade responsável pela realização do projecto de execução, que considere a localização da área de serviço por forma a que o traçado definitivo não interfira com a mesma.”
FFF) Na Proposta da Assembleia Municipal de Vila Velha de Ródão aprovada por unanimidade consta que “...propõe que seja solicitado ao Ministro da Tutela uma solução que salvaguarde os interesses ambientais das populações, e ao mesmo tempo manter a área de serviço naquele local, pois os postos de trabalho (á criados e as potencialidades de desenvolvimento da zona assim aconselham”.
GGG) Em Setembro de 1999, a ANAREC - Associação Nacional de Revenda de Combustíveis solicitou ao Presidente do Instituto de Promoção Ambiental que fosse ponderado o estudo apresentado pela B…………, Lda., e a que se refere o supra “EEE)”, dada a importância da “área de serviço”.
HHH) Através das certidões emitidas a seu pedido e pelas informações prestadas pelo Ministério do Equipamento Social, tiveram as Autoras conhecimento formal de que o traçado do IP2-Sublanço ……/Castelo Branco fora aprovado por despacho do Secretário de Estado das Obras Públicas em 28-5-2001 e que em 27-7-2001 a concessionária SCUTVIAS tomara a posse administrativa das parcelas necessárias à execução da obra.


3. O Direito
A sentença recorrida julgou a acção parcialmente procedente e, consequentemente, condenou:
- A Ré E……….., SA a pagar à Autora A…………. a quantia de € 1.055.279,51, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação até integral pagamento e,
- A Ré E………., EPE a pagar à Autora B…………, Lda. a quantia de € 1.090.527,10, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.
- Absolvendo o Estado Português do pedido.

No presente recurso vem impugnada a sentença proferida nos autos, na parte em que não condenou os Réus, ora Recorridos, Estado Português e E…………., SA no ressarcimento dos prejuízos a título de lucros cessantes respeitantes às margens de comercialização que a A………… e a B…………, Lda. obteriam caso o traçado definitivo do troço do IP2 tivesse contemplado a área de serviço em questão, bem como das perdas financeiras suportadas pelos Recorrentes com a aquisição dos imóveis destinados exclusivamente à edificação da área de serviço, bem como o preço pago pela constituição do direito de superfície e o valor da comparticipação pecuniária atribuída pela 1.ª Recorrente à 2.ª Recorrente.
A sentença recorrida apontou como questão a decidir a de apurar se havia lugar a responsabilidade civil extracontratual dos Réus, “em consequência da reconversão solicitada pela ex-JAE e posterior alteração do traçado do IP2 motivada por razões ambientais e dos danos e prejuízos que daí advieram para os Autores, depois de avultados investimentos por eles feitos”.
Procedendo, depois, à qualificação do tipo de responsabilidade civil aqui em causa, considerou que se estava perante responsabilidade civil extracontratual por acto lícito, prevista no art. 9º, nº 1 do DL nº 48051 (quanto ao pedido formulado a título principal).
Tendo enunciado os pressupostos desta responsabilidade civil, considerou que a reconversão do posto de abastecimento em área de serviço, ocorreu por iniciativa da então JAE, vendo-se os autores obrigados a proceder de acordo com as indicações dadas por aquela entidade, sob pena de o posto de combustíveis que exploravam até então, encerrar e das respectivas licenças caducarem.
Quanto aos prejuízos entendeu que havia que determinar se a conduta lícita do ente público (a sentença refere o Estado, mas verdadeiramente, conforme dela resulta, está em causa, na parte em que se deu procedência à acção, a conduta da 2ª Ré, actualmente, E……….., SA) que originou, por um lado, a reconversão do posto de abastecimento em área de serviço e inerentes encargos de construção e, por outro lado, a decisão de alteração do traçado inicial do IP2, excluindo dele a área de serviço, em que os autores viram a perda da amortização / remuneração do investimento pela construção exploração que se prolongaria pelo menos por 18 ou 19 anos, geraria os prejuízos invocados pelos autores e se seriam possíveis de incluir no conceito de especialidade e anormalidade.
Afirmando a existência de prejuízos entendeu a sentença que, «(…) o prejuízo relativo à reconversão do posto de abastecimento existente e construção da área de serviço, é especial porque atinge especialmente os Autores que se viram na obrigação de proceder conforme indicações dadas pela ex-JAE, sendo estes especialmente atingidos pela decisão de alteração do traçado inicial do IP2 excluindo a área de serviço construída, não extensível à população em geral, nem sequer aos restantes afectados por tal alteração que não se viram constrangidos a procederem e a despenderem avultados investimentos que acabaram por não atingir os objectivos fixados.
É anormal porque se não fosse pelos actos da ex-JAE, nomeadamente, através dos ofícios n.º 2299 de 13-11-1992, n.º 767 de 15-04-1994, n.º 1417 de 07-06-1995 e n.º 2439 de 25-11-1996, os Autores manteriam o posto de abastecimento e não teriam realizado investimentos avultados com as obras de construção da área de serviço, o que por isso determina a relevância indemnizatória dos montantes despendidos com os encargos e obras realizadas, uma vez que se mostra como um sacrifício que não foi determinado à generalidade dos cidadãos.
Pelo exposto também está verificado o preenchimento do quarto requisito, uma vez que os actos praticados pela antiga JAE foram causa dos prejuízos alcançados pelos encargos e obras realizadas pelos Autores».
Decidiu-se, assim, que existia responsabilidade civil extracontratual por acto lícito da, agora E…………, SA, e apenas desta “ficando excluída a responsabilidade do Estado Português, uma vez que a antiga JAE através da sua conduta, deu origem aos encargos e obras realizadas pela A………… e pela B……….., Lda, associados ao projecto e respectiva execução de reconversão dos postos de abastecimento pré-existentes na área de serviço.
Este será o limite da indemnização, não podendo integrar a mesma, a quebra de vendas invocada e demais valores decorrentes tanto da alegada redução do volume de tráfego como da redução das margens de comercialização ou as demais consequências financeiras que, não obstante serem prejuízos invocados pelos Autores e, embora significativos, são considerados no núcleo de generalidade e normalidade de sacrifícios comummente suportados por todos, ou por grupos indiferenciados de cidadãos”.

