Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0614/16.7BEAVR
Data do Acordão:01/12/2022
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO VERGUEIRO
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
IVA
ÓNUS DE PROVA
CONSERVAÇÃO
DOCUMENTOS
LIQUIDAÇÃO DO IMPOSTO
NOTIFICAÇÃO
Sumário:I - No caso dos autos, se é certo que o discurso do Recorrente alude, indistintamente, aos actos de notificação e liquidação de IVA (basta analisar a petição inicial), referindo logo no art. 1º daquele articulado que a presente acção funda-se na nulidade dos actos de notificação e liquidação de IVA relativos aos exercícios dos anos de 2006 e 2007, temos por adquirido que a sua alegação atinge, em termos essenciais, no domínio a considerar, apenas os actos de notificação.
II - Ora, neste âmbito, resulta essencial distinguir a situação relativa aos actos de liquidação da matéria que envolve a forma como a sua comunicação foi feita ao sujeito passivo, na medida em que os vícios susceptíveis de serem imputados à notificação não se estendem ao acto de liquidação, pelo que, independentemente da forma como os actos foram notificados ao Impugnante, sempre haveria que analisar se o acto de liquidação foi ou não praticado de acordo com os requisitos legais.
III - Tendo presente apenas o acto de notificação, temos que a decisão recorrida não merece qualquer censura, porquanto, o Impugnante apontou que recebeu as notas de notificação (o que supõe a sua emissão e recepção), o que significa que não pode invocar nesta sede o disposto no art. 74º nº 2 da LGT, sendo certo que o que releva para efeitos de apreciação do vício imputado ao acto são os termos em que os mesmos foram praticados e recepcionados pelo Impugnante, o que demanda a análise desses documentos e não outros.
IV - Clarificada a situação relativa ao alcance da pretensão do Recorrente, não merece censura o Acórdão recorrido quando refere que, afirmando o Recorrente que os actos impugnados (os actos de notificação das liquidações) se encontram inquinados de vício que gera a respectiva nulidade, o que lhe conferiria o direito a que se arroga de os impugnar a todo o tempo (esgotados que se encontram todos os demais prazos legais conferidos para o efeito), cabia-lhe fazer prova dos factos em que suporta a sua pretensão, pelo que, não o tendo feito, contra ele, decidiu, e bem, o Tribunal recorrido.
Nº Convencional:JSTA000P28757
Nº do Documento:SA2202201120614/16
Data de Entrada:07/13/2020
Recorrente:A...............
Recorrido 1:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
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Processo n.º 614/16.7BEAVR (Recurso de Revista)



Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. RELATÓRIO

A……………, devidamente identificado nos autos, inconformado, veio interpor Recurso de Revista, ao abrigo do disposto no artigo 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, datado de 23-05-2018, que negou provimento ao recurso por si interposto da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro que julgou improcedente a impugnação judicial por si deduzida contra liquidações de IVA relativas aos anos de 2006 e 2007, por ter julgado não provadas, por incumprimento do ónus da prova que julgou recair sobre o impugnante, as nulidades invocadas e que fundavam a pretensão de a impugnação poder ser deduzida “a todo o tempo”.

Formulou nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:

“ (…)

a) Incumbia à Administração Fiscal conservar pelo prazo de dez anos todos os arquivos atinentes ao procedimento de liquidação adicional de IVA e IRS que apenas concluiu em Janeiro de 2012;

b) O Recorrente identificou nos autos os períodos de cada liquidação, (“0603T; 0606T; 0609T; 0612T; 0703T; 0706T; 0709T; 0712T;”); os números a cada uma delas atribuídos pela administração tributária (“10103620; 10103622; 10103623; 10103624; 10103628; 10103630; 10103632; 10103634”), e como foram referenciados os órgãos de que as mesmas dimanaram, à acção inspectiva que lhes deu origem, o pedido de revisão oficiosa que se lhe sucedeu, bem como à espécie e ano do imposto.

