Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0264/09.4BELRA 0806/15
Data do Acordão:11/06/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:SUZANA TAVARES DA SILVA
Descritores:PREÇO
PROCEDIMENTO
CONDIÇÃO DE IMPUGNABILIDADE
Sumário:A apresentação atempada do pedido para demonstração do preço efectivo (instauração do procedimento), previsto no n.º 3 artigo 129.º do CIRC (actualmente, artigo 139.º do CIRC), é condição de procedibilidade da impugnação judicial quando nesta se pretenda discutir o preço efectivamente praticado nas transmissões de direitos reais sobre bens imóveis.
Nº Convencional:JSTA000P25116
Nº do Documento:SA2201911060264/09
Data de Entrada:07/01/2015
Recorrente:A............, LDA
Recorrido 1:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:


I – Relatório

1 – A…………, Lda. interpôs recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, em 30 de Março de 2014, que julgou verificada a excepção dilatória da inimpugnabilidade do acto, absolvendo a ré da instância, apresentando, para tanto, alegações que conclui do seguinte modo:
A - O artigo 58.º-A remete para os n.ºs 3 e 4 do artigo 129.º, ambos do CIRC.
B - Por sua vez, o n.º 3 do artigo 129.º do CIRC remete para o artigo 91.º da LGT.
C - Ou seja, a aplicação do n.º 3 do artigo 129.º do CIRC implica a aplicação do regime do artigo 91.º da LGT.
D - De acordo com o n.º 1 do artigo 91.º da LGT, a aplicação da decisão de tributação por métodos indirectos depende sempre da notificação efectuada para esse efeito.
E - Do mesmo modo, a tributação, em sede de IRC, do valor patrimonial tributário carece de notificação específica para efeitos do exercício do direito de reclamar do valor do preço efectivo.
F - Notificação do contribuinte efectuada nos termos do artigo 91.º da LGT que constitui elemento essencial da própria correcção nos termos do artigo 58.º-A do CIRC, por força da remissão dos artigos 129.º do CIRC e 91.º da LGT.
G - Efectuada correcção nos termos do artigo 58.º-A do CIRC sem que haja prova da notificação efectuada nos termos do artigo 91.º da LGT conjugado com o n.º 3 do artigo 129.º do CIRC, a respectiva correcção é ilegal.
H - A douta sentença recorrida incorreu em errada e incorrecta interpretação e aplicação do artigo 58.º-A e do n.º 3 do artigo 129.º, ambos do CIRC, conjugados com o artigo 91.º da LGT.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e em consequência ser revogada a douta sentença recorrida, com as legais consequências».


2 - Não foram produzidas contra-alegações.

3 - O Excelentíssimo Senhor Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso pelas seguintes razões:
1.º o contribuinte não promoveu, no prazo legalmente estatuído, como era seu ónus, o procedimento de prova do preço efectivo na transmissão de imóveis;
2.º ao não ter promovido atempadamente o referido procedimento, perdeu, legalmente, o direito a ilidir a presunção do n.º 1 do artigo 58.º-A do CIRC.

4 - Colhidos os vistos legais, cabe decidir.


II – Fundamentação

1. De facto
Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte factualidade concreta:
A) Em 07-12-2007 os Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Leiria elaboraram as conclusões do relatório do procedimento interno de inspecção, efectuado ao abrigo da Ordem de Serviço n.º OI200702112, em nome da ora impugnante, ao exercício de 2005, onde consta, designadamente, o seguinte:
"I. Objectivos, âmbito e extensão da acção inspectiva
1.1. Credencial e período em que decorreu a acção
O procedimento interno de inspecção foi efectuado em cumprimento da Ordem de Serviço n.º OI200702112, de 09-11-2007. A acção teve início a 09-11-2007 e terminou a 07-12-2007.
1.2. Motivo, âmbito e incidência temporal
No âmbito da análise à correcção ao valor de transmissão de direitos reais sobre imóveis nos termos do artigo 58.º-A do Código do IRC, com base numa proposta de verificação à empresa, após ser seleccionada por consulta ao sistema informático da DGCI. O âmbito da acção é o IRC, com extensão ao exercício de 2005.
1.3. Outras situações
A empresa encontra-se registada na actividade Construção e Engenharia Civil, CAE 045212, com início em 02-01-1975. É tributada em IR pelo regime geral de tributação e, em sede de IVA, está enquadrada no regime normal mensal.
II. Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria tributável. Durante o exercício de 2005 a empresa vendeu entre outros os seguintes imóveis:



A empresa deveria ter efectuado uma correcção na declaração de rendimentos do exercício de 2005, a entregar em Maio de 2006, correspondente ao somatório das diferenças positivas entre o VPT definitivo de cada um dos cinco primeiros imóveis transmitidos identificados no quadro atrás e o valor constante do contrato - € 63.000,00, uma vez que à data em que foi notificada do VPT ainda estava em tempo de proceder a este acerto no Modelo 22 entregue dentro do prazo legal.
Relativamente ao artigo 8456, e dado que a notificação do VPT só foi efectuada em 19-12-2006, o sujeito passivo, nos termos do artigo 58.º-A, n.º 4 do CIRC, deveria ter entregue uma declaração de substituição tipo 3, para o exercício de 2005, em Janeiro de 2007, a corrigir a diferença entre o VPT e o valor do contrato, ou seja, € 161.710,58.
III. (...)
IX Direito de audição - fundamentação
A) Notificação do projecto de correcções
O sujeito passivo foi notificado do projecto de correcções através de carta registada, para no prazo de 10 dias exercer o direito de audição.
B) Resposta obtida
O sujeito passivo exerceu o direito de audição por escrito em 03-12-2007, alegando resumidamente o seguinte:
Vendeu a 19-05-2005 a fracção J do prédio inscrito na matriz sob o número 4189, freguesia e concelho de ..., por € 100.000,00. A 5 de Julho do mesmo ano foi notificado do valor patrimonial tributário, sendo este de € 132.370,00. Solicitou a 21 de Julho seguinte, nos termos do artigo 76.º do CIMI uma 2.ª avaliação. Continua a aguardar pelo resultado da 2.ª avaliação.
Ao cumprir o n.º 4 do artigo 58.º-A do CIRC a empresa não está obrigada a efectuar qualquer tipo de correcção na declaração de rendimentos de 2005, nem em nenhum outro até à presente data por não ser aplicável.
Nos restantes prédios identificados no projecto de relatório, o VPT é susceptível de impugnação, é o caso do artigo inscrito na matriz sob o n.º 8456 da freguesia de ………, concelho de Leiria.
Pelo que as correcções propostas no projecto de relatório devem ser retiradas.
C) Análise da resposta
Relativamente à fracção J do artigo 4189, apesar de no sistema informático estar a informação "matriz actualizada", o sujeito passivo fez um pedido de 2.ª avaliação que deu entrada no Serviço de Finanças de Leiria 1 a 21 de Julho de 2005, não tendo ainda sido notificado do resultado. A correcção só é devida quando o VPT se torna definitivo, o que não é o caso pelo que não se aplica o artigo 58.º-A do CIRC. Esta correcção no valor de € 32.370,00 não é devida.
Relativamente às restantes fracções identificadas no projecto de relatório, o sujeito passivo já foi notificado do VPT definitivo pelo que a correcção já devia ter sido efectuada nos termos do artigo 58.º-A do CIRC.
Nos termos do n.º 1 do artigo 77.º do CIMI "Do resultado das segundas avaliações cabe impugnação judicial nos termos definidos no CPPT". Nos termos do n.º 8 do artigo 129.º do CIRC "A impugnação do acto de fixação do valor patrimonial tributário, prevista no artigo 77.º do CIMI e no artigo 134.º do CPPT, não tem efeito suspensivo quanto à liquidação de IRC (...) Desta forma a correcção relativa à diferença entre o VPT definitivo e o valor do contrato é devida nos termos do artigo 58.º do CIRC.
Conclusão
Face ao exposto, mantém-se as correcções propostas no projecto de relatório com excepção da correcção relativa à fracção J do artigo 4189 que aguarda pelo resultado da 2.ª avaliação, ou seja, mantém-se uma correcção no valor de € 193.740,58. (...),". - (cfr. 10 a 14 dos autos).”
B) Com data de 17-12-2007 a Direcção de Finanças de Leiria, através do ofício n.º 9810, notificou a ora impugnante do relatório de inspecção identificado na alínea anterior - (cfr. fls. 8 dos autos).
C) Com data de 26-12-2007 a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu em nome da ora impugnante a liquidação de IRC n.º 20078310019761, relativa ao exercício de 2005, no montante de - € 53.671,63 - (cfr. doc. de fls. 6 dos autos).
D) Em 27-12-2007 a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu em nome da ora impugnante a demonstração de acerto de contas e aviso de cobrança da liquidação referida na alínea anterior, com data limite de pagamento de 06-02-2008 - (cfr. doc. de fls. 7 dos autos).
E) Em 28-01-2008 a ora impugnante apresentou junto do Serviço de Finanças de Leiria 1 reclamação graciosa da liquidação de IRC referida em C), a qual por despacho do Director de Finanças de Leiria de 02-02-2009 foi parcialmente deferida, na parte respeitante ao cálculo dos juros compensatórios - (cfr. fls. 28 a 30 dos autos).
F) Em 16-02-2009 deu entrada neste Tribunal a petição inicial da presente impugnação judicial - (cfr. carimbo aposto no rosto da p.i. a fls. 1 dos autos)».
2. Questão a decidir
Saber se a instauração atempada do procedimento previsto no n.º 1 e 3 do artigo 129.º do CIRC (na redacção em vigor em 2007), para efectuar prova de que o preço efectivamente praticado nas transmissões de direitos reais é inferior ao valor patrimonial tributário, constitui ou não condição de procedibilidade da impugnação judicial da liquidação adicional do imposto quando nesta se pretenda discutir o valor calculado nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 58.º-A do CIRC (na redacção igualmente em vigor em 2007).