No presente recurso pretendem os Recorrentes o seguinte:
“i) Condenar complementarmente o Estado Português e a E………., para além da indemnização decretada na Sentença, no devido ressarcimento dos prejuízos — dados como provados - a título de lucros cessantes, no valor de € 5.281.494,55. e € 2.693,109,78, nos termos do artigo 22º da Constituição da República Portuguesa e artigo 9º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 48051, de 21 de Novembro de 1967.
ii) Condenar o Estado Português e a E……….. no devido ressarcimento dos prejuízos - dados como provados — a título de perdas financeiras suportadas pelos Recorrentes com a aquisição dos imóveis destinados exclusivamente à edificação da área de serviço, a determinar em execução de Sentença, bem como o preço pago pela constituição do direito de superfície e da comparticipação pecuniária, no valor de, respectivamente, € 49.879,78 e € 798.076,63, a todas as Recorrentes nos termos acima descritos, e à luz do artigo 22.º da Constituição da República Portuguesa e artigo 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 48051, de 21 de Novembro de 1967”.

Vejamos.
Como resulta destes pedidos de condenação dos Réus está em causa nos autos a responsabilidade civil extracontratual por actos de gestão pública, no caso praticados pela então JAE, contemplada no art. 9º, nº 1 do DL nº 48051, de 21.11.67.

A responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas de direito público, por actos lícitos praticados no âmbito da gestão pública, mostra-se regulada no referido art. 9º do DL nº 48051, nos seguintes termos: “O Estado e demais pessoas colectivas públicas indemnizarão os particulares a quem, no interesse geral, mediante actos administrativos legais ou actos materiais lícitos, tenham imposto encargos ou causado prejuízos especiais e anormais.
São, assim, pressupostos desta responsabilidade, os seguintes: i) a prática de um acto lícito; ii) para satisfação de um interesse público; iii) causador de um prejuízo “especial” e “anormal”; iv) o nexo de causalidade entre o acto e o prejuízo.
No caso em apreço a sentença recorrida considerou como não especiais e anormais os danos que os recorrentes agora vêm pedir, defendendo que detêm essas características.
Como refere o Prof. Gomes Canotilho, “O Problema da Responsabilidade do Estado por Actos Lícitos”, pág. 282/283: «(…) a exigência da anormalidade outra função não tem que salientar a importância, o peso que o sacrifício deverá ter para lhe ser atribuída relevância indemnizatória. Ora, a anormalidade do dano, de acordo com o já exposto, não pode nem deve substituir a necessidade da especialidade do prejuízo. Caso contrário, mesmo os danos generalizados de excepcional gravidade mereceriam tutela reparatória já que, sendo anormais, eram, ipso facto, especiais.
A ideia da exigência destes dois requisitos na responsabilidade objectiva só pode fundar-se na necessidade de um duplo travão ou limite: 1) – evitar a sobrecarga do tesouro público, limitando o reconhecimento de um dever indemnizatório do Estado ao caso de danos inequivocamente graves. 2) – procurar ressarcir os danos que, sendo graves, incidiram, desigualmente sobre certos cidadãos.
Introduzem-se, assim, dois momentos perfeitamente diferenciáveis: em primeiro lugar, saber se um cidadão ou grupo de cidadãos foi, através dum encargo público, colocado em situação desigual aos outros; em segundo lugar, constatar se o ónus especial tem gravidade suficiente para ser considerado sacrifício.»
É, portanto, fundamento deste tipo de responsabilidade civil extracontratual o princípio da igualdade dos cidadãos na repartição dos encargos públicos, ou seja, a igualdade de contribuição dos cidadãos no suporte daqueles encargos. Por isso, se exige um prejuízo “especial”, não imposto à generalidade das pessoas, mas a pessoa certa e determinada em função de uma específica posição relativa. E “anormal”, no sentido de não inerente aos riscos normais da vida em sociedade, suportados pela generalidade dos cidadãos.
Estarão, pois, afastados deste direito indemnizatório os danos gerais, normais ou comuns, ou seja, aqueles que recaem sobre a generalidade dos cidadãos, ou sobre grupos indeterminados e abstratos de pessoas, e que são considerados normais e inerentes ao risco próprio da vida em sociedade, constituindo como que “encargos sociais compensados por vantagens de outra ordem proporcionadas pela actuação da máquina estatal” (cfr. Ac. deste STA de 10.10.2002, rec. 048404, e os arestos nele citados, bem como os Acs. de 02.12.2004, proc. 0670/04).
No caso sub judice, estão em causa os prejuízos relativo à reconversão do posto de abastecimento existente e construção da área de serviço, determinada pela ex-JAE, face à alteração do traçado do IP2.
Considerando que, não fora aquela imposição da ex-JAE de reconversão, os Autores manteriam o posto de abastecimento e não teriam realizado investimentos avultados com as obras de construção da área de serviço, o que por isso determina a relevância indemnizatória dos montantes despendidos com os encargos e obras realizadas, uma vez que se mostra como um sacrifício que não foi determinado à generalidade dos cidadãos.
Defendem os Recorrentes, que os prejuízos respeitantes aos 3º e 4ª autores, C…………. e D……….., passam pelo valor das aquisições de todos os imóveis, descontado do respectivo valor de mercado sem possibilidade de nele ser erigida uma área de serviço; bem como pelo valor das quantias que, nos termos do contrato com a A…………, estes Autores, ora Recorrentes tiverem que devolver à A……….., posto que se tornou impossível, no prazo de 30 anos, o uso para que o prometido direito de superfície foi constituído, e que receberam da A…………, a título de sinal e de princípio de pagamento, a quantia de Esc.: 10.000.000$00, equivalente a € 49.879,78.
Quanto ao valor de aquisição dos terrenos não representa qualquer prejuízo (e muito menos especial e anormal), pois que os mesmos têm um valor patrimonial que permanece na esfera jurídica destes autores, podendo mesmo valorizar-se, e deles podendo tais autores dispor livremente, dando-lhes outro uso ou alienando-os ao deixarem de estar afectos ao fim a que se destinavam. Sendo certo que não se provou que a aquisição tenha sido efectuada por valores superiores aos de mercado ou que os referidos autores tenham sofrido quaisquer perdas financeiras, dada a exigência de reconversão do posto de combustíveis em área de serviço.
Quanto à devolução do sinal também não representa qualquer prejuízo, antes sendo a consequência da não concretização da celebração do contrato prometido (cfr. als. DD), EE) e FF) dos FP).

Quanto à Recorrente, B……….., Lda, os prejuízos prendem-se com o valor das quantias que, nos termos da cláusula contratual, esta terá de devolver à A…………, aqui 1ª Recorrente, porque a comparticipação financeira de Esc.160.000.000$00 equivalente a €798.076,63 concedida pela A……….. à B…………., Lda., será proporcionalmente reduzida ao tempo em que o direito de superfície tiver efectivamente vigorado (al. HH) dos FP).
Quanto à Recorrente A…………, defendem os Recorrentes dever também ser ressarcida pelo valor correspondente às parcelas das quantias pagas a C………….. e D…………… (pagamento antecipado do direito de superfície) e à B………… Lda. (comparticipação financeira), visto que estes, nos termos referidos, não estão obrigados a restituir-lhe.