c) Basta a mera identificação correcta nas liquidações e das respectivas notificações, (o que, aliás, o Recorrente no caso fez), para que, nos termos do n.º 2 do Art.º 74.º da LGT se considere satisfeito o ónus probatório de quem alegue factos provados com elementos que se encontrem - ou se devessem encontrar - em poder da administração tributária;

d) Ao considerar incumprido o ónus da prova por parte do Recorrente o venerando Tribunal Central Administrativo Norte decidiu contra legem e de forma divergente com ampla jurisprudência, e.g., Ac. TCA de 27/20/2016 no processo 08554/15; Ac. TCAS de 08-05-2019 no processo 2550/12.7BELRS; Ac. STA de 27/05/2015 no processo 078/14; Ac. TCAN de 25-02-2016 no processo 00023/00-Porto; Ac. TCAN de 27-02-2014 no processo 00076/11.5BEPRT; Ac. STA de 17-10-2018 no processo 0394/16.6BELRA 01049/17, (todos disponíveis em www.dgsi.pt);

e) Foi a Fazenda Pública quem protestou levar aos autos 2.ª via das liquidações sindicadas nos mesmos, bem como as respectivas notificações e comprovativos de realização, mas não o logrou fazer, incumprindo assim o ónus da prova que sobre si recaia;

f) A administração fiscal não logrou, como lhe incumbia demonstrar que efectuou as notificações sub judice de forma correcta, cumprindo os requisitos formalmente exigidos;

g) A administração fiscal não logrou, como lhe incumbia demonstrar que das liquidações e das respectivas notificações constava a indicação do autor do acto e, no caso de este o ter praticado no uso de delegação ou subdelegação de competências, da qualidade em que decidiu, do seu sentido e da sua data;

h) Em face das regras da distribuição do ónus da prova impunha-se que se dessem por demonstradas as nulidades alegadas pelo recorrente, com a consequente procedência do recurso e subsequente procedência da prerrogativa porque pugnou em sede de impugnação.

Nestes termos e nos melhores de Direito, cuja falta de invocação o experimentado e proficiente juízo de Vossas Ex.as Doutamente suprirá, deverá o presente recurso ser julgado procedente, com as legais consequências.”

A Recorrida Autoridade Tributária e Aduaneira não apresentou contra-alegações.

Em apreciação preliminar sumária, foi admitida a revista.

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao presente recurso de revista.

Cumpre decidir.




2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que a matéria apontada nos autos resume-se, em suma, em proceder à interpretação da regra tributária de distribuição do ónus da prova conjugado com o dever de conservação de documentos, ponderando-se o que deve entender-se como “elementos de prova dos factos (…) em poder da administração tributária” para efeitos de repartição do ónus da prova, em concreto, saber se as liquidações de imposto e respectivas notificações podem como tal [ser] consideradas.




3. FUNDAMENTOS

3.1. DE FACTO

Neste domínio, consta do Acórdão recorrido o seguinte:

“…

1. O ora Impugnante exerceu em nome individual, até 31-12-2007 a actividade de "Comércio de veículos automóveis", a que corresponde o CAE 45110 (cfr. Relatório de Inspecção, a fls. 4 e ss. do PA apenso);

2. Em 11-05-2010, na sequência do exame à sua escrita pelos Serviços de Inspecção da Direcção de Finanças de Aveiro, foi elaborado um relatório, sancionado superiormente, que aqui se dá por reproduzido, de acordo com o qual foram feitas correcções meramente aritméticas de IRS e IVA, aos anos de 2006 e 2007, e que, quanto ao IVA tiveram os seguintes fundamentos:

- o Impugnante fez aquisições intracomunitárias de veículos automóveis não tendo fornecido o NIF nessa aquisição, agindo como se de particular se tratasse, o que não deveria ter acontecido, já que as viaturas de destinaram a ser comercializadas em Portugal; não declarou as bases tributáveis nem liquidou IVA das aquisições intracomunitárias;

- O Impugnante fez aquisições intracomunitárias de veículos com liquidação de IVA, ou seja, sujeitas ao regime geral e efectuou a sua venda através do regime dos bens em segunda mão, quando a deveria ter sujeitado ao regime geral;

- Na venda dos veículos através do regime dos bens em segunda mão, o Impugnante apurou a margem (a base tributável do IVA) de forma errada, já que incluiu no preço de compra os encargos com as viaturas, nomeadamente, o imposto automóvel, as despesas de legalização, de transporte, reparações, etc., tendo diminuído a base tributável de IVA (fls. 1 e ss. do PA apenso);