3. De direito
3.1. A questão aqui em apreço – qualificação e efeitos jurídicos do procedimento de prova do preço efectivo na transmissão de imóveis, previstos no artigo 129.º do CIRC (na redacção em vigor em 2007, correspondendo actualmente ao artigo 139.º) – não é nova na jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, pois sobre ela já se pronunciaram os acórdãos de 6 de Fevereiro de 2013 (processo n.º 0989/12) e de 3 de Dezembro de 2014 (processo n.º 0881/12), em sentido do qual aqui não iremos divergir.

3.2. A factualidade em apreço prende-se com a correcção, no âmbito da determinação da matéria colectável do imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (IRC), do valor de transmissão de direitos reais sobre imóveis prevista no artigo 58.º-A do CIRC (na redacção em vigor em 2007, correspondendo actualmente ao artigo 64.º). Esta medida foi aditada àquele código por ocasião da aprovação e entrada em vigor da reforma da tributação do património (prevista no Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro) e dela resultava que “os valores patrimoniais tributários que servissem de base à liquidação do IMT passariam também a constituir o valor mínimo para a determinação do lucro tributável, quer do IRS, rendimentos empresariais, quer do IRC” (v. preâmbulo do Decreto-Lei n.º 287/2003).
Assim, e como se explica no acórdão do STA de 3 de Dezembro de 2014 (processo n.º 0881/12) “a determinação do valor patrimonial tributário dos imóveis, que é obtida através da fórmula prevista no artigo 38.º e seguintes do Código do IMI, e que procura uma aproximação aos valores de mercado com vista a proporcionar maior equidade na tributação do património, tem importantes consequências a nível fiscal, designadamente a nível de tributação do rendimento, particularmente quando o valor de transacção do imóvel diverge do seu valor patrimonial tributário (VPT). Na verdade, pese embora não haja reflexos quando o valor efectivo da transmissão é maior que o valor patrimonial tributário (dado que é o valor efectivo da transmissão a base fiscal para o IMT, o IRS, e o IRC – cfr. arts. 12.º do CIMT, 31.º-A do CIRS e 58.º-A do CIRC), já assim não acontece quando o valor efectivo da transmissão é inferior ao que posteriormente vier a ser fixado como VPT, com a agravante de que este valor patrimonial tributário definitivo pode ser apenas conhecido e/ou fixado num exercício fiscal diferente daquele em que a transmissão ocorreu”.
Trata-se, como se afirma no mesmo acórdão do STA de 3 de Dezembro de 2014 (processo n.º 0881/12), de “um preceito [o do n.º 1 e 2 do artigo 58.º-A do CIRC (na redacção em vigor em 2007)] com a natureza de norma especial anti-abuso, que visa corrigir, para efeitos de determinação do lucro tributável, os valores de venda/aquisição dos imóveis”. Por essa razão, diz-se também no aludido aresto, que aquele instrumento “só pode operar na sequência de um procedimento legal tributário que possibilite a demonstração, perante a administração tributária, que os valores das transacções praticados foram efectivamente