De acordo com a teoria da diferença (cfr. art. 566º, nº 2 do Código Civil) os autores não têm prejuízo pois devolvem, o que receberam.
Com efeito, a 2ª Recorrente recebeu um determinado montante a título de comparticipação financeira, destinada a compensar as obras por si efectuadas, no pressuposto de o contrato de direito de superfície indicado no considerando 7 do “Contrato de Comparticipação” ser efectivamente celebrado e durar a totalidade do seu prazo de vigência, que era de 30 anos (cfr. cláusula 1º do referido contrato) e tem que devolver a parte da comparticipação na medida proporcional ao período em que a exploração da área de serviço não se verificou.
O que recebeu destinou-se a pagamento da totalidade da comparticipação acordada, mas tem que devolver a parte correspondente ao período em que o contrato não vigorou (por motivos alheios à vontade das partes).
Igualmente a 1ª Recorrente pagou de acordo com o acordado no contrato, estando a tal obrigada pelo tempo em que o direito de superfície vigorou, mas recebe o restante proporcionalmente ao período em que aquele direito deixa de vigorar por impossibilidade.
Não há, pois, nesta parte, quaisquer prejuízos a ressarcir.

Por fim, e no que se refere à responsabilidade por facto lícito pedem os Recorrentes determinados montantes a título de lucros cessantes.

Entendeu a sentença recorrida que não era de atribuir qualquer montante indemnizatório por estes invocados prejuízos já que não revestiam as características de “especialidade” e “anormalidade” prescritas no art. 9º, nº 1 do DL nº 48051.
Os lucros cessantes aqui em causa seriam o resultado da quebra de vendas invocada e da redução das margens de comercialização, face à alteração do traçado do IP2 que deixava de contemplar o local onde estava implantado a “área de serviço” reconvertida tendo em vista o traçado daquele itinerário principal inicialmente previsto (cfr. al. F) dos FP).
Esta alteração do traçado foi determinada por razões ambientais e urbanísticas, por despacho de aprovação da alteração ao primitivo traçado projectado pela JAE para o “IP2 - lanço Castelo Branco - Sublanço Castelo Branco Sul/………”, de 28.05.2001, do Secretário de Estado das Obras Públicas. Isto é, estiveram em causa na alteração do traçado razões de interesse público, no sentido de minimizar impactos ambientais e/ou de implantação urbanística que seriam mais gravosos com o traçado primitivo.
Ora, os prejuízos invocados pelos Recorrentes de quebra de vendas e da redução das margens de comercialização, decorrente de a área de serviço reconvertida deixar de fazer parte do traçado da via aqui em causa são prejuízos que, embora significativos, não podem deixar de se integrar no núcleo de “generalidade” e “normalidade” de sacrifícios suportados comummente por todos, ou por grupos indiferenciados de cidadãos.
Não podem ser considerados prejuízos especiais por não terem um carácter de especificidade subjectiva, na consideração de quem os suporta, no sentido em que não foram impostos a pessoa certa e determinada, mas antes em função de uma determinada alteração ditada pelo interesse público.
E, sobretudo, não são de considerar como anormais, por serem inerentes aos riscos normais da vida em sociedade, mais precisamente aos riscos da actividade comercial, suportados por todos os cidadãos que se encontrassem em situação idêntica à dos recorrentes (cfr. o já citado Ac. deste STA de 02.12.2004).
Com efeito, como bem refere a sentença recorrida é hoje uma circunstância normal a abertura de novas estradas que podem determinar a deslocalização de tráfego, sendo certo que é também possível a reversão desta situação, em vias que tendo inicialmente não sido portajadas o passem a ser, voltando muitas vezes o tráfego a fazer-se pelas vias primitivas.
Aliás, em relação às 1ª e 2ª recorrentes, como bem salienta a sentença recorrida, “Tal como sufragado em sede de relatório de peritagem, nos presentes autos, a Autora A…………, é uma das maiores empresas do País, controlando uma fatia importante do negócio de combustíveis, que se implantou noutro local perto do local inicial e a Autora B……….., não obstante as expectativas geradas, acabou por reconverter e adaptar, pelo menos parcialmente, o negócio inicial”.
Ao que acresce que não podem as Recorrentes pedir um montante a título de lucros cessantes por uma área de serviço que nunca existiu enquanto tal, de acordo com a previsão do DL nº 173/93, de 11/5, quando já foram ressarcidas pelos prejuízos em que incorreram com as obras efectuadas com a construção dessa área de serviço, pois tal representaria uma duplicação de indemnização.
Termos em que, não podem considerar-se como especiais e anormais os prejuízos respeitantes aos lucros cessantes questionados neste recurso, não sendo, sequer, de considerar que houve prejuízos quanto aos restantes, nos termos sobreditos.
Improcedem, consequentemente as conclusões A) a W).