3. Na sequência do relatório a que se refere o ponto anterior, foram emitidos os actos tributários aqui impugnados, os quais consistem nas liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios dos 4 períodos dos anos de 2006 e 2007, com datas de 26-06-2010, com os n.ºs 10103620, 10103621, 10103622, 10103623 10103624, 10103625 10103626, 10103627, 10103628, 10103629, 10103630, 10103631, 10103632, 10103633, 10103634 e 10103635, nos montantes de € 45.881,50, € 7.325,96, € 52.312,92, € 7.819,71, € 29.365,11, € 4.096,63, € 49.224,64, € 6.370,88, € 25.506,75, € 3.052,43, € 25.453,32, € 2.786,62, € 11.572,74, € 1.151,57, € 1.639,56 e € 146,62, respectivamente, cujas datas limite de pagamento voluntário foram fixadas em 31-08-2010 (fls. 68 e 72 do PA apenso e 115 dos autos em suporte de papel);

4. Os actos m.i no parágrafo supra foram objecto de pedido de revisão nos termos do art. 78.º da LGT, o qual foi apresentado por carta registada de 08-02-2011 (cfr. fls. 69 a 71 do PA apenso);

5. Tal pedido foi indeferido em 28-12-2011, por despacho do Senhor Subdirector-Geral dos Impostos, em substituição, baseado na informação dos serviços, dando-se ambos aqui por reproduzidos (fls. 104 a 110 do PA apenso);

6. A decisão que antecede foi enviada ao Impugnante pelo oficio n.º 200063, de 09-01-2012, remetido por carta registada com AR, assinado em 12-01-2012 (fls. 110 v.º e 111 do PA apenso);

7. Em 31-05-2016 foi deduzida a presente impugnação judicial, apresentada através do site oficial (cfr. fls. 1 e 2 dos autos em suporte físico).

3.2. Factos não Provados
A. Das notificações das liquidações adicionais a que se refere o ponto 3. supra não consta o seu autor, a data da prática do acto ou os poderes usados (como resulta do relatório desta decisão, o Impugnante, a quem competia a completa identificação dos actos impugnados, ainda para mais, quando afirma expressamente que deles foi notificado, não os juntou aos autos, nem as liquidações, nem as notificações, mesmo após interpelação expressa do Tribunal; a FP veio dizer não ser possível a AT a recuperação das segundas vias por terem sido emitidas há mais de 5 anos; nestas circunstâncias, na falta dos documentos que permitissem a análise do alegado, o Tribunal não o pôde considerar provado);
B. Das próprias liquidações a que se refere o ponto 3. supra não constam os elementos identificativos do seu autor, a data da prática do acto, nem os poderes usados (como resulta do relatório desta decisão, o Impugnante, a quem competia a completa identificação dos actos impugnados, ainda para mais, quando afirma expressamente que deles foi notificado, não os juntou aos autos, nem as liquidações, nem as notificações, mesmo após interpelação expressa do Tribunal; a FP veio dizer não ser possível a AT a recuperação das segundas vias por terem sido emitidas há mais de 5 anos; nestas circunstâncias, na falta dos documentos que permitissem a análise do alegado, o Tribunal não o pôde considerar provado).
Não há outros factos não provados com interesse para a decisão da causa.
A decisão da matéria de facto, provada e não provada, efectuou-se com base no exame crítico dos documentos que constam dos autos e do processo administrativo, não impugnados, bem como da falta de junção dos necessários, cuja relevância foi referida a propósito de cada ponto do probatório.”


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3.2. DE DIREITO

Assente a factualidade apurada cumpre, então, entrar na análise da realidade em equação nos autos, sendo que a este Tribunal está cometida a tarefa de indagar da bondade do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte e Fiscal do Porto, datado de 23-05-2018, que negou provimento ao recurso interposto pela aqui Recorrente da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro que julgou improcedente a impugnação judicial por si deduzida contra liquidações de IVA relativas aos anos de 2006 e 2007, por ter julgado não provadas, por incumprimento do ónus da prova que julgou recair sobre o impugnante, as nulidades invocadas e que fundavam a pretensão de a impugnação poder ser deduzida “a todo o tempo”.

Com efeito, o acórdão recorrido negou provimento ao recurso interposto pelo Recorrente da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro que julgou improcedente a impugnação, por ter entendido que não ficou provado nos autos que os actos de liquidação e os da sua notificação não contivessem o autor, a data da prática do acto ou os poderes usados, pois que, como se deixou consignado na fundamentação desses factos, o Impugnante, a quem competia a completa identificação dos actos impugnados, não os juntou aos autos, mesmo após interpelação expressa do Tribunal, sendo que a Fazenda Pública veio dizer não ser possível a recuperação das segundas vias por terem sido emitidas há mais de 5 anos.