inferiores aos valores patrimoniais tributários respectivos”, ou seja, consagra-se um expediente procedimental que assegura a possibilidade de elisão da presunção; e, para assegurar essa garantia dos contribuintes, “foi instituída a possibilidade de os sujeitos passivos exibirem elementos de prova que comprovem que o valor declarado e registado na contabilidade é o verdadeiro preço de compra (no caso do comprador) e o verdadeiro preço de venda (no caso do alienante), em conformidade com o disposto no artigo 129.º do CIRC”.
Esta qualificação daquela disposição legal como norma especial anti-abuso que institui uma presunção ilidível é, de resto, reconhecida pelo legislador no preâmbulo do Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis, aprovado pelo referido Decreto-Lei n.º 287/2003, quando aí se afirma que “alteram-se alguns preceitos dos Códigos do IRS e do IRC, de modo que o valor tributável para efeitos da tributação das transmissões de imóveis seja, em regra, igualmente relevante para efeitos da determinação do lucro tributável das empresas, individuais ou colectivas, cuja actividade seja a alienação de bens imóveis, quer por si construídos, quer no âmbito da actividade de compra para revenda. Não obstante, não se trata de uma regra absoluta, já que se confere ao alienante o direito de requerer segunda avaliação, em pé de igualdade com o adquirente, podendo ainda requerer a instauração de um procedimento próprio para demonstrar que o preço efectivamente praticado foi inferior ao valor patrimonial tributário que serviu de base à liquidação do IMT”.

3.3. Sobre o modus operandi e a natureza jurídica do procedimento consagrado no referido artigo 129.º do CIRC (redacção em vigor em 2007) para ilidir a presunção e fazer prova do preço efectivo da transmissão do bem imóvel, diz-nos ainda o acórdão do STA de 3 de Dezembro de 2014 (processo n.º 0881/12) que o mesmo “é instaurado mediante requerimento dirigido ao director de finanças competente e apresentado no mês de Janeiro do ano seguinte àquele em que ocorreu a transmissão (caso o valor patrimonial tributário já se encontre definitivamente fixado) ou nos 30 dias posteriores à data em que a avaliação se tornou definitiva (nos restantes casos) e que se rege «pelo disposto nos artigos 91.º e 92.º da Lei Geral Tributária, com as necessárias adaptações, sendo igualmente aplicável o disposto no n.º 4 do artigo 86.º da mesma lei» (n.º 5 do artigo 129.º).
Equiparou-se, assim, este procedimento àquele outro previsto nos artigos 91.º e 92.º da LGT (pedido de revisão da matéria colectável fixada por métodos indirectos), constituindo tal procedimento uma condição necessária à abertura da via contenciosa (n.º 7 do artigo 129.º). Ou seja, o procedimento que visa a demonstração, pelo sujeito passivo, de que o preço efectivamente praticado foi inferior ao VPT definitivamente fixado, constitui uma condição de procedibilidade da impugnação judicial quando nesta se pretenda discutir o preço efectivamente praticado nas transmissões de direitos reais sobre bens imóveis”.

3.3. De resto, os dois acórdãos do STA a que fizemos alusão anteriormente [(acórdãos de 6 de Fevereiro de 2013 (processo n.º 0989/12) e de 3 de Dezembro de 2014 (processo n.º 0881/12)] cuidaram também, de forma pormenorizada, da relação que se há-de estabelecer entre este procedimento do artigo 129.º do CIRC (hoje artigo 139.º) e o princípio da impugnação unitária, previstos no artigo 54.º do CPPT, tendo firmado sobre esta matéria os seguintes postulados: i) que a apresentação atempada do pedido para demonstração do preço efectivo (instauração do procedimento), previsto no n.º 3 artigo 129.º do CIRC, é condição de procedibilidade da impugnação judicial quando nesta se pretenda discutir o preço efectivamente praticado nas transmissões de direitos reais sobre bens imóveis; ii) que é no âmbito da impugnação judicial da liquidação que devem ser invocados, não só qualquer ilegalidade ou erro praticado na liquidação, como também no procedimento destinado à prova do preço efectivo; iii) que no âmbito da impugnação judicial é possível lançar mão de qualquer meio de prova admitido e que se revele adequado para a demonstração do preço efectivo; iv) que o acto de determinação do VPT definitivo do imóvel quando afecte, de forma actual e imediata, os direitos e interesses legalmente protegidos do sujeito passivo de imposto sobre o rendimento pode ser objecto de impugnação autónoma e imediata, subtraída ao regime regra da impugnação unitária; v) que o contribuinte pode propor acção administrativa especial para sindicar a legalidade do acto final do procedimento que instaurou com vista à prova do preço efectivo da transmissão.
Em suma, a jurisprudência deste Tribunal assegurou já, por via da interpretação normativa dos preceitos legais aplicáveis a este tipo de casos e no âmbito da concreta resolução dos litígios que lhe foram colocados, uma tutela jurisdicional ampla e efectiva da posição jurídica do sujeito passivo do IRC.

3.4. No litígio que agora, em concreto, nos cumpre analisar e decidir verifica-se, da factualidade dada como provada na sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, que a recorrente impugnou judicialmente a liquidação adicional do imposto resultante das correcções efectuadas no seguimento do procedimento de inspecção tributária, liquidação que decorre da aplicação do disposto no n.º 2 do artigo 58.º-A do CIRC (na redacção em vigor em 2007), sem ter previamente instaurado o procedimento previsto no artigo 129.º do CIRC (na redacção em vigor em 2007) para prova do preço efectivamente praticado nas transmissões, mediante requerimento dirigido ao director de finanças competente. Um procedimento que – como dissemos antes – é condição de procedibilidade da impugnação judicial.
Por isso, não merece censura a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria quando afirma que “(…) não tendo a impugnante apresentado o procedimento contemplado no artigo 129.º do CIRC, está-lhe vedada na presente impugnação judicial, discutir que o preço constante nas escrituras corresponde ao real, por falta dessa condição de procedibilidade” e conclui que “procede a excepção invocada pela Fazenda Pública e pelo Digno Magistrado do Ministério Público da inimpugnabilidade da liquidação em causa, o que implica que a presente impugnação judicial careça de objecto e acarreta, por consequência, a extinção da instância, nos termos previstos nos artigos 278.º, al. e) do Código de Processo Civil (CPC) aplicável por remissão do art.º 2.º, al. e) do CPPT”.

3.5. Conclusões
Assim, podemos concluir, relativamente à questão em apreço, que:
A apresentação atempada do pedido para demonstração do preço efectivo (instauração do procedimento), previsto no n.º 3 artigo 129.º do CIRC (actualmente, artigo 139.º do CIRC), é condição de procedibilidade da impugnação judicial quando nesta se pretenda discutir o preço efectivamente praticado nas transmissões de direitos reais sobre bens imóveis.

Pelo exposto, acordam os juízes que compõem esta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida.

Custas pelo recorrente [nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 527.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi a alínea e, do artigo 2.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário].
Lisboa, 6 de Novembro de 2019. - Suzana Tavares da Silva (relatora) – Paulo Antunes – Francisco Rothes.