Subsidiariamente vieram os Recorrentes pedir a condenação dos Recorridos a indemnizá-los por omissão ilícita e culposa de informação atempada de que havia uma séria probabilidade de a área de serviço aqui em causa vir a ser excluída do novo traçado do IP2, o que teria determinado que os Recorrentes não iniciassem as obras de reconversão, nos termos do art. 6º do DL nº 48051, interpretado em conformidade com o disposto no art. 22º da CRP.
Diga-se, desde já, que verdadeiramente não estamos aqui perante uma nova causa de pedir, mas perante uma causa de pedir subsidiária das anteriormente apreciadas, tendo como objectivo atingir a mesma indemnização pedida a título de responsabilidade civil por factos lícitos.
Estar-se-ia, segundo os Recorrentes, perante responsabilidade civil extracontratual do Estado e de pessoa colectiva pública, cujos presssupostos estão enumerados no art. 2º do DL nº 48051 (cfr. igualmente art. 4º do mesmo diploma e art. 483º, nº 1 do Código Civil (CC)).
Porém, no caso presente não existe qualquer dever de informar que tenha sido violado e que possa consubstanciar a prática de facto ilícito e culposo que tenha provocado dano, existindo um nexo de causalidade entre este e o facto (cfr. art. 563º do CC).
Alegam os Recorrentes que as obras de construção da área de serviço tiveram o seu início em Junho de 1997, já, portanto, em momento em que o traçado inicial era contestado pela Comissão de Avaliação de Impacte Ambiental, como decorre dos factos dados como provados pelo Tribunal a quo.
Com efeito, como se provou, a ex-JAE informou a Comissão de Coordenação da Região Centro, através do ofício nº 3974, de 17.11.98, de que não existia qualquer estudo que implicasse a exclusão da área de serviço do novo IP2. Entretanto terminara já a 1ª fase das obras de reconversão da área de serviço (por volta de Junho de 1998) e decorria já a 2ª fase dessas obras (entre Novembro de 1998 e final do primeiro trimestre de 1999).
E, embora houvesse, pelo menos em Março de 1999, contestação de populações ao traçado (cfr. als. AAA) e BBB) dos FP), a posição da 2ª Ré era no sentido da manutenção da área de serviço, independentemente do traçado, vindo o então Instituto de E……… a enviar a C…………, na qualidade de sócio gerente da B……….., Lda., o oficio nº 0031, de 14 de Julho de 1999, do qual consta que “Informo V. Exa. que o novo traçado do IP2 na zona de ……….., concretizado na planta que enviou, surgiu por recomendação da Comissão de Impactes Ambientais, para o lanço em que está inserido, após consulta pública, pelo que a “Sugestão Inicial” de V. Exa. não poderá ser atendida.
Mais informo que será solicitado à concessionária, entidade responsável pela realização do projecto de execução, que considere a localização da área de serviço por forma a que o traçado definitivo não interfira com a mesma.”
Ou seja, não existia ainda em Julho de 1999, qualquer decisão de membro do Governo ou de entidade para tal competente a pôr em causa o primitivo traçado, o que apenas vem a suceder com a declaração de impacte ambiental do Secretário de Estado do Ambiente, de 05.01.2001, e posterior despacho do Secretário de Estado das Obras Públicas, de 28.05.2001, a aprovar a alteração do traçado (cfr. als. D) e E) dos FP).
O que significa que não poderia a Recorrida E……….., SA e muito menos o Estado (que nunca manteve qualquer relação jurídica com os aqui recorrentes na matéria em causa nos autos) comunicar aos Recorrentes que haveria a hipótese de alteração do traçado com interferência na manutenção da área de serviço antes de as obras de reconversão da área de serviço estarem concluídas, sendo certo que tal “aviso” nunca poderia ter por base meras especulações.
Termos em que, não se podem ter por verificados os requisitos da existência de facto ilícito e culposo omissivo por parte dos Recorridos, tal como bem entendeu a sentença recorrida.
Improcedem, consequentemente, as conclusões X) a CC) do recurso.

Pelo exposto, acordam em julgar improcedente o recurso, confirmando a sentença recorrida.
Custas pelos Recorrentes.

Lisboa, 8 de Novembro de 2018. – Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa (relatora) – José Francisco Fonseca da Paz – Jorge Artur Madeira dos Santos.