Além disso, o Impugnante afirmou expressamente na p.i. que foi notificado de tais actos, pelo que nem se percebe o requerimento probatório a solicitar à AT a sua junção aos autos, não sendo invocada qualquer justificação para tal e nos termos do art. 74.º n.º 1 da LGT, “O ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.”, o que significa que, invocando o Impugnante que os actos notificados padeciam das nulidades invocadas, era ele quem tinha que o demonstrar, juntando os mesmos aos autos, o que não fez e, nestas circunstâncias, na falta dos documentos que permitam a análise do alegado, o Tribunal vê-se impedido de apreciar o mérito dessa alegação, de modo que, funcionando no caso as regras do ónus da prova, recaindo sobre o Impugnante tal ónus, e não o tendo cumprido, a impugnação tem necessariamente que improceder.

O Acórdão do TCA Norte corroborou tal análise, “Uma vez que para aquilatar da observância dos requisitos formais dos actos postos em crise era imperativo que o Tribunal a quo acedesse aos originais daqueles documentos, e que aqueles estão em poder do Recorrente, dúvidas não subsistem que era sobre este que impendia o respectivo ónus da prova.

No caso vertente, afirmando o Recorrente que os actos impugnados se encontram inquinados de vício que gera a respectiva nulidade, o que lhe conferiria o direito a que se arroga de os impugnar a todo o tempo (esgotados que se encontram todos os demais prazos legais conferidos para o efeito), cabia-lhe fazer prova dos factos em que suporta a sua pretensão. Pelo que, não o tendo feito, contra ele, decidiu, e bem, o Tribunal recorrido”.

Que dizer?

Tendo presente o decidido em ambas as Instâncias, deparamos com um “non liquet” no que concerne à prova sobre os vícios que alegadamente afectavam a validade tanto do acto tributário, do acto de notificação, os quais constituíam o suporte do Impugnante para viabilizar a tempestividade da propositura da ação (em resultado da nulidade do acto tributário e da ineficácia do acto de notificação), o que significa que a questão que se coloca, consiste, pois, em saber se à luz do disposto no artigo 74 º da Lei Geral Tributária, esse “non liquet” é imputável ao Autor da acção ou à AT.

Como se viu, quer a 1ª Instância, quer o TCA Norte decidiram pela sua imputabilidade ao Autor da acção, nos termos do artigo 74º nº 1 da LGT, sendo que o ora Recorrente, por referência ao nº 2 do aludido preceito legal, sustenta que da sua parte satisfez o ónus que sobre ele recaía, passando a incidir sobre a AT o ónus de juntar aos autos os documentos em falta, porque os mesmos foram por esta emitidos e remetidos.

Neste ponto, importa salientar que o Acórdão do TCA Norte começou por apontar que “o centro nevrálgico do dissídio consiste em determinar se a Mmº Juiz do Tribunal a quo fez errado julgamento, ao julgar caducado o direito de impugnar, no entendimento de que o Impugnante, ora Recorrente, não logrou demonstrar, como sobre ele impendia, que os actos impugnados padeciam de vícios que lhes assacara (lembre-se, falta de indicação do autor, da data da prática do acto e dos poderes usados) que, a verificarem-se, determinariam a nulidade dos mesmos e consequentemente a sua impugnabilidade a todo o tempo”.

E se é certo que o discurso do Recorrente alude, indistintamente, aos actos de notificação e liquidação de IVA (basta analisar a petição inicial), referindo logo no art. 1º daquele articulado que a presente acção funda-se na nulidade dos actos de notificação e liquidação de IVA relativos aos exercícios dos anos de 2006 e 2007, temos por adquirido que a sua alegação atinge, em termos essenciais, no domínio a considerar, apenas os actos de notificação.

Com efeito, após referir no art. 10º da petição inicial que “as notificações em crise padecem de vício formal, que determina a sua nulidade, nomeadamente porque delas não constam o seu autor, a data da prática do acto, nem os poderes usados, conforme o determinava o n.º 9 do Art.º 39º do CPPT, na sua 17.ª versão, à data aplicável”, dizendo ainda que tal nulidade essa afecta os actos aqui em crise, dimanados do Serviço de Finanças de Ovar que terão forçosamente sido praticados ao abrigo de uma delegação, ou subdelegação de poderes, por falta de competências próprias para o efeito, acrescentando ainda que, reconhecida a nulidade das notificações, e em consequência disso mesmo, todo o processado subsequente é ineficaz, não podendo as liquidações notificadas produzir quaisquer efeitos, alega também (art. 15º) que “as próprias liquidações enfermam de nulidade, pois das mesmas também não consta qualquer elemento identificativo do seu autor, a data da prática do acto, nem os poderes usados, violando o disposto no n.º 9 do Art.º 39º do CPPT, na sua 17.ª versão).

Pois bem, no contexto da realidade descrita pelo Impugnante, o articulado no art. 15º da petição inicial só se compreende por referência aos elementos que lhe foram disponibilizados no âmbito da notificação efectuada, não sendo por acaso que o Impugnante repete os elementos de facto e de direito que servem à sua alegação relacionada com os actos de notificação e liquidação de IVA, sendo significativa a referência, pela ordem indicada, aos actos em apreço.

Para ilustrar o que acabamos de apontar, cabe ainda referir que o pedido formulado aponta que “a) As notificações das liquidações de IVA dos anos de 2006 e 2007, remetidas ao Impugnante, padecem de nulidade, por vício de forma, por violação dos termos do Art.º n.º 9 do Art.º 39º do CPPT, na sua 17.ª versão, à data aplicável” e que “b) As liquidações de IVA dos anos de 2006 e 2007, propriamente ditas, padecem de nulidade, por vício de forma, por violação dos termos do Art.º n.º 9 do Art.º 39º do CPPT, na sua 17.ª versão, à data aplicável”.

Ora, a norma em apreço diz respeito ao acto de notificação, considerando que “O acto de notificação será nulo no caso de falta de indicação do autor do acto e, no caso de este o ter praticado no uso de delegação ou subdelegação de competências, da qualidade em que decidiu, do seu sentido e da sua data”.

Com este pano de fundo, cremos ter demonstrado, de forma inequívoca, que o Recorrente, apesar da sucessiva referência aos actos de notificação e liquidação de IVA, tem apenas como suporte de toda a sua alegação os termos em que foi feita a notificação, sendo neste pressuposto que importa analisar a matéria subjacente aos autos.

Dito de outro modo, quando o acórdão recorrido menciona que “… consubstanciando-se os actos recorridos quer nas liquidações de IVA, quer nas respectivas notificações remetidas ao Recorrente, cujos vícios geradores de nulidade emergem da falta das menções reputadas essenciais pelo legislador, (concretamente, a falta de indicação do autor, a data da pratica do acto e os poderes usados), a nulidade apontada, como se viu, incide só sobre as notificações das liquidações de IVA.

Ora, neste âmbito, resulta essencial distinguir a situação relativa aos actos de liquidação da matéria que envolve a forma como a sua comunicação foi feita ao sujeito passivo, na medida em que os vícios susceptíveis de serem imputados à notificação não se estendem ao acto de liquidação, pelo que, independentemente da forma como os actos foram notificados ao Impugnante, sempre haveria que analisar se o acto de liquidação foi ou não praticado de acordo com os requisitos legais.

Avançando, e tendo presente apenas o acto de notificação, temos que a decisão recorrida não merece qualquer censura, porquanto, o Impugnante apontou que recebeu as notas de notificação (o que supõe a sua emissão e recepção), o que significa que não pode invocar nesta sede o disposto no art. 74º nº 2 da LGT, sendo certo que o que releva para efeitos de apreciação do vício imputado ao acto são os termos em que os mesmos foram praticados e recepcionados pelo Impugnante, o que demanda a análise desses documentos e não outros.

Tal significa que, clarificada a situação relativa ao alcance da pretensão do Recorrente, não merece censura o Acórdão recorrido quando refere que, afirmando o Recorrente que os actos impugnados (os actos de notificação das liquidações) se encontram inquinados de vício que gera a respectiva nulidade, o que lhe conferiria o direito a que se arroga de os impugnar a todo o tempo (esgotados que se encontram todos os demais prazos legais conferidos para o efeito), cabia-lhe fazer prova dos factos em que suporta a sua pretensão, pelo que, não o tendo feito, contra ele, decidiu, e bem, o Tribunal recorrido, situação que tem um verdadeiro efeito de implosão no que concerne ao presente recurso.


4. DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pelo Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida.

Custas pelo Recorrente.

Notifique-se. D.N..




Lisboa, 12 de Janeiro de 2022. - Pedro Nuno Pinto Vergueiro (relator) - Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia - Